• Nenhum resultado encontrado

Foi visto, ao estudar os conceitos utilizados por Arrighi, que seus ciclos sistêmicos são fundamentalmente baseados na presença de uma nação que se apresentasse como "hegemônica" mundialmente, ainda que por períodos históricos limitados, graças à própria necessidade de ciclicidade do sistema em que são inseridas. O autor refere-se, por "hegemonia", à capacidade de um Estado nacional de exercer funções que o tornem um líder global às outras nações.

Em outra seção deste trabalho, foi observado que a análise política das nações hegemônicas feitas por Arrighi, ao discutir os ciclos sistêmicos, não é encontrada no trabalho de Perez. Mesmo ao estudar o papel do estado, ela o faz de modo prático, não se aprofundando em interesses de classes e disputa de poder, como o autor. Entretanto, é possível ver que isso ocorre pois o foco de Perez é outro: a autora faz um estudo aprofundado dos efeitos e trajetórias das tecnologias em nível mundial. Enquanto Arrighi dá importância às consequências econômicas das inovações tecnológicas (especialmente após o período das Revoluções Industriais na Inglaterra), ele não as estuda tão profundamente quanto Perez.

É certo que os autores partem de perspectivas analíticas divergentes para estudar um assunto em comum, a história econômica mundial. No entanto, mesmo com abordagens diferentes os autores chegam à conclusões bastante semelhantes.

Enquanto a teoria de Perez não coloca um “limite” à quantidade de países que podem usar as janelas de oportunidade para se desenvolver, segundo a própria interpretação da autora, as oportunidades foram aproveitadas por poucos países. Isso é provado pela rigidez do país-

núcleo de cada revolução tecnológica, como já visto na seção 3: a dupla Inglaterra-Estados Unidos não deixa espaço para a dinamização, e os progressos tecnológicos normalmente se disseminam a partir deles.

É claro que, como provado por países como Alemanha e Japão, que conseguiram se desenvolver, a dificuldade não inviabiliza a teoria das janelas de oportunidades presentes nas revoluções. No entanto, mostra certa rigidez à mudança de nação hegemônica e poder político, característica do sistema. Essa rigidez é bastante discutida por Arrighi, mostrando, assim, um ponto de encontro das duas teorias.

Ainda que na obra de Perez o enfoque não seja na hegemonia do país-núcleo de cada revolução tecnológica, vimos que as mesmas surgem em uma nação para depois se espalhar ao redor do mundo. O “big bang” que inicia as revoluções, para a autora, normalmente acontece nos países mais intensivos em conhecimento (mais ricos) e, conforme a revolução tecnológica avança e se torna mais próxima da fase de maturidade, o paradigma tecnoeconômico que a acompanha começa a se dissipar globalmente.

Já para Arrighi, é a divisão do trabalho no plano internacional que divide o mundo em núcleo orgânico - onde se realizam as atividades "cerebrais" - e periferia - onde se realizam as atividades "neuromusculares" (Haddad, 1997).

As atividades “cerebrais” são associadas ao fluxo de inovações que a concorrência capitalista sempre incentiva de maneira sistêmica. Essas atividades, realizadas nos países ricos, proporcionam aos agentes os ganhos superiores ao lucro médio proporcionado pelas atividades rotineiras “neuromusculares”.

Essas atividades “neuromusculares” são as desenvolvidas nos países fora do núcleo (periféricos e semiperiféricos), que são incentivados pelo próprio funcionamento do sistema a se manterem em suas condições menos beneficiadas.

Anteriormente, foi observado que as duas primeiras revoluções tecnológicas têm a Inglaterra como país-núcleo, enquanto as três posteriores tem seu início nos Estados Unidos. Em adição a isso, segundo Haddad (1997), “Para Arrighi, do mesmo modo que Schumpeter supôs que as inovações orientadas para o lucro e seus efeitos se agrupam "no tempo", podemos supor que se agrupem "no espaço".”

O agrupamento das inovações feito “no espaço” remete, novamente, aos países centrais. Significa precisamente o que a falta de dinamismo nas nações pioneiras nas revoluções tecnológicas deixa implícito: trata-se de um monopólio de conhecimento, técnico, científico e organizacional que perdura por décadas.

Esses países centrais se beneficiam, então, de uma riqueza de caráter oligárquico não- universalizável (Haddad, 1997). Isso indica que as tendências do processo implicam uma polarização na economia mundial, acentuando as diferenças entre a zona central e a zona periférica.

