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Capítulo II – O recrudescimento do movimento e as ligações internacionais

7. Departamento de Estado “repreende” independentistas

No final do mês agosto é do interesse da administração norte-americana difundir a posição de não envolvimento nas questões independentistas açorianas como forma de garantir estabilidade à política no continente. Ora é justamente a instabilidade

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GOMES, op. cit, p. 245. Carlucci sabia que que havia políticos, “em particular Jessie Helms, que lutavam pela independência dos Açores junto do Departamento de Estado” bem como “nos setores militares e nos serviços secretos que apoiavam uma solução emancipadora para o arquipélago.” P 244 138 Cit em GOMES, ob. cit., p. 260.

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69 vivida a nível nacional que preocupa os mais conservadores. É também nessa altura que o Departamento contacta os separatistas

A 26 de agosto Carlucci havia relatado ao Departamento de Estado as dúvidas levantadas por um membro da FLA, Vasco Lima, quanto à posição dos Estados Unidos sobre a independência dos Açores. Na conversa que manteve com o embaixador em Lisboa, Vasco Lima havia explicitado a existência de três grupos fora dos Açores que coordenavam a ajuda externa ao movimento de independência: "um nas ilhas Canárias, outro nos Estados Unidos e outro em Lisboa em cujo nível superior estava Mota Amaral.” 140

Para o grupo de Lisboa fazia sentido a teoria de que era necessário dar algum espaço a Melo Antunes, mas havia movimentações que o poderiam impedir

“José de Almeida, que era a cabeça do grupo nos Estados Unidos, tinha enviado a mensagem de que o governo americano suportaria uma declaração imediata de independência. Lima desconhecia quem teria dado essa garantia a José de Almeida. (…) Esta mensagem estava a causar uma tremenda confusão na FLA, que se encontrava dividida. O grupo de Lisboa era favorável à nossa política de dar uma oportunidade a Melo Antunes. Alguns deles até já me pediram para cancelar o visto de permanência nos EUA de José de Almeida, já que ele estava a causar problemas desnecessários.”

O embaixador sugere que o Departamento de Estado “contacte urgentemente José de Almeida para o fazer entender de forma inequívoca qual é a política norte americana em relação à questão açoriana.”

Perante os rumores de que os Estados Unidos apoiariam imediatamente uma declaração de independência, a reação do Departamento de Estado não se fez esperar. O

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70 membro do Comité Açoriano Carlos Matos (José de Almeida encontrava-se no Canadá), foi chamado ao Departamento de Estado para lhe ser reiterada a informação recebida superiormente e transmitidos os seguintes pontos:

“Qualquer movimento agora poderia ser usado pelos comunistas para reforçar uma posição já de si frágil.

- Amigos em Lisboa entendem que qualquer mudança agora poderia ser desastrosa para os esforços de melhorar a situação no país.

- A posição do governo americano sobre a questão da independência dos Açores continua a ser de estrita neutralidade, ou seja de não envolvimento.” 141

Carlos Matos comprometeu-se em passar a informação a José de Almeida.

Pela mesma altura, também em Ponta Delgada, a administração norte- americana persuadia os separatistas a conterem a ação revolucionária. A cônsul Pfeifle encontrou-se em privado com Luís Franco, um dos dirigentes da FLA de Ponta Delgada, para lhe transmitir o interesse dos Estados Unidos em agir de modo a permitir que a situação em Lisboa pudesse evoluir no sentido da consolidação do poder por parte dos moderados e para transmitir também que eram falsas as declarações de que os Estados Unidos apoiariam uma declaração de independência. Perante este cenário, Franco respondeu

“Considerando a posição do governo americano, seria difícil para a FLA atuar de momento e isso deixa-o triste porque acreditava que Portugal não mandaria tropas se os Açores declarassem a independência. A FLA pode aceitar que o Melo Antunes ganhe poder, apesar de ele ser um comoderado, desde que os EUA e a Europa Ocidental o apoiem. Se for esse o caso, Franco pessoalmente

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iria discutir a situação dos Açores com Melo Antunes, de quem foi amigo de infância, e insinuou que poderiam negociar a independência.” 142

O dirigente da FLA manifestou também a sua preocupação com a instabilidade vivida em Lisboa que poderia conduzir à substituição de governo. A preocupação era tanto em relação a uma viragem à direita como à esquerda. Na opinião do dirigente separatista, se esse novo governo fosse de feição ao “braço direito de Spínola”, seria desastroso para os Açores, nas palavras de Franco:

“Seriam submetidos a uma exploração fascista e possivelmente punidos pelas ligações ao movimento independentista (…) no futuro, se a esquerda vencesse no continente, Costa Gomes poderia também vir para os Açores e formar um governo português a partir das ilhas. A posição do general Magalhães, anti- comunista e anti-separatista, facilitaria o cenário.”

A cônsul aproveitou a conversa com Luís Franco para que este lhe fizesse um ponto de situação da atividade da Frente de Libertação dos Açores. Foi-lhe transmitido que a liderança da FLA era composta por cinco membros de grupos espalhados pela Horta, Angra, Ponta Delgada, continente e um fora de Portugal. Em termos de ligações internacionais, “recentemente os líderes da FLA estiveram reunidos em Paris143

, reunião em que Franco também participou.”

No final da conversa, perante a expetativa de Luís Franco em relação a um apoio futuro por parte dos EUA, a cônsul reiterou a política de “objetiva neutralidade” dos Estados Unidos.

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“Ponta Delgada, 311, august, 28, 1975”, www.archives.gov/aad/series-description.jsp.

143 A 4 de setembro a cônsul informa o Departamento de Estado que tem ouvido com insistência histórias que relatam apoio francês ao movimento independentista. Simpatizantes da FLA sustentam a existência de apoios de vários países, entre eles Israel e países árabes. Para a cônsul o mais credível será o apoio francês.

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