• Nenhum resultado encontrado

CAPITULO I: CONTEXTUALIZAÇÃO DO DEBATE NA LITERATURA

1.1. NOTA INTRODUTÓRIA

1.2.3.2. Desafios para o desenvolvimento sustentável

O primeiro desafio é a dificuldade decorrente da mudança paradigmática. As mudanças socioeconômicas, ambientais e políticas registradas na atualidade provocam uma revisão dos conceitos e uma busca por um novo paradigma26. Nesse contexto, Santos (2000), faz uma crítica à ciência moderna e ao paradigma científico atual do pensamento hegemônico ocidental. Ele propõe uma mudança paradigmática que traduza os conhecimentos do senso comum. Mas como construir esse novo paradigma? Sachs (2004) fornece algumas pistas, dizendo que, antes de tudo, é necessário pensar globalmente e atuar localmente, ou seja, visualizar os problemas de natureza global e avaliar os impactos sobre os processos locais. Além disso, para se construir esse novo paradigma é necessário modificar atitudes, valores e objetivos, visando

25 Os principais eventos relacionados com o Desenvolvimento Sustentável se embasam em: 1) Documentos (Relatório do Clube de Roma: Limites do Crescimento (1972), Relatório de Brundtland: Nosso Futuro Comum (Noruega, 1987), Agenda 21 (1992); Carta da Terra (1992), Convenção sobre Diversidade Biológica (1992), Convenção sobre Mudanças Climáticas (1992), Declaração de Estocolmo (1972), Declaração de Princípios sobre o Uso das Florestas (1992), Declaração do Milênio, Declaração do Rio (1992). 2) Conferências (Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano - CNUMAH (Estocolmo, 1972), Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e o Desenvolvimento - CNUMAD (Rio de Janeiro, 1992), Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável (Joanesburgo, 2002) e 3) Documentos Oficiais (Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável - Conferência de Joanesburgo, Declaração de Joanesburgo e Plano de Implementação de Joanesburgo) (ESTADO DE SÃO PAULO, 2006).

26

Para Kuhn, paradigma é uma realização científica universalmente reconhecida; um mito; uma filosofia, ou constelação de perguntas, um manual, ou obra clássica. O paradigma é constituído de tradição e, em certo sentido, um modelo; uma realização científica; um princípio organizador capaz de governar a própria percepção; um ponto de vista epistemológico geral; um modo de ver a realidade; e como algo que define ampla extensão de realidade. usa o termo 'paradigma' para se referir a estruturas e/ou compreensões do mundo de várias comunidades científicas. Para Kuhn, um paradigma científico inclui modelos como o modelo planetário dos átomos, e teorias conceitos, pressupostos e valores. Para Kuhn, uma noção como a do paradigma científico foi essencial para compor seu argumento alusivo a um aspecto particular da história da ciência, a saber, quando uma estrutura conceitual cede lugar a outra, durante o que ele chamou de revolução científica (KUHN, 1991).

contribuir conscientemente para uma geração de um novo estilo de desenvolvimento.

Bursztyn (2001) sintetizou as questões básicas do desenvolvimento sustentável em uma explanação de postulados com referência introdutória utilizados pelos países desenvolvidos e da análise crítica de questões atuais. Com isso, ele refletiu sobre as responsabilidades e condicionantes das políticas públicas para o desenvolvimento sustentável, propondo encaminhamentos que precisam ser considerados na definição de desenvolvimento (Quadro 1).

POSTULADOS REFERENCIAIS EIXOS NORTEADORES DE REFLEXÃO PROPOSIÇÕES

Desenvolvimento – nenhum país se desenvolve sem um projeto nacional.

Crise do paradigma estatal – toda nova função pública implica crescimento das estruturas estatais (seja no caso do Estado que faz ou do que vai fazer).

Estado – é preciso fazer mais com menos (fazer menos e fazer mais).

Educação – nenhum projeto nacional de desenvolvimento cumpre seu papel se uma marcante componente educacional.

Educação – por ser portadora de mudanças de atitude, é base para a sustentabilidade, mas tem sido voltada a uma modernidade técnica.

