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No século XX, em meio à contraditória expansão do capitalismo monopolista mundial um dos mais proeminentes economistas burgueses, o austríaco Joseph A. Schumpeter (1961), formularia um dos conceitos mais utilizados pela economia política nas últimas décadas. Preocupado com a nítida contradição entre as formulações harmoniosas da economia tradicional neoclássica e as visíveis turbulências da nova fase do sistema capitalista mundial, Schumpeter (1961) inovaria em suas elaborações teóricas ao propor um modelo de análise distinto dos equilibrados manuais de economia neoclássica.

Como sabemos a tradição econômica neoclássica entende o conjunto do sistema econômico capitalista e as relações de transações e trocas estabelecidas entres seus agentes como um perfeito equilíbrio propiciado pelas condições do mercado livre. Nesse contexto a vida econômica capitalista é entendida como que fluindo através de canais que, interligando empresas e unidades familiares, caracterizavam o chamado fluxo circular de renda. Sob essa perspectiva a economia de mercado, franqueado de empecilhos à livre concorrência, conduziria a sociedade capitalista a um equilíbrio econômico no qual os canais de interação e os tipos de fluxos não sofreriam mudanças significativas e substanciais no decorrer do tempo. Marshall (1985, p. 55), por exemplo, considerava que “[...] os fenômenos econômicos (assim como os fenômenos naturais - CHM) são configurados por processos lentos, contínuos e graduais, sem a ocorrência de grandes saltos (Natura non facit saltum) [...]”.

Essas elaborações harmônicas da economia neoclássica, desde o surgimento da fase imperialista do capitalismo, chocavam-se continuamente

com um sistema produtivo cada vez mais dominado pelo monopólio e que apresentava visíveis contradições que ora ocasionavam crises, recessões e guerras; ora permitiam saltos tecnológicos e inovações sem precedentes na produção de mercadorias. Schumpeter (1961) ao perceber, por um lado, o visível paradoxo entre o desenvolvimento capitalista de seu tempo e as teorias ortodoxas da economia liberal e, por outro, o avanço das análises marxistas, desenvolveu uma nova corrente que possibilitou renovar as análises da economia política burguesa. Assim, diferentemente da tendência neoclássica ao equilíbrio espontâneo do mercado, Schumpeter defendia outro entendimento sobre o desenvolvimento capitalista. Dizia ele:

O desenvolvimento, no sentido em que o tomamos, é um fenômeno distinto, inteiramente estranho ao que pode ser observado no fluxo circular ou na tendência para o equilíbrio. É uma mudança espontânea e descontínua nos canais do fluxo, perturbação do equilíbrio, que altera e desloca para sempre o estado de equilíbrio previamente existente. [...] Essas mudanças espontâneas e descontínuas no canal do fluxo circular e essas perturbações do centro do equilíbrio aparecem na esfera da vida industrial e comercial, não na esfera das necessidades dos consumidores de produtos finais. (SCHUMPETER, 1982, p. 47-48).

Em primeiro lugar, para Schumpeter (1961) o capitalismo é inerentemente um sistema “evolutivo” que precisa se expandir e aumentar a produção para continuar existindo. “O ponto essencial que se deve ter em conta é que, ao tratar do capitalismo, tratamos também de um processo evolutivo. [...] um fato tão evidente que, além disso, há muito tempo foi salientado por Karl Marx.” (Schumpeter, 1961, p. 109). Para o autor não era a concorrência livre e a “competição perfeita” que garantia por si só esse processo de avanço da produção capitalista, mais sim a capacidade dos empreendimentos privados, e inclusive dos grandes monopólios empresariais, em concentrarem capitais e desenvolverem contínuas inovações produtivas.

O impulso fundamental que põe e mantém em funcionamento a máquina capitalista procede dos novos bens de consumo, dos novos métodos de produção ou transporte, dos novos mercados e das novas formas de organização industrial criadas pela empresa capitalista. [...] na realidade capitalista e não na

descrição contida nos manuais, o que conta não é [...] (a concorrência perfeita - CHM), mas a concorrência de novas mercadorias, novas técnicas, novas fontes de suprimento, novo tipo de organização (a unidade de controle na maior escala possível, por exemplo) — a concorrência que determina uma superioridade decisiva no custo ou na qualidade e que fere não a margem de lucros e a produção de firmas existentes, mas seus alicerces e a própria existência. (SCHUMPETER, 1961, p. 110 e 112)

De acordo com o autor esse desenvolvimento contínuo da economia capitalista em busca das inovações produtivas longe de ser guiado por uma evolução natural e harmoniosa é o resultado de um processo cheio de contradições e descontinuidades. Nas palavras do autor,

