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2.9 Reações adversas às drogas envolvidas na PQT

2.9.2 Dapsona

A dapsona é metabolizada no fígado, onde sofre reações de oxidação (acetilação e N- hidroxilação), que resultam na produção de metabólitos tóxicos, como a hidroxilamina, responsáveis pelos efeitos adversos hematológicos da dapsona, como a anemia hemolítica e a metaemoglobinemia (ASHURST et al., 2010; VIEIRA et al., 2010; KANNAN et al., 2009).

Tentativas de bloquear os efeitos hematotóxicos dos metabólitos da dapsona através do uso de antioxidantes como vitaminas E e C, bem como do ácido fólico têm sido feitas. A coadministração de um inibidor do metabólito, como a cimetidina tem mostrado reduzir

significativamente a metaemoglobinemia dose-dependente, sem reduzir a eficácia terapêutica (COLEMAN, 1993; QUEIROZ et al., 1997; GONÇALVES et al., 2012). Tem-se observado que, devido a mecanismo de inibição enzimática, a cimetidina, um antagonista dos receptores de histamina H2, pode desviar o metabolismo da dapsona para uma maior produção de metabólitos inativos não-tóxicos. No entanto, até o momento, não está claro se o uso da cimetidina com a dapsona oral é capaz de reduzir efeitos adversos como a neuropatia, por exemplo (COLEMAN, 1993).

Tem sido demonstrada a existência de acetiladores lentos e rápidos, porém essa variação não parece alterar o risco de desenvolver os efeitos colaterais hematológicos pela dapsona (QUEIROZ et al., 1997; KANNAN et al., 2009).

Os efeitos adversos mais frequentes da dapsona são os hematológicos, como a anemia hemolítica e a metaemoglobinemia. Tais efeitos são dose-dependentes (BULA DA DAPSONA, 2014) e tipicamente aparecem durante as fases precoces do tratamento (McCARTY; DEL ROSSO, 2010). Exceto nos casos graves, a hemólise não requer suspensão do tratamento (BULA DA DAPSONA, 2014). Os pacientes com deficiências genéticas de enzimas envolvidas nas defesas oxidantes, tais como a glicose-6-fosfato-desidrogenase (G6PD) ou a glutationa- redutase, são mais suscetíveis à hemólise (FANELLO et al., 2008).

A G6PD desempenha um papel crítico na proteção dos eritrócitos contra a hemólise por estresse oxidativo. Essa enzima permite a regeneração do NADPH, que é essencial para a reciclagem de glutationa e proteção contra danos oxidativos (FANELLO et al., 2008). A deficiência de G6PD é o defeito hereditário enzimático humano mais comum, presente em mais de 400 milhões de pessoas em todo o mundo. O gene que codifica a G6PD está localizado no cromossomo X; Com a deficiência da enzima, homens hemizigotos e mulheres homozigotas são vulneráveis a hemólise por estresse oxidativo, enquanto mulheres heterozigotas têm deficiência variável (mais branda) determinada pelo grau de inativação do cromossomo X. Existem numerosos polimorfismos do gene da G6PD. Aproximadamente 200 alelos variantes têm sido descritos e 140 mutações, ou combinação de mutações, foram identificadas. Anemia hemolítica aguda é a manifestação clínica mais frequente associada à deficiência de G6PD. Pode ser precipitada por alimentos ou fármacos com propriedades oxidantes. O grau de hemólise induzida por drogas relacionadas depende de uma série de fatores, incluindo a variante

G6PD, a droga e a dosagem, além de outros fatores pouco caracterizados. As sulfonas podem causar hemólise em pacientes com deficiência de G6PD (FANELLO et al., 2008).

A figura 2 mostra o papel da G6PD na primeira reação na via pentose fosfato.

