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Delimitação e perspectiva adotadas neste estudo

CARACTERIZAÇÃO DE ETHOS DISCURSIVO DE DILMA ROUSSEFF

3.1. Delimitação e perspectiva adotadas neste estudo

A estratégia de análise dos discursos de Dilma Rousseff alinha-se com as abordagens de Maingueneau e Charaudeau e será norteada pelos preceitos linguístico-discursivos para descrever a imagem de si construída pelo enun- ciador. O interesse maior deste estudo está nos efeitos de sentido produzidos pelos discursos escolhidos para análise, não havendo a intenção de defender este ou aquele ponto de vista, em geral bastante diversificado dentro do campo político. Será considerado o contexto sócio-histórico e político, onde está inserido o sujeito enunciador, dentro da descrição das cenas de enunciação, tentando encontrar visão menos subjetiva ou menos parcial.

Em todo estudo acadêmico e científico prevalece a criticidade e objetivi- dade das ideias, conceitos e opiniões apresentadas, em busca de visão de conjunto e priorizando o saber e o conhecimento com vistas a ampliar a com- preensão dos usos diversos da linguagem, os diferentes modos de dizer e de ser de cada falante da língua.

Com essa pequena introdução para situar este trabalho, recordamos que em qualquer obra o autor está presente em sua produção, o mesmo valendo para esta pesquisadora e para o sujeito enunciador dos discursos a serem analisados. Cada detalhe observado auxiliará na análise dos elementos que compõem o ethos discursivo que se destaca pela voz feminina.

Nos estudos linguísticos, busca-se considerar o fato de que qualquer meio de comunicação sempre está impregnado pela posição social dos seus interlocutores: o sujeito enunciador marca sua presença no próprio discurso que enuncia; o sujeito empírico tem sua identidade pessoal e social marcadas por sua condição de cidadão de modo indissociável em quaisquer das aborda- gens de sua caracterização (autor, sujeito histórico, sujeito ideológico, sujeito social, sujeito enunciador etc.). Há sempre uma autoria da obra produzida e (re)produzida.

Iniciamos os primeiros comentários, a partir da noção de interdiscurso de Maingueneau, destacando a abordagem mais geral dos discursos de Dilma Rousseff. Constatamos a relação (dialógica) existente entre vários espaços discursivos bem como a preponderância de um deles, o político, observando que nesse embate prevalece o discurso político em primeiro, por ter sido o espaço inicial e motivador do enunciador para a realização do mesmo, sendo fator da formação das cenas de enunciação; e, em segundo, destaca-se o discurso de voz feminina, por ser o espaço de interesse específico do enun- ciador em abordar determinados temas do universo feminino, além de se posi- cionar enquanto sujeito do gênero feminino.

Colocamos em itálico a condição de primeiro e segundo na tipologia dos discursos analisados por mero efeito didático, pois concordamos com Maingueneau (2008, p. 75), quando este afirma que não há hierarquias entre os planos discursivos, pois cada qual visa a condensar o essencial da

especificidade de um discurso, importando, então, a consideração dos funda-

mentos semânticos do discurso, estando cada um dos planos integrados, tanto na ordem do enunciado, quanto na própria enunciação.

Assim, dentro dos espaços discursivos de cada um dos discursos sele- cionados, vamos mesclar as análises de vários planos discursivos, visando ao entendimento das estratégias adotadas pelo enunciador na construção da imagem de si.

Tomaremos como referência de organização das análises o seguinte procedimento metodológico: 1- descrição das cenografias de cada discurso selecionado pela perspectiva de Maingueneau; e 2- suas relações com a constituição dos vários tipos de ethé manifestados pelo enunciador pelas perspectivas de Maingueneau e de Charaudeau. Para cada descrição de cenografia (D1, D2, D3, D4) será feita análise daquele respectivo discurso, sendo os recortes ali selecionados referentes ao discurso em pauta e, em geral, na sequência em que foi enunciado. Haverá subdivisões de itens e abordagens sobre alguns planos discursivos, destacados por nós, quando possível, e quando do interesse para o estudo.

