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A demanda por acesso à educação infantil

No documento rafaelareisazevedodeoliveira (páginas 170-175)

4. A JUDICIALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO INFANTIL EM JUIZ DE FORA

4.5 A DEMANDA POR ACESSO À EDUCAÇÃO INFANTIL EM JUIZ DE FORA

4.5.1 A demanda por acesso à educação infantil

Em Juiz de Fora, a demanda por acesso à Educação Infantil é bastante definida – está centrada na etapa de creches. Todos os entrevistados e dados de pesquisa retratam um atendimento praticamente universalizado na etapa pré-escolar, de 4 e 5 anos e um grande déficit de vagas para as crianças de 0 a 3 anos de idade, situação semelhante em diferentes municípios brasileiros (CORRÊA, 2010).

Mas antes que os dados da demanda desta etapa de escolarização sejam apresentados, é importante esclarecer do que está sendo chamando de demanda. O significado da palavra, de acordo com o dicionário Michaelis49, é: “um quantum de determinado produto ou serviço que uma coletividade está necessitando e procurando, ou que, por previsões, se avalia que ela

49

Dicionário online. Disponível em: http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portugues- portugues&palavra=demanda. Acesso em: 24 de janeiro de 2015.

necessitará e procurará em certa data”. Esta definição se enquadra nos dados que está sendo trazido para o trabalho: a demanda por acesso à Educação Infantil é definida pela procura de vagas nos Centros Regionais de Assistência Social – CRAS, na Secretaria de Educação de Juiz de Fora ou ainda na Vara da Infância e Juventude, ainda que tenham sido encaminhadas pelos Conselhos Tutelares. Ou seja, é a demanda reprimida, que não é considerada pelo quantitativo de crianças que estão na faixa etária de 0 a 5 anos de idade no município. Inclusive, muitas, ou estão na rede privada, ou, simplesmente, não procuram pela vaga.

Tomando o caminho mais provável da demanda, conforme observado em pesquisa, inicialmente serão apresentados neste tópico os dados obtidos nos Conselhos Tutelares. Ao que tudo indica, o Conselho é o primeiro lugar onde a família procura a garantia de seu direito e de lá são dados os encaminhamentos, seja para a Secretaria de Educação ou mesmo a orientação para os CRAS e/ou Promotoria.

Esse primeiro contato com os CT se justifica porque, segundo Kátia Frizzo (2011) é um órgão ou instituição essencialmente comunitário. Esse envolvimento, segundo a autora, se dá antes mesmo que o conselheiro atue no cargo, tendo em vista, que para o processo de eleição ele vai à comunidade para conquistar seus eleitores, que podem ser, ainda, instituições e órgãos públicos.

Dentre suas atribuições, os Conselhos Tutelares apresentam semestralmente um relatório estatístico dos atendimentos e procedimentos realizados para o CMDCA. Estes relatórios trazem informações de violações pelo agente violador, separados pelas seguintes categorias: família, criança e adolescente em razão de sua própria conduta, poder público/educação, poder público/ saúde, poder público/ assistência social, poder público/ segurança pública e sociedade. Além disso, são contabilizados os encaminhamentos por instituição, os tipos de requisições de serviço público, os tipos de procedimentos, casos de aplicação de medida excepcional de acolhimento institucional, casos ocorridos pela primeira vez e ainda os bairros que foram atendidos. Pesquisando estes relatórios na sede dos três conselhos, identificaram-se os seguintes dados sobre a demanda por Educação Infantil no município, entre os anos de 2012 e 2014:

