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―As escolas são instituições responsáveis por acolher … não apenas mais uns elementos da fila de cidadãos utentes, mas as pessoas que há nos alunos‖

Azevedo 2009, p.39

Se atentarmos em Carneiro (2001, p.52) para quem o conceito de educação ―é tipicamente um bem comum‖, facilmente verificamos que a ação educativa é responsabilidade da comunidade e das políticas implementadas e, consequentemente, encontra-se veiculada à esfera da responsabilidade pública o que, inevitavelmente, implica a instituição escolar. Na verdade, é na escola, se tivermos em linha de conta o seu campo de ação e a autonomia que lhe está consignada no que concerne à política de

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escola e à definição de estratégias que permitam responder aos problemas e necessidades identificadas (Decreto-Lei n.º 115-A/98 de 4 de Maio), que se encontram as maiores possibilidades de se minorar as desvantagens sociais, culturais e económicas de que muitos alunos são portadores e a partir das quais pode resultar o insucesso escolar.

Ao partirmos da premissa que a escola é um ―meio privilegiado de produção de competências e qualificações‖ (Rodrigues: 2009, p.11), percebemos que será, então, através da instituição escolar que se podem desenvolver estratégias fundamentais de promoção da igualdade de oportunidades e da extinção de dinâmicas continuadas (re)produtoras de várias formas de exclusão social.

Também Mendonça (2008, p.2) constata que, atualmente, a escola constitui um bem acessível a qualquer cidadão mas tal não significa que exista uma tendência para a igualização social. Interroga-se ainda quanto aos tempos em que vivemos, pois tratando- se de uma época em que se ―suprimiram discriminações legais e se atenuaram obstáculos económicos, como explicar a falência das sucessivas Reformas Educativas na promoção do sucesso escolar de todos os alunos?‖

Esta perspetiva é corroborada por Azevedo (1999, p.8) ao defender que, efetivamente, a escolarização é vista como um bem social, um benefício sobre o qual os indivíduos alimentam fortes espectativas mas que, pelo menos para uma parte da população, não é mais que ―uma armadilha social da exclusão. Como se uma parte dos convidados para o banquete fosse dele expulsa, sem mais, ao fim da sopa.‖

Desde há muitas décadas que investigadores se debruçam sobre a escolarização e são vários os estudos inaugurais de referência sobre esta temática que apontam para uma associação entre o desempenho escolar, a família e pertença social (Coleman, 1966; Bourdier, 1964; Plowdem, 1967). Estes estudos concluíram existir uma grande divergência dos resultados dos alunos com base na classe social a que pertencem. Na verdade, os resultados escolares dos filhos das classes populares, ainda que sujeitos às mesmas condições de ensino, eram penalizadores relativamente às classes mais abastadas económica e culturalmente (in Pinto, 1995, Giddens, 2007). Um dos fatores explicativos para estas desigualdades entre os jovens seria justamente o contexto familiar de pertença ―em que a família levaria à reprodução os privilégios ou handicaps herdados, contrariando o projecto da escola libertadora e promotora de igualdade de oportunidades‖ (Almeida, 2006, p.113).

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Atualmente reconhecemos que o capital cultural legado pela família desempenha, sem dúvida, um papel fulcral na orientação escolar e, principalmente, no prosseguimento de estudos. O meio social e a família constituem, assim, uma referência social determinante para a orientação e conceção de projetos de futuro. Na verdade, a família é ―uma referência social determinante, um contexto onde, de forma mais intensa e contínua, se partilham recursos e experiências, se formam disposições e projectos, se desenvolvem práticas quotidianas e estratégias de vida‖ (Costa, 2003, p.100).

A OCDE no seu relatório Education Today 2010 – The OECD Perspective (2010, p.72) corrobora esta opinião destacando o nosso país: …students with fathers

who had completed higher education were more than twice as likely to be in higher education in Austria, France, Germany, Portugal and the United Kingdom e prossegue,

reforçando a ideia de que o social background strongly influences teenage expectations

to go on to complete higher education…..

A instituição escolar desempenha, do mesmo modo, um papel crucial na integração e sucesso educativo do jovem. Com a massificação da escola assistimos ao proliferar de uma enorme diversidade populacional e a escola passou a ter de lidar com diferentes alunos, diferentes personalidades. Importa, agora, analisar que tipo de escolarização de massas temos implementado e se essa escolarização se tem desenvolvido no sentido de proporcionar uma igualdade de oportunidades ou se, pelo contrário, se tem condicionado o indivíduo na sua progressão com sucesso nos diferentes patamares do sistema, em função da sua origem social (Sebastião & Correia, s.d., p.2). Os autores equacionam, então, o entendimento que se deve do conceito de democratização do ensino, enquanto expressão da aplicação do direito à educação. E acrescentam: ―Como avaliá-la num período tão particular como o da escolaridade obrigatória?‖.

Canavarro (2007, p.31) considera que, por um lado, a massificação escolar tem contribuído para a ―alteração de modelos e métodos pedagógicos mais dinâmicos, mais adaptados a novas realidades, mas sempre orientados para objectivos‖. Por outro lado convém lembrar que ―… muitos dos que correm esta maratona sem as melhores sapatilhas, sem o equipamento ideal, cumprem-na com sucesso e «crescem» com esse sucesso. Mas só a fazem se alguém ou alguma instituição compreender que tem ali um corredor capaz e com vontade‖ (p.6).