4.8 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nessa seção foram discutidas as semelhanças e diferenças entre as obras de Giovanni Arrighi e Carlota Perez afim de explicitar a sinergia presente entre as teorias. Vimos primeiramente que, seguindo autores precursores como Schumpeter (1982) e Kondratiev, ambos utilizam o longo prazo como instrumento de análise para estudarem a história econômica mundial.

Embora tenham o mesmo objeto de estudo, foi visto que os autores partem de escolas econômicas diferentes, o que representa uma segregação já presente na base de interpretação de ambos. Entretanto, mesmo com diferentes abordagens, os autores foram capazes de chegar a conclusões semelhantes.

Além disso, foi discorrido sobre o papel do Estado no processo de desenvolvimento econômico, utilizando outros autores.

Foi visto que as revoluções tecnológicas e os ciclos sistêmicos de acumulação se dão em períodos semelhantes, mesmo que sejam divergentes em duração: os CSAs de Arrighi são mais longos que as revoluções. Dentro do período de tempo do quarto CSA, por exemplo, Perez identifica três revoluções tecnológicas.

A duração não é a única diferença em relação às datas que ambos partilham; enquanto Arrighi analisa o sistema capitalista desde o século XV, Perez irá identificar paradigmas tecnoeconômicos somente a partir do século XVIII.

Nessa seção foi aprofundada a teoria das “janelas de oportunidade” de alcançar o desenvolvimento econômico que aparecem simultaneamente nas duas fases das revoluções tecnológicas, assim que um paradigma tecnoeconômico entra em transição. Esse olhar de possibilidades foi estendido ao caso do Brasil, cujos dados mostraram perda de participação da indústria no PIB (IEDI, 2019ª, 2019b) e uma reprimarização da economia, identificando que o país não se encontra pronto para usufruir da próxima janela de oportunidade da revolução tecnológica atual.

Por último, foi discorrido sobre o benefício não partilhado que as nações hegemônicas possuem, concluindo que a tendência sistêmica é de polarização e acentuação das diferenças entre os países do centro e os países periféricos – tendência essa observada ao analisar o caso brasileiro anteriormente.

5 CONCLUSÃO

A presente monografia se dedicou ao objetivo de analisar alguns conceitos-chave de Giovanni Arrighi e Carlota Perez para explorar a possibilidade de diálogo e junção entre as teorias.

Assim, foi visto na primeira seção do desenvolvimento desse trabalho todos os principais conceitos de Carlota Perez a respeito do desenvolvimento econômico com enfoque em tecnologia e inovação. Foi revisitado o que a autora considera como desenvolvimento econômico dentro da corrente teórica neo-schumpeteriana a qual ela pertence, suas definições de revoluções tecnológicas e dos paradigmas tecnoeconômicos que as acompanham. Após analisar a estrutura das revoluções, foi apresentada uma a uma todas as cinco revoluções tecnológicas identificadas por Perez ao decorrer da história econômica.

Já na segunda seção, há uma breve introdução à análise do Sistema-Mundo e o conceito de semiperiferia. Utilizou-se o enfoque sistêmico de Giovanni Arrighi para estudar a dinâmica do sistema capitalista desde seu início. O autor identifica o que ele chama de “ciclos sistêmicos de acumulação”, como uma continuidade, ciclicidade no processo de acumulação de capital em âmbito mundial, e coloca a nação hegemônica como o centro de sua análise.

O estudo bibliográfico feito nas primeiras seções se mostram necessários para a exploração da sinergia entre as obras feita na seção final do trabalho. Mesmo com divergências na perspectiva de cada autor, os dois discutem temas que geram agregações relevantes ao debate de desenvolvimento econômico através de suas análises históricas.

Foram explorados diversos pontos de convergência, e também de divergência, entre os conceitos usados pelos autores. Sobretudo, foram traçadas semelhanças entre as revoluções tecnológicas e os ciclos sistêmicos de acumulação. Foram abordados pontos desde o longo prazo como instrumento para a análise histórica, até a fundamental diferença na abordagem de Arrighi e Perez, uma vez que são de escolas de pensamento econômico distintas.

O estudo a respeito dos períodos compartilhados pelas revoluções tecnológicas e os CSAs mostra que as revoluções são, em média, mais curtas que os ciclos hegemônicos de Arrighi. Isso pode ser facilmente visto no terceiro e quarto CSA, por exemplo, que agregam duas e três revoluções tecnológicas no mesmo período, respectivamente.

