• Nenhum resultado encontrado

Descrição Teórica dos Parâmetros de Agitação Marítima

4. ANÁLISE E CARACTERIZAÇÃO DA AGITAÇÃO MARÍTIMA

4.3. Descrição Teórica dos Parâmetros de Agitação Marítima

O espectro direcional (ou espectro de energia de onda em direção) oferece uma caracterização complementar da agitação marítima na medida em que faz uma descrição da forma como a energia das ondas é distribuída em várias frequências e direções. Estes modelos fornecem a energia de onda local mas não a distribuição de alturas de onda, apesar deste parâmetro ter uma função importante no que diz respeito ao dimensionamento e avaliação de estruturas marítimas (como é caso dos quebra-mares).

Em águas profundas, o comportamento aproximadamente linear das ondas permite realizar uma descrição teórica estatística das suas características, baseada na distribuição de Gauss de valores individuais da elevação da superfície, resultando numa distribuição de Rayleigh (da crista à cava) de alturas de onda que é determinada pela energia de ondas locais.

A aplicação de dados estatísticos sobre ondas marítimas foi realizada originalmente por Longuet-Higgins (1952), que demonstrou que em espectros de banda estreita as amplitudes de onda seguem a distribuição estatística de Rayleigh. Esta distribuição de probabilidades foi concebida por Rayleigh no final do século XIX para descrever a distribuição da intensidade dos sons emitidos por

um número infinito de fontes. No ano de 1952 foi demonstrado pelo cientista britânico Longuet- -Higgins que esta distribuição é também aplicável às ondas do oceano, e desde então tem sido universalmente empregada para a possibilitar uma descrição estatística das alturas de onda. Segundo a teoria de Rayleigh na qual se baseou Longuet-Higgins, a probabilidade de uma certa altura de onda individual, representada por 𝐻′, ser menor ou igual a uma altura de onda arbitrária,

𝐻, pode ser expressa da seguinte forma:

𝑃(𝐻′≤ 𝐻) = 1 − 𝑒−(𝐻 𝐻⁄ 𝑟𝑚𝑠)2

(4.13)

onde 𝐻𝑟𝑚𝑠 representa o valor quadrático médio das alturas de onda (em inglês esta medida estatística designa-se por “root-mean-square”).

4. ANÁLISE E CARACTERIZAÇÃO DA AGITAÇÃO MARÍTIMA

20

O nome deste parâmetro deriva do facto de se tratar da raiz quadrada da média aritmética dos quadrados das alturas de onda. A altura média quadrática de onda, 𝐻𝑟𝑚𝑠, para um registo composto por 𝑁 ondas individuais, é definida como:

𝐻𝑟𝑚𝑠 = √𝑁1 ∑ (𝐻𝑁𝑖=1 𝑖)2

(4.14)

onde 𝐻𝑖 é a altura de cada onda individual. Note-se que o valor do parâmetro 𝐻𝑟𝑚𝑠 é sempre superior ao valor da altura média das ondas. A equação (4.14) traduz a função de distribuição de probabilidade de Rayleigh (também designada por função de distribuição cumulativa) válida para a variável aleatória contínua como é o caso da altura de onda, 𝐻.

Na Figura 4.7 ilustra-se, a título exemplificativo, o aspeto gráfico associado à função densidade de probabilidade em função da frequência, cuja integração fornece a distribuição de probabilidades de Rayleigh.

Figura 4.7: Exemplo da função densidade de probabilidade de Rayleigh

É interessante observar que a função densidade de probabilidade de Rayleigh, ao contrário de, por exemplo, a função normal de Gauss, não é uma função simétrica, mas apresenta uma “cauda” na região de frequências mais elevadas, que diminui de forma gradual até atingir o zero.

Esta caraterística tem implicações na estatística de casos extremos, pois nessa região é frequentemente observado que a distribuição de Rayleigh oferece previsões de alturas de onda excessivamente altas em comparação com a maioria das alturas de onda (Forristall, 1978).