Aduziríamos a esta linha de pensamento as opiniões de Venâncio e Otero (2003, p.7), que constatam que ―a década de 60 do século passado caracterizou-se pela ênfase

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nos princípios de igualdade no acesso à educação‖ pelo que se verificou a tal expansão dos sistemas educativos, atrás referida, e a firme convicção de que ―a mais educação corresponde mais riqueza‖. Nas duas décadas seguintes dá-se primazia aos atores educativos e à ―relação educativa‖. A escola passa a ser o palco da formação integral e começa a valorizar-se, a par com os currículos formais académicos, o desenvolvimento sócio-afectivo dos alunos. Grácio (1986, pp.117-127) sugere o surgimento da teoria do desencanto ao esclarecer que a ―procura optimista‖ do início da década de 50 a meados da de 70 e que se traduziu num crescimento efetivo das oportunidades sociais devido às mudanças na estrutura social e económica, deu lugar a uma ―procura desencantada‖ no seio da evolução do processo de escolarização.

Canavarro (2007, p.31) considera que a Escola, para além da função tradicional que se prende com a integração social, cumpre, ainda, ―uma função de utilidade social, de investimento familiar‖ e quando esta não se afirma, apenas se contribuirá para a descriminação do próprio indivíduo. Azevedo (2009, p.43) vai mais longe e defende que ―se a nossa preocupação fosse cada escola concreta e não o sistema educativo (…), há muito que a educação escolar tinha mais qualidade e os alunos, pais e professores se sentiriam muito mais animados no seu labor quotidiano‖, até porque o ―funcionamento do sistema educativo português está bloqueado e moribundo quanto à sua capacidade de prosseguir vias inequívocas de melhoria‖ (p.38).

Para Nóvoa (2005, p.15), a ―escola de hoje é infinitamente melhor que a de ontem. É mais aberta, mais inteligente, mais sensível à diferença. Mas não chega‖. O mesmo autor sustenta que o grande dilema que a escola enfrenta é então o fato de se encontrar prisioneira da própria modernidade. Assim, todas as medidas e estratégias adotadas, ―A diferenciação pedagógica, o interesse e a motivação, os métodos activos ou os modelos de aprendizagem centrados no aluno‖ surgiram para melhorarem o ato educativo de todas as crianças e não para ―servir de pretexto (e de desculpa) à nossa incapacidade para as instruirmos‖.

As orientações políticas no quadro da União Europeia têm, efetivamente, procurado visar o acréscimo do nível educacional de crianças e jovens de diversas origens sociais e reduzir as diferenças que separam os que provém de famílias mais desprovidas de um capital económico digno dos seus pares, oriundos de meios sociais mais favorecidos. No entanto, e apesar de ser perfeitamente observável a concretização progressiva do acesso generalizado da população à escola e à escolarização, a verdade é que persistem os fenómenos do insucesso e do abandono escolares sendo que os seus

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protagonistas são as crianças e jovens originários de meios sociais desfavorecidos (Rodrigues, 2009, p.12).

Aduzindo a estes contextos, não podemos ignorar, como defende Formosinho (2009), que a massificação da escola trouxe consigo transformações irreversíveis que acabaram por pôr a descoberto a inadequação das estruturas organizacionais para responder aos novos desafios que nelas se manifestaram.

Estes fatores acabaram por colmatar invariavelmente no aumento do insucesso escolar e este é, efetivamente, uma das maiores batalhas que a educação em Portugal tem vindo a travar nas últimas décadas. Tem-se, desde então, procurado novas alternativas, novos percursos capazes de assegurar ―a norma geral à especificidade de cada lugar e de cada indivíduo ou grupo de indivíduos‖ (Venâncio e Otero, 2003, p.8). Passou a ser uma necessidade a promoção e adoção de estratégias capazes de valorizar o indivíduo, desenvolvendo competências e preparando-o para a vida. Procurou-se a criação de mecanismos que permitissem ultrapassar esses desafios, não perdendo de vista os objetivos e finalidades que entretanto se sobrepuseram no nosso sistema educativo.

Não obstante, é preciso fazer mais e melhor. Azevedo (2009, p.17) defende o ―paradigma da melhoria gradual‖ e descreve a necessidade de Portugal dinamizar e desenvolver um novo quadro político que comporte uma autonomia real das escolas, desenvolvida num quadro de rigorosa avaliação interna e externa e de definição de responsabilidades; uma gestão profissional das escolas, feita por professores devidamente selecionados; uma administração educacional completamente reestruturada, construída sobre o modelo de Agências Nacionais; a revalorização das melhores práticas de educação e ensino, de gestão e de desempenho profissional, de

empowerment dos atores; a construção social gradual e anual de planos de melhoria e de

um sistema simples e eficaz de avaliação interna e externa; uma verdadeira responsabilização das escolas e que, simultaneamente, lhes confira um sentimento de liberdade e de confiança. O autor reforça, ainda, a necessidade de um esforço de renovação ética, inserido num novo quadro de cooperação social local pelo que se impõe um novo ciclo de mudanças de política. É preciso que se invista na reconstrução da capacidade política de analisar e intervir em educação e essa intervenção pode passar justamente pelo debate público, pelo espaço público, os ―interesses e conflitos em presença, o papel do Estado, o papel do centro e o papel das periferias, a cooperação interinstitucional, a qualidade e níveis claros de desempenho, a avaliação e a

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responsabilização, a participação e a cooperação entre os actores sociais em cada território‖ (p.38).

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