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Desenvolvimento Sustentável e Agricultura Familiar

No documento PROJETO VIDA NO CAMPO (páginas 136-140)

Agenda 21 Brasileira em ação

29. Desenvolvimento Sustentável e Agricultura Familiar

Os agricultores familiares são sujeitos excluídos do atual modelo de desenvolvimento e, como conseqüência, não têm acesso aos benefícios da sociedade brasileira e regional. Migrantes forçados pela dinâmica da penetração capitalista no campo colonizaram inúmeras regiões, em especial a “fronteira agrícola” do país. Sua sobrevivência social e econômica, bem como dos recursos naturais dos quais sobrevivem, continua ameaçada pelo mesmo modelo concentrador de riquezas.

Nesse processo de mudança e reconstrução do conhecimento, chama a atenção que essa capacidade de sobrevivência ocorre em condições de exclusão social, econômica e tecnológica. Sem o estímulo (ou com pouco) e contribuições de insumos externos ao estabelecimento agrícola, sejam eles financeiros, biológicos, físicos, químicos e de informação. Esse contexto levaria a crer que esses sujeitos não conseguiriam produzir e se reproduzir em função dessa exclusão, no entanto, essa capacidade de operarem no vermelho, do ponto de vista da economia, indica que há um conjunto de fatores no uso dos recursos que confere ao estabelecimento agrícola familiar uma condição de sustentabilidade.

A primeira referência que deve ser citada, por ser a mais difundida e por se constituir em um marco na discussão sobre sustentabilidade, é a definição encontrada no Relatório Brundtland (“Nosso Futuro Comum”): “desenvolvimento sustentável significa atender às necessidades do presente, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de atender suas próprias necessidades”. (World Comission on Environment and Developmet – WCED, 1987).

A preocupação com a sustentabilidade, mesmo ainda sem esse rótulo, vem de longa data. A humanidade sempre interagiu com o meio ambiente, e conseqüências negativas, de maior ou menor grau, sempre aconteceram. Alguns autores notavam isso. Pode-se citar, o abandono de cidades suméricas em função da salinização do solo pela irrigação, por volta de 1.700 a.C.; a observação de Platão sobre a erosão das colinas da Ática em conseqüência do desmatamento para o uso de lenha e constituição de pastagens, há cerca de 2.400 anos. Howard (1950), menciona o desaparecimento de algumas civilizações, inclusive a decadência do Império Romano, devido a um relacionamento “não sustentável” com o meio ambiente.

O que tradicionalmente se entende por desenvolvimento é o conjunto de transformações técnicas que visam aumentar a produção, gerando riquezas e melhorando as condições sociais. Porém o que se tem observado é que o desenvolvimento que segue a revolução industrial leva o ser humano a depender cada vez mais de tecnologias complexas e aumentar a cisão entre a humanidade e a natureza, sendo o meio natural muitas vezes visto como um obstáculo ao desenvolvimento econômico. Além dos problemas ambientais gerados pelo

“desenvolvimento”, graves problemas sociais também são gerados, como se demonstra pela crescente pobreza e populações que arrastam suas vidas abaixo dos níveis mínimos de subsistência. Além disso, é preciso destacar que as identidades culturais são afetadas em grande medida.

A ciência contemporânea dá ênfase nos aspectos quantitativos e o seu desprezo pelos aspectos qualitativos, quando são justamente estes os mais essenciais. A própria vida se caracteriza pela sua essencialidade qualitativa, como o são a busca de bem-estar coletivo ou de felicidade individual, ou qualquer outro critério que possamos tomar como motivador, em última instância, das ações individuais ou coletivas.

O que se pretende abordar seria justamente a sustentabilidade ou não do processo de desenvolvimento capitalista no que diz respeito a esse fluxo e refluxo energético à luz da característica expansionista contemporânea do desenvolvimento.

Para que o desenvolvimento contemporâneo seja sustentável, é preciso que ocorra sustentabilidade social, econômica, ecológica, espacial e cultural.