Algo mais interessante que o agrupamento das revoluções nos ciclos sistêmicos denuncia, no entanto, é o “oligopólio” que os países centrais têm sobre o conhecimento técnico

e a capacidade de inovação. Apesar das diferenças exploradas na seção três, um ponto de encontro entre as revoluções e os CSAs é a falta de dinamismo e mudanças nos países considerados países-núcleo, tanto na teoria de Perez e na de Arrighi. Os mesmos países precursores das revoluções tecnológicas são identificados por Arrighi como as nações hegemônicas de cada CSA correspondente.

Com isso, o que se identifica é que os países centrais se beneficiam de uma facilidade de conseguir conhecimento tecnológico que é praticamente suficiente para se perpetuarem em suas posições como países do centro.

Adicionalmente, na terceira seção, Perez enxerga nas revoluções tecnológicas duas “janelas de oportunidades” que podem ser aproveitadas por países para realizarem um salto no desenvolvimento econômico. Essas janelas se dão nas duas fases identificadas por Perez para as revoluções tecnológicas, previamente discutidas e esquematizadas.

Através dos modelos teóricos propostos pelos autores e da análise de como se deu o desenvolvimento econômico para as nações hegemônicas – seja considerando poder político e econômico, ou levando em consideração potencial tecnológico e altas taxas de lucro –, que são apresentadas ao decorrer da monografia, o mais importante é levar o leitor ao pensamento de que tomar a dianteira do desenvolvimento econômico mundial ou mesmo conseguir progresso econômico o suficiente para equiparar-se às outras nações mostra-se um processo extremamente complexo. Tal processo somente se torna possível num ponto de convergência entre alinhamento de objetivos e estratégias condizentes do Estado, liquidez internacional, tudo à disposição no período identificado como janela de oportunidade.

Ou seja, para que o desenvolvimento seja alcançado por um país, é necessário que ele esteja não só no lugar certo – estratégico, geograficamente falando, conquistar uma posição central – mas também no período certo (vide análise das janelas de oportunidade nas revoluções tecnológicas).

O caso do Brasil foi analisado com o objetivo de dizer se o país estava apto a usar a janela de oportunidade da revolução tecnológica atual para se desenvolver economicamente. Com poucos indicadores já foi visto, no entanto, um processo de desindustrialização que coloca o país numa rota de volta à condição de periferia, e não na trajetória para tornar-se um país do núcleo. Deste modo, o país não está pronto para conseguir aproveitar a janela de oportunidade da revolução tecnológica atual.

Contudo, conforme visto ainda na terceira seção, as oportunidades para que os países fora do núcleo se desenvolvam mostram-se extremamente estreitas e restritivas. Conclui-se que,

enquanto há evidências históricas apoiando a teoria das janelas de oportunidades, com países que obtiveram sucesso e realizaram o catching up, o que também se é possível de observar é uma tendência cada vez mais contrária à ideia de possibilidade de se desenvolver, para os países periféricos. Essa tendência é a de polarização do sistema capitalista mundial entre países do centro e países periféricos, graças à facilidade em perpetuar a posição hegemônica que os países do núcleo exercem, sob o modo de um “oligopólio” das inovações orientadas para maiores níveis de lucratividade.

REFERÊNCIAS

ABRAMOVITZ, M. Catching-up, forging ahead and falling behind. Journal of Economic

History, New York, v. 46, n. 2, p. 385-406, 1986.

AREND, Marcelo. 50 anos de industrialização do Brasil (1955-2005): uma análise evolucionária. 273 p. Tese (Doutorado). Programa de Pós-Graduação em Economia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2009.

AREND, Marcelo. Revoluções tecnológicas, finanças internacionais e estratégias de

desenvolvimento: um approach neo-schumpeteriano. Ensaios FEE (Impresso). v. 33. p. 363- 396, 2012.

ARIENTI, W; FILOMENO, F. Economia política do moderno sistema mundial: as

contribuições de Wallerstein, Braudel e Arrighi. Ensaios FEE, Porto Alegre, v. 28, n. 1, p. 99-126, jul. 2007.

ARRIGHI, Giovanni. A ilusão do desenvolvimento. Local: Editora Vozes, 1997.

ARRIGHI, Giovanni. O Longo Século XX: Dinheiro, poder e as origens de nosso tempo. 10a ed. Local: Editora Contraponto, 2016.

ARRIGHI, G; SILVER, B. Caos e governabilidade no moderno sistema mundial. Rio de Janeiro: Contraponto; UFRJ, 2001.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR14724. Apresentação Gráfica. Rio de Janeiro, 2011.

CHANG, Hajoon. Chutando a escada. Local: UNESP, 2004.

CHANG, Hajoon. Maus Samaritanos: O mito do livre-comércio e a história secreta do capitalismo. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009.