Ademais, a dapsona reduz a vida média da hemácia (ZUIDEMA; HILBERS- MODDERMAN; MERKUS, 1986). Após exposição aos seus metabólitos tóxicos, como a hidroxilamina, os eritrócitos são reconhecidos como envelhecidos e prematuramente removidos da circulação pelo baço (QUEIROZ et al., 1997). Apesar dos estudos acerca da ocorrência de hemólise e anemia induzidas pela dapsona sugerirem que tais manifestações ocorrem principalmente na presença de altas doses da medicação (>100 mg/d) ou na deficiência de G6PD (GILL; TINGLE; PARK, 1995), o estudo de Queiroz et al. (1997) encontrou 44% de frequência de anemia na ausência de deficiência de G6PD e em doses terapêuticas (100 mg/d) de dapsona (QUEIROZ et al., 1997).

A metaemoglobinemia ocorre tanto como um processo congênito, no qual existe deficiência da enzima nicotinamida-adenina-dinucleotídeo-hidrogênio (NADH)-citocromo-b5- redutase, ou como condição adquirida, usualmente farmacocineticamente induzida, na qual existe um aumento na taxa de oxidação da hemoglobina em metaemoglobina, que consiste em uma forma aberrante de hemoglobina onde o íon ferroso (Fe2+) original é oxidado em íon férrico (Fe3+). O íon Fe3+ promove uma alteração na porção heme da molécula da hemoglobina, resultando em uma redução na sua capacidade de se ligar ao O2. Isso provoca Figura 2. G6PD e o shunt hexose monofosfato. A defesa antioxidante de eritrócitos é dependente de G6PD, que catalisa a primeira reação na via da pentose fosfato. Esta reação produz o NADPH, que doa elétrons à glutationa. A glutationa reduzida é essencial para a redução das espécies reativas de oxigénio, protegendo, assim, a hemoglobina e outras proteínas eritrocitários de oxidação (Adaptado de SCHUURMAN et al., 2009).

uma anemia funcional e se manifesta com cianose periférica e central, que quase sempre ocorre quando a metaemoglobina encontra-se com níveis séricos de no mínimo 15%. À medida em que os níveis de metaemoglobina se elevam a cerca de 45%, surgem sintomas como tontura, fadiga, cefaleia e palpitações. Acidose, arritmia, dispneia, convulsões e, eventualmente, coma, tornam-se evidentes quando os níveis de metaemoglobina se aproximam de 70% (ASHURST et al., 2010; TURNER; KARLIS; GLICKMAN, 2007). O diagnóstico é feito pela análise do sangue arterial, onde os pacientes apresentam elevação da pressão arterial de oxigênio (PaO2) e queda da saturação de O2, além de elevação dos níveis de metaemoglobina no sangue. O tratamento consiste na remoção do agente, suporte ventilatório e, algumas vezes, especialmente nos casos de metaemoglobinemia acima de 30%, aplicação intravenosa de azul de metileno, na dose de 1-2 mg/Kg de peso em um período de 5 minutos (ASHURST et al., 2010). O azul de metileno é oxidado em azul de leucometileno, após receber um elétron da nicotinamida adenina dinucleotídeo fosfato (NADPH), na presença de NADPH-metaemoglobina redutase. O azul de leucometileno doa esse elétron para a metaemoglobina, a qual volta a se converter em hemoglobina (TURNER; KARLIS; GLICKMAN, 2007).

Outros quadros hematológicos menos comuns relacionados à dapsona são agranulocitose, leucopenia, discrasias sanguíneas, linfadenopatia (BULA DA DAPSONA, 2014).

