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Das teses inovadoras do GTDN à modernização conservadora dos governos militares (1965-1970)

POLÍTICAS DESENVOLVIMENTISTAS PARA O NORDESTE: UM BALANÇO HISTÓRICO 1959/

1.4 Das teses inovadoras do GTDN à modernização conservadora dos governos militares (1965-1970)

A partir de 1964, houve profunda mudança na orientação das diretrizes da Sudene: foram substituídas as teses do GTDN que haviam idealizado implantar a indústria no Nordeste, de forma que ela atuasse de maneira independente à da polarização exercida pelas indústrias do Centro Sul, concedendo subsídios para formulação do Primeiro Plano Diretor da Sudene pela lógica de atender à demanda do Centro Sul; a Sudene passou de instituição formuladora de uma política regional para o Nordeste para um instrumento de incentivos fiscais aos programas setoriais formulados pelo MINTER; e a questão social que havia sido apresentada no Segundo Plano Diretor da Sudene foi marginalizada em prol da máxima: criar forças de arranque na economia a qualquer custo para gerar o crescimento econômico.

O Terceiro Plano Diretor, formulado para o período de 1966/68, por meio do artigo de concessão de incentivos fiscais 34/18, priorizou projetos nos setores de bens intermediários e de capital, expandiu a sua área de cobertura de incentivos fiscais regionais para as regiões Amazônia e Espírito Santo e outros setores da economia, tais como reflorestamento, turismo, pesca, indústria aeronáutica e educação (CARVALHO, 1988; GOODMAN e ALBUQUERQUE, 1974).

Dado que a possibilidade de dedução de até 50% do imposto de renda se estende a todo o Território Nacional, não é de se estranhar que a grande maioria dos recursos seja de propriedade extra-regional. Grande número de aplicações corresponde meramente à criação de sucursais de empresas sediadas na área São Paulo-Guanabara – filiadas, por sua vez, em muitos casos, a empresas sediadas no exterior. Esta tendência só se tem acentuado, à medida que diminui o peso relativo dos investimentos de renovação e entre as novas aplicações crescem em importância as atividades de maior sofisticação tecnológica (CASTRO, 1980, p. 202).

As empresas aproveitaram o benefício concedido pelo governo federal, que subtraiu parte do seu imposto de renda e empréstimos tomados do fundo 34/18, para se instalarem no Nordeste em busca de matérias-primas e minerais. A opção política por investimentos setoriais para a industrialização e a “vantagem locacional” de abundância de recursos naturais e da mão de obra barata descaracterizaram a proposta inicial da Sudene, de transformações estruturais no Nordeste (CASTRO, 1980).

A Zona da Mata, em vez da diversificação proposta pelos planos iniciais da SUDENE, conheceu o fortalecimento do monopólio da cana, estimulado pela possibilidade de produzir álcool [...] A fronteira agrícola do oeste nordestino se fecha. A região foi rapidamente ocupada não pelos sertanejos como uma agricultura mercantil de alimentos para o mercado interno, como proposto pelos programas iniciais da SUDENE, mas pelos capitalistas do Centro-Sul plantando soja ou melão, para exportação, e consolidando ali, também, a grande propriedade. No Semi-Árido, a pecuária se firma como atividade cada vez mais hegemônica expulsando o milho, o feijão, e com eles os arrendatários e parceiros e portanto consolidando também a grande propriedade (ARAÚJO, 2000b, p.18/19).

Questões que foram emergentes para o GTDN e aos dois primeiros Planos Diretores da Sudene haviam sido escamoteadas pelo Terceiro e Quarto Planos Diretores. A restrita diversificação produtiva do Nordeste e a conservação da estrutura produtiva, liderada pela elite local, excluíram a oportunidade de emergência de pequenos agricultores, o que determinou a permanência e expansão da monocultura no Nordeste. O estreitamento das relações comerciais com o Centro-Sul, associado à complementação da produção industrial do Nordeste aos insumos industriais produzidos com o Centro-Sul, escaparam à alternativa inicialmente proposta pelo GTDN, a de concluir o ciclo produtivo industrial no Nordeste. A proposta do relatório do GTDN de reorganização fundiária foi arquivada, e a intervenção no Semiárido reforçou a concentração de investimentos em agricultura irrigada e na pecuária em pontos focais. O monopólio da cana na Zona da Mata foi reafirmado, e a expansão da produção agrícola para as terras úmidas foi engavetada, sendo os incentivos fiscais concedidos pelo mecanismo 34/18 concedidos em grande medida aos empresários oriundos do Centro-Sul ou agricultores que faziam parte da elite nordestina (ARAÚJO, 2000b).

