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Definindo democracia e sua relação com a educação

2.2 Educação e emancipação

2.2.2 Educação e democracia

2.2.2.1 Definindo democracia e sua relação com a educação

Certamente ‘democracia’ é um dos conceitos que mais sofreram ao longo do tempo nas mãos de pesquisadores, políticos e cidadãos. Geralmente usamos a palavra democracia e suas variações para defender uma sociedade em que o poderpolítico pertence, em última instância e por direito, ao povo. Contudo, esquecemos que a sua definição é fundamental para evitar confusões sobre o real potencial da democracia e sobre o potencial da área da educação, da qual estamos nos aproximando. Não tenho a pretensão de apresentar uma definição detalhada do que é democracia, mas pretendo mencionar alguns elementos sem os quais entendo que não podemos falar de um governo, de uma sociedade ou de uma instituição democrática.

O primeiro problema ao analisar o conceito de democracia é que, nas sociedades complexas e plurais, dificilmente encontramos pessoas que não queiram ver seu nome agregado a ela. Pelo contrário, facilmente escutamos, nos mais diversos tipos de discursos, a

inclusão do termo ‘democracia’ como técnica de valorização do discurso. Decorre daí que é possível encontrar tantos significados para democracia que ou não sabemos defini-la minimamente ou, pior, lhe atribuímos tal diversidade de sentidos que o próprio conceito perde sua força. Assim sendo, vou dar um passo atrás e procurar o significado da palavra democracia.

Etimologicamente, democracia é um termo de origem grega composto de demos e kratos que significam, respectivamente povo e poder. Democracia é, portanto, um regime político no qual a soberania é exercida pelo povo. O poder pertence ao conjunto dos cidadãos que exercem o sufrágio universal. Segundo Norberto Bobbio (2000, p. 7):

(...) por democracia entende-se uma das várias formas de governo, em particular aquelas em que o poder não está nas mãos de um só ou de poucos, mas de todos, ou melhor, da maior parte, como tal se contrapondo às formas autocráticas, como a monarquia e a oligarquia.

No entanto, existem tipos diferentes de democracia, sendo os mais comuns aqueles que pressupõem a participação direta ou indireta do povo. No caso da democracia direta, o povo, através de eleições, plebiscitos, referendos ou outras formas de consultas populares, pode deliberar diretamente sobre assuntos políticos ou administrativos de sua cidade, Estado ou país. A ênfase nesse recai sobre participação dos cidadãos sem intermediários (presidente, governador, deputados, senadores, vereadores). Alguns chamam as democracias diretas de deliberativas, pois nela são valorizados os mecanismos racionais e discursivos de tomada de decisão.

Já na democracia indireta, o povo também participa, porém não de forma direta mas por meio de representantes aos quais é delegado o poder mediante o voto. Os cidadãos elegem seus representantes (presidente, governador, deputados, senadores, vereadores) que tomam decisões em nome de todos. Estes representantes promulgam, julgam e aplicam as leis. Diretamente, o povo só entra em cena no período eleitoral. Esta forma de democracia é conhecida como democracia representativa, pois todo o poder é repassado pelo povo para as mãos dos seus representantes.

Para John Dewey (1979, p. 93) democracia “é mais do que uma forma de governo; é, essencialmente, uma forma de vida associada, de experiência conjunta e mutuamente comunicada”. Nestes termos, ou seja, democracia como forma de vida é uma ideia que precisa ser constantemente discutida e reavaliada. Um conceito fixo do que é democracia pode eliminar dela todo o seu verdadeiro potencial. Exemplo disso é a democracia

grega, na qual povo não significa todos, pois mulheres, escravos e estrangeiros não participavam das decisões políticas. Paulo Freire (1989, p. 80), seguramente inspirado em Dewey, também definia a democracia como forma de vida:

A democracia que, antes de ser forma política, é forma de vida, se caracteriza, sobretudo por forte dose de transitividade de consciência no comportamento do homem. Transitividade que não nasce e nem se desenvolve a não ser dentro de certas condições em que o homem seja lançado ao debate, ao exame de seus problemas e dos problemas comuns. Em que o homem participe.