Agranulocitose é uma condição rara, no entanto pode ser potencialmente fatal se ocorrer quadro de sepse (KOBE; SETOGUCHI; KITAMURA, 2011). É uma reação severa, imprevisível, idiossincrásica, descrita em 0,2% a 0,4% dos pacientes tratados com dapsona (RANAWAKA; MENDIS; WEERAKOON, 2008). Ao contrário da metaemoglobinemia, a agranulocitose não é um efeito adverso dose-dependente da dapsona e o mecanismo de ação permanece desconhecido. Usualmente, instala-se de 4 a 12 semanas após a dapsona ter sido introduzida, e gradualmente evolui. Os sintomas iniciais são febre, linfadenomegalia, inflamação e úlceras em cavidade oral, faringe e esôfago. Uma vez que a agranulocitose se instala, existe um aumento da susceptibilidade a sepse (KOBE; SETOGUCHI; KITAMURA, 2011). Suspensão da droga e tratamento precoce com antibióticos e fator estimulante de colônia de granulócitos (G-CSF) são fundamentais para a recuperação desses pacientes (RANAWAKA; MENDIS; WEERAKOON, 2008).

As alterações dermatológicas mais comuns são dermatite alérgica, urticária e exantema. Prurido, dermatite esfoliativa, fototoxicidade e lúpus eritematoso são menos frequentes (BULA DA DAPSONA, 2014).

Fotossensibilidade induzida pela dapsona é uma reação adversa rara. Pode ser fototóxica ou fotoalérgica. A reação fototóxica baseia-se em mecanismo não-imunológico e pode ser provocada na maioria das pessoas na primeira exposição, se a concentração da substância ou a quantidade de radiação com apropriado comprimento de onda forem suficientes. As reações fotoalérgicas são baseadas em mecanismos imunológicos e podem ser provocadas pela radiação ultravioleta somente em uma minoria de pessoas, que tenham sido previamente sensibilizadas pela substância fotossensibilizante. A reação a um fotoalérgeno é baseada no mesmo mecanismo imunológico da alergia de contato. Sulfonamidas são sensibilizantes bem conhecidos para reações fotoalérgicas, sejam elas administradas por via tópica ou sistêmica. Poucos casos foram relatados na literatura acerca da fotossensibilidade causada pela dapsona (DIPANKAR; DOGRA; KAUR, 2007). O grupamento sulfona característico (-C-SO2-C) presente na molécula-mãe bem como os metabólitos são responsáveis pela fotossensibilidade associada à dapsona. As características que favorecem o quadro de fotoalergia incluem a típica distribuição das lesões em áreas fotoexpostas, poupando dobras e áreas cobertas, além de fototeste cutâneo de contato positivo. Em locais onde o fototeste cutâneo de contato não for disponível, a readministração (teste de provocação) da droga serve como teste confirmatório (KAR, 2008).

A síndrome de Stevens-Johnson/necrólise epidérmica tóxica (SJS/NET), a pustulose exantemática generalizada aguda (AGEP) e a síndrome de hipersensibilidade induzida por drogas (DIHS), também conhecida como reação à droga com eosinofilia e sintomas sistêmicos (DRESS), constituem reações de hipersensibilidade tardia, um subgrupo de RAMs tipo B, também classificadas como do tipo IV de acordo com a classificação de Gell-Coombs (KARLIN; PHILLIPS, 2011).

Síndrome de Stevens-Johnson(representada por erosões mucosas e máculas purpúricas cutâneas disseminadas, frequentemente confluentes, com destacamento epidérmico limitado a menos de 10% da superfície corporal) e a necrólise epidérmica tóxica (casos com máculas purpúricas disseminadas e destacamento epidérmico acima de 30%) podem ocorrer raramente (CRIADO et al., 2004).

