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(Gilvan Santos) ESTER BRAGA,

DESCRIÇÃO QUANTIDADE (KM) QUILOMETRAGEM PERCORRIDA/DIA LETIVO

PREÇO UNITÁRIO (R$) PREÇO TOTAL Linha 1 30.000 150 3,03 90.900,00 Linha 2 32.000 160 3,03 96.960,00 Linha 3 27.600 138 3,03 83.628,00 Linha 4 24.000 120 3,03 72.720,00 Total: 344.208,00

Fonte: Pesquisa de campo, junho 2018.

Nota: Valores apresentados pela Secretaria de Educação de São Francisco de Sales (MG) em junho de 2018.

Organização: Nogueira (2018)

Em todos os municípios a média de tempo percorrido nas linhas de transporte é de 1 hora e meia em cada trajeto, ou seja, passam no mínimo 3 horas do dia na estrada entre ida e volta da escola, uma rotina extremamente desgastante para estes alunos, a maioria crianças do Ensino Fundamental I que tem entre 6 e 14 anos de idade, que precisam acordar ainda de madrugada para que possam chegar a tempo na escola e além de problemas relacionados ao sono, podem ainda desenvolver problemas relacionados ao processo cognitivo de ensino e aprendizagem escolar.

Outro exemplo, que pode ser citado é do município de Limeira do Oeste, onde o repasse do PNATE em 2018 foi R$ 56.078,03 (R$165,30 per capta) referente a 345 alunos. No entanto, a previsão de gastos com transporte apenas para a primeira quinzena de junho de 2018, era de R$ 65.834,30 que correspondeu a 17 linhas – 10 vans e 7 ônibus – para os quais pagou-se por km R$ 2,19 e R$ 3,03, respectivamente.

Diante desta discussão a respeito do transporte e dos recursos destinados para esta finalidade, Pessoa (2007, p. 8), acredita que estes Programas apenas sirvam para reforçar a compreensão de que o transporte de crianças e adolescentes do campo para a cidade acarreta sérios prejuízos para as comunidades. “O imperativo da redução inescrupulosa de custos não apenas implica, em muitos casos, a precariedade desse serviço, como o torna, na verdade, um perverso desserviço às famílias rurais, retirando os filhos do seu convívio”.

Quando se tem a compreensão dos altos valores gastos em transporte escolar, torna-se questionável o discurso de viabilidade econômica do fechamento da escola. Nas conversas informais durante a pesquisa de campo, por vezes se ouve algo que embora seja dito despretensiosamente, vai desvelando algumas partes deste emaranhado obscuro de circunstâncias e interesses, inclusive na viabilidade econômica de manter o transporte.

Segundo informações obtidas durante uma conversa informal na pesquisa de campo, muitos donos de vans e ônibus tem algum tipo de vínculo com o serviço público – a oferta do transporte também é utilizado nas campanhas eleitorais, visto que conforme já citado, o transporte é colocado para os moradores do campo como um benefício oferecido, diante da necessidade de fechar a escola, conforme pôde ser constatado durante uma das entrevistas na pesquisa de campo - por meio de uma conversa presenciada entre terceiros coincidentemente sobre este assunto – transcrita a seguir:

eu recebi uma correspondência aqui [...] deixa eu te falar o que eles estão me pedindo que eu quero que você veja pra mim [...] eles querem ver a relação dos motoristas de veículos, assim, os motoristas e veículos tá tranquilo, eu faço, agora eles querem também é... a rota de cada perueiro porque eles tem que fazer buscando eleitor, entendeu? Então nós temos que fazer esse documento e enviar para eles das rotas das fazendas de cada um [...]

Diante das evidencias de que a falta de acesso à educação ocorre também em função das dificuldades no deslocamento às unidades escolares é lamentável e preocupante este tipo de discurso, pois, o transporte escolar não é um favor, visto que a educação é um direito a ser garantido pelo Estado. “A conclusão é que a perversidade do sistema encontra na precariedade ou na ausência de condições dignas de transporte escolar as condições adequadas para reproduzir as desigualdades sociais na região e, sem dúvida, no próprio País”. (MARTINS, 2013, p.260)

