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Debates sobre o erro de subsunção como erro de proibição

No documento Pedidos dessa obra: experteditora.com.br (páginas 74-81)

O último debate que precisa ser feito quanto ao tema aborda- do neste trabalho é se o erro de subsunção realmente pode ser trata- do com erro de proibição. Para tanto, é necessário que se destaque o conceito de erro de subsunção. Trata-se de uma espécie de erro que ocorre quando a pessoa acredita, por alguma razão, que sua conduta não corresponde ou não se “subsumi” aos elementos do tipo penal ob- jetivo102. Assim, trata-se de uma espécie de erro que exige a avaliação direta tanto da conduta, como de uma norma penal proibitiva especí- fica103. A denominação dessa espécie de erro como erro de subsunção advém da antiga e há muito questionada distinção entre erro de fato e erro de direito, em relação à qual podemos citar a importante ob- servação adiante que foi feita por Ingeborg Puppe quanto às teses da Suprema Corte alemã:

Esta terminología llevo a que se le formulasen al Rei- chsgericht reproches de formalismo y superficialidad. Pero sobre todo borró la profunda diferencia existente entre dos clases, totalmente diversas, de error al deno- minarlas a amabas como error de Derecho. Lo que el Reichsgericht entendió como error de Derecho penal es, sobre todo, el error de subsunción, es decir, un error so- bre el contenido de aquella norma que rige para el autor mismo y que es protegida a través del Derecho penal. 104 101 Explorando argumentos diversos sobre a distinção entre a proibição inerente à ilicitude e à tipificação penal da conduta praticada, vide a seguinte obra: LEITE, Alaor. Dúvida e erro sobre a proibição no direito penal: atuação nos limites entre o permitido e o proibido. 2 ed. São Paulo: Atlas, 2014, p. 121-143.

102 TOLEDO, Francisco de Assis. O erro..., p. 123. 103 TOLEDO, Francisco de Assis. O erro..., p. 124.

104 PUPPE, Ingeborg. Error de hecho..., p. 136. Observações interessantes sobre o tema também em: JIMÉNEZ DE ASÚA, Luis. Reflexiones sobre el error de derecho en materia penal. Buenos Aires: Librería El Ateneo Editorial, 1942, p. 117. LEITE, Alaor; ASSIS, Augusto. O erro. Especial foco no erro de proibição. In BUSATO, Paulo César (Org.). Teoria do delito. Curitiba: Juruá, 2012, p. 302.

A despeito das críticas à terminologia do erro de subsunção, é exatamente por ser conceituado e delimitado dessa forma que nos parece muito mais próximo de um erro de tipo do que de um erro de proibição. Em primeiro lugar, pois o erro de tipo exige a cognição quanto a elementos específicos vinculados estritamente ao tipo penal objetivo. O erro de proibição, ao contrário, necessariamente deve es- tar “desconectado” de fatos específicos e, ainda mais, do tipo penal objetivo. Além disso, no erro de tipo não há qualquer questionamento ético-social sobre a conduta e sua correição frente a todo o ordena- mento jurídico, assim como ocorrerá no erro de subsunção, enquanto no erro de proibição essa espécie de questionamento não só existe, como constitui sua essência. Assim, nos parece mais coerente classifi- car o erro de subsunção como espécie de erro de tipo que incide num juízo de tipicidade vicioso que é feito pelo agente na ocasião da prática da conduta105. Assim, o erro de subsunção sempre será erro de tipo.

6. Conclusões

Com base na breve análise realizada neste trabalho, que tem mais pretensão de fomentar o debate sobre o tema abordado do que propor soluções definitivas, considerando ainda a ampla complexida- de e riqueza do tema, é possível, ainda assim, que algumas conclusões sejam feitas e sintetizadas a partir da pesquisa descrita nessas linhas. Dessa forma, os próximos itens contêm uma série de sínteses dos as- pectos abordados no presente trabalho:

1. Os elementos normativos do tipo penal são conceitos con-

tidos na própria descrição da conduta proibida que exigem um juízo de valor para que seu significado seja conhecido,

105 TOLEDO, Francisco de Assis. O erro..., p. 124. Entendemos que o autor indica que pode haver o tratamento do erro de subsunção como erro de proibição, confor- me citado pelo autor com base na obra de Welzel, nas situações excepcionais em que obsta a consciência da ilicitude do autor. Contudo, consideramos essa distinção sem qualquer efeito prático, pois nesse caso sempre haverá erro de tipo, além de dogma- ticamente equivocada, pois a lógica do erro de proibição, conforme exposto acima, é absolutamente distinta daquela do erro de tipo.

enquanto as leis penais em branco, embora possam exigir também esse juízo, exigem a análise de outro dispositivo normativo, sem o qual o tipo penal não está completo.

2. A consciência da ilicitude, adotando-se o posicionamen-

to intermediário desenvolvido pela doutrina, é um juízo paralelo na esfera do profano, ou seja, a consciência in- dividual quanto à contrariedade entre a conduta e todo o ordenamento jurídico, a qual resulta na compreensão da “incorreição” ou “injustiça” da conduta praticada.