Tabela 08: Número de atendimentos relacionado ao acesso a creches e pré-escolas

Conselho 2012 2013 2014

Creche Pré-escola Creche Pré-escola Creche Pré-escola

Centro/ Norte 45 03 32 02 x X

Sul/ Oeste 115 01 103 0 40 02

Leste 140 22 248 03 x x

Fonte: relatório de atendimentos dos Conselhos Tutelares – 2011 a 2014

Como é possível observar, os dados de demanda por acesso à creche são sempre superiores ao da demanda por vagas na etapa pré-escolar e, de acordo com os relatos dos conselheiros entrevistados, são sempre garantidas as vagas para 4 e 5 anos que chegam até eles. Diferentemente é o que acontece com a demanda por creche. Há, conforme já destacado, um desencorajamento por parte dos conselheiros de dar encaminhamento a demanda que chegam até eles, tendo em vista o que todos mencionaram – que não adiantaria judicializar, porque já foi deixado claro que não serão deferidos os pedidos.

De um modo geral, os conselheiros apresentam uma postura crítica frente a esta demanda reprimida de creches. A postura é crítica, sobretudo quanto aos critérios de atendimento que são adotados no município. Hoje, uma família que deseja matricular sua criança em creche, de acordo com a Resolução 001/13 do Conselho Municipal de Educação, passará pelas seguintes etapas: (i) fará o cadastro no Cadastro Único para Programas Sociais (CadÚnico) nos CRAS, indicando que local gostaria de obter a vaga; (ii) a Secretaria de Desenvolvimento Social, via CRAS, fará uma lista de classificação dessas crianças, conforme os critérios de vulnerabilidade social estabelecidos pela Norma Operacional Básica (NOB/SUAS) e encaminhará para o Departamento de Educação Infantil da SE/JF; (iii) o DEI organizará o atendimento, conforme esta lista e dará a autorização de matrícula para a família através de ofício, que contém os nomes das crianças que poderão ser matriculadas, transferidas ou desligadas. Cumpre dizer que, ainda conforme a Resolução, a partir de seu vigor, as escolas conveniadas também tiveram que obedecer a esta regulação para a realização da matrícula. Antes, cada instituição conveniada obtinha sua própria lista, abrindo espaço, inclusive, para favorecimentos via atores públicos que solicitavam a matrícula de alguma criança, desrespeitando a fila de espera.

De um modo geral, os conselheiros entrevistados relataram muitos casos de famílias que questionam estes critérios, sobretudo quando é um caso no qual a mãe precisa trabalhar e identifica uma criança, filha de uma mãe que não trabalha, tendo sua vaga garantida. Maria de Lourdes destaca que, como o município não consegue atender toda a demanda reprimida, a creche virou uma medida de proteção para a criança em extrema situação de vulnerabilidade. Em suas palavras,

creche pública ela não é mais um direito universal, ela já está priorizada como medida de proteção. É para crianças em situação de extrema vulnerabilidade, situação de risco [...] Mas a creche é para essa criança de mãe drogada. Não para resolver o problema da mãe, é para resolver o problema da criança (CT – Maria de Lourdes, 2014).

Ela ainda pondera de que a demanda que hoje se apresenta por meio dos relatórios ou mesmo apresentado pelo governo, pode não ser uma demanda real. Na entrevista ela menciona que muitas vezes o CRAS desencoraja a família a se cadastrar no pedido de creches, indicando outro programa para inscrição. “[...] eles desestimulam as pessoas oferecendo outro programa. „Você não vai conseguir a creche, mas a gente vai te encaixar no Vale Gás‟. „Você não vai conseguir a creche, mas a gente vai te encaixar no Bolsa Família‟ (CT – Maria de Lourdes, 2014).

No que toca a declaração da conselheira tutelar, vale uma reflexão sobre anos de lutas em torno da política de Educação Infantil, que tem buscado substituir uma concepção de espaço assistencialista, para tornar-se um espaço educativo, que seja capaz de desenvolver a criança em sua totalidade. Da maneira como foi posto, é possível afirmar que a Educação Infantil no munícipio tem se prestado a combater a pobreza e proteger as crianças de situações de risco, enquanto o esperado é a garantia de um direito educacional estabelecido constitucionalmente (CAMPOS, 2008). Estaria Juiz de Fora, a partir dos critérios definidos de atendimento, colaborando para um retrocesso da Educação Infantil a um lugar de assistência?

