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Caracterização do solo

5 Tecnologia e Funcionamento

5.1.5 Descrição do processo

As centrais previstas neste trabalho destinam-se a tratar qualquer tipo de mistura de resíduos biodegradáveis, já referenciados no capítulo anterior, tais como farinhas animais (carne e peixe), óleos vegetais, restos de colheitas, restos de cozinha e de mesa, lamas de depuração, para além de chorumes e dos efluentes pecuários, dependendo das disponibilidades locais de matérias. O tratamento conjunto de matérias com origem e características diversificadas apresenta vantagens ao nível de:

• viabilização económica de uma central de biogás de grande dimensão mais fácil de concretizar, dado que existem vantagens de escala.

• produção melhorada de biogás, em termos de quantidade gerada por tonelada de resíduo e em termos de conteúdo de metano

• melhor manuseamento de resíduos

mais fácil gestão dos inputs ao longo do ano, superando as quebras de abastecimento com carácter sazonal, próprias de algumas actividades

• reciclagem eficaz e eficiente de resíduos orgânicos diversos

Por sua vez, o tratamento conjunto de matérias com origem diversificada pode apresentar como desvantagem a dificuldade em assegurar uma alimentação constante ao processo.

As diferentes matérias, sujeitas em alguns casos a uma operação prévia de pasteurização / higienização (ex: matérias animais), são misturadas no tanque de homogeneização de resíduos e posteriormente encaminhadas para o(s) digestor(es).

Um ou mais tanques de betão ou aço, dotados de um sistema de agitação/ mistura, tapados, para controlo de odores, permitem ajustar as características finais do efluente a introduzir no digestor.

Os digestores, tanques construídos em aço, são dotados de sistema de aquecimento e de agitação, sistema de recolha de biogás e dispositivos de segurança para as linhas de efluente e de

gás. É fundamental que o digestor esteja dotado de um isolamento térmico adequado ás condições locais, de forma a evitar as perdas térmicas do sistema e a minimizar as necessidades de utilização da energia térmica produzida.

As formas de isolamento térmico mais frequentemente utilizadas são (Santos, 2000)(2): • construção do digestor parcialmente abaixo do nível do solo

• revestimento do digestor com materiais de origem sintética

• utilização de paredes duplas com caixa de ar, ou fluido permutador de calor • utilização de materiais refractários

A digestão anaeróbia, ocorre em situação de total ausência de oxigénio. Neste meio, a decomposição da biomassa é levada a cabo por uma população de bactérias, que actuam sobre a estrutura de materiais orgânicos complexos, para obter a energia e os compostos necessários ao seu desenvolvimento.

O resíduos a digerir em geral não se encontram à temperatura adequada, pelo que é necessário fornecer o calor necessário ao aquecimento da mistura a digerir e à compensação das perdas térmicas ocorridas durante a digestão.

O aquecimento é realizado através da utilização de permutadores de calor internos ou externos ao digestor, que utilizam a energia térmica resultante da utilização do biogás, disponibilizada geralmente sob a forma de fluído (água quente).

As diferentes tecnologias classificam-se de acordo com o teor de sólidos do material em digestão e com a temperatura de operação:

- digestão anaeróbia seca ocorrendo com uma concentração total de sólidos superior a 22%, abaixo deste valor é digestão anaeróbia húmida;

- digestão mesófila (30 a 40ºC) e termófila (50 a 65ºC).

A digestão anaeróbia húmida num só estágio – forma mais simples - ocorrendo numa só etapa num reactor completamente misturado e operando com um teor de sólidos da ordem dos 3-8%, apresenta alguns problemas:

- formação de uma crosta no reactor que dificulta a boa mistura,

- as principais reacções do processo não podem ser separadas e optimizadas, - na acidogénese o pH baixa enquanto que na metanogénese, mais lenta, tem um

pH óptimo próximo de 7.

Estes problemas podem ser ultrapassados pelo desenvolvimento do processo em dois estágios, hidrólise + acidogénese num primeiro reactor a pH 6, seguida de metanogénese num segundo reactor a pH 7,5 – 8,2.

Na digestão anaeróbia seca têm sido desenvolvidos vários processos numa só etapa à qual se segue um estágio de pós-digestão, aeróbia, de alguns dias para estabilização do resíduo.

As principais vantagens do processo com elevado teor de sólidos relativamente ao de baixo teor de sólidos, reside no baixo consumo de água, na elevada produção de biogás por unidade de volume de reactor e no menor esforço necessário na desidratação e deposição do digestato. (Tchobnoglous, 1993).