0 0.2 0.4 0.6 0.8 1 1.2 1.4 1.6 1.8 2 0 0.2 0.4 0.6 0.8 1 1.2 1.4 Frequência (𝐻𝑧)

4. ANÁLISE E CARACTERIZAÇÃO DA AGITAÇÃO MARÍTIMA

21

Apesar destas exceções, foi demonstrado que a distribuição de Rayleigh constitui uma boa aproximação, podendo até ser considerada como conservativa, pois em comparação com outras distribuições probabilísticas, esta fornece valores ligeiramente superiores para a altura de onda para um qualquer nível de probabilidade, (Straioto, 2006).

Como foi referido, nos espectros de banda estreita e em águas profundas, tem sido demonstrado que as alturas de onda seguem a distribuição de Rayleigh, pelo que se torna necessário obter algum indicador que permita classificar o espectro em análise como sendo de banda larga ou de banda estreita, e para tal Longuet-Higgins (1952) definiu o seguinte parâmetro:

𝜀𝑠= √1 − 𝑚2 2

𝑚0𝑚4 (4.15)

Os valores de 𝜀𝑠 apresentados na Tabela 4.1 foram estabelecidos teoricamente como indicadores da largura de banda do espectro e da distribuição estatística da altura de onda que lhe corresponde, (Liu e Frigaard, 2001):

Tabela 4.1: Classificação da largura do espectro e respetiva distribuição de altura de onda

Parâmetro de largura do espectro Distribuição da altura de onda 𝜀𝑠= 0 ; banda estreita Distribuição de Rayleigh

𝜀𝑠= 1 ; banda larga Distribuição de Gauss

De acordo com o que foi explicado no subcapítulo 4.1, a análise do registo de ondas permite obter uma estimativa da altura significativa, 𝐻1/3, pelo que se torna necessário obter um termo de comparação proveniente do espectro que seja o equivalente espectral deste parâmetro. Considerando que as alturas de onda seguem a distribuição de Rayleigh, i.e., 𝜀𝑠= 0, é possível obter teoricamente a altura de onda significativa baseada na energia do espectro, representada por 𝐻𝑚0 e definida como:

𝐻𝑚0= 4√𝑚0 (4.16)

O seu valor é quatro vezes o desvio padrão da elevação da superfície pois, como foi demonstrado anteriormente, o momento de ordem zero é equivalente à variância do espectro. Tipicamente, os valores de 𝐻𝑚0 são superiores aos da altura significativa calculados pelo método do cruzamento com o zero, 𝐻1/3, encontrando-se numa ordem de valores 5% a 10% mais elevados

em relação a este último (Holthuijsen, 2007).

4. ANÁLISE E CARACTERIZAÇÃO DA AGITAÇÃO MARÍTIMA

22

Para determinadas condições, como no caso de o espectro ser de banda estreita, este parâmetro, 𝐻𝑚0, é uma estimativa equivalente à altura significativa de onda, 𝐻1/3, determinada a partir da análise dos registos, mas obtida pela análise espectral (Sarpkaya and Isaacson, 1981).

A altura de onda significativa é normalmente representada por 𝐻𝑠, pelo que se torna necessário distinguir qual dos parâmetros está a ser analisado, ou seja, deve-se indicar se a variável 𝐻𝑠 refere-se a 𝐻1/3 ou 𝐻𝑚0.

Como foi mencionado anteriormente, a consideração de que a envolvente das amplitudes varia de forma regular possibilita que a distribuição de probabilidades de Rayleigh possa ser aplicada à distribuição das alturas de onda. De forma geral, os dados recolhidos por monitorização

in situ confirmam esta hipótese para a maioria das condições marítimas, com exceção dos casos

em que a profundidade é pequena ou quando ocorre rebentação das ondas. Em águas profundas e intermédias, a altura de onda significativa obtida pela análise espectral aplicando a equação (4.16) é ligeiramente superior à que é obtida pelo método do cruzamento com o nível zero.

Para zonas de pequenas profundidades, o comportamento das ondas é mais complexo e o conhecimento sobre a descrição estatística das características de ondas é mais limitado. Uma situação de bastante importância do ponto de vista da engenharia marítima ocorre quando as ondas se propagam em direção à costa, deparando-se com profundidades progressivamente menores. Nestas zonas a rebentação pode fazer com que a distribuição das alturas de onda difira consideravelmente da distribuição de Rayleigh, de uma forma que até à atualidade não se encontra inteiramente conhecida.