A democracia se caracteriza por ser uma forma de organização social na qual é possível deliberar conjuntamente sobre os problemas da cidade. O voto como instrumento político é apenas um efeito. Por si só, ele não gera democracia. A sociedade democrática se caracteriza pela comunicação, pelo conflito, pelo debate, pela cooperação e livre intercâmbio entre todos os indivíduos. Dessa forma, a democracia envolve dois elementos fundamentais: primeiro, a reavaliação constante do próprio conceito e, segundo, a exigência de participação e deliberação de todos os membros de uma sociedade. Jürgen Habermas (1997, p. 145), com seu ‘princípio democracia’, ajuda-nos a compreender melhor essa forma de vida chamada democracia:

[...] o princípio democracia destina-se a amarrar procedimentos de normatização legítima do direito. Ele significa, com efeito, que somente podem pretender validade legítima as leis jurídicas capazes de encontrar o assentimento de todos os parceiros do direito, num processo jurídico de normatização discursiva. O princípio da democracia explica, noutros termos, o sentido performativo da prática de autodeterminação de membros do direito que se reconhecem mutuamente como membros iguais e livres de uma associação estabelecida livremente. [...] (O) princípio da democracia pressupõe preliminarmente a possibilidade da decisão racional de questões práticas, mais precisamente, a possibilidade de todas as fundamentações, a serem realizadas em discursos (e negociações reguladas pelo procedimento), das quais depende a legitimidade das leis.

Na perspectiva de Habermas, a democracia está relacionada à participação na deliberação sobre os assuntos da cidade. No entanto, ele fala de membros que se reconhecem livres e iguais e que escolhem o discurso racional como meio para chegar ao entendimento. Embora concorde com Habermas em quase tudo, prefiro a perspectiva honnethiana sobre a democracia. A diferença fundamental entre o mestre e o discípulo é que Honneth afirma que não é o entendimento o motor que move as relações sociais, mas o conflito. Aqui apenas estou antecipando essa diferença, que irei tratar mais detalhadamente adiante.

Embora não sejam poucos os que acusam a democracia de ser o pior tipo de governo, Platão e Winston Churchill, por exemplo, acreditam que a distribuição de poder

dentro do sistema democrático e a possibilidade de participar, de deliberar livremente, parece fazer dele o melhor sistema político pensado até hoje. De qualquer forma, não pretendo discutir este ponto, pois parto da convicção de que a democracia é o melhor sistema político e que as nações mais desenvolvidas do planeta atualmente são sociedades democráticas. Contudo, isto não significa que não existam dificuldades no modelo democrático, mas penso que a aproximação entre a democracia e a educação pode contribuir para aprimorar tanto o campo educativo quanto o campo político.

Espero ter deixado claro que ao tratar da democracia estou abordando um modo de vida que implica em participação, deliberação e conflito. Nesse sentido, parece oportuno agora explicar melhor o caráter produtivo da aproximação entre educação e democracia. Embora falar de educação democrática tenha se tornado comum nos dias atuais, convém lembrar que existem formas diferentes de entender essa aproximação. Designo a primeira forma de ‘educação para a democracia’, a segunda de ‘educação na democracia’ e a terceira de ‘educação com os outros na e para a democracia’.

No caso da primeira forma, a educação para a democracia, o indivíduo é visto como um produto da educação. Embora não muito lembrado, Rousseau está nas origens da tradição, segundo a qual, a educação é entendida como preparação para a democracia. Há na sua obra uma unidade a partir da qual as suas contradições internas podem ser entendidas. Essa unidade reside na ideia de que o homem é naturalmente bom e a sociedade o corrompe. Rousseau (2006, p. 9) afirma no início do Contrato social que “o homem nasceu livre e por toda parte ele está agrilhoado”. Porém, isso não significa que o homem deve voltar ao seu estado natural, mas deve, por meio da educação e da sociedade, transformar a si mesmo para que possa transformar a sociedade.

