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Segundo Perez (2004), uma mudança de paradigma e uma nova revolução tecnológica abre as "janelas de oportunidades" necessárias para que os países subdesenvolvidos obtenham sucesso nos processos de adiantamento (forging ahead) e o emparelhamento (catching-up). A

história econômica apresenta vários exemplos de experiências bem-sucedidas de "superação do atraso", discutidos na seção 2.

Veremos como se dão essas “janelas de oportunidade” nas fases das revoluções tecnológicas, já estudadas neste trabalho.

Conforme Ouriques e Vieira (2017, p. 201), a posição de um país no sistema global não está garantida, pois o sistema capitalista está sempre em movimento e de tempos em tempos passa por transformações mais profundas. Tanto as revoluções tecnológicas do pensamento neo-schumpeteriano quanto as transições hegemônicas de Arrighi (1996) estão em concordância sobre um fato: o capitalismo é dinâmico, e os países necessitam se adaptar às transformações e ajustarem seus sistemas de produção.

Nesse sentido, as oportunidades para o desenvolvimento econômico são ao mesmo tempo abertas aos países desenvolvidos, na fase um, e aos países em desenvolvimento, com a fase quatro. Perez (2001) avalia a tecnologia como parte essencial das estratégias de desenvolvimento econômico propostas, e em momento nenhum a veremos separada.

É justamente com o surgimento de novos paradigmas que se abrem novas "janelas de oportunidade", e a oportunidade que se abre na fase um é exatamente essa. Um país desenvolvido é forçado a se adaptar ao novo paradigma, para se manter à dianteira da fronteira tecnológica.

A questão central do modelo proposto por Perez, no entanto, foca na oportunidade criada para os países periféricos no sistema. As mudanças de direção, que são consequência da instalação, do novo paradigma oferecem vantagens para os países em desenvolvimento. Segundo Arend (2009, p. 48), os países atrasados possuem níveis iniciais de produtividade do trabalho menores do que os países líderes, e podem absorver novas tecnologias com menor custo relativo nos períodos iniciais de mudança no paradigma tecnoeconômico.

A janela de oportunidade que se abre na fase um tem vantagens claras em relação à da fase de maturação: as possibilidades de lucro são grandes, bem como as de crescimento do mercado e de produtividade, já fazendo uso do novo conjunto de inovação. Além disso,

ingressar em uma indústria na sua fase de maturidade tem a desvantagem de que essas indústrias já perderam dinamismo, correndo o risco de perderem importância perante o novo conjunto de inovações trazidos pelo novo paradigma (AREND, 2009, p. 51).

Entretanto, a oportunidade da última fase é a mais interessante para os países atrasados: ao chegar na fase de maturidade de um paradigma, as tarefas já estão tão rotineiras que não se necessita de um conhecimento prévio ou muita experiência, ou seja, os custos comparativos são

melhores. Os riscos nessa fase, entretanto, são bem mais altos, pois se trata do novo conjunto de inovações que requer altos níveis de investimento e que pode não ser consolidado na economia.

Desse modo, vemos que embora as oportunidades existam, a janela de tempo em que estão abertas é mínima e difícil de ser identificada quando vigente. Essa não é a principal dificuldade, no entanto. O objetivo com as janelas de oportunidade é conseguir um salto no desenvolvimento econômico dos países, especialmente os subdesenvolvidos, e é extremamente difícil que o façam adentrando a fase quatro, de maturidade. É importante recordar que essa fase é caracterizada por margens mínimas de lucros e de perspectiva de crescimento de produtividade - se ainda existisse algo a ser aproveitado pelos países centrais, um novo paradigma tecnoeconômico não seria necessário.

4.6.1 O Caso Brasileiro

As janelas de oportunidade para o desenvolvimento econômico das nações periféricas acaba sendo um ponto chave nesse trabalho pois é fácil olhar para o Brasil nesse sentido. Dentro do arcabouço teórico da análise dos sistemas-mundo, que fundamenta a interpretação de Arrighi, o Brasil pode ser considerado um Estado semiperiférico. O próprio Immanuel Wallerstein, desde o início da criação do conceito de semiperiferia, coloca o Brasil como um Estado membro desse grupo (WALLERSTEIN, 1979).

Segundo Ouriques e Vieira (2017, p. 223), no período 1950-2014 o PIB per capita brasileiro oscilou entre 20% e 30% do PIB per capita dos EUA, para fins de comparação. Em 2017, o produto real per capita da manufatura do Brasil foi 25% inferior ao nível obtido em 1980, enquanto nos Estados Unidos foi cerca de 75% maior. (IEDI, 2019a). Até em relação aos países que, em 1950, estavam em semelhante condições econômicas, o Brasil continua "ficando para trás", evidenciando a manutenção de seu posicionamento semiperiférico.