CHESNAIS, François. Até onde irá a crise financeira. In: Primeiro dossiê de textos marxistas sobre a crise atual. Sociedade Brasileira de Economia Política, 2008a. DIAS, Rafael. O BRASIL E A EXPERIÊNCIA SUL-COREANA: UM RUMO ALTERNATIVO? Revista Redes, v. 14, n. 28, p. 195-219, nov. 2008.

DOSI, Giovanni. Technical Paradigms and Technological Trajectories: A Suggested Interpretation of the Determinants of Technical Change. Research Policy, Vol. 02, n. 03, p. 147-162, junho, 1982.

HADDAD, Fernando. O embate Arrighi x FHC. Local: Folha de São Paulo, nov. 1997. Disponível em: < https://www1.folha.uol.com.br/fsp/1997/11/30/mais!/26.html>. Acesso em: 18 nov. 2019.

INSTITUTO DE ESTUDOS PARA O DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL – IEDI. Um

Mal Brasileiro: declínio industrial em setores de maior tecnologia. Brasília: IEDI, 2019a.

INSTITUTO DE ESTUDOS PARA O DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL – IEDI.

Indústria: enquanto o mundo avança, o Brasil fica para trás. Brasília: IEDI, 2019b.

MARTINS, J. R. Immanuel Wallerstein e o sistema-mundo: uma teoria ainda atual? Local: Iberoamérica Social, 2015. Disponível em: <http://iberoamericasocial.com/immanuel-

wallerstein-e-o-sistema-mundouma-teoria-ainda-atual/>. Acesso em: 21 set. 2019. NORTH, Douglass. Instituições, Mudança Institucional e Desempenho Econômico. Tradução de Alexandre Morales. Local: Três Estrelas, 2018.

OURIQUES, H. R.; VIEIRA, P. A. A CONDIÇÃO SEMIPERIFÉRICA DO BRASIL NA ECONOMIA MUNDO CAPITALISTA: NOVAS EVIDÊNCIAS. Revista Carta

Internacional, v. 12, n. 3, p. 199-228, dez 2017. Disponível em:

<https://doi.org/10.21530/ci.v12n3.2017.711>. Acesso em: 13 nov. 2019.

RIBEIRO, L.C.S. Ciclos sistêmicos de acumulação arrighianos e a crise econômica de

2008: Será o fim do ciclo norte-americano? Local: Diálogo e Interação, v. 2, p. 1-12, 2009.

ROCHA, Igor Lopes. Falling Behind and Moving Ahead: The Brazilian and South Korean Process of Industrialization. Local: University of Cambridge, dec. 2015. Disponível em: <https://www.researchgate.net/publication/313502969_FALLING_BEHIND_AND_MOVIN G_AHEAD_THE_BRAZILIAN_AND_SOUTH_KOREAN_PROCESS_OF_INDUSTRIALI SATION>. Acesso em: 08 nov. 2018.

ROSTOW, W. W. The Stages of Economic Growth: A Non-Communist Manifesto. Cambridge, Inglaterra. University Press, 1960.

PÉREZ, Carlota. Mudanças tecnológicas e oportunidades para o desenvolvimento como um alvo móvel. Revista CEPAL, n. 75, p. 109-130, dez., 2001.

PÉREZ, Carlota. Revoluciones tecnológicas y capital financiero: la dinámica de las grandes burbujas financieras y las épocas de bonanza. México: Siglo XXI, 2004. p. 35-39.

PÉREZ, Carlota. Revoluções tecnológicas e paradigmas tecno-econômicos. Cambridge Journal of Economics, Vol. 84, n. 1, p. 185-202, jan., 2009.

PRODANOV, Cleber C. FREITAS, Ernani C. Metodologia do Trabalho Científico:

Métodos e Técnicas da Pesquisa e do Trabalho Acadêmico. 2a ed. Local: Editora Feevale,

2013.

SALOMON, D. V. Como fazer uma monografia. 11.ed. São Paulo: Martins Fontes, 2004. SCHUMPETER, J. A. A Teoria do Desenvolvimento Econômico: uma investigação sobre lucros, capital, crédito, juro e o ciclo econômico. Rio de Janeiro: Abril Cultural, 1982.

WALLERSTEIN, Immanuel. The Capitalist World-Economy. Local: New York, Cambridge University Press, 1979.

WALLERSTEIN, Immanuel. The Three Instances of Hegemony in the History of the

Capitalist World-Economy. International Journal of Comparative Sociology, Vol. 24, 1-2, p.