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Movimiento Nacionalista Revolucionário (MNR) (depois revogado) 2 delegados Partido Revolucionário de Izquierda Nacional (PRIN) 2 delegados

Partido Comunista de Bolivia (PCB) 2 delegados Partido Comunista de Bolivia Marxista Leninista (PCB-ML) 2 delegados Partido Obrero Revolucionario (POR-Masas) 2 delegados Partido Democrata Cristiano Revolucionario (PDCR) 2 delegados

Movimiento Revolucionario Espartaco 1 delegado

TOTAL 13 delegados

SOMA DE TODAS DELEGAÇÕES DA ASSEMBLEIA POPULAR 220 delegados

Fonte: ANDRADE, 2011, pp. 128-130.

As diferenças políticas no interior do Comando Político também se refletiram nas divergências quanto ao funcionamento da Assembleia. As duas posições, delineadas por Andrade eram: “fazer da Assembleia Popular um novo poder ou constituí-la como um instrumento coadjuvante e auxiliar do governo Torres” (2011, p. 108). A partir das principais falas no Ato de Abertura, vão se revelando os alinhamentos com estas posições. René Higueras, da COB e dirigente do sindicato dos professores fez um histórico do percurso de constituição da Assembleia, com ênfase no enfrentamento aos setores golpistas e nas dificuldades políticas e organizativas que se apresentavam. Simon Reyes, delegado mineiro demarcou a originalidade do organismo que estava sendo criado, fez referência ao sangue proletário que banhou a História da Bolívia na jornada pela libertação nacional. Afirmou:

Nós, trabalhadores mineiros, nos sentimos com o direito de participar desse triunfo, porque temos demonstrado capacidade para luta e profundas convicções revolucionárias. Não só devemos participar da Assembleia, mas também devemos lutar mais, nas trincheiras, nas barricadas para enfrentar os inimigos da classe trabalhadora (apud ANDRADE, 2011, p. 109).

A fala de Guillermo Lora teve como ênfase extrair as lições dos momentos históricos anteriores, sobretudo da Revolução de 1952. Ao mesmo

tempo, mostrou como a COB em 1952 personificou a dualidade de poderes que, naquele momento, se resolveu em favor do MNR. O Secretário Geral da Federação dos Mineiros (FSTMB) Victor Lopez mostrava os limites da democracia burguesa como via para as conquistas dos trabalhadores:

Estamos plenamente convencidos, os trabalhadores organizados, que o velho parlamentarismo não trouxe benefícios para nossa classe nem para o país. Só foi uma caricatura da chamada democracia formal; ademais era custoso, inoperante e quase sempre a serviço do sistema presidencialista e dos partidos no poder. O poder do povo deve expressar-se através de sua participação plena na Assembleia Popular, organizada de tal modo que se faça presente em todos os lugares do país. E no nível econômico, industrial, mineral, agrário, (...) a Assembleia Popular não só constituirá o braço político da COB, senão de todo o povo (apud ANDRADE, p. 109).

O futuro dirigente do MIR, que no momento integrava os quadros do Partido Democrata Cristão Revolucionário (PDCR) falou representando os partidos na Assembleia, afirmando que estes deveriam ser leais à classe operária e organizar política e militarmente as massas para a tomada do poder. Juan Lechín, com sua capacidade de falar o que a audiência gostaria de ouvir rechaçou as propostas de Torres de uma Assembleia Constituinte ou um referendo. Homenageou Che Guevara e os universitários mortos na guerrilha de Teoponte, condenou imperialismo norte-americano, defendeu a expulsão das missões militares e defendeu que a única garantia de libertação era o fuzil no ombro do operário.

Nesta primeira sessão ainda não havia documentos, propostas e preparação política suficientes para um funcionamento pleno. Assim, sua inauguração, “foi muito mais um ato de propaganda e reafirmação política, necessário para reforçar a decisão do Comando Político da COB, acelerar a preparação da Assembleia Popular e consumar um marco político aos recalcitrantes” (ANDRADE, 2011, P. 111). Muitos sindicatos e partidos ainda havia disputas pela delegação. Diante disso, René Higueras propôs que o Comando Político da COB continuasse funcionando até a realização da primeira sessão da Assembleia Popular, que foi fixada para iniciar-se no dia 22 de junho.