3. Devem ser estritamente vinculadas ao tipo penal objetivo

as exigências que concernem ao elemento volitivo dolo, sendo incabível considerarmos que o dolo possa abarcar as valorações inerentes à consciência da ilicitude, mesmo nas leis penais em branco. Por certo, o pode dolo conter valorações jurídicas, se direcionado aos elementos nor- mativos do tipo, por exemplo, mas jamais abarcará valora- ções quanto à ilicitude da conduta.

4. A distinção entre ambas as valorações tem que conside-

rar qual foi o processo cognitivo realizado pelo indivíduo. Caso tenha se referido aos elementos objetivos do tipo penal específico, haverá sempre erro de tipo, ainda que o elemento seja a norma que completa a lei penal em bran- co. Ao contrário, caso se refira à contrariedade da conduta com todo o sistema jurídico, haverá erro de proibição pela falta de consciência da ilicitude.

5. Os casos chamados tradicionalmente como de erro de

subsunção devem ser tratados, na realidade, como casos de erro de tipo. Isso se dá em razão do próprio conceito e limites do erro de subsunção. Enquanto nesse há necessi- dade de análise específica sobre se um tipo penal incide na conduta, sem valorações ético-sociais, no erro de proibi- ção deve existir uma valoração geral em relação ao sistema jurídico, acompanhada de elementos ético-sociais. Assim, a estrutura de ambos é absolutamente distinta, devendo o erro de subsunção ser sempre tratado como erro de tipo, o que não exclui a possibilidade de ocorrência do erro de

proibição nos casos em que o erro seja quanto à ilicitude.

6. No caso apresentado neste trabalho, X cometeria erro de

tipo caso tivesse errado quanto à existência da autoriza- ção, desde que esse erro envolvesse, em seu processo cog- nitivo, a inaplicabilidade do tipo penal do art. 50-A da Lei nº 9.605/1998, ainda que ele achasse ético-socialmente in- correta a extração das árvores – elemento irrelevante. Ao contrário, haverá erro de proibição quando X errar sobre a existência da autorização, mas a suposta autorização o tivesse levado a pensar que a extração era permitida ou ético-socialmente aprovada perante todo o ordenamento jurídico.

7. Há amplo espaço para a ocorrência de erro de proibição

quando se trata de leis penais em branco e, ao menos den- tro do escopo metodológico deste trabalho, não foi possí- vel constatar qualquer óbice à sua ocorrência. Novos estu- dos certamente serão necessários, especialmente no que se refere aos efeitos da administrativização do Direito Pe- nal na consciência da ilicitude ou à teoria da prova aplica- da ao erro de proibição. Espera-se que estas breves linhas consigam fomentar esses debates.

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Considerações sobre o princípio da taxatividade e o delito de

extração irregular de minério

Beatriz Vasconcelos Coelho Melo106

1. Introdução

As normas de Direito Penal Ambiental, não tuteladas na reda- ção original de 1940 do Código Penal, são acréscimos recentes após o entendimento de que o meio ambiente é bem jurídico relevante o su- ficiente para merecer a proteção da ultima ratio do sistema. Por meio dele, busca-se a tutela do direito difuso a um espaço sadio e completo, que compreenda gerações presentes e futuras, nas mais diversas for- mas e nos mais diversos ambientes.

É dentro deste contexto que surge a Lei nº 9.605, de 1988, que dispõe sobre as sanções, sejam elas administrativas ou penais, aos que violem alguma esfera deste ambiente, impondo a estas a delimitações de tipos penais específicos a cada uma das áreas de proteção. Uma destas proteções se dá em relação à extração irregular de minério, no artigo 55 da referida Lei, que afeta não somente o solo, mas pode pre- judicar toda a vegetação e o funcionamento da biosfera no entorno dos chamados garimpos ilegais, que, sem fiscalização, ameaçam a saúde, a dignidade e o meio ambiente dos locais.

A questão a ser aqui discutida está na compatibilidade do tipo pena ora tratado com o princípio da taxatividade, um desdobramento da legalidade constitucionalmente imposta ao Direito Penal. Por meio desta, há a negativa de legitimidade das normas que possuam conteú- do muito abstrato e estejam descritas de forma imprecisa e genérica, dificultando ou impossibilitando a compreensão da conduta proibida pelo Legislador.

A discussão, como será tratada, perpassa por diversos pontos a serem debatidos, desde a evidente necessidade de tutela do meio am- biente, como a preponderância da segurança jurídica em detrimento

106 Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Pós-graduanda em Ciências Penais pelo Instituto de Educação Continuada da PUC-Minas.

da acessoriedade administrativa pela complexidade dos elementos a serem considerados, em uma discussão sobre a legitimidade ou não desta norma penal proibitiva.

No documento Pedidos dessa obra: experteditora.com.br (páginas 74-81)