Apesar do lançamento do Quarto Plano Diretor da SUDENE para o período 1969-73, as orientações propostas pelo Minter e o Ministério do Planejamento e Coordenação Geral permaneceram ordenadas em atividades agropecuárias que reafirmaram a estrutura latifundiária e a exclusão dos pequenos e médios proprietários rurais dos benefícios gerados pelo crescimento econômico. No processo de industrialização, os investimentos foram concentrados em particular nas cidades de Recife e Salvador. O diagnóstico do Quarto Plano Diretor da Sudene alertou sobre a iminência das disparidades intra-regionais de níveis de renda sobrepujar as inter- regionais (SUDENE, 1968).

Conforme atesta a tabela 3, houve preponderância de investimentos aprovados pela SUDENE em apenas dois estados do Nordeste em específico, a Bahia, com 39,7%, e Pernambuco, com 34,0%, o que representou mais de 70% dos investimentos totais em projetos. (SUDENE, 1968).

Tabela 3. Investimentos em Projetos Aprovados pela SUDENE (a preços de 1967%)

ESTADOS 1960 1962 1964 1966 1967 TOTAL % empresas nº de

MA - 12.163 295 1.413 15.544 33.280 1,3 11 PI - 315 662 4.255 35 8.308 0,3 9 CE 5.430 37.444 9.620 13.119 96.324 185.670 7,1 85 RN - 2.698 1.976 11.833 35.228 90.225 3,5 23 PB 9.643 32.830 2.495 7.313 62.415 143.327 5,5 61 PE 77.755 11.788 54.625 135.830 306.248 884.908 34,0 162 AL 7.536 2.355 3.997 7.009 120.103 151.413 5,8 24 SE - 6.299 2.125 14.401 5.437 46.508 1,8 10 BA 29.795 22.142 256.865 178.400 145.753 1.031.003 39,7 105 MG - - 1.503 12.215 12.503 26.221 1,0 7 TOTAL 130.159 128.013 334.163 385.788 1.099.590 2.600.863 100,0 497 Fonte: SUDENE, 1968, p. 64.

Os fatores que contribuíram para a estagnação econômica de determinadas unidades federativas dessa região foram devido à reduzida criação de empregos diretos pela industrialização e à baixa participação dos salários no valor agregado de novos projetos. A proposta formulada pelo Plano Diretor para superação desta situação crônica foi a formação do mercado interno regional, condição basilar para a expansão industrial e a incorporação da força de trabalho marginalizada (SUDENE, 1968).

Em 1970, o Nordeste foi atingido por uma forte seca, e a Sudene por severas críticas dos governadores em relação à conduta do seu Quarto Plano Diretor. Eles exigiram medidas mais eficazes do governo federal, que por sua vez extinguiu esse Plano Diretor que tinha previsão de duração de 1969 a 1973. Ele foi substituído pelo Primeiro Plano Nacional de Desenvolvimento ( I PND), 1972/1974, que instituiu, por intermédio dos recursos do Sistema 34/18, o Programa de Integração Nacional (PIN) e o Programa de Redistribuição de Terras e de Estímulo à Agroindústria do Norte e do Nordeste (PROTERRA) (CARVALHO, 2001).

As palavras do mentor e primeiro Superintendente da SUDENE ao final dos anos 1970, Celso Furtado, expressaram o significado dessa instituição nos governos militares:

Pensar o Brasil a partir do Nordeste tornou-se tão esdrúxulo que ninguém teve a ideia de imaginar que a Sudene possa ser outra coisa além de um organismo tecnocrático, encarregado de administrar os inventivos fiscais. Subordinada a um ministro de Estado como um cargo público a mais e reunindo governadores que nada mais são do que funcionários do governo central, ela não mais existe senão como um fantasma – ruína de uma instituição que ninguém sabe por que foi criada (FURTADO, 2009 [1979], p. 182).

Nesse momento, a situação da SUDENE refletia o título do segundo volume da autobiografia de Celso Furtado, A fantasia desfeita, pois perdeu a autonomia na formulação de programas e projetos para o desenvolvimento do Nordeste e principalmente, a sua expecionalidade de atuação política. A SUDENE perdeu a sua força política para dialogar com os governadores do Nordeste, o que permitia que as suas medidas propostas fossem aplicadas nesta região.

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