Além do Programa Caminho da Escola, existem também outros como o Programa Dinheiro Direto na Escola – PDDE Campo, que tem como objetivo conforme o disposto na Resolução no 36, de 21 de agosto 2012, a destinação de recursos financeiros às escolas públicas nos níveis municipais, estaduais e distritais localizadas no campo com estudantes matriculados na educação básica. A finalidade do programa neste sentido é “propiciar adequação e benfeitoria na infra-

estrutura física dessas unidades, necessárias à realização de atividades educativas e pedagógicas voltadas à melhoria da qualidade do ensino”. (BRASIL, 2012)

E o Programa Nacional de Educação do Campo – Pronacampo – instituído pela Portaria nº 86, de 1º de fevereiro de 2013 -, com o objetivo dar apoio técnico e financeiro aos Estados, Distrito Federal e Municípios “para a implementação da política de educação do campo, visando à ampliação do acesso e a qualificação da oferta da educação básica e superior, por meio de ações para a melhoria da infraestrutura das redes públicas de ensino”. Além disso, o programa também objetiva fomentar a “formação inicial e continuada de professores, a produção e a disponibilização de material específico aos estudantes do campo e quilombola, em todas as etapas e modalidades de ensino”. (BRASIL, 2013)

O Pronacampo desenvolve-se em quatro eixos, sendo eles: I - Gestão e Práticas Pedagógicas; II - Formação de Professores; III - Educação de Jovens e Adultos, Educação Profissional e Tecnológica; e IV - Infraestrutura Física e Tecnológica. Destaca-se que incorporado ao primeiro eixo, está o Programa Nacional do Livro Didático do Campo - PNLD Campo, instituído pela Resolução nº 40, de 26 de julho de 2011, que visa à distribuição de material didático específico para os estudantes do primeiro ao quinto ano do ensino fundamental de escolas públicas da área rural, seriadas e multisseriadas.

Outra finalidade do Pronacampo seria a oferta de cursos para professores e também os cursos de licenciatura específicos para a Educação do Campo, contudo, a realidade tem se mostrado oposta aos objetivos inicialmente propostos por estes Programas. Os livros didáticos com conteúdos que reforçam estereótipos e a dicotomia entre o campo e a cidade e assim como as milhares de escolas, os cursos de licenciatura também estão sendo extintos, um transtorno tanto para os alunos quanto para os professores destes cursos, servidores que acabaram sendo exonerados de seus cargos.

No âmbito legal, a Constituição Federal de 1988 confere ao cidadão o direito à Educação, visando o desenvolvimento pleno da pessoa e seu preparo para o exercício da cidadania. E a LDBEN 9394/96, no art. 28, incisos de I a III, aponta elementos que direcionam a oferta da educação básica para a população rural e orienta que os sistemas de ensino promovam adaptações necessárias à adequação das peculiaridades da vida rural e de cada região.

Assim, o acesso à escola não é um favor e nem mesmo um benefício, mas sim um direito, razão pela qual Arcoverde (2012) reforça que a substituição de escolas por ônibus é contrária à luta pelo acesso a educação e pelo ensino de qualidade, o investimento deve ser nas escolas, não no transporte, direcionado para construir mais escolas no campo e não para implantar políticas e programas de transporte destes alunos. Hage (2012) corrobora esta afirmativa ao considerar que

é essa perspectiva quantitativa da relação custo-benefício, a partir da perspectiva urbanocêntrica, que é aplicada pela gestão pública. Há ainda uma aceitação da sociedade, porque conseguem demonstrar que, por meio da oferta do transporte escolar, atendem toda a demanda e em todos os níveis. Isto acontece porque há uma compreensão de que a cidade é o lugar do desenvolvimento, que consolida como natural esse movimento das pessoas se deslocarem do campo para a cidade. Só que não há lugar para todo mundo viver na cidade, no lado urbano. A população que vive nas cidades não vive essas promessas do desenvolvimento que a perspectiva urbanocêntrica apresenta. Quem vive bem na cidade? Quem vive no centro e quem tem um emprego significativo? A grande maioria vive muito mal na cidade, vive pior que as pessoas que vivem no campo. (HAGE, 2012, p.1)

Neste sentido Camini (1998, p. 35) acredita que “o descaso com a Educação no meio rural tem levado a uma compreensão de que o lugar de quem estuda é na cidade e que, para continuar na roça, os trabalhadores não necessitam de estudo”. No entanto, tem sido possível compreender esta análise a partir de uma perspectiva ideológica que desvaloriza a Educação como um todo, visto que, embora a escola esteja prioritariamente na cidade, também não parece refletir a compreensão que, somente, na roça os trabalhadores não precisem de estudo, pois também na cidade os trabalhadores e seus filhos, na escola, estão sendo negligenciados pelo Estado.