Passando à Secretaria de Educação, todos os entrevistados confirmaram a creche como a etapa que possui a maior demanda. De acordo com a ex-chefe do DEI/SE, Renata Rainho, a grande demanda por creches se justificaria por alguns fatores, como: atendimento prioritário do Ensino Fundamental pelo município, o histórico assistencialista das creches, a transferência das creches para a Secretaria de Educação apenas em 2009, o município ter passado oito anos sem

investir em construção de creches, o aumento da natalidade e as mudanças de governo (DEI – Renata, 2014).

No que compete o atendimento prioritário ao Ensino Fundamental, tendo em vista a busca pela sua universalização e a vinculação orçamentária do Fundef, foi sem dúvida o argumento mais encontrado para justificar o pouco investimento na Educação Infantil. Juiz de Fora, por exemplo, utilizava – e continua utilizando -, todo o recurso do Fundef para a folha de pagamento de seus professores (OLIVEIRA, 2011). Deste modo, a Educação Infantil passou anos sem que houvesse investimentos de construção de novas unidades ou, mesmo de ampliação de recursos para a área.

Sobre a demanda específica para a pré-escola, tanto da SEPEI, quanto a ex-chefe de DEI não souberam precisar o quantitativo no momento da entrevista, pois segundo informaram, além de pequena, oscilava bastante, já que o município obtinha a vaga, era apenas questão de ajustar a escolha do pai à escola, em função de localidade. A informação de que a etapa está universalizada e que demanda apenas ajuste de localização de matrícula também foi confirmada pela ex e pelo atual Secretário de Educação.

No que compete, contudo, a demanda por vagas em creches, observa-se que a demanda ainda é bastante alta, em outubro de 2014 a rede apresentava o seguinte quadro de atendimento:

Tabela 09 – Atendimento e demanda por creches no município em 2014

Nº de vagas em creches públicas Nº de vagas em creches conveniadas Nº total de vagas em creches Nº da demanda reprimida 2.558 1.251 3.809 1.335

Fonte: Supervisão de creches Públicas – SE/JF

Como se observa, a demanda reprimida em creches é um desafio grande ao município, sobretudo quando se tem em vista o alcance de metas de uma política nacional, como o Plano Nacional de Educação. A perspectiva frente a este desafio não é tão otimista quando se fala desta etapa da Educação Infantil. Enquanto todos afirmam, invariavelmente, que a pré-escola está universalizada, (podendo ocorrer algum problema apenas se as escolas da rede privada optarem por migrar para a pública), quanto ao alcance da meta para creches, que é alcançar 50% do

atendimento até 2020, as opiniões divergem um pouco, mas todas ressaltando o desafio que está posto.

Renata Rainho destaca que:

[...] só de ter planejamento, interesse público e financiamento federal, acho que Juiz de Fora vai alcançar antes de 2020 50% no atendimento [creche], porque a previsão do PNE é essa. Se nós estamos em 2014 com 1.300 crianças na fila de espera e deve ter 12(doze) Proinfâncias em Juiz de Fora até 2016, [...] se a natalidade não crescer demais, então estará tudo dentro do planejamento. É claro que a família não quer entender isso, a família quer a vaga imediata (DEI – Renata, 2014)

A demanda reprimida apresentada é antiga na rede. Desde a pesquisa de mestrado, quando foram analisadas notícias nos jornais desde o ano de 1996, já se encontravam menções a respeito do problema e, sobremaneira vinculado ao primeiro momento da Educação Infantil – as creches. Contudo, embora a demanda continue a existir, ela passou a se modificar, em princípio, pela localização da cidade. Conforme será observado no próximo tópico a seguir, o impacto do Programa Minha Casa, Minha Vida, traz novos contorno à demanda reprimida no município.

4.5.2 O Impacto do Programa Minha Casa Minha Vida na demanda por acesso à Educação

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