Quanto à temperatura de operação, a digestão pode ocorrer numa das três gamas principais de temperatura:

Tabela 5.1 Gamas de temperatura para a digestão anaeróbia

Regime Gama de temperatura

Psicrofílico 20 – 25º C

Mesofílico 30 – 40º C

Termofílico 50 – 65º C

Fonte: Santos, 2000 (2)

Temperaturas mais elevadas envolvem em geral uma produção de biogás superior e apresentam a vantagem de eliminar parte da carga patogénica originalmente presente nos resíduos.

No entanto, a gama de microorganismos capazes de se desenvolverem na gama termofílica é limitada e as necessidades energéticas para aquecimento são maiores.

Na passagem pelo digestor a matéria orgânica presente no influente, pode ser reduzida entre 60 a 80%, em massa, sendo o resíduo digerido enviado para um tanque de armazenamento, que poderá funcionar, caso se justifique como segundo digestor.

Deste processo, resulta a produção de biogás. O biogás é uma mistura gasosa, em proporções variáveis de metano (50 a 75%), dióxido de carbono (25 a 40%) e outros gases. A sua produção ocorre naturalmente no fundo dos lagos, nos intestinos dos ruminantes e nos processos em que a decomposição da matéria orgânica, ocorra na ausência do oxigénio, por exemplo, em lixeiras e aterros.

Os gases presente no biogás, dependem do processo de digestão e das características dos resíduos digeridos. É um combustível inflamável e de características corrosivas.

Na Tabela 5.2 apresenta-se o intervalo de possíveis misturas dos gases que constituem o biogás, à saída do digestor.

Tabela 5.2 Características técnicas do biogás, produzido por co-digestão (valores médios, fracção volumétrica) Gás Símbolo % no biogás Metano CH4 60%-75% Vapor de água H2O 1%-6% Azoto N2 <2% Dióxido de carbono CO2 20%-40% Hidrogénio H2 1%-3% H 2 S H 2 S >2.000 ppm NH 3 NH 3 0% -0,05% Fonte: Wellinger (2001)

Em termos energéticos dos gases que compõem o biogás assume particular interesse o metano. O metano em estado puro (CH4), em condições normais de pressão (1 atm) e à temperatura de 0ºC, apresenta um PCI (poder calorífico inferior) de 9,9KWh/m3. (Santos, 2002) (2)

Assim sendo, quanto maior a percentagem de metano no biogás, mais elevado será o seu PCI.

Cada 1 m3 de biogás, em termos de PCI, equivale a cerca de:

Em média, o biogás produzido por digestão anaeróbia de resíduos apresenta uma teor de metano variável entre o 60% e 70%, pelo que o PCI apresentará valores entre os 6 Kwh/m3 e os 7 Kwh/m3. Na prática, esta equivalência é afectada pelas diferentes eficiências de conversão, que dependem directamente das características da tecnologia e do combustível utilizado.

Este gás, pode ser utilizado em sistemas de queima directa, substituindo combustíveis gasosos convencionais, ou em sistemas de co-geração ou de pilhas de combustível para produção simultânea de energia térmica e eléctrica.

A co-geração é a tecnologia mais utilizada nas centrais de biogás. O actual estado da tecnologia possibilita uma rentabilização de 90% do biogás sujeito a co-geração, através da conversão da energia química do biogás em energia térmica e eléctrica.

Os melhores resultados atingidos em termos de eficiência de conversão energética do biogás, rondam os 38% para motores com potência de 600 a 1000 Kw.

Quaisquer sistemas de utilização ou conversão de biogás exigem a depuração do mesmo. O recurso a técnicas mais ou menos apuradas de depuração depende da utilização prevista.

Os requisitos de um simples sistema de queima, serão muito menos exigentes dos de um sistema de co-geração ou de pilhas de combustível.

A depuração incide na remoção parcial de alguns constituintes presentes na mistura inicial de gases, nomeadamente:

Figura 5.2 Constituintes a remover com a depuração do biogás

Fonte: Santos, 2000 (2)

Depois de sujeito a um processo de purificação, o biogás gerado durante a digestão é encaminhado para um sistema de armazenamento de gás, o gasómetro. Esta estrutura revela-se de grande utilidade para equalizar o fluxo de gás produzido, homogeneizar a qualidade do gás e proporcionar um caudal constante aos sistemas de utilização.

Os sistemas de armazenamento de biogás classificam-se segundo a pressão de armazenamento, dependendo da pressão necessária ao funcionamento do equipamento de utilização.

