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Capítulo II Enquadramento teórico

2.1 Os sentidos da educação e da formação nas sociedades

2.1.4 Definição e desenvolvimento do conceito de competência

Apesar do conceito de competência ter sido explorado inicialmente durante o movimento Taylorista, foi no início da década de 80 que começou a ganhar força no mundo do trabalho através da sua sobreposição ao conceito de qualificação (Parente, 2004; Stroobants, 2006), sendo dado mais enfoque à capacidade de mobilizar diferentes recursos e competências adquiridas em contexto de trabalho em detrimento da certificação escolar. Nesta altura começa a ser valorizada a capacidade de mobilizar de forma efetiva os saberes para um desempenho laboral mais eficiente, sejam eles pessoais ou adquiridos.

Com a diversidade de tarefas e a vasta acumulação de funções, a evolução tecnológica e a natureza mutável do mercado de trabalho, os recursos humanos das instituições passaram a agregar e a desenvolver todo um conjunto de competências suscetíveis de serem aplicadas em outros contextos de trabalhos, permitindo uma maior versatilidade no desempenho de outras funções e na possibilidade de abraçar outros caminhos profissionais (Michael et al, 1999; Guichard & Huteau, 2002).

Neste contexto de incerteza e transformações permanentes, de acordo com Boterf (2003), as organizações procuram sujeitos capazes de mobilizar saberes entre contextos

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profissionais. Esta procura, apesar de não ser a solução imediata para a possível preocupação com os riscos do desemprego, revela que “à partida um conjunto de competências validadas e uma capacidade comprovada para entrar em processos de aprendizagem disporá de uma vantagem apreciável no mercado de trabalho” (Boterf, 2005, p.16), fazendo do sujeito alguém autónomo e capaz de defender a sua empregabilidade.

Etimologicamente, a palavra competência tem as suas raízes no latim, competens, e significa “o que vai com, o que é adaptado a” de acordo com (Boterf, 2003, p.53). Para o autor a competência aproxima a resolução de problemas à capacidade de análise, num contexto de trabalho que necessita de regular adaptação.

O conceito de competência é dotado de um carácter polissémico, o que leva a alguma falta de consenso quanto ao seu significado (Hoffmann, 1999; Stroobants, 2006). Uma das razões para a falta de consenso na sua definição deve-se, essencialmente, à sua ampla utilização em diferentes áreas do conhecimento, tais como a psicologia, a política, a gestão, assim como na educação e formação (Boterf, 1993).

Tendo em conta o seu significado polissémico, Stroobants (2006) refere-se à competência como a capacidade de mobilizar os diferentes saberes, saber ser e saber fazer, para a resolução de problemas em diferentes contextos e ao longo do tempo. Alicerçado numa perceção crítica acerca das suas valências e potencialidades, e consciente das suas dificuldades e limitações, Gonçalves (2006) fala da competência como a capacidade de atingir respostas, soluções e resultados, em diferentes dimensões e contextos. Na mesma linha de pensamento “ser competente é cada vez mais ser capaz de gerir situações complexas e instáveis” (Boterf, 2005, p.18)

Cardoso et al (2006), na sua publicação, defende que a complexidade do conceito foi o resultado das orientações do sistema económico capitalista em virtude de, cada vez mais, ser imposto às organizações e aos seus recursos humanos uma maior capacidade de orientação para o resultado, no sentido de dar resposta à globalização do mercado de trabalho, envolto em traços de forte competitividade. Ser competente implica saber agir e reagir de forma adequada ao acontecimento imprevisto e inopinado, implica ser capaz de “auto-regular as suas ações, saber contar não somente com os seus recursos, mas procurando outros complementares, estar em condições de os transferir e (re)investir as suas competências num contexto diferente” (Castro, 2007, p. 7).

O entendimento da competência como um “saber fazer – operacional – validado” é descrito por Meignant (2003, pp.281/282) como “a capacidade de executar uma

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combinação específica perante um problema muitas vezes inédito. Esta capacidade combinatória, base da competência, permite mobilizar imediatamente saberes teóricos, processuais, experimentais, empíricos, sociais, cognitivos, para encontrar uma resposta inovadora para uma situação que não pôde ser inteiramente prevista pelos gabinetes de estudo. Esta capacidade combinatória é o cerne da competência”.

Para os autores Roegiers e De Ketele (2004), a competência é entendida como um conceito capaz de realizar a mobilização de saberes entre contextos que permite “de maneira espontânea – apreender uma situação e responder a ela mais ou menos pertinentemente” (Roegiers & De Ketele, 2004, p.45), afirmando que toda a competência que um profissional deve possuir tem de ser encarada numa perspetiva de integração de saberes que foram adquiridos em processos de ALV e em contextos de aprendizagens variados (formais, não formais, informais).

De acordo com Stroobants (2006), de forma sumária, a competência é concebida como a capacidade de mobilizar os saberes, saber ser e o saber fazer, em contextos distintos. Esta não se esgota naquilo que é externo e observável e possui uma certa singularidade, uma vez que o seu caráter tácito remete-nos para uma dimensão não formal e informal das competências, em que de uma forma implícita, decorrente de práticas externas ao sistema tradicional de ensino, se repercute nas ações de trabalho

No que diz respeito ao desenvolvimento deste conceito no seio das práticas de educação e formação, é ponto assente que este envolve novas exigências e considerações. Para além da sua evidente manifestação ao nível das práticas pedagógicas, é-lhe atribuído grande importância à vertente prática, ao saber fazer, em conjugação com os conteúdos teóricos e técnicos (Parente, 2004).

No entanto, o desenvolvimento e aquisição de competências não resulta unicamente da dimensão formal da aprendizagem, como temos vindo a defender. Na sua dimensão social, a família, o trabalho e todas as suas práticas e vivências devem também ser tidos em conta como contextos amplamente ricos para o desenvolvimento de competências, mesmo que de forma informal (Pires, 2002; Boterf, 2003). De acordo uma abordagem sistémica defendida por Pires (2002), as competências resultam de uma articulação de saberes de diferente natureza, mobilizados em determinada ação, através de um mecanismo que é contextualizado, objetivo e integrativo. Podemos afirmar que as competências resultam de combinações complexas de atributos como os conhecimentos, atitudes, comportamentos, valores e estratégias cognitivas que são mobilizados para responder a situações complexas que os sujeitos vão experienciando em diferentes

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contextos. Esta dinâmica de desenvolvimento das competências atribui repartidas responsabilidades à articulação das aprendizagens adquiridas através da via formal e ao percurso de vida dos indivíduos (via não formal e informal).

Numa perspetiva construtivista o desenvolvimento das competências é sempre um processo contextualizado em termos pessoais e sociais, que ocorre de forma progressiva, em que o contexto e a motivação adquirem fulcral importância (Trépos, 1996). No decorrer desta construção, Witorsky (1998) afirma que as competências se desenvolvem num processo que apela a um exercício constantemente reflexivo, durante o processo que existe entre a atividade e a sua concetualização.

Neste sentido, torna-se imperativo considerar o processo de aquisição e desenvolvimento de competências como o resultado de experiências, laborais e formativas, e não como uma atividade exclusivamente anterior ou paralela ao trabalho. As competências não são qualidades inatas ao sujeito, não se ensinam nem se transmitem, mas sim o resultado de um conjunto de experiências que o sujeito vivenciou, adquiriu e mobilizou.

2.1.5 A relação entre as competências-chave e a aprendizagem ao longo da