• Nenhum resultado encontrado

2.2 DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO RURAL

2.2.1 Desenvolvimento Rural e Agricultura

Já, o conceito de desenvolvimento rural não deve estar associado exclusivamente à dimensão agrícola, nem é concebido como um resíduo atrasado do urbano, mas sim é

necessário que a visão de rural seja destacada positivamente, e que a diversidade, a multifuncionalidade são marcas específicas dos espaços rurais, e que o campo tem um papel importante a desempenhar no desenvolvimento de qualquer país. Navarro (2001, p. 88) define desenvolvimento rural como “uma ação previamente articulada que induz (ou pretende induzir) mudanças em um determinado ambiente rural”.

O conceito de desenvolvimento rural não é entendido como modernização agrícola, nem como industrialização ou urbanização do campo. O desenvolvimento está associado à ideia de criação de capacidades humanas, políticas, culturais, técnicas etc., que permitam às populações rurais agir para transformar e melhorar suas condições de vida, por meio de mudanças em suas relações com as esferas do Estado, do mercado e da sociedade civil (BRASIL, 2013, p. 13).

A definição exata do termo “desenvolvimento rural” tem se alterado ao longo do tempo, porém, todas as definições destacam a melhoria do bem-estar das populações rurais como objeto principal desse desenvolvimento, onde as diferenças surgem das “estratégias escolhidas, na hierarquização dos processos (prioridades) e nas ênfases metodológicas” (NAVARRO, 2001, p. 88).

O debate a respeito da definição de desenvolvimento é praticamente inesgotável. Inúmeros fatores contribuem para o processo de desenvolvimento das áreas rurais, podendo destacar os seguintes elementos como os principais (VEIGA, 2001):

a) maior acesso à educação e a terra, com o intuito de elevar a renda e diminuir a pobreza;

b) Uma agricultura diversificada e um meio rural multifacetado proporcionam um maior desenvolvimento nas áreas rurais;

c) Uma maior concentração das atividadesdevido às vantagens da proximidade; d) Um conjunto de instituições bem alicerçadas, permitindo uma valorização do

território, e promovendo o desenvolvimento rural.

O desenvolvimento rural, por sua vez, deve ser entendido como um movimento em direção a um novo modelo para o setor agrícola, com novos objetivos, buscando a valorização crescente das economias de escopo em detrimento das economias de escala, o fortalecimento das sinergias com os ecossistemas locais, sempre buscando superar o paradigma da modernização da agricultura. O desenvolvimento rural deve implicar, necessariamente, na criação de novos produtos e serviços, estes vinculados a novos mercados, a necessidade de redução de custos a partir de novas trajetórias tecnológicas e a reconstrução da agricultura em

nível dos estabelecimentos, e da economia rural como um todo , conforme Ploeg et al. (2000) citado por Conterato et al., (2007).

O denominado novo enfoque do desenvolvimento rural, trata-se de uma abordagem apoiada no alargamento da abrangência espacial, ocupacional e setorial do rural. Os múltiplos níveis da nova abordagem do desenvolvimento rural estariam apoiados em seis mudanças gerais, todas elas relacionadas aos limites e problemas decorrentes do modelo agrícola produtivista:

a) o crescente inter-relacionamento da agricultura com a sociedade;

b) Uma necessidade urgente em definir um novo modelo agrícola, que seja capaz de valorizar as sinergias e a coesão no meio rural, permitindo a convivência de iniciativas e atividades diversificadas;

c) Um desenvolvimento rural capaz de redefinir as relações entre indivíduos, famílias e suas identidades, atribuindo, dessa forma, um novo papel aos centros urbanos e a combinação de atividades multiocupacionais;

d) Um modelo que redefina o sentido da comunidade rural e as relações entre os atores locais;

e) Um desenvolvimento rural que leve em conta a necessidade de novas ações de políticas públicas e o papel das instituições;

f) Levar em consideração as múltiplas facetas ambientais, buscando garantir o uso sustentável e o manejo adequado dos recursos (SCHNEIDER, 2003).

Portanto, o desenvolvimento rural deve ser compreendido como o fortalecimento das competências das comunidades rurais direcionadas a proporcionar-lhes os níveis de bem- estar, mas que esse bem-estar deve ser escolhido por eles próprios.