A crescente mobilização social nas semanas seguintes mostravam a polarização em torno da Assembleia Popular. De um lado, se afirmava uma situação revolucionária com o fortalecimento das organizações de massa a partir de órgãos de democracia direta o que amplificava sua ação política. Fazendas eram tomadas em Santa Cruz, com a iniciativa da União dos Camponeses Pobres (UCAPO). Sedes de organismos ligados aos EUA eram ocupados por universitários. A Semana anti-imperialista foi realizada em La Paz “repercutindo na juventude o clima de militância política que preparava a própria Assembleia Popular” (ANDRADE, 2011, p. 111). As atividades políticas e culturais manifestavam a solidariedade com os povos do Vietnã, Camboja e Laos. E nos atos foram queimadas bandeiras dos Estados Unidos em frente à embaixada. A direita também mantinha a iniciativa procurando pavimentar o caminho do golpe. Torres era o retrato de um governo em ruínas. Decretou um estado de sítio que foi ignorado. A comissão governamental que prepararia a proposta de Constituição estava sem iniciativa.

O sentimento anti-imperialista se fortaleceu com a divulgação de que os Corpos de Paz dos Estados Unidos estavam uma política de controle de natalidade com esterilizações forçadas11. Cresceram as mobilizações pela expulsão destas organizações e Torres se viu obrigado a exigir sua retirada. Outras reivindicações antiimperialistas eram feitas. As mobilizações exigiam a expulsão de uma base dos EUA próxima a La Paz, oficialmente chamada de “Centro de Transmissões Estratégicas”, mas conhecida popularmente como “Guantanamito” por causa da base dos Estados Unidos existente em Cuba. Uma central sindical continental ligada ao governo dos EUA, a ORIT, também foi expulsa. No início de Junho, com o aumento da movimentação de organizações políticas direitistas contra Torres e para frear o desenvolvimento da Assembleia Popular, a COB convoca a mobilização geral dos sindicatos e decreta estado de alerta. A Central Departalmental de La Paz deflagra o “alerta armado”.

11 O filme Yawar Mallku (Sangue de Condor), de 1969, do cineasta Jorge Sanjinés retrata a situação

de penúria das comunidades indígenas e a ação dos Corpos de Paz. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=f51nkM1jt64.

A sessão nacional da Assembleia Popular ocorreu em 22 de junho. No processo de eleição e garantia dos delegados, houve uma firmeza em manter a independência política e material em relação ao governo e partidos burgueses. As dificuldades financeiras foram um grande obstáculo, o que impediram inclusive a presença de delegações de cidades mais distantes (ANDRADE, 2011, p. 131). Em relação à escolha dos delegados, a uma semana do início, das 44 organizações, apenas 18 haviam elegido seus delegados. Nem todas comissões preparatórias haviam redigido os documentos que lhes foram incumbidos, sobrecarregando o Comando Político. As delegações já começavam a chegar a La Paz, dentre elas a dos mineiros, com 52 trabalhadores de base e 6 da federação. As assembleias nos acampamentos em todo o país haviam elegido seus delegados e aprovado as resoluções que levariam à Assembleia Popular sobre a Universidade Única, o controle operário da mineração. A delegação trazia também um projeto, redigido pelo POR-Masas e PCB de nacionalização e integração das empresas mineradoras e de fundição. Os ferroviários se pronunciaram defendendo a Assembleia Popular e manifestaram sua disposição para organizar as milícias armadas do povo. Sua delegação preparava uma proposta de resolução sobre a reorganização da rede nacional de ferrovias (ANDRADE, pp. 132-133). O Bloco Independente Camponês realizou uma Conferência Nacional em Catavi, em 22 de junho, quando elegeram seus delegados. A Conferência rechaçou o pacto militar-camponês e aprovou o pacto operário-camponês-universitário. Um dos seus delegados, o dirigente de Cochabamba Cassiano Amurrio, foi um dos membros da Comissão Nacional da Assembleia.

