• Nenhum resultado encontrado

Desenvolvimento de aprendizagens autênticas: valorização e

CAPÍTULO 2 – Referencial teórico e fundamentos do estudo

2.2. A aprendizagem e tarefas autênticas: enquadramento conceptual e

2.2.6. Desenvolvimento de aprendizagens autênticas: valorização e

As vantagens do desenvolvimento da aprendizagem autêntica nos dias de hoje são evidentes: pretende-se formar alunos com um leque de competências muito vasto, que inclua não só competências de índole conceptual, mas também competências de competitividade, criatividade, espirito crítico, sociais, e que se sintam preparados para lidar com situações

63 complexas futuras (Hart, 2006; Lombardi, 2007). De acordo com Lombardi (2007) a aprendizagem autêntica revela-se como uma boa aposta perante os novos desafios impostos em grande parte pelo mercado de trabalho. No entanto, Figueiredo (2005) refere, que se verifica ainda que a visão mecanicista da aprendizagem em que se privilegia o depósito de conteúdos continua a dominar o atual cenário educacional. A justificação desta constatação prende- se com o facto de por um lado se verificar alguma preferência por parte dos alunos pelo tradicional modo de instrução, já que estes estão formatados desde muito cedo para questões do tipo certo ou errado, e não se sentem muitas vezes confortáveis com questões problema que possam ter diferentes e variadas soluções (Lombardi, 2007). Segundo Perry (1981, citado por Lombardi, 2007, p. 10) os alunos acreditam que “right answer exists somewhere for every problem, and authorities know them. Right answers are to be memorized by hard work.”

Por outro lado, o uso das novas ferramentas tecnológicas de que se destaca a utilização da Internet, só se tornou prática corrente nas escolas portuguesas há cerca de dez anos. Segundo o Inquérito à Utilização de Tecnologias da Informação e da Comunicação pelas Famílias: 2005 a 2008, realizado pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), (2009, p. 3), a “escola tem sido, nos últimos quatro anos, o local onde os indivíduos dos 10 aos 15 anos mais têm utilizado o computador e acedido à Internet”. Em 2012, foi realizado pelo INE o mesmo inquérito, que revela que a “a escola é ainda uma referência importante na utilização destas TIC, (…): 69% de utilizadores de computador e 65% de utilizadores de Internet declaram usar estas tecnologias na escola em 2012.” (INE, 2012, p. 7).

Se a aprendizagem autêntica é uma aprendizagem que deve ser realizada num determinado contexto específico, ou seja, deve acontecer com tarefas, interações e ambientes sociais enriquecedores, o crescente avanço da tecnologia está a torná-la cada vez mais possível de se concretizar (Figueiredo & Afonso, 2005). No entanto, em Portugal, tem-se assistido a uma série de medidas governamentais que podem dificultar uma melhoria no ensino experimental das ciências, nomeadamente pela abordagem das aprendizagens autênticas, das quais se destacam:

64 - um decréscimo acentuado nos incentivos financeiros, por parte do Ministério da Educação e Ciência, para aquisição de computadores e outros equipamentos tecnológicos no ensino básico, o que constitui um entrave à implementação das aprendizagens autênticas nas escolas. A relação alunos /computador no 2.º CEB, em 2008/2009, era de 1,1 passando para 3,1 em 2011/2012 (Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência, 2014).

- um crescente número de alunos por turma (atualmente algumas turmas chegam a atingir os 36 alunos), o que dificulta quer a gestão dos recursos materiais disponíveis nas escolas, quer o ensino contextualizado e orientado para as necessidades individuais dos alunos.

- as metas curriculares definidas pelo MEC (2013) para a área curricular de Estudo do Meio, do 1º ciclo do ensino básico, e para a área curricular de Ciências Naturais, do 2º ciclo do ensino básico, estão orientadas para a aquisição de competências muito centrada nos conteúdos, e pouco centrada no desenvolvimento de competências de natureza científica (formular hipóteses, fazer previsões, selecionar e relacionar variáveis, tirar conclusões), uma vez que a aposta nas atividades experimentais é muito reduzida.

Outro dado importante é que, desde 2010, se verifica uma inversão na tendência de valorização da formação dos professores do ensino básico, no ensino experimental das ciências. Entre 2006 e 2010, a Direção-Geral de Inovação e do Desenvolvimento Curricular (DGIDC) desenvolveu em Portugal o Programa de Formação em Ensino Experimental das Ciências (PFEEC) para professores do 1.º CEB. Este programa de formação teve como finalidade desenvolver competências profissionais dos professores do 1.º CEB, para que aumentassem os níveis de literacia científica dos alunos (DGIDC, 2006). O estudo de avaliação concluído em 2011 (Martins et al., 2012), sobre o impacte deste programa de formação, permitiu concluir que, os professores, após a formação passaram a recorrer a atividades experimentais com controlo de variáveis, a debates na turma, a exercícios práticos, a experiências de verificação e sensoriais, a saídas de campo, trabalho de projeto, recurso a exposição oral de temas com recurso a cartazes, transparências, esquemas no quadro, em vez da exposição oral de conteúdos pelo professor. Os professores passaram a incorporar nas suas práticas docentes as etapas fundamentais de

65 uma atividade experimental (contextualização da atividade, problematização e formulação da questão-problema, preparação dos recursos adequados à realização da experiência, execução da experiência, registo de dados, análise e discussão dos dados, sistematização das conclusões, resposta à questão- problema).