O Coeficiente de Gini é um indicador de desigualdade, variando de 0 a 100. Quanto mais próximo de 100, mais desigual é a distribuição de renda no país. O do Brasil, ainda segundo Ouriques e Vieira (2017, p. 211), foi de 51,5 nos anos de 2010 a 2015, evidenciando que o Brasil possui uma das piores distribuições de renda no mundo, apenas superado por outros nove países.

Há também uma condicional sistêmica referente ao fato da permanência de alguns países nesse grupo. Os Estados periféricos

podem, individualmente, conseguir e conseguem cruzar o golfo que separa a riqueza modesta da semiperiferia da riqueza oligárquica do núcleo orgânico, como ocorreu com o Japão recentemente e com alguns outros antes do Japão (ARRIGHI, 1997, p. 219).

O problema é que como já dito, o sistema capitalista se posta fundamentalmente excludente, ou seja, não é possível que todos os Estados possam passar para a condição de núcleo orgânico e ascender a economias semelhantes à de países centrais.

Como verificado, é necessário apenas um breve levantamento de dados para verificar que o Brasil parece estar estacionado na posição semiperiférica e ainda está longe de alcançar os padrões de riqueza dos países do centro.

Além de já ser identificado há anos como um país periférico, a economia brasileira vem sofrendo uma diminuição nas atividades industriais mais intensivas em conhecimento. Em seguida, são apresentados alguns dados reforçando a ideia da desindustrialização brasileira como problema crônico.

Apesar de termos uma base industrial diversificada, não conseguimos acompanhar o progresso tecnológico que vinha sendo desenvolvido a nível mundial nos anos 1980 e 1990. O setor industrial vem perdendo participação no PIB do Brasil desde os anos 1980, denunciando um problema mais sistêmico em sua fundação que uma escolha partidária.

Em conjunto, os setores de maior intensidade tecnológica perderam 40% de peso no PIB desde 1980. Isso é grave e prejudicial ao desenvolvimento do país dado o dinamismo tecnológico destes setores presentes na economia brasileira.

As dificuldades dos últimos anos de instabilidade política (em especial 2014) apenas aprofundaram o problema, levando ao menor patamar real em que a indústria brasileira já teve desde 1947, conforme mostra a Figura 2 (IEDI, 2019a).

Figura 2 – PIB real da indústria de transformação e grau de industrialização, 1947- 2018

Fonte: IEDI, 2019a.

Em 2018, por exemplo, a indústria de transformação representou apenas 11,3% do PIB, isto é, quase a metade dos 20% registrados em 1976 a preços constantes. O recuo é de - 0,4%, na direção oposta da indústria mundial, que cresceu +3,6% (IEDI, 2019b). O país tem passado por um processo de regressão industrial dos mais intensos do mundo, o que tem resultado em baixo crescimento econômico e atrasos tecnológicos importantes.

Os resultados negativos da indústria brasileira têm aprofundado sua perda de espaço e relevância industrial a nível mundial. Em 2018, o país conservou sua colocação no ranking de maiores potencias industriais (em 9º lugar), mas o risco de sair desse panorama é real (IEDI, 2019b).

Nas primeiras colocações estão os países líderes da atual revolução tecnológica, como a China, EUA, Japão, Alemanha, Índia, Coréia do Sul, Itália e França.

O setor núcleo da terceira revolução industrial, de informática e eletrônicos, tem uma participação muito pequena na estrutura industrial do país, e demonstra pouco crescimento. Este setor era responsável por 0,5% do PIB do Brasil mensurado a preços básicos, enquanto nos Estados Unidos representou percentual do PIB 3,5 vezes maior. (IEDI, 2019a). Trata-se de

um setor chave para a quinta revolução tecnológica, pois representa a base e fornece infraestrutura para o paradigma tecnoeconômico atual.

Ou seja, os países que conseguiram investir o suficiente nesse setor-chave obtiveram mais facilidade ao “entrar na onda” da quinta revolução tecnológica. Para os países subdesenvolvidos, no entanto, o menor nível de renda per capita presente compromete a capacidade de aprimorar constantemente seu grau de sofisticação tecnológica, o que se mostra necessário. O processo de emparelhamento para os países subdesenvolvidos, deste modo, mostra-se cada vez mais complexo.

Nesse contexto atual de perda da participação industrial no PIB, é possível ver o Brasil caminhando para uma situação periférica, e não procurando fazer parte dos países centrais.