Todavia, as escolas na cidade não são o contexto que se pretende tratar. Assim, no que diz repeito à citação da autora quanto à educação ofertada no campo, e diante do que tem sido possível observar tanto nesta pesquisa quanto em outros estudos que abordam a temática, é que se poderia dizer que: o modelo produtivista no campo, tem evidenciando que o desinteresse com a educação advém de um projeto ideológico para converter o campo cada vez mais em rural agroexportador, e neste modelo o camponês é absolutamente dispensável, enquanto força de trabalho pode ser incluído no processo, porém, não como camponês.

Percebe-se então que são inúmeros os fatores associados ao êxodo das famílias do campo para as cidades. Diante do exposto, Ramos Filho (2013, p. 37) faz uma pertinente reflexão, quanto à intensificação do que considera como um

suposto dinamismo do agronegócio na geração de empregos e contribuição na redução da pobreza, o autor aponta que o setor

propõe ações que buscam na realidade garantir custos mais baixos de produção [...] mediante políticas governamentais de controles cambiais, realização de um modelo de reforma trabalhista rural que viabilize uma precarização ainda maior do trabalho, bem como investimentos públicos na educação rural. Neste último, a preocupação não é viabilizar um direito universal e promover a escolarização, capacitação, qualificação, formação e politização dos pobres rurais com vistas à construção de sua autonomia, mas, efetivamente, busca-se escolarizar os pobres do campo para que domine um determinado oficio ou conhecimentos básicos que serão necessários ao trabalho nas fazendas, escritórios ou cozinhas das corporações que atuam e controlam a agricultura comercial e suas agroindústrias. (RAMOS FILHO, 2013, p. 39, grifo nosso)

E se para exercer estas funções, a identidade com o campo é dispensável, o potencial trabalhador pode ser escolarizado em qualquer escola. Bruno (2009) também acredita que a supervalorização do salário, em detrimento de outras condições, e a valorização atribuída ao emprego reforça no trabalhador o sentimento de necessidade de manter o emprego, submetendo-se inclusive a condições precárias, de vulnerabilidade e até mesmo de trabalho escravo.

A posse ou a intenção de possuir é um elemento comum em todas as classes envolvidas na cadeia do agronegócio. A posse se manifesta em diferentes escalas, por meio desta necessidade de garantia. O empresário rural compreende a posse da terra como garantia de acumulação de renda e poder. O camponês compreende a posse da terra como uma garantia de sobrevivência. E o trabalhador assalariado também considera a posse de um emprego como a mínima garantia de suprimento das suas necessidades e das necessidades da família.

No entanto, ao contrário da posse que é comum a todos. O poder não é necessidade nem do camponês, nem do trabalhador assalariado, somente do empresário, pois sua intenção principal, não está firmada em suprir necessidades básicas ou na sua sobrevivência, mas sim na acumulação de riquezas. Então, entende-se que todos os conflitos se originam nestes dois eixos – posse e poder – pois aquele que os detém, intenciona controlar os demais.

E na medida em que o acesso a terra é dificultado, os expropriados sentem-se como o elo mais frágil desta cadeia, socialmente discriminados pelo agronegócio e por parte da sociedade, sistematicamente explorados na sua força de trabalho e financeiramente suscetível ao salário oferecido pelo agronegócio.

Porém, ao compreender-se como elo frágil, os trabalhadores refletem e expõem a deturpação na compreensão da realidade à qual o sistema os submete, a partir do momento, que percebe o salário como resultado do trabalho ao qual se empenhou é desvinculado da compreensão maior do seu papel na geração da riqueza acumulada, ou seja, há uma inversão proposital na compreensão da realidade quando ao invés do trabalhador sentir-se como o elo mais forte, que através do seu trabalho gera a riqueza acumulada pelo empresário, ele passa a sentir-se como o mais fraco, justamente com um dependente daquele que na verdade depende da sua força de trabalho, e assim, se concretiza a alienação necessária para a geração constante de mais –valia.

Partindo destes pressupostos, ficam evidentes os motivos pelos quais são fechadas as escolas, pois o fechamento não é por si só uma consequência da falta de alunos e do esvaziamento do campo. Fechar uma escola é mais que uma consequência, pois há claramente uma finalidade e uma motivação.

