• Nenhum resultado encontrado

2.4 A Fase de Projeto Conceitual

3.1.1 Definição de Escopo e Objetivos

Inicialmente, o objetivo é declarado e justificado, explicitando-se as aplicações pretendidas da ACV, as partes interessadas e o público-alvo. De acordo com Heijungs (1992b), algumas aplicações importantes da ACV são a geração de informações de produtos, a melhoria de produtos, a regulação de produtos e o traçado de políticas governamentais.

A distinção entre os tipos de objetivo tem importantes consequências na modelagem do sistema do produto. Além disso, a norma ISO que trata da ACV estabelece requisitos específicos obrigatórios para estudos cujo objetivo é fazer declarações comparativas para divulgação pública. Por declarações comparativas entenda-se uma alegação de superioridade ou equivalência ambiental de um produto com relação a seus concorrentes que desempenham a mesma função.

Após a definição do objetivo, vem a definição do escopo. Segundo Guinée (2002), ela consiste de duas etapas: definição dos níveis de cobertura do estudo e definição da unidade funcional e do fluxo de referência. A seguir, esses tópicos são detalhados.

Guinée (2002) explica que a cobertura de uma ACV relaciona-se com a qualidade dos dados a serem obtidos e inclui cinco elementos distintos: cobertura temporal, cobertura geográfica, cobertura tecnológica, cobertura dos processos e cobertura das intervenções ambientais e categorias de impacto.

A cobertura temporal envolve determinar a idade máxima dos dados a serem utilizados e o intervalo de tempo mínimo em que eles serão coletados.

A cobertura geográfica diz respeito ao local de origem dos dados dos processos elementares para estes serem compatíveis com o objetivo do estudo, pois em alguns casos diferenças regionais devem ser consideradas.

A cobertura tecnológica relaciona-se aos tipos de processos que serão utilizados com referência, por exemplo, a melhor tecnologia disponível, a pior tecnologia disponível ou a tecnologia média do setor do estudo.

A cobertura dos processos requer o traçado inicial das fronteiras do sistema do produto. Segundo Guinée (2002), idealmente o sistema deve ser modelado de forma que todas as entradas e saídas em suas fronteiras sejam intervenções ambientais. Entretanto, de acordo com Goedkoop, Schryver & Oele (2008), o sistema do produto tende a ser inter-relacionado de uma maneira complexa de forma que é impossível traçar todas as suas entradas e saídas. Por exemplo, em uma ACV de embalagens, caminhões são utilizados para o transporte. Estes

também são produtos com um ciclo de vida físico. Para produzi-los, aço é necessário, que por sua vez, necessita de carvão, que necessita de caminhões etc.. Fica claro que se faz necessário definir limites ou fronteiras para o sistema. Mas, dependendo das fronteiras e do que é excluído, os resultados podem ser distorcidos. Segundo Goedkoop, Schryver & Oele (2008), os níveis de inclusão são, em ordem crescente:

 Primeira ordem: considerar apenas a produção de materiais e transporte;  Segunda ordem: considerar todos os processos, exceto os bens de capital;

 Terceira ordem: os bens de capital são incluídos, mas normalmente modelados eles mesmos no modo de primeira ordem, isto é, somente a produção dos materiais necessários para fabricá-los é considerada.

Dependendo do objetivo, é possível limitar alguns estágios do ciclo de vida do produto a montante ou a jusante. Uma situação onde as fronteiras são limitadas é na comparação de produtos alternativos e cujo foco é apenas na avaliação daquelas partes diferentes entre eles. Isto é chamado por Nielsen & Wenzel (2002) de ΔACV (delta ACV). Por exemplo, se embalagem e transporte são idênticos, estes podem ser desconsiderados em uma análise comparativa. Vigon et al. (1993) chamam a atenção que nestes casos deve-se garantir que os elementos eliminados sejam idênticos em termos de processo, materiais e quantidade.

Finalmente, tem-se a cobertura das intervenções ambientais e categorias de impacto. Pode-se tentar incluir todas as intervenções e categorias de impacto conhecidas ou, no extremo oposto, focalizar em algumas poucas e mais bem consolidadas. O primeiro caso tem a desvantagem de introduzir no estudo intervenções e categorias que não podem ser precisamente medidas ou para as quais não há metodologias práticas de avaliação. Por outro lado, a segunda opção só é justificável em condições e objetivos muito restritos e específicos. O importante é justificar as escolhas e torná-las transparentes.

A segunda etapa na definição do escopo é a definição da unidade funcional e do fluxo de referência. A unidade funcional define a quantidade a ser medida das funções do sistema do produto e deve ser consistente com os objetivos do estudo. Uma de suas utilidades primárias é fornecer uma referência para que os dados de entrada e saída possam ser normalizados. Portanto, a unidade funcional deve ser claramente definida e quantificável. O resultado dessa quantificação é o fluxo de referência. Este é então utilizado para determinar as entradas e saídas do sistema. Guinée (2002) define ambos da seguinte maneira:

 Unidade funcional: quantidade de serviço fornecido pelo sistema do produto em estudo para uso como uma base de referência para a ACV;

 Fluxo de referência: quantidade de fluxo de produto geralmente associada com a fase de uso ou consumo do produto e representando uma maneira específica de se obter a unidade funcional.

Comparações entre sistemas devem ser feitos apenas com base na mesma função, quantificada por meio da unidade funcional na forma de seus fluxos de referência. Por exemplo, ao se comparar sabonete em barra com sabonete líquido, a base de comparação deve ser um serviço equivalente. Como a taxa de uso é diferente, a unidade funcional poderia ser 1.000 lavadas de mãos (VIGON et al., 1993). Já as quantidades de materiais do produto contidas na unidade funcional (fluxo de referência) podem variar entre as alternativas. Suponha que estudos de laboratório tenham determinado que em cada lavagem de mãos sejam utilizados, em média, 5 mm3 de sabonete em barra e 10 mm3 de sabonete líquido. Assim, seriam comparados 5.000 mm3 de sabonete em barras com 10.000 mm3 de sabonete líquido.

Wenzel, Hauschild & Alting (1997) declaram que também é necessário expressar na unidade funcional o tempo de duração da função provida pelo produto. Assim, por exemplo, um refrigerador com vida útil de 13 anos deve ser comparado com 1,3 refrigeradores de vida útil de 10 anos, expressando, dessa forma, os impactos ambientais por 13 anos. Além dos elementos quantitativos, deve-se incluir uma descrição qualitativa do nível de qualidade dos serviços fornecidos.