Aqui podemos perceber a importância que Rousseau dá a educação, pois, para ele, a educação é o meio mais eficaz para preparar o indivíduo para enfrentar a sociedade corrupta que ele irá encontrar. Rousseau, ao contrário do que alguns podem pensar, não é um pessimista em relação ao homem. Ele deposita muita confiança na bondade humana:

O que Rousseau pretende transmitir, de facto, é que todos os homens são potencialmente bons – ninguém pode ser totalmente mau. Se os homens deixassem a sua bondade natural brotar, desejariam apenas aquilo que é correto; e o fato de não o desejarem só significa que não compreendem a sua própria natureza. Mas a natureza está lá, apesar de tudo isso (BERLIN, 2005, p. 70).

Para Rousseau, se a educação de uma criança for bem dirigida, as chances de a bondade natural predominar no mundo são maiores. A ideia de uma educação natural deve ser

entendida, portanto, a partir deste eixo. Rousseau não parece querer que o homem civilizado retroceda no tempo e se torne agora um bom selvagem. A sociedade que é responsável pela corrupção do homem, também é responsável pela sua moralização. Dessa forma, a educação cumpre um papel muito importante, pois ela visa à constituição deste novo homem, deste cidadão, capaz de reformar esta sociedade corrupta. Mas o mais importante para a tradição posterior é que o modelo deste novo homem não deve ser buscado fora do homem, mas dentro dele mesmo.

Em outras palavras, a tradição posterior a Rousseau, propõe que o resultado obrigatório do processo educativo é a formação de um indivíduo dotado das capacidades e habilidades necessárias para a participação na democracia. Embora Rousseau seja o iniciador dessa tradição, é preciso reconhecer que o difusor de suas ideias foi Immanuel Kant. Depois do seu escrito Sobre a Pedagogia, outros autores seguiram essa mesma linha. Exemplos mais recentes são Henry Giroux e Amy Gutmann. Nessa tradição, é fundamental que o currículo escolar aproxime os jovens dos conhecimentos e habilidades necessários para a democracia. O problema dessa forma de entender a democracia e sua relação com a educação, dizem seus críticos, é que os jovens são vistos como indivíduos isolados, capazes de sair da sua menoridade apenas com a aquisição de habilidades e conhecimentos democráticos. Kant (1999, p. 22), em Sobre a Pedagogia, fala da educação como preparação para o futuro:

Um princípio de pedagogia, o qual mormente os homens que propõem planos para a arte de educar deveriam ter ante os olhos, é: não se devem educar as crianças segundo o presente estado da espécie humana, mas segundo um estado melhor, possível no futuro, isto é, segundo a ideia de humanidade e de sua inteira destinação. Esse princípio é de máxima importância. De modo geral, os pais educam seus filhos para o mundo presente, ainda que seja corrupto. Ao contrário, deveriam dar-lhes uma educação melhor, para que possa acontecer um estado melhor no futuro.

Para Kant, a educação é vista como a preparação do indivíduo para deixar sua menoridade e contribuir para um futuro melhor, não só seu, mas da humanidade. Contudo, a crítica feita a essa tradição kantiana parte do pressuposto de que o indivíduo não é um ser isolado do mundo. A máxima kantiana e do Iluminismo que convida a pensar por si mesmo teria esquecido o papel fundamental que o ambiente desempenha na formação da subjetividade. Afirmar que o sujeito com acesso aos conhecimentos e habilidades da democracia estará preparado para a democracia é ignorar as pesquisas que indicam que os jovens não aprendem apenas com o que lhes é ensinado, mas que aprendem também, e até mesmo com mais eficácia, por influência do contexto, do ambiente em que vivem.

Dessa crítica decorre a segunda forma de entender a aproximação entre educação e democracia. Esse segundo modelo privilegia uma formação na democracia. Sem dúvida, seu maior expoente é John Dewey, pois entendia, como bom pragmatista, que a mente era algo adquirido. Se Kant entendia o funcionamento da educação como um despertador para acordar os indivíduos da sua menoridade, Dewey atribuía ao indivíduo a necessidade de adquirir conhecimentos e habilidades por meio da experiência da vida democrática. Assim, a ideia orientadora dessa tradição é que através da experiência de um ambiente democrático os jovens irão desenvolver e promover a democracia.