A Síndrome de Stevens-Johnson (SJS) e a necrólise epidérmica tóxica (NET) estão classificadas entre os tipos mais graves de reações cutâneas adversas a drogas. Apesar de raras (1 a 2 casos por um milhão de habitantes anualmente), essas desordens possuem uma alta taxa de mortalidade. Caracterizam-se por eritema que evolui para áreas de destacamento da pele, associadas a erosões mucosas, especialmente oral, conjuntival e genital, acompanhadas de febre e mal-estar. Por apresentarem lesões similares, que lembram “alvos”, bem como semelhança na histologia, a SJS e NET são tradicionalmente classificadas dentro do espectro do eritema multiforme. A diferenciação é baseada nas lesões iniciais e no percentual de superfície corpórea com destacamento de pele. A SJS é caracterizada por apresentar comprometimento preferencialmente do tronco ou por disseminação das lesões em alvo e máculas, as quais coalescem formando bolhas, que por sua vez podem se fundir, formando áreas de destacamento cutâneo que afetam menos de 10% da superfície corpórea. Na NET, observa-se mais de 30% de área de superfície corpórea com destacamento de pele. No entanto, como é muitas vezes difícil diferenciar SJS e NET, tem-se utilizado o termo SJS/NET para classificar as formas intermediárias, com 10-30% da superfície corporal de destacamento cutâneo. Assim, as três formas (eritema multiforme, SJS e NET) representam uma única entidade nosológica com diferentes graus de severidade. O sinal de Nikolsky, no qual a epiderme da pele perilesional desliza quando se aplica uma pressão digital oblíqua, é positivo. Biópsia de pele deve ser realizada sempre que possível. Na histologia da SJS e NET, encontram-se queratinócitos necróticos, muitas vezes com necrose total da epiderme, além de degeneração vacuolar da camada basal, levando à formação de clivagem subepidérmica. Na derme superior observa-se infiltrado linfo-histiocitário, com eosinófilos. O tratamento consiste em suspender drogas suspeitas, isto é, aquelas que tenham sido administradas dentro das últimas 3 semanas que antecederam a instalação do quadro. Pacientes com destacamento de pele com mais de 30% de superfície corporal devem ser idealmente internados em unidade de terapia intensiva ou em unidade de queimados. O tratamento sintomático deve consistir em manter o paciente aquecido, reposição intravenosa de fluidos, com nutrição precoce. Não se recomenda cobertura profilática com antibioticoterapia de amplo espectro na ausência de infecção suspeita, uma vez que podem piorar a reação cutânea grave e mascarar sinais de infecção. O uso de antibióticos é indicado na vigência de infecção instalada e de sepse, idealmente baseados em culturas e antibiogramas. Recomenda-se o uso de soluções e/ou géis antissépticos, como clorexidine e nitrato de prata, devendo-se, no entanto, evitar medicações tópicas à base de sulfonamidas, pois podem piorar o

quadro cutâneo. As áreas erosadas podem ser cobertas com gazes não-aderentes. Soluções antissépticas devem ser usadas nos cuidados da mucosa oral, genital ou anal. As lesões oculares, além do uso de colírios ou pomadas de antibióticos, devem ser acompanhadas pelo oftalmologista pelo risco de ectrópio, triquíase, sinéquias e até cegueira. Os corticoides continuam sendo usados no tratamento da SJS/NET, apesar serem controversos na literatura internacional, assim como a ciclofosfamida, ciclosporina e imunoglobulina intravenosa. A talidomida pode piorar o quadro e deve ser evitada na SSJ/NET (MOCKENHAUPT, 2009).

Outro quadro cutâneo grave possível é a síndrome de hipersensibilidade induzida por drogas (DIHS), também conhecida como reação à droga com eosinofilia e sintomas sistêmicos (DRESS), caracterizada pelo início súbito de erupção cutânea papular ou esfoliativa, acompanhada por febre, mal estar e fraqueza, seguida de icterícia, hepatomegalia dolorosa e linfadenopatia, semelhante à mononucleose infecciosa. Anemia, erosões orais, conjuntivite, esplenomegalia, eosinofilia, linfocitose atípica, elevação das enzimas hepáticas são outros achados comprobatórios (BUCARETCHI et al., 2004).

A DRESS / DIHS apresenta vários outros sinônimos, a maioria dos quais refere-se à droga envolvida na reação, como a síndrome da dapsona (RAO; LAKSHMI, 2001).