Historicamente, o mundo rural se destaca por se organizar em torno de uma tetralogia de aspectos bem conhecida:

a) uma função principal: a produção de alimentos; b) Uma atividade econômica dominante: a agricultura;

c) Um grupo social de referência: a família camponesa, com modos de vida, valores e comportamentos próprios;

d) Um tipo de paisagem que reflete a conquista de equilíbrios entre as características naturais e o tipo de atividades humanas desenvolvidas (SILVA; SHAFFRATH, 2012, p. 40).

Portanto, Silva e Shaffrath (2012) mostram como o rural era visto ou encarado antes, como sinônimo de agrícola ou de agrário, significava zona destinada exclusivamente para a

produção de alimento, enfim era visto como o atrasado, o oposto ao urbano. Chalita (2005) lembra que a noção de desenvolvimento rural surge posteriormente àquela de desenvolvimento agrícola (condições de produção relativas à atividade econômica específica) e àquela de desenvolvimento agrário (condições de produção na sociedade inerentes ao processo histórico e estrutural mais amplo). Por isso, é uma noção que traduz alterações políticas, sociais e econômicas influenciadas pelos novos condicionantes que o movimento mais geral da sociedade gradualmente impõe às populações e às atividades rurais, além das condições únicas da realização da prática econômica.

Promover o desenvolvimento rural significava o aumento da produtividade agrícola em índices mais elevados do que o crescimento populacional. Weisheimer (2013) afirma que a partir da década de 1950, começou a se acelerar o processo de industrialização da agricultura e de formação do complexo agroindustrial, provocando mudanças profundas na estrutura da produção e da comercialização agropecuária.

Segundo Rosa (1999), as propostas de desenvolvimento rural apresentavam, até as últimas décadas, um amplo enfoque de estratégia agrícola, que previa ocupação e colonização de novas terras, aberturas de fronteiras agrícolas, introdução de novos produtos para o mercado, projetos de irrigação, incentivo à agropecuária, à agroindústria, políticas agrícolas com base em produtos etc. Este conceito de desenvolvimento rural partia da suposição que predominou no país durante muitas décadas, de que a tecnologia, aliada ao capital, é que promove o desenvolvimento.

Para se alcançar a tal almejada industrialização da agricultura, Weisheimer (2013) diz que foram lançados um conjunto de medidas que resultaram no desenvolvimento de novas tecnologias voltadas à ampliação da produtividade de produtos agrícolas que ficou conhecida por “Revolução Verde”. Esta se constituiu sob um novo padrão tecnológico para a agricultura, rompendo com os processos produtivos do passado, impondo aos agricultores uma nova racionalidade técnica e econômica, mercantilizando a vida social e minando com a relativa autonomia setorial que a agricultura teria experimentado antes do amplo desenvolvimento das relações capitalistas na agricultura em escala planetária.

Fica patente que o desenvolvimento rural era medido através do nível crescente da produtividade dos produtos agrícolas, do aumento do mercado exportador e da balança comercial. Portanto, abrange outras tantas atividades além da agricultura e, contrariamente do que o senso comum diz, não é sinônimo de agrícola, mas sim a atividade agrícola é fator de dinamização de outros setores da atividade.

A compreensão da forma pela qual são dinamizadas às relações socioeconômicas no meio rural e no seu entorno, pode acontecer, de acordo com Frantz e Silva Neto (2005, p. 111), “pela avaliação da potência, assim as atividades não-agrícolas presentes na região, passando a ter papel decisivo para o desenvolvimento rural”. O valor agregado que é gerado pela atividade agrícola responsabiliza-se, para Silva Neto e Basso (2005), por efeitos diretos, indiretos e induzidos sobre a economia de uma região. Os efeitos indiretos dizem respeito à geração de valor agregado pela agricultura que, em parte, é apropriado sob a forma de renda agrícola pelos agricultores, e, em parte, é distribuído entre agentes relacionados à dinâmica produtiva (como é o caso do Estado, bancos e trabalhadores). O efeito indireto na economia de uma região é representado pelo valor agregado que é gerado pela atividade agrícola em segmentos de montante e jusante da agricultura, já que a atividade consome insumos e abastece atividades de transformação. Por fim, o efeito induzido sobre a economia é proporcionado pelo gasto em bens e serviços, no local do valor agregado pela agricultura.