Mudança de atitude – é preciso ambientalizar a educação.

Estado – nenhum país empreende um projeto nacional sem uma marcante presença do Estado.

Globalização – pode ser um aspecto positivo, na medida em que expõe o mundo à consciência de que somos um só sistema (ambiente, global); mas é negativa por criar barreiras invisíveis que hoje tornam “desnecessárias” nações inteiras.

Globalização sem exclusão – é preciso não ser apenas vitima da globalização.

Natureza – nenhum projeto nacional se materializa sem a apropriação de uma base de recursos naturais (agricultura, extração, pilhagem colonial, indústria de transformação).

Neoliberalismo – conspira contra a solidariedade, a sustentabilidade e o papel do Estado, na promoção de um projeto nacional (coloca o crescimento acima da equidade, a eficiência e a competitividade acima da qualidade de vida e do ambiente).

Participação – é preciso fortalecer os canais que permitam o envolvimento da sociedade nas decisões públicas. Sustentabilidade – nenhum país da modernidade sacrificou seu desenvolvimento econômico original em função da consciência da finitude dos recursos naturais.

A sustentabilidade pressupõe solidariedade – hoje, é preciso solidariedade com as futuras gerações; mas ainda não aprendemos a ser solidário com o “outro” no presente.

Ambientalização das decisões econômicas – em geral, o mercado não conduz à sustentabilidade. É necessária a intervenção reguladora do Estado. Quadro 1: Os desafios das políticas públicas para o desenvolvimento sustentável segundo Bursztyn.

Fonte: Autora.

Os enunciados, mostrados no Quadro 1, perpassam basicamente pelas questões de desenvolvimento econômico com a intervenção reguladora do Estado, visando a equidade entre as gerações atuais e futuras, nos âmbitos nacional e internacional. Os desafios para o desenvolvimento sustentável estão ligados ao papel a ser desempenhado pelo Estado e pelas políticas públicas

necessárias. A elaboração e execução de um projeto de construção para o futuro de uma nação devem considerar uma visão de longo prazo e a versatilidade de empreender reformas. Para tanto, o grande desafio do Estado é fazer mais, com menos; cumprir a função regulamentadora, com menor ação direta. O Estado deve atuar por intermédio de meios econômicos e normativos legais (BURSZTYN, 2001).

As cinco proposições elaboradas por Bursztyn (2001) para alcançar o desenvolvimento sustentável são: 1) o novo estado neoliberal deve conciliar pelo menos os princípios complementares da subsidiariedade (descentralizar), coordenação (caráter indelegável do poder público) e flexibilidade (não estabelecer leis gerais para qualquer contexto); 2) a participação da sociedade nas decisões públicas. Apesar da partilha das decisões públicas, é preciso que todos os atores envolvidos estejam bem representados, pois os mecanismos da democracia participativa não podem substituir a democracia representativa; 3) a globalização deve estender democraticamente os seus benefícios a todos, sem exclusão social, contrapondo-se à globalização neoliberal excluidora; 4) mudança de atitude se faz necessária, é preciso ambientalizar a educação. A educação ambiental deve ultrapassar os problemas complexos entre a fragmentação e sintetização do conhecimento e a indisciplinaridade da natureza; 5) o Estado deve atuar por meios econômicos e normativos, para o bem-estar e a perenidade da vida, pois o mercado, por si só, não conduz à sustentabilidade, sendo necessária a intervenção do Estado.

Em relação ao desafio para o desenvolvimento sustentável, Buarque (2007) afirma que o maior dilema é a modificação do pensamento antropocentrista e segregacionista da sociedade humana moderna. Buarque concorda com Bursztyn (2001) quando diz que, para emergir uma consciência nova, é preciso uma revolução na educação. Para tanto, afirma que é preciso criar uma lei de responsabilidade educacional lastreada em um padrão básico de conteúdo, com as disciplinas existentes, acrescido do sentimento de sustentabilidade, além de aumentar o orçamento para a educação, visando elevar os padrões das infra-estruturas, a qualidade e a remuneração dos recursos humanos. O maior desafio da idéia e prática do desenvolvimento sustentável é a ascensão coletiva do saber e da consciência.

O grande desafio brasileiro para o desenvolvimento sustentável é mudar o padrão de ocupação do território e das condições de acesso produtivo à terra e

aos recursos naturais, criando mecanismos para o desenvolvimento de certos setores e a inclusão de grandes parcelas da população no mercado interno (MELO, 2001).

Nesse contexto considera-se que o país substituiu o modelo desenvolvimentista pelo modelo ambientalista ainda em fase de consolidação e que precisa de ajustes. A mudança de tendências e modelos na Amazônia está vinculada as condicionantes de: 1) superar os conflitos ideológicos entre desenvolvimento e conservação; 2) superar a dicotomia entre a inclusão social e competitividade, pois a questão institucional é a base de qualquer processo de desenvolvimento e 3) definir melhor a questão fundiária, que é um dos problemas institucionais, pois somente 20% das áreas são destinadas para a produção (BECKER, 2001).

Consoante às idéias dos autores apresentados, percebe-se que existem dois conceitos de desenvolvimento, o bom e o mau, e ambos participam da realidade de maneira simultânea. A sociedade global precisa de um conceito de desenvolvimento, por um lado como instrumento para avaliar o passado, e, por outro, como um marco conceitual para a construção de um novo paradigma. Somente um feixe de políticas públicas simultâneas que possibilitem uma equidade social por meio do acesso de todos à terra, ao conhecimento, às tecnologias, ao mercado e ao crédito é que poderá embasar um desenvolvimento sustentável (SACHS, 2000).

As preocupações colocadas pelos autores são todas pertinentes, mas o maior desafio para o desenvolvimento sustentável ainda é a elaboração e cumprimento de um projeto de longo prazo, que abranja a equidade social inter e intra-geracional e que dê direito de participação a todos. A sociedade global demanda a adoção idéias normativas que permitam visualizar os problemas, os desafios e discuti-los publicamente, buscando “empoderar”27 as comunidades. Para acontecer o desenvolvimento sustentável “[...] as estratégias devem dar respostas aos problemas mais pungentes de cada comunidade, superar os

27

O “empoderamento” refere-se a uma construção diferente nas relações de poder, ou seja, procura potencializar pessoas ou grupos que têm menos poder na nossa sociedade; é um poder que vem de baixo, que reconhece os oprimidos como sujeitos da história. É um conceito importante para entender e dimensionar o fortalecimento de capacidades dos atores — individuais, coletivos — em níveis local e global, público e privado, para a sua afirmação como sujeitos e para a tomada de decisões. É o mecanismo pelo qual as pessoas, as organizações, as comunidades tomam controle de seus próprios assuntos, de sua própria vida, de seu destino, tomam consciência da sua habilidade e competência para produzir e criar e gerir. O “empoderamento” político necessita de um processo prévio de “empoderamento” social, através do qual se torne possível a participação efetiva na política (FRIEDMANN, 1996). A idéia do empoderamento é a base do conceito de capital social. Este pressupõe a capacidade dos atores de agenciar processos de autonomia individual e coletiva e de estabelecer articulações de natureza política (MARTINO, 2000).

gargalos, [...] para tanto se deve garantir a participação de todos os atores envolvidos no processo de desenvolvimento” (SACHS, 2004, p. 61).

Além do direito do cidadão ter garantindo seus direitos legais de participar nos processos de desenvolvimento, ele tem também o direito de expressar a sua idéia e de discuti-la durante o processo de participação social. Todavia afirma-se que esse processo é correto quando todas as pessoas envolvidas em um processo participativo tenham acesso a informação e capacitação sobre o assunto tratado e elas têm o mesmo nível de conhecimento sobre o assunto discutido.

A inconsciência de alguns atores sociais sobre os assuntos tratados durante eventos de participação social e as modificações constantes dos objetivos por parte do governo nacional contribuem para a descontinuidade dos projetos nos dias atuais.

1.2.3.3. Participação, articulação de atores sociais no desenvolvimento