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2.1 ABORDAGEM SISTÊMICA E DESENVOLVIMENTO RURAL

2.1.2 Sistemas Agrários

Segundo Spedding (19802) citado em Porto (2003, p. 19), existem tantas coisas diferentes que podem legitimamente se considerar como sistema (uma vaca, uma propriedade agrícola etc.), o que nos leva a concluir que qualquer objeto pode ser um sistema. São as propriedades dos sistemas que fundamentalmente importam, pois são elas que acabam por assinalar os seus contornos.O autor resume essas propriedades na frase: “comportamento como um todo em resposta a estímulos em qualquer parte”. Portanto, é o relacionamento entre as partes e a resposta destas quanto aos estímulos externos que determinam os contornos de um sistema. Porém, como, muitas vezes, torna-se impossível estudar sistemas completos, o conhecimento para a identificação de subsistemas (o estudo isolado de partes do sistema) é fundamental. Há subsistemas que, por causa do papel que representam no sistema completo, merecem ser estudados separadamente.

Como argumentam MAZOYER e ROUDART (2010, p. 70), um sistema é formado por um conjunto de elementos que possuem variáveis e características que têm relações entre si e com o ambiente. O pensamento sistêmico leva em conta as categorias como o espaço (situação como estão postas as coisas no ambiente), a paisagem (como sendo uma construção pessoal do espaço concreto) e o território (espaço que possui uma gestão social).

As formas de agricultura observáveis aparecem como objetos muito complexos que podem ser analisados e concebidos em termos de sistemas. Ao se analisar e conceber um objeto complexo em termo de sistema é, em um primeiro momento delimitá-lo, ou seja, traçar uma fronteira virtual entre esse objeto e o seu entorno e é considerá-lo como um todo,

2 SPEDDING, C. R. W. Sistemas agrários. Zaragoza: Acribia, 1980. Disponível em: < Disponível em

:http://speed-test.co.s79942.gridserver.com/wp-content/uploads/2012/09/nathan-216073-v1- private_investment_in_the_agriculture_sector_portuguese.pdf>. Acesso em: 23 dez. 2017.

composto de subsistemas hierarquizados e interdependentes (MAZOYER; ROUDART, 2010, p. 71).

Para Maigrot e Poux (19913) citado por Miguel (2009, p. 23), o conceito de sistema agrário é o mais apto a restituir a região a seu conjunto e à sua dinâmica. É um conceito em que se encontram as ciências necessárias para a concepção de projetos de desenvolvimento: Economia, Socioeconomia, Geografia, História e Agronomia. A pertinência do conceito como ferramenta de desenvolvimento está em sua visão globalizante. Um dos primeiros objetivos do diagnóstico de um sistema agrário é propor uma hierarquia nas dificuldades do desenvolvimento.

Miguel (2009) afirma que cabe a Mazoyer (1986) apresentar a definição de sistema agrário mais atual, completa e ampla no âmbito das Ciências Agrárias. Para Mazoyer (1986), um sistema agrário é definido como sendo um modo de exploração do meio historicamente constituído e durável, um conjunto de forças de produção adaptado às condições bioclimáticas de um espaço definido e que responde às condições e às necessidades sociais do momento.

De acordo com Mazoyer e Roudart (2010), o sistema agrário pode ser conceituado como o instrumento intelectual que permite apreender a complexidade de toda forma de agricultura real pela análise metódica de sua organização e de seu funcionamento. Ainda segundo os autores, este conceito permite também classificar inúmeras formas de agricultura identificáveis no passado ou observáveis no presente em um limitado de sistemas, caracterizados cada um por um gênero de organização e funcionamento.

Um sistema agrário deve ser entendido como a inter-relação das seguintes variáveis: a) o meio cultivado, ou seja, o meio original e as suas transformações historicamente

sofridas;

b) Os instrumentos de trabalho utilizados, isto é, as ferramentas, as máquinas, os materiais biológicos (as plantas cultivadas e os animais domésticos) e a força do trabalho social;

c) O modo de artificialização do meio que resulta na reprodução e na exploração do ecossistema cultivado;

d) A divisão social do trabalho entre a agricultura, o artesanato e a indústria; e) Os excedentes agrícolas;

f) As relações de troca entre os ramos associados, ou seja, as relações de propriedade, as de força que regulam a divisão dos produtos do trabalho, dos bens de produção e

3 MAIGROT, J.-L; POUX, X. Les systèmes agraires du plateau de Langres – Chatillonnais. Dijon: CDDP de

dos bens de consumo, e as de troca entre os sistemas concorrentes (MAZOYER; ROUDART, 2010, p. 72).

Portanto, a análise dos sistemas agrários, de um espaço agrário, parte do pressuposto de que analisar e explicitar um objeto é também estudar à sua dinâmica de evolução através do tempo e as relações que esse sistema mantém com o resto do mundo nos seus diferentes estágios de evolução.

Analisar e conceber em termos do sistema agrário, a agricultura praticada em um momento e lugar consiste em decompor essa mesma agricultura em dois subsistemas principais: o ecossistema cultivado e o sistema social produtivo, estudando tanto a organização e o funcionamento de cada um desses subsistemas, como suas inter-relações (MAZOYER; ROUDART, 2010, p. 72).

De modo geral, a primeira etapa de um diagnóstico de sistemas agrários consiste na realização de um zoneamento desse espaço, isto é, de um zoneamento regional. O zoneamento consiste no ordenamento estruturado e sistemático, que resulta do processo de identificação de um espaço geográfico no qual, os elementos do tipo ecológico e do tipo antrópico se articulam entre si de maneira organizada e finalizada. O espaço geográfico deve necessariamente ser definido e delimitado de maneira clara e precisa pelo observador/pesquisador, na forma de uma ou várias paisagens agrárias. É importante ressaltar que tal delimitação do espaço geográfico é uma “construção”progressiva, segundo as necessidades e interesses do observador/pesquisador. Deve-se igualmente proceder à caracterização do espaço geográfico com uma descrição das diferentes “paisagens agrárias”, e de suas características fundamentais do ponto de vista geomorfopedológico, natural e humano (MIGUEL, 2009, p. 134).

De acordo ainda com Mazoyer e Roudart (2010), o ecossistema cultivado possui uma organização: ele é composto por vários subsistemas complementares e proporcionados, por exemplo, as hortas, as terras cultiváveis, os campos de ceifa, as pastagens e as florestas. Cada um desses subsistemas é organizado, cuidado e explorado de maneira particular, e contribui, por sua vez, para a satisfação das necessidades dos animais domésticos e dos homens.