Sustentabilidade Social

Se entende como a criação de um processo de desenvolvimento que seja sustentado por um outro crescimento e subsidiado por uma outra visão do que seja uma sociedade boa. A meta é construir uma civilização com maior eqüidade na distribuição de renda e de bens, de modo a reduzir o abismo entre os padrões de vida dos ricos e pobres.

Sustentabilidade Econômica

Deve ser tornada possível através da alocação e do gerenciamento mais eficientes dos recursos e de um fluxo constante de investimentos públicos e privados. Uma condição importante é a de ultrapassar as configurações externas negativas resultantes do ônus do serviço da dívida e da saída líquida de recursos financeiros do Sul, dos termos de troca desfavoráveis, das barreiras protecionistas ainda existentes no Norte e do acesso limitado à ciência e a tecnologia. A eficiência econômica deve ser avaliada em termos macrossociais, e não apenas através do critério da rentabilidade empresarial de caráter microeconômico.

Sustentabilidade Ecológica

Pode ser melhorada utilizando-se das seguintes ferramentas:

• Ampliar a capacidade de carga da espaço-nave Terra, através da criatividade, isto é, intensificando o uso do potencial de recursos dos diversos ecossistemas, com um mínimo de danos aos sistemas de sustentação da vida.

• Limitar o consumo de combustíveis fósseis e de outros recursos e produtos que são facilmente esgotáveis ou danosos ao meio ambiente, substituindo-os por recursos ou produtos renováveis e/ou abundantes, usados de forma não agressiva ao meio ambiente.

• Reduzir o volume de resíduos e de poluição, através da conservação de energia e de recursos e da reciclagem.

• Promover a autolimitação no consumo de materiais por parte dos países ricos e dos indivíduos em todo o planeta.

• Intensificar a pesquisa para a obtenção de tecnologias de baixo teor de resíduos e eficientes no uso de recursos para o desenvolvimento urbano, rural e industrial.

• Definir normas para uma adequada proteção ambiental, desenhando a máquina institucional e selecionando o composto de instrumentos econômicos, legais e administrativos necessários para o seu cumprimento.

Sustentabilidade Espacial

Deve ser dirigida para a obtenção de uma configuração rural urbana mais equilibrada e uma melhor distribuição territorial dos assentamentos humanos e das atividades econômicas com ênfase no que segue:

• Reduzir a concentração excessiva nas áreas metropolitanas.

• Frear a destruição de ecossistemas frágeis, mas de importância vital, através de processos de colonização sem controle.

• Promover a agricultura e a exploração agrícola das florestas através de técnicas modernas, regenerativas, por pequenos agricultores, notadamente através do uso de pacotes tecnológicos adequados, do crédito e do acesso ao mercado.

• Explorar o potencial da industrialização descentralizada, acoplada a nova geração de tecnologias, com referência especial às indústrias de biomassa e ao seu papel na criação de oportunidades de emprego não agrícolas nas áreas rurais. Nas palavras de M.S. Sucaminathan: “uma nova forma de civilização baseada no uso sustentável de recursos renováveis não é apenas possível mas essencial”.

Sustentabilidade Cultural

Incluindo a procura de raízes endógenas de processos de modernização e de sistemas agrícolas integrados, processos que busquem mudanças dentro da continuidade cultural e que traduzam o conceito normativo de ecodesenvolvimento em um conjunto de soluções específicas para o local, o ecossistema, a cultura e a área.

Partindo da conceituação, hoje aceita por todos que trabalham com a questão da sustentabilidade, a agricultura sustentável, na sua concepção mais idealista, além do enfoque técnico-produtivo (que envolve o econômico), não pode prescindir dos enfoques ambiental (associado à exploração dos recursos naturais) e social (ligado à concentração dos meios de produção). Observe-se que, nestes termos, fala-se de um paradigma inserido num novo modelo de desenvolvimento, onde o tripé economicamente viável, socialmente justo e ecologicamente equilibrado, tenha força para sobrepor a dinâmica acumulação/concentração de capitais/lucro.

No documento PROJETO VIDA NO CAMPO (páginas 136-140)