Não tenho a pretensão de entrar nesse debate, mas Dewey acusa Kant e a tradição posterior de pressupor indivíduos possuidores de disposições naturais para a vida democrática. Nesse caso, bastaria à educação despertar o indivíduo para sair daquela situação de menoridade, ou seja, de não uso de sua razão. Para Dewey e aqueles que o seguiram, a maioridade kantiana só pode ser atingida pela experiência. No caso específico da democracia, não se pode pressupor que seja possível alcançá-la mediante o auto desenvolvimento do indivíduo. Ao contrário, é necessária a influência externa de instituições educativas democráticas. Em outras palavras, de nada adianta um currículo modelar em termos de democracia se a gestão e as práticas pedagógicas são autoritárias.

A polêmica entre aqueles que se alinham à tradição de Rousseau e Kant e os adeptos da tradição deweyniana lembra a antiga querela entre ensinar história da filosofia e ensinar a filosofar. De um lado, os críticos da tradição de Rousseau e Kant alegam que eles optaram por um individualismo e racionalismo. Ao dizer que o indivíduo já possui dentro de si as disposições naturais e que precisa apenas desenvolvê-las, essa tradição teria esquecido o fator social na formação da subjetividade. Friedrich Nietzsche, Sigmund Freud, John Dewey, Michel Foucault e Jürgen Habermas são alguns dos autores críticos dessa tradição incapaz de entender a relação entre a formação da subjetividade e o contexto externo.

Esses críticos, cada um ao seu modo, mostraram a configuração social da subjetividade. É por meio da interação social e da comunicação que o indivíduo adquire as habilidades necessárias à vida. Dewey, por exemplo, argumenta que o próprio hábito de pensar e refletir criticamente se adquire por meio da experiência. Dito de outra forma, os hábitos e habilidades necessários à postura democrática se adquirem socialmente. Por meio da participação na vida democrática o indivíduo desenvolve a inteligência social necessária para aprender a governar e ser governado.

Entendo como dispensável assumir posição excludente a favor de um ou de outro lado desta querela. Certamente, cabe parcela de razão a cada uma dessas posições teóricas, ou

seja, o processo educativo parece não ser nem apenas individual nem exclusivamente social. É inegável o avanço feito por Dewey em comparação com Rousseau e Kant. Contudo, as duas posições veem o cidadão democrático como um produto do processo educativo. Caberia à educação, para e na democracia, formar um sujeito com os predicados necessários à vida democrática.

Entendo ser possível assumir as contribuições das duas posições e ainda assim avançar na aproximação entre educação e democracia. Primeiro, é inegável a importância de oferecer aos educandos a oportunidade de acessar os conhecimentos e habilidades necessários à vida democrática. Na comparação com a querela entre filosofar ou ensinar filosofia, poderíamos perguntar se é possível filosofar sem conhecer a tradição da história da filosofia. Segundo, também é importante sublinhar a importância que o ambiente social tem na formação da subjetividade. Novamente comparando com a contenda da filosofia, podemos perguntar se apenas ensinar história da filosofia é suficiente para aprender a filosofar.

Uma verdadeira educação democrática deve oferecer tanto o acesso aos conhecimentos e habilidades necessárias à democracia quanto um ambiente gestado e vivido democraticamente. De resto, é possível avançar para além dessas duas perspectivas. Penso, por exemplo, que Hannah Arendt (2007) oferece uma contribuição interessante para o encaminhamento dessa questão quando ela destaca a importância dos outros na constituição da nossa subjetividade.

Arendt distingue três dimensões do que ela chama de vida ativa: labor, trabalho e ação. As duas primeiras não são relevantes no presente contexto, por isso, as deixo de lado. Vou me deter na terceira dimensão. De acordo com a autora, a ação é a dimensão da vida ativa que acontece diretamente entre os homens. Agir significa engendrar algo novo por meio de tudo o que fazemos, mas isto só pode ocorrer mediante a reação dos outros. Vale dizer que a constituição de nossa subjetividade se efetiva no encontro e na relação com o outro. Gert Biesta, ao falar sobre Arendt, afirma:

Se eu começasse algo, mas ninguém reagisse, nada resultaria da minha iniciativa e, consequentemente, meus inícios não viriam ao mundo e eu não seria um sujeito. Eu não viria ao mundo. Quando, por outro lado, começo algo e os outros adotam realmente meus inícios, eu venho de fato ao mundo, e precisamente nesse momento eu sou um sujeito (2013, p. 175-176).