Kardaun et al., em 2007, adotaram critérios e criaram um escore baseado na presença de sintomas e sinais clínicos e laboratoriais para o diagnóstico da DRESS / DIHS, o RegiSCAR, que contempla a presença de febre, linfonodos aumentados, eosinofilia, linfócitos atípicos, rash cutâneo, comprometimento de órgãos, como fígado, rins, músculo cardíaco e pâncreas, tempo de resolução de período igual ou superior a 15 dias, e exclusão de outras causas, como infecções bacterianas, colagenoses e hepatites virais (KARDAUN, et al., 2007).

Um grupo de estudo japonês de reações adversas cutâneas severas a drogas (SCAR-J) também adotou critérios para o diagnóstico da síndrome: rash maculopapular desenvolvido após 3 semanas do início do tratamento com um limitado número de drogas; persistência dos sintomas após a suspensão da droga; febre > 38oC; anormalidades hepáticas (TGP > 100), anormalidades leucocitárias (leucocitose > 11000/mm3, linfocitose atípica > 5%, eosinofilia > 1500/mm3); reativação do HHV-6 (Herpesvírus Humano-6). O diagnóstico é confirmado pela presença de todos os critérios (DIHS típica), ou dos primeiros 5 critérios (DIHS atípica). Deve- se salientar que a reativação do HHV-6 é detectada entre a segunda e terceira semanas após o

início dos sintomas, através da elevação dos títulos de IgG anti-HHV-6 (SHIOHARA; INAOKA; KANO, 2006).

Recentemente, mostrou-se que vírus da família Herpesvírus Humano (HHV), HHV-6/7, CMV (citomegalovírus), EBV (Epstein-Barr vírus) comumente reativam durante o curso de DIHS / DRESS. Em alguns pacientes, as manifestações clínicas da síndrome persistem apesar da suspensão da droga envolvida e esse fato coincide com a reativação dos herpesvírus (KANO et al., 2006; SHIOHARA; KANO, 2007).

No tratamento da DRESS / DIHS, é fundamental o diagnóstico precoce e suspensão da droga suspeita. O retardo pode estar associado a pior prognóstico (HUSAIN; REDDY; SCHWARTZ, 2013).

Os corticoides sistêmicos são atualmente a droga mais universalmente aceita e usada no tratamento. Observa-se melhora significativa tanto nos sintomas clínicos quanto nas anormalidades laboratoriais geralmente dentro de vários dias após o início da corticoterapia (CHIOU et al., 2008). A dose deve ser igual ou maior a 1,0-1,5 mg/kg/d de prednisona ou equivalente (CRIADO et al., 2012). A dose deve ser reduzida lentamente, após a melhora clínica e laboratorial, ao longo de 6 a 8 semanas, a fim de evitar recorrência dos sintomas. Deterioração súbita do quadro é observada quando há suspensão acidental ou rápida redução da dose do corticoide (CRIADO et al., 2004).

Nos casos em que não se observa essa melhora, pode-se indicar pulso de metilprednisolona (30 mg/kg intravenosa por 3 dias), imunoglobulina intravenosa e plasmaférese (SHIOHARA; INAOKA; KANO, 2006; KITO; ITO; HASHIZUME, 2012). Outros agentes imunossupressores, como a ciclosporina, podem ser necessários (ZULIANE; ZWAHLEN; GILLIET, 2005).

A pustulose exantemática generalizada aguda (AGEP) é uma dermatose caracterizada por um episódio agudo de aparecimento de pústulas estéreis subcórneas sobre pele eritemato- edematosa, associadas a sintomas sistêmicos, como febre alta, geralmente relacionada ao uso de medicações. Representa uma reação mediada por linfócitos T capazes de estimular resposta inflamatória neutrofílica. As principais drogas desencadeantes da AGEP são os antibióticos beta-lactâmicos; porém outras medicações como anti-fúngicos, anti-inflamatórios não- hormonais, analgésicos, antiarrítmicos, anticonvulsivantes e antidepressivos podem desencadear AGEP. Narasimharao et al. (2009) reportaram um caso de AGEP seguida do uso

de dapsona para tratamento de hanseníase (NARASIMHARAO; PRATAP; SUNEETHA, 2009). O quadro costuma regredir espontaneamente dentro de 4 a 10 dias após suspensão da droga suspeita, o que geralmente é suficiente como medida terapêutica, além da aplicação de soluções antissépticas para evitar infecção secundária das lesões e aplicação de emolientes na fase de descamação pós-pustular. Em pacientes com um exantema generalizado muito inflamatório, pode-se considerar o uso de corticoides por períodos curtos (MOCKENHAUPT, 2009).