Tabela 5.3 Sistemas de armazenamento de biogás, por nível de pressão

Nível Pressão Características dos gasómetros

baixa < 50 mbar

No próprio digestor (campânula fixa flutuante, volume fixo, telas sintéticas fixas ao digestor)

Exteriores ao digestor (gasómetros de campânula fixas externos, sistemas de tela flexível)

media 10 bar<pressão<20 bar Tanques de aço (exigem a depuração de H2S e a compressão prévia do gás)

alta 20 bar<pressão<350 bar Garrafas a alta pressão (exigem a depuração de H2S e a compressão prévia do gás)

Fonte: Santos, 2000 (2)

A compressão, mediante a utilização de um ventilador ou de um compressor, pode ter diversos objectivos:

• reduzir o espaço de armazenamento

• concentrar o conteúdo energético (ex: para utilização em veículos)

• aumentar a pressão para vencer resistência ao fluxo do gás (ex: para injectar gás numa conduta de gás).

• proporcionar a pressão necessária ao funcionamento dos equipamento de conversão

Diferentes sistemas de equipamento de conversão de biogás exigem diferentes pressões, Tabela 5.4

Tabela 5.4 Intervalos típicos de pressão de funcionamento de equipamentos de conversão de biogás

Sistema de conversão Intervalo típico de pressão (bar)

Motor de combustão interna (aspiração natural) 0,03 – 1,4

Motor de combustão interna (turbocharged) 0,85 – 2,5

Caldeira a gás 0,02 – 0,7

Turbina a gás 10,5 – 12

Célula de combustível 3,5 – 5

Cilindros de armazenamento para veículos 250

Adaptado de CCE 2000

Em sistemas de co-geração, o gás purificado (à base de metano e dióxido de carbono), é conduzido para um sistema de co-geração e posteriormente transformado em energia eléctrica e calorífica.

Num grupo motor-gerador, o gerador permite a obtenção de energia eléctrica em cerca de 30% da energia química do biogá. O arrefecimento do óleo, do motor e dos gases de escape permite recuperar cerca de 50% da energia química do biogás sob a forma de energia térmica.

Parte do calor recuperado é utilizado para realizar o aquecimento dos digestores (40%) e manter a temperatura adequada ao processo de digestão.

O restante pode ser injectado em redes de aquecimento público ou vendido a unidades industriais ou comerciais localizadas na proximidade da central de biogás.

Da energia eléctrica produzida, parte é utilizada em auto-consumo e o remanescente (cerca de 80%) vendido à rede nacional de distribuição eléctrica.

Os efluentes e matérias geradas são sujeitos a tratamento adequado à produção de fertilizantes de elevada qualidade. O efluente digerido é desagregado nas suas fracções líquida e sólida. A fracção líquida é aplicável à agricultura como fertilizante em substituição de outros com origem química, dado que é rico em fósforo azoto e potássio.

As lamas e as fibras, originadas durante o processo e separadas do efluente digerido, são tratadas (em condições aeróbias e estabilizadas) e utilizadas quer como condicionadores do solo, quer como matéria-prima no fabrico de adubos organominerais. A fracção sólida deverá ser sujeita a um tratamento de estabilização, para parar o processo anaeróbio e para lhe conferir melhores qualidades para aplicação agrícola, eliminando a fitotoxicidade. A desidratação da fracção sólida é uma opção frequentemente utilizada, quer para facilitar o manuseamento quer para utilizar em incineração. (Edelmann)

Os efluentes resultantes do processo são incorporados num tratamento complementar, (ex: lagunagem ou digestão aeróbia), por forma a assegurar o cumprimento da legislação referente à realização de descargas em meio hídrico.

Figura 5.3 Circulação dos fluxos materiais numa central de biogás

5.1.6 Análise resumo

Em relação à tecnologia e funcionamento, as centrais de biogás apresentam as seguintes forças, fraquezas, ameaças e oportunidades, cuja análise demonstra os aspectos a seguir apresentados.

Forças

Possibilidade de usufruir das experiências levadas a cabo em outros países e outras unidades similares.

Possibilidade de criar uma unidade de raiz em conformidade com as recentes exigências da UE.

Grande disponibilidade de informação técnica relevante. Fraquezas

Indefinição quanto à possibilidade de rentabilização da energia térmica Ameaças

Não atribuição de ponto de ligação por parte da EDP

Dependência dos preços fixados pelos grandes clientes das energias

Dependência das condições de abastecimento fixadas pelos grandes clientes. Oportunidades

Tecnologia amadurecida e testada

Possibilidade de contacto e determinação dos problemas e sucessos das instalações similares já em funcionamento.

Obrigatoriedade no encaminhamento dos resíduos industriais e comerciais para destinos aprovados.

Tendência para um crescente rigor dos destinos dados aos resíduos agrícolas. O não cumprimento da lei pode inviabilizar a obtenção das licenças de laboração.

Obrigatoriedade da promoção do biogás em Portugal pela UE e a necessidade de dar cumprimento ao plano estratégico para redução da dependência energética e para redução de gases com efeito de estufa.

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