A grande contribuição de Arendt foi mostrar que a reação dos outros é imprevisível. A tentativa de prever ou de controlar a reação dos outros eliminaria toda a possibilidade de pluralidade e diferença. Além disso, controlar a reação dos outros seria o

mesmo que usá-los como instrumentos de afirmação da nossa subjetividade o que anularia a nossa subjetividade uma vez que esta só existe na interação aberta e imprevisível. Dessa forma, para Arendt, a subjetividade não é um atributo apenas do sujeito, mas uma qualidade da interação humana. Só existimos como sujeitos se os outros também puderem ser sujeitos.

Uma educação que se pretenda democrática precisa garantir a pluralidade e a diferença. Em função disso, as instituições educativas não devem apenas oferecer a oportunidade de educação a todos os indivíduos; elas precisam, acima de tudo, garantir a todos a oportunidade de serem sujeitos, pois só assim, o termo formação alcança seu pleno sentido. A interação humana, ou seja, a ação social é fundamental para o sujeito sentir-se reconhecido e, assim, ser capaz de lidar com os benefícios e os desafios próprios da vida democrática.

Por isso, é muito importante entender que a sobrevivência da democracia depende de uma compreensão da sociedade e da educação a partir da pluralidade e da outridade. A formação da minha subjetividade depende do outro. A diferença, presente nas sociedades complexas e plurais, não é apenas inevitável, mas também boa e preciosa. Não podemos esperar queos outros sujeitos pensem, sintam e reajam do mesmo modo como nós. Qualquer estratégia política ou educativa baseada numa suposta essência geral do ser humano prejudica a riqueza humana da diferença.

Axel Honneth também destaca a importância do outro na formação da subjetividade. Ele entende que o sujeito só aprende a ver a si mesmo de modo positivo na medida em que desenvolve suas capacidades e é reconhecido por seus parceiros de interação. No entanto, quando é desrespeitado, injustiçado ou humilhado, o sujeito encontra nessas experiências a motivação para lutar pelo reconhecimento. Essa noção de conflito é muito importante para a formulação de teoria crítica de Honneth, pois, aquilo que os sujeitos experimentam como um prejuízo de suas expectativas morais pode se tornar um bloqueio ao processo emancipatório. A formação da identidade depende das relações de reconhecimento recíproco e a violação dessas relações impede a realização da autonomia subjetiva.

Com Arendt e Honneth, podemos dizer que a educação pode e deve ser o ambiente em que os indivíduos podem se tornar e se sentir sujeitos. A novidade fundamental dos argumentos de Honneth é que tornar-se sujeito é o resultado de uma luta diária e intersubjetiva. O indivíduo jamais pode se afirmar reconhecido em sua plenitude; é no convívio diário com os outros que ele busca reconhecimento e forma sua identidade. Daí a importância das instituições educativas oportunizarem um ambiente onde a intersubjetividade seja cultivada e estimulada.

Crucial para uma educação realmente democrática é a organização de um ambiente em que os jovens possam alcançar a condição de sujeitos. Isto contrasta com a ideia de produzir uma pessoa democrática. A subjetividade é acima de tudo uma construção intersubjetiva que, porém, não é livre de conflitos. Honneth destaca a ideia de conflito como central às ações humanas. Com isso, nos ajuda a compreender que uma educação democrática bem sucedida depende não apenas do sucesso dos indivíduos nas suas lutas por reconhecimento, mas também da capacidade de lidar com o conflito, com o não reconhecimento, com o fracasso.

A aprendizagem, nessa perspectiva, deve deixar de ser compreendida apenas como mera aquisição de conhecimentos, valores ou habilidades. Ela deve ser entendida como resposta ou reação ao não familiar, ao outro, à diferença. Essa é a noção de conflito tão cara a Honneth, pois a formação da subjetividade depende fundamentalmente da reação do indivíduo diante daquilo que o desafia ou perturba. Responder é uma possibilidade aberta. Daí o caráter