A dapsona pode levar a alterações relacionadas ao sistema nervoso, como cefaleia, insônia, alterações do humor, confusão mental, alucinações, nervosismo e neurite periférica. Outras queixas podem ocorrer, como visão turva, zumbido e febre (BULA DA DAPSONA, 2014).

Devido à ênfase dada ao monitoramento dos efeitos colaterais hematológicos da dapsona, as reações adversas neurológicas tendem a passar despercebidas, especialmente nas suas fases iniciais. Aqui estão incluídas as neuropatias sensoriais e motoras e atrofia ótica. A neuropatia periférica relacionada à dapsona, apesar de ser um efeito adverso incomum, é clinicamente significativa devido à sua frequente instalação de modo sutil, especialmente quando há comprometimento motor, e ao alto potencial de persistência a longo prazo, mesmo após suspensão da droga. O mecanismo da neuropatia pela dapsona não está comprovado, porém existem várias teorias, sendo que a mais popular sugere que exista um efeito neurotóxico direto, devido à capacidade da droga de se concentrar no tecido nervoso. A instalação da neuropatia costuma ocorrer após tratamentos prolongados, usualmente após alguns anos de uso, embora existam relatos de instalação precoce, como após 3 semanas de uso. A neuropatia motora é mais comum que a sensitiva, nos casos associados à dapsona, com comprometimento dos membros inferiores predominando sobre o dos membros superiores. A eletroneuromiografia mostra alterações no potencial de ação muscular composto, com diminuição na amplitude dos membros inferiores em relação aos superiores, consistentes com atrofia axonal, com poucos aspectos de desmielinização secundária. Resolução da neuropatia costuma ocorrer mais de um ano após a suspensão da dapsona, apesar do relato de casos com duração mais prolongada (McCARTY; DEL ROSSO, 2010). Didanosina aumenta o risco de neuropatia quando administrada simultaneamente à dapsona (KANNAN et al., 2009).

Queixas gastrointestinais como perda de apetite, irritação gástrica, náuseas, vômitos, além de icterícia e dano hepatocelular podem ser observados (BULA DA DAPSONA, 2014).

Síndrome nefrótica, necrose papilar renal e proteinúria representam possíveis manifestações de comprometimento renal (BULA DA DAPSONA, 2014). Em geral, o comprometimento renal associado à dapsona se dá através de nefrite tubulointersticial alérgica (LAU, 1995). Alves Rodrigues et al. (2005) descreveram um caso de vasculite de hipersensibilidade, com comprometimento renal e cutâneo, associada à dapsona. A vasculite de hipersensibilidade é caracterizada por púrpura palpável, rash maculopapular e biópsia de espécime mostrando granulócitos de localização perivascular ou extravascular. O mecanismo patogênico responsável pela injúria vascular parece ser uma reação neutrofílica mediada por imunocomplexos (tipo III) ou uma reação tipo IV mediada por linfócitos. A suspensão da droga, medidas de suporte e a restrição ao uso de drogas são fundamentais no tratamento. Além disso, corticoides e imunossupressores podem ser necessários (ALVES-RODRIGUES; RIBEIRO; SILVA, 2005).

O trabalho de Richardus & Smith (1989) demonstrou que as reações adversas à dapsona aumentaram com o advento da PQT, sugerindo que uma interação, ainda inexplicada, da rifampicina com a droga em questão seria responsável pelas reações de hipersensibilidade (RICHARDUS; SMITH, 1989). Esta mesma hipótese também foi mencionada por Lau (LAU, 1995).

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