A estrutura de exposição dessa categoria de análise (ethos) será feita de modo similar para cada discurso, identificando as cenas de enunciação propos-

tas por Maingueneau (1997, p. 87): cena englobante, cena genérica e cenogra- fia.

Em nosso estudo, a cena englobante refere-se ao tipo de discurso, asse- melhando-se ao conceito de campo político, pelo fato de os parceiros envol- vidos na comunicação obedecerem a um estatuto pragmático, de interação social comum ao mundo da política. Todavia, considerar somente a cena englobante é insuficiente para especificar as atividades discursivas nas quais se encontram engajados os sujeitos políticos (MAINGUENEAU, 2008, p. 116). A linguagem política possui elementos específicos que a caracterizam, como veremos mais adiante.

Já a cena genérica relaciona-se ao próprio ambiente político, às instâncias onde de fato operam as relações políticas de modo essencial (partidos políticos, Congresso Nacional, Assembleias Legislativas, Câmaras de Deputados, sindicatos, Ministérios, entre outros). A caracterização da cena genérica se dá pelas marcas do gênero do discurso político, especificando detalhes e particularidades do local de acontecimento de determinado discurso político, apresentando condições variáveis que vamos observar em cada uma das amostras escolhidas. As cenas englobante e genérica compõem o que Maingueneau chama de quadro cênico do texto em que se desenrola a cenografia.

Para nossos objetivos, a cenografia é mais relevante e determinante para a constituição do ethos discursivo. A exploração da cenografia em nossas análises nos permitirá compreender os processos de legitimação do que é dito:

a cenografia legitima um enunciado (MAINGUENEAU, 2008, p.116) na mesma

proporção em que o enunciado legitima a cenografia. Essa reciprocidade demonstra que a cenografia intervém na cena de enunciação e é instituída pelo próprio discurso.

Simultaneamente às descrições das cenografias, vamos investigar e destacar as manifestações de ethos discursivo produzidas pelo enunciador na sequência dos quatro discursos, apoiando-nos em outras categorias de análise trazidas por Maingueneau e Charaudeau. A exposição desses discursos está em ordem cronológica de acontecimento, o que nos facilita a verificação, se há ou não algum tipo de crescendo na maneira de dizer do enunciador e de, portanto, construir sua imagem perante os co-enunciadores.

3.1.1. Síntese dos macrotemas e microtemas dos discursos selecionados para análise

Buscando visão de conjunto das amostras de discursos para análise, listamos de modo sintético, na Tabela 1, os tópicos ou temas e subtemas tratados pelo enunciador em seus discursos:

Discurso Macrotema Microtemas

D1 Apresentação da Presidente eleita Dilma Rousseff e de seu plano de governo (discurso de posse)

Miséria, pobreza, reforma política, sistema tributário, economia, produção industrial e agropecuária, desenvolvimento regional, serviços essenciais, fome, desigualdade social, políticas públicas, investimentos pú- blico e privado, PAC, educação, saúde, segurança, pré-sal, ciência e tecnologia, cultura, meio ambiente, política externa, liberdades individuais, governabilidade. D2 Política e relações internacionais Presença feminina na ONU, crise econô-

mica internacional, sistema financeiro, re- cessão, desemprego, crise política, pro- blemas fiscais, cooperação, papel da ONU, economia brasileira, Conselho de Segu- rança da ONU, projetos humanitários, con- flitos nos países árabes, direitos humanos, o Estado da Palestina, meio ambiente, pobreza, a questão da mulher.

D3 Promulgação de dois projetos de lei Transparência política, acesso à informa- ção, memória, verdade, exercício da cida- dania, democracia, direitos humanos. D4 Mulheres, gênero e empoderamen-

to das mulheres

Direitos das mulheres, desenvolvimento sustentável, presença das mulheres na política, empreendedorismo, papel social da mulher, mercado de trabalho feminino, tarefas domésticas, pobreza, programas sociais, meio ambiente, acesso aos varia- dos recursos naturais e aos serviços públi- cos de saúde, desigualdades de gêneros, tipos de violência, políticas para as mulhe- res.

3.2. A relevância das cenografias na constituição de ethos nos