O historiador Everaldo Andrade considera que a eleição dos delegados não foi um processo tranquilo e uniforme.

Dependia de vontade política. Muitas entidades e organizações que há apenas um ano nem sequer podiam existir, depois de anos de perseguições políticas, estavam se rearticulando em suas bases e recompondo seus quadros e militantes (ANDRADE, 2011, p. 133).

O fato de as delegações, em sua maioria, expressarem mandatos sindicais e populares não inviabilizava a expressão partidária. Diferentemente do que René Zavaleta afirmava, que os partidos foram diluídos no espontaneísmo sindical (ZAVALETA MERCADO, 1987, p. 132), a influência dos partidos ia além de sua representação nominal e aparecia em meio aos delegados de base. Everaldo Andrade traz em seu livro os números obtidos em uma enquete do jornal Los

Tiempos, de 4 de julho de 1971, em que os delegados indicavam suas simpatias

partidárias. O que não necessariamente refletia a presença do programa destes partidos ou mesmo seu efetivo peso. Apresentamos no quadro abaixo a resposta de 212 delegados.

Tabela 2 - Preferências partidárias dos delegados da Assembleia Popular

MNR 53 militantes

PRIN 28 militantes

PCB 26 militantes

PCML 17 militantes

Partido Socialista 13 militantes

MIR (Espártaco e PDCR) 13 militantes

FSB 8 militantes

POR - Masas 8 militantes

Não declararam preferências partidárias 46 delegados

TOTAL 212 delegados

Fonte: ANDRADE, 2011, p. 34

Percebe-se com isso ainda a grande presença do MNR em meio aos trabalhadores. Mesmo que ele tenha sido expulso da Assembleia e que seus dirigentes máximos estivessem preparando o golpe junto com Hugo Bánzer, seu Comando Nacional Trabalhista apoiava a Assembleia Popular, contrariando a

direção do partido. O Jornal La Jornada piblicou a declaração desta ala do MNR, no dia 17 de agosto de 1971, poucos dias antes do golpe.

O Comando Nacional Trabalhista do MNR (…) estabelece com claridade sua plena identificação com a Tese do IV Congresso Nacional da COB e - como partido majoritário sem lugar a dúvida alguma – como militantes da COB, do Ampliado Nacional de Trabalhadores da Bolívia e da Assembléia Popular, atuarão juntamente com o povo boliviano em sua luta pela libertação nacional… (apud ANDRADE, 2011, p. 134)

Everaldo procura explicar os 8 delegados que simpatizavam com a FSB, por meio da existência de esquerda neste partido conhecido por ser de direita e, inclusive, com características fascistizantes. O POR-Masas, por mais que tivesse um destacado papel político na organização e elaboração dos documentos, tendo como dirigentes destacados seus militantes Guillermo Lora, o mineiro Filemon Escobar e o dirigente estudantil Jorge Lazarte era bastante minoritário entre as delegações. As organizações políticas estavam em um processo acelerado de recomposição e a realização da Assembleia Popular fez com que o conjunto das forças políticas tivessem que se posicionar e que buscassem representação na Assembleia Popular, mesmo aquelas que não tinham como objetivo a construção do duplo poder.

Figura 2 - Mapa da relação dos Partidos e organizações políticas com a Assembleia Popular

Fonte: ANDRADE, p. 299, s/d.

Na tarde do dia 22 de junho, ocorreu a primeira sessão da Assembleia Popular, no Palácio Legislativo, escoltado por uma guarda armada composta por integrantes de organizações operárias e estudantis. O oferecimento de proteção por parte do presidente Torres foi rejeitado. A guarda da Assembleia, que era parte do início da formação das milícias armadas, impedia a entrada de provocadores. Uma grande faixa indicava, na fachada do edifício, que ali se reunia a “Asamblea del Pueblo”. Quatro mineiros com seus capacetes e uniformes de trabalho, empunhando fuzis, se colocava atrás da mesa que presidia os trabalhos. Na leitura dos nomes dos delegados presentes, houve alguns atritos por questionamentos entre delegações, o

que no dia seguinte levou à impugnação de alguns representantes. Os camponeses exigiam maior representação, mas não foram atendidos.