[...] é uma história de revoluções, como o é a história da indústria de ferro e aço, desde o forno de carvão vegetal até os tipos que hoje conhecemos, a história da produção da eletricidade, da roda acionada pela água à instalação moderna, ou a história dos meios de transporte, que se estende da antiga carruagem ao avião que hoje corta os céus. A abertura de novos mercados, estrangeiros e domésticos, e a organização da produção, da oficina do artesão a firmas, como a U.S. Steel, servem de exemplo do mesmo processo de mutação industrial [...] que revoluciona incessantemente a estrutura econômica a partir de dentro, destruindo incessantemente o antigo e criando elementos novos. (SCHUMPETER, 1961, p. 110)

A esse longo processo de retrocessos e avanços que acompanha o desenvolvimento capitalista Schumpeter (1961) chamou de “Destruição Criadora”. Segundo ele, “[...] Este processo de destruição criadora é básico para se entender o capitalismo. É dele que se constitui o capitalismo e a ele deve se adaptar toda a empresa capitalista para sobreviver.” (SCHUMPETER, 1961, p. 110). Do processo de “destruição criadora” nasceriam os grandes “empreendedores” capitalistas que de posse de grandes recursos financeiros poderiam proporcionar o ambiente adequado para a proliferação de grandes inovações tecnológicas que guiariam a economia a novas fases de crescimento econômico e social.

Foi assim, que para defender o capitalismo como o sistema econômico mais adequado para o avanço civilizatório e democrático da humanidade Joseph Schumpeter (1961) afirmou nas suas teorias que o desenvolvimento

capitalista evoluía através de um processo contraditório de rupturas traumáticas, mas que quando analisado a longo prazo também produzia saltos revolucionários em direção ao progresso econômico e social da humanidade. Assim, segundo o autor, as diversas crises periódicas e desumanidades cometidas em nome da economia capitalista seriam compensadas pelo posterior crescimento industrial e pelo desenvolvimento das forças produtivas da humanidade.

Neste pobre resumo da rica elaboração de Joseph Schumpeter sobre o processo capitalista de “destruição criadora” podemos observar como a economia política burguesa procurou justificar durante um bom tempo a contraditória dinâmica de desenvolvimento do capitalismo na sua fase imperialista. Fase esta que apesar de possibilitar o aparecimento de grandes crises econômicas – base material para a explosão de duas devastadoras guerras mundiais – contraditoriamente também ofereceu as condições para que posteriormente o capitalismo vivesse um período de crescimento econômico relativamente contínuo e duradouro para vários países centrais e algumas economias periféricas.

Na entrada do capitalismo monopolista na fase do capitalismo tardio (MANDEL, 1982), ou seja, com o período pós-segunda guerra mundial (1945 – 1970) a adoção das chamadas políticas keynesianas previram o controle estatal de alguns elementos contraditórios do sistema fazendo com que a economia capitalista mundial alcançasse, durante três décadas seguidas, grandes saltos de crescimento econômico. Fase que Mandel (1982) chamou de “onda longa de expansão”, mas que os economistas burgueses preferiram nomear como uma “idade de ouro do capital”. Uma onda de crescimento econômico aparentemente tão sólida que grandes intelectuais passaram a defender, não só o processo de “destruição criadora”, mas também que o mundo assistia a uma nova forma de desenvolvimento capitalista baseada na racionalização da economia pelo Estado.

É nesse sentido, que em 1944, o grande intelectual Karl Pollanyi publicou seu livro chamado “A grande transformação”, ocasião em que fez uma das mais duras críticas não-marxistas ao pensamento liberal e a chamada economia de mercado. Na sua obra Pollanyi (2000) acenava com a esperança

de que, com base no keynesianismo europeu e no “New deal” norte-americano, poderíamos brevemente anunciar o começo de uma nova era de grandes conquistas para a humanidade. Segundo ele, o mundo estava prestes a assistir à retomada e o controle racional da economia pela sociedade organizada através do Estado.

Da mesma forma, como vimos no capítulo anterior, nessa época as

ideologias desenvolvimentistas nos países periféricos, como o Brasil,

ancoraram suas promessas de uma modernização planejada como redentora das limitações subdesenvolvidas nitidamente pegando carona na fase áurea do capitalismo mundial.

A crença em uma economia capitalista baseada no desenvolvimento econômico planejado, racional e contínuo não atingiu apenas a intelectualidade burguesa. Chegando a influenciar intelectuais filiados ao espectro da tradição marxista como Hebert Marcuse36 e Lucien Goldmann37 entre outros. Na década de 60, estes autores, ao contemplarem a conjuntura de crescimento, diminuição das crises, intervenção estatal e integração social-democrata das massas trabalhadoras esses teóricos pensaram estar diante de um capitalismo auto-regulado e racional ou no conceito consagrado um “capitalismo organizado” ou “harmonizado”38.

Seria, contudo, um grande erro para o pensamento marxista interpretar a ausência esporádica de crises extremas ou de tempestades de súbita irrupção como evidência de uma transição para um capitalismo saudável e civilizado. Até porque, como vimos anteriormente, os ganhos para a classe trabalhadora de alguns países da Europa não foram universalizados, nem com os trabalhadores europeus, nem com a massa trabalhadora dos países periféricos que tiveram que se contentar com uma industrialização pouco civilizatória.

Diferentemente das análises epidérmicas da economia política burguesa sabemos que no capitalismo a realização das necessidades sociais está subsumida a realização da mais-valia. Fica claro assim que durante o período histórico de expansão capitalista o que houve foi uma combinação, forçada

36 MARCUSE, Herbert. A ideologia da sociedade industrial. Rio de Janeiro: Zahar, 1969. 37 GOLDMANN, Lucien. Ciências Humanas e Filosofia. São Paulo: Difel, 1967.

38 Para uma análise crítica sobre essa ideologia de um “capitalismo harmonizado” ver:

pela ameaça de avanço dos movimentos socialistas pela Europa, entre a reprodução ampliada do capital, através da criação de valores de troca, e a produção social em larga escala de valores de uso indispensáveis ao estabelecimento das necessidades. Como ressalta Meszaros (2002), enquanto ocorreu essa “confluência forçada” entre produção de mercadorias e o estabelecimento de necessidades, o sistema capitalista ao perseguir seus interesses privados mercantis pôde cumprir seu papel civilizador de atender necessidades sociais aumentando as forças produtivas da sociedade enquanto ao mesmo tempo acumulava lucros crescentes. Assim, por este período, nos países centrais, foi possível ao movimento organizado dos trabalhadores forçar alguns ganhos civilizatórios do capital.

Mas a expansão desenfreada da economia capitalista nessa fase de ascensão histórica não podia ser sustentada indefinidamente. Já no final da década de 60 o capitalismo começava a dar sinais de esgotamento da “onda longa expansiva”. O primeiro teórico marxista a indicar tal inflexão foi Ernest Mandel. Em sua obra de 1972, O Capitalismo Tardio, Mandel já apontava indícios do esgotamento da “onda longa expansiva” e da entrada do capitalismo numa nova fase de estagnação e baixo crescimento, ao qual nomeou de “onda longa de estagnação” ou “onda longa depressiva”. Segundo o autor,

Desde o início do que chamei de a onda longa depressiva, isto é, desde o ano de 1974, quando começa a primeira recessão generalizada na economia capitalista internacional depois da II Guerra Mundial, entramos em uma longa depressiva que se caracteriza especialmente por uma taxa de crescimento média, a longo prazo, que é menos da metade daquela dos 25 anos precedentes e se traduz notadamente por uma elevação ininterrupta, através dos altos e baixos da conjuntura, do desemprego, que atingiu quase 40 milhões de pessoas apenas nos países imperialistas. Durante esse longo período depressivo, a acumulação de capital prossegue, evidentemente, não há crise permanente, isso não existe. Há sempre períodos de recessão seguidos por períodos de retomada. Conhecemos uma recessão em 1974/75, outra em 1981/82, e uma retomada após essa última, que durou de 1983 a 1986. Mas no curso de todas essas retomadas, o investimento produtivo – no sentido mais amplo do termo, em novas fábricas que produzem não somente mercadorias, como também telecomunicações, transportes, eletricidade, gás, infra- estrutura – não manteve o ritmo. Tem havido cada vez menos investimentos produtivos. (MANDEL, 1990, p. 320).

Portanto, para Mandel (1982) o capitalismo entrava agora numa fase em que as crises são cada vez mais profundas e freqüentes e os períodos de retomada de crescimento cada vez mais fracos e curtos. Essa nova fase de recessão acionará a luz vermelha para os capitalistas privados que, a partir daí, buscarão de todas as formas recomporem os seus lucros estagnados e ao fazerem isto intensificarão as contradições gerais do capitalismo. Segundo Mandel (1990), se após 1945 o objetivo principal do capital havia sido a estabilização social e política dos principais países capitalistas; após 1