A questão da avaliação realizada pelos professores aos alunos, também sofreu mudanças, uma vez que os professores consideram que, após o programa de formação, passaram a implementar múltiplas estratégias de participação dos alunos no processo de avaliação. Relativamente ao impacte do PFEEC nas aprendizagens dos alunos, analisaram-se dois grupos de alunos, um grupo experimental, que teve professores integrados neste programa de formação e um outro grupo em que tal não se verificou e que portanto serviu de grupo de controlo. Não foram evidentes as diferenças entre os dois grupos analisados, uma vez que a diferença amostral não foi suficiente para afirmar que as classificações do GE diferiam significativamente das dos alunos do GC. No entanto, e tendo em conta as melhores classificações obtidas no GE e no GC, verificou-se que as melhores classificações foram globalmente superiores no GE.

Um outro programa de incentivo ao ensino experimental das ciências nas crianças, é o programa Ciência Viva, em vigor desde 1996 (Ciência Viva, 2014). Este programa, tem colmatado algumas necessidades de formação de docentes e alunos na área das ciências (Ciência Viva, 2014). Tem como principal linha de ação apoiar o ensino experimental das ciências e promover a educação científica na escola. A escola é o espaço de prioridade de intervenção deste programa, onde se procura o reforço do ensino experimental das ciências e a mobilização da comunidade científica e das suas instituições para a melhoria da educação científica (Ciência Viva, 2014). Inserido nesta linha de ação destaca-se a realização anual de um concurso nacional de projetos de educação científica, e um programa de ocupação científica de jovens em laboratórios e unidades de investigação durante as férias (Ciência Viva, 2014). Uma outra linha de ação deste programa relaciona-se com a Rede Nacional de Centros Ciência Viva, concebidos como espaços interativos de divulgação científica para a população (Ciência Viva, 2014). A terceira linha de

66 ação visa a realização de campanhas nacionais de divulgação científica, o que permite que a população usufrua de oportunidades “de observação de índole científica e de contacto direto e pessoal com especialistas em diferentes áreas do saber”, de que são exemplo a Semana da Ciência e da Tecnologia, Astronomia no Verão e Biologia no Verão (Ciência Viva, 2014).

Pelo exposto, faz sentido que o MEC aposte neste tipo de programas de formação, já que, são inúmeras as vantagens deste tipo de iniciativas, quer para professores, quer para os alunos, e é através desta valorização do ensino das ciências que se conseguirá formar alunos com capacidades de decisão e escolha fundamentada.

Um dado positivo em relação à formação dos professores, é a abertura de cursos de mestrado de especialização na área do ensino experimental das ciências, como por exemplo: Curso de Mestrado em Ensino Experimental das Ciências, Curso de Mestrado em Didática das Ciências da Natureza e da Matemática, que possibilita uma maior formação científica e pedagógica destes profissionais, que se repercutirá posteriormente numa melhoria das práticas de ensino.

Em síntese, a aprendizagem autêntica é uma abordagem de ensino que, não sendo nova, é atual, já que vai ao encontro das necessidades dos alunos no sentido de promover o pensamento científico nos mesmos. A apresentação de tarefas autênticas pelos professores, motivadoras e significativas para os alunos, constitui ferramentas poderosas e potenciadoras do desenvolvimento de práticas epistémicas. Em última análise, a aposta nas aprendizagens autênticas, com a implementação de tarefas autênticas, poderá constituir uma forma de alcançar o sucesso educativo na área das ciências. No entanto a implementação de tarefas autênticas encara alguns desafios, nomeadamente: ao nível dos recursos, nomeadamente no que concerne a equipar as escolas com TIC, já que se tem verificado um menor investimento neste campo, por parte do MEC, nos últimos três anos; resistências de professores e alunos a abordagens em que o aluno tem um papel ativo no processo de aprendizagem; a gestão e a adequação das tarefas autênticas aos conteúdos curriculares, tendo em conta o número de alunos por turma, e a extensão dos programas curriculares. Para que se consiga fazer face a estes desafios, e como referido

67 anteriormente, tem-se mostrado importante os apoios à implementação de programas de ensino experimental das ciências. Assim, constata-se a necessidade de apoiar as aprendizagens autênticas, não só em termos de recursos e formação mas também em termos metodológicos.

68