Pois, se é a identidade com a terra que mantém no camponês o vínculo e a necessidade de permanecer no campo, e se essa permanência demanda novas políticas e principalmente a redistribuição de terra, por meio da Reforma Agrária, algo diretamente contra os interesses do latifundiário, é justamente a construção da identidade com o campo que precisa ser desconstruída. E se não tem como ser desconstruída naqueles em que ela já está consolidada, então, é preciso impedir que se consolide também nas próximas gerações.

Diante deste contexto Leite (1999) reforça que uma lei criada sem a participação do povo e que não considera tamanha desigualdade e diversidade territorial, não poderá ser eficaz e também não irá trazer mudanças permanentes, apenas providências, ou seja, ações momentâneas e pontuais que encobrem a reais causas, dão a falsa impressão de algo está sendo feito para solucionar um determinado problema, porém são transitórias, não se consolidam e não se institucionalizam.

Bravo (2007, p. 31) avalia que é necessário compreender que os problemas educacionais não se resolvem apenas com leis, programas e controle de qualidade, mas "sobretudo, do entendimento da diversidade social, econômica, cultural e histórica que, sendo estrutural e conjuntural, determina os limites da ação dos dirigentes educacionais”. Assim, se o real objetivo da educação é a garantia dos direitos à cidadania, a proposta não deve considerar apenas a dimensão econômica,

mas principalmente, as dimensões sociopolítica e cultural. Ressalta-se também que a realidade da educação proposta para uma região exige necessariamente que se considere a dimensão sociopolítica do povo que nela vive.

Apontados estes aspectos apresenta-se os resultados das análises e observações provenientes da realização da pesquisa de campo nos doze municípios do Triângulo Mineiro, onde se buscou compreender qual a percepção dos gestores municipais da educação sobre o fechamento das escolas e quais possíveis consequências podem ser identificadas neste processo para as comunidades.

5.2 Discursos e representações sobre o fechamento de escolas no campo no Triângulo Mineiro

Durante a pesquisa, foram feitos levantamentos de dados de diferentes plataformas com o intuito de estabelecer um panorama da realidade do Triângulo Mineiro, e principalmente, dos municípios estudados, estes dados foram organizados em tabelas que apresentam elementos norteadores para a interpretação das entrevistas e observações em campo.

Também compõe os resultados, os dados organizados e tabulados, bem como as fotografias e informações obtidas nas entrevistas com os gestores nas Secretarias de Educação, todavia mantendo o sigilo dos entrevistados, conforme garantido pelo Termo de Consentimento Livre e Esclarecido – TCLE. São apresentados quadros, tabelas e mosaicos de fotografias relacionados aos grupos de análise em que as questões do roteiro foram subdivididas. São cinco quadros que agrupam as questões de conteúdos semelhantes de acordo com o conteúdo de análise, nas respostas foram identificadas palavras e expressões que sintetizam os principais pontos levantados e por meio das quais se elaborou uma síntese interpretativa do contexto.

A síntese interpretativa foi inspirada na técnica do Discurso do Sujeito Coletivo – DSC, entretanto, optou-se por chamar de síntese interpretativa, pois na técnica do DSC são seguidos os passos de classificação de categorias, ideias centrais, ancoragem, representações sociais que se convertem em problemáticas e a partir das quais são construídos os DSC redigidos na primeira pessoa do singular, para dar voz à coletividade. Esses passos não foram seguidos na metodologia de análise desta tese, de modo que a síntese interpretativa apresentada não é a

construção de uma fala coletiva, mas sim da interpretação da pesquisadora diante das respostas obtidas nas entrevistas. As partes destacadas em negrito nas falas dos participantes, foi um alternativa utilizada para evidenciar algumas palavras chave como elementos norteadores na análise e construção da síntese. Esclarecida esta questão metodológica, apresenta-se a análise dos dados da pesquisa empírica.

5.2.1 Resultados da pesquisa empírica: análise das entrevistas e observações em campo

A partir da década de 1970, com a inserção de um novo modelo de produção tanto na cidade quanto no campo ocorre de modo geral uma expressiva transformação nos índices demográficos da sociedade, que passa de predominantemente rural para predominantemente urbano, conforme pode ser observado na Tabela 7 nos municípios onde foi realizada a pesquisa de campo.

TABELA 7 - População rural e urbana nos municípios pesquisados, 1970 – 2010

MUNICÍPIO

POPULAÇÃO (QUANTIDADE DE HABITANTES)

1970 1980 2010