Dessa forma, os efeitos diretos e induzidos da produção agrícola responsabilizam-se por estimular atividades não-agrícolas em um dado território e, assim proporcionar seu desenvolvimento (FRANTZ; SILVA NETO, 2005; BASSO, 2005).

Portanto, é necessário que haja uma política de fomento dos pequenos agricultores ao longo do tempo, isso fará certamente com que a produção e a distribuição mais equitativas do valor agregado sejam maiores. Assim sendo, o valor agregado gerado poderá originar uma dinâmica econômica e social local importante, podendo promover, por exemplo, processos de urbanização por multiplicação de pequenas empresas industriais e comerciais, organização e oferta de serviços de saúde, educação etc., em suma, ajudando na redução em grandes proporções dos problemas sociais locais.

Pode-se dizer que o espaço rural sofre mudanças de caráter multidimensional, ou seja, deixa de ser visto apenas pela ótica econômica ou do ponto de vista da produção agropecuária. Em outras palavras, Rosa (1999) afirma que o espaço rural passa a ser visto como um mundo rural diferente e novo, e como um espaço de produção e consumo da sociedade urbano-industrial, onde o campo pode se tornar referência de um “bom lugar de vida”. Novas possibilidades de exploração do meio, como a de oferecer para a população citadina, novas formas de lazer associadas ao convívio com o meio ambiente natural, que podem ser incorporadas como: pesqueiros, pousadas rurais e áreas verdes para caminhadas, atividades econômicas ligadas ao turismo ecológico ou rural, etc.

Schneider (2003) menciona que os empregos rurais não-agrícolas representam 40% das rendas dos habitantes do meio rural latino-americano. Para o Brasil, Graziano da Silva

(1996) mostra que a população economicamente ativa rural, entre 1985 e 1995, cresceu a uma taxa de 0,4% ao ano, muito menor que a taxa de crescimento urbano, de 2,5% ao ano. Paralelamente, considerando os empregados em atividades agrícolas entre 1992 e 1995, a população rural diminuiu 0,5% ao ano, enquanto a atividade não-agrícola no meio rural teve um crescimento de 3,5% ao ano, compensando as perdas de postos de trabalho que ocorriam no setor produtivo agrícola.

Estas informações trazidas por Scheneider (2003) e Graziano (1996), mostram um processo de diversificação das formas de ocupação no meio rural brasileiro, que resultam das novas dinâmicas espaciais possibilitadas por processos técnicos e organizacionais que caracterizam a nova estratégia de acumulação. Neste sentido, Weisheimer (2013) afirma que a busca das empresas por relações de trabalho mais flexíveis é a principal indutora dos processos de industrialização difusa, que estão alterando as características espaciais da divisão social do trabalho e transformando o meio rural em um espaço não exclusivamente agrícola.

É o que Graziano (1997) chama de novo rural, que é basicamente caracterizado pelo crescimento das atividades não agrícolas no seu espaço e seu ator principal seria o agricultor ou família rural, que exerce múltiplas atividades (a chamada pluriatividade). Desta forma, a dinâmica não seria mais dada pelo crescimento agrícola e sim pelas dinâmicas de crescimento das atividades não-agrícolas.

Sobre a situação do rural brasileiro, Graziano (1997) afirma que esse meio se urbanizou nas duas últimas décadas, como resultado do processo de industrialização da agricultura de um lado, e de outro, pelo transbordamento do mundo urbano naquele espaço que tradicionalmente era definido como rural. Como resultado desse duplo processo de transformação, a agricultura, que antes podia ser caracterizada como um setor produtivo relativamente autárquico com seu próprio mercado de trabalho e equilíbrio interno, integrou- se no restante da economia a ponto de não mais poder ser separada dos setores que lhe fornecem insumos e/ou compram seus produtos.

Portanto, fica mais que claro que o novo rural não se restringe mais àquelas atividades relacionadas à agropecuária e à agroindústria. Hoje, o meio rural vem ganhando novas funções nomeadamente as agrícolas e não-agrícolas, e vem oferecendo novas oportunidades de trabalho e renda para famílias que residem nessas regiões. Agora, a agropecuária moderna e a agricultura de subsistência dividem espaço com um conjunto de atividades ligadas ao lazer, prestação de serviços e até à indústria, reduzindo-se deste modo, cada vez mais, os limites entre o rural e o urbano.