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DEMOCRACIA E VIOLÊNCIA EM SÃO PAULO

MESES O ESTADO DE S PAULO FOLHA DE S PAULO

F. Novos rumos para a Polícia Militar

9. as medidas adotadas pela (e para a) polícia: demissão de policiais, compra de equipamentos, operações especiais de policiamento e substituição de comandantes; com nove matérias analíticas.

2.1. A desativação do Dops paulista

Iniciando as discussões resultantes do esquadrinhamento das mat érias relacionadas à questão da Segurança P ública e, particularmente, à violência policial publicadas pela Folha de S. Paulo e pelo O

Estado de S. Paulo entre janeiro de 1983 e março de 1985, procederemos, nos próximos tópicos,

ao acompanhamento das discussões veiculadas em 1983, envolvendo diretamente os governos estadual e federal: ( 2.1. ) a desativação do Dops paulista e ( 2.2. ) a reação do governo paulista ao decreto - lei que submeteu a a ção da Polícia Militar ao Exército.

2.1. A desativação do Dops paulista

A ameaça e posterior efetivação do rompimento do convênio entre a Polícia Federal e os Dops de São Paulo e do Rio de Janeiro[62], que garantia aos governos estaduais a vigilância sobre a aplicação da Lei de Segurança Nacional nos Estados, colocou em discussão não apenas a pertinência dessa famigerada lei herdada da Ditadura, frente ao iminente fim do regime militar, como também as possíveis relações entre um governo democrático, como era o governo Montoro, e a necessidade de uma “polícia política.” Questionava-se, portanto, o pr óprio conceito de “segurança nacional” e, indiretamente, também a concepção de cidadania adotada por esse governo.

Recusando-se, mais uma vez, a reconhecer o caráter político desta discussão, o Estadão dirigiu insistentes críticas à atitude do governo estadual sobre a questão, baseando-se em argumentos técnicos. As primeiras críticas dirigiram-se ao an úncio de uma suposta intenção de romper o convênio e desativar o Dops, por parte de um dos membros da futura equipe montorista (José Carlos Dias)[63], considerado como o “pretexto ideal” para que o Ministério da Justiça agisse contra a autonomia paulista.[64]

Já as matérias publicadas pela Folha, embora concordassem com as críticas iniciais do Estadão, conferiram maior densidade às discussões, à medida que enfocaram não apenas seu conteúdo político, mas também as diferentes concepções que sustentavam o embate.

Em matéria intitulada “Desativa ção do Dops vai depender dos governadores”, a Folha informou sobre as atribuições do Dops at é o rompimento do conv ênio:

“A constituição federal, reforçada pela LSN, atribui à Polícia Federal a competência de instruir os inquéritos sobre crimes de transgressão à segurança nacional.

A necessidade de expandir sua ação pelos diversos Estados levou o governo federal, através do Minist ério da Justi ça, a firmar convênios com os governos estaduais, atribuindo-lhes competência para através das Secretarias de Segurança Pública - Dops - investigar e instruir os inquéritos relativos aos crimes contra a segurança nacional. ”[65]

Logo no dia seguinte, o jornal introduziu na discussão, ainda que de forma simplificada, os diferentes conceitos de segurança nacional que se confrontavam neste primeiro impasse entre governo Montoro e governo federal. De acordo com a matéria, a concepção “superabrangente” de segurança nacional, tal como concebida pela Escola Superior de Guerra, não era aceita pelo PMDB. Durante a campanha eleitoral, o partido comprometeu-se inclusive a responder às reivindicações dos movimentos sociais emergentes através do diálogo, exceto nos casos em que a “ordem pública” e o direito à propriedade fossem perturbados.[66]

Nesta mesma matéria, no entanto, o jornal informa sobre o decreto - lei baixado pelo governo federal limitando a autonomia dos governos estaduais sobre as Polícias Militares. Partindo para o enfrentamento aberto, iniciado com tal demonstra ção de força, a atitude do governo Figueiredo diferenciou-se da estratégia posteriormente adotada pelo governo Montoro de neutralização do conflito.[67]

A partir desse decreto - lei, ampliaram-se os casos em que o governo federal, através da Forças Armadas, poderia intervir nas Polícias Militares, caracterizando assim, sua forte tendência centralizadora. A contrapartida, classificada pela Folha como “modesta mas real”, residia na entrega do comando das Polícias Militares a coronéis da pr ópria corporação[68], indicados pelos governadores e aprovados pelo Ministro do Ex ército.

Depois de longas discussões que envolveram não apenas a Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo, mas também o então diretor do Dops, Romeu Tuma, os novos secretários da Justiça, José Carlos Dias, e da Segurança P ública, Manoel Pedro Pimentel, o então deputado Eduardo Suplicy, do Partido dos Trabalhadores (PT)[69], além do próprio governador eleito, Franco Montoro, e do Ministro da Justiça, Ibraim Abi Ackel, o acordo foi rompido.

Encerrando a questão com duas demonstrações finais de sua força, o ministro Abi Ackel nomeou Romeu Tuma[70] superintendente da Polícia Federal em São Paulo. Garantiu assim a continuidade na aplicação da LSN no Estado, numa manobra política que pretendia fortalecer o poder do governo federal sobre os estados, onde governadores de oposição venceram as eleições.

Mas, de acordo com Mingardi[71], a extinção do Dops já estava prevista no “projeto Montoro ” para a área da Segurança P ública, apresentado à convenção do PMDB, em junho de 1982.

A partir de entrevistas com membros da comissão encarregada da elaboração do projeto, esse autor aponta duas ordens de motivações para a opção pela extinção: 1. a motivação ideológica, que associava esse departamento à forma mais violenta de repressão política, associada com a qual o novo governo estadual não queria ver sua imagem e 2. a motivação funcional, que justificava a liberação de delegados, escriv ães e investigadores deslocados da polícia para esse departamento, em decorrência do convênio existente.

A primeira ordem de motivações trazia embutidas implicações diversas, entre as quais destacamos a nova concepção de polícia que sustentava o projeto do governo: não mais um instrumento a serviço do governo ou do regime, mas a serviço da população, sobretudo da população pobre. A introdução de uma proposta não prevista no projeto original do governo, sugere, entretanto, que

reformulações foram feitas desde a posse da nova equipe de governo. Tratava-se da cria ção de uma Divis ão de Informações Policiais, divulgada apenas pelo Estadão, que ainda insistiu no seu caráter de “substituição ao antigo Dops.”[72]

A despeito dos esforços do Secret ário Pimentel em diferenciar a nova divis ão do Dops[73], reforça- se a impress ão de distanciamento em relação ao projeto original, aparentemente iniciado no momento em que ele assumiu a pasta da Segurança Pública.

Com relação à liberação dos policiais emprestados, encontramos na imprensa informações sobre um acordo informal firmado entre o então Secretário de Segurança (Pimentel) e o diretor do Dops (Romeu Tuma), garantindo a volta dos mesmos policiais antes emprestados e depois devolvidos, mediante novo empr éstimo.[74] Desse modo, a racionalidade que parecia embasar o projeto original foi sendo suplantada pelas injunções políticas e pelas soluções imediatistas.

2.2. A reação do governo paulista ao decreto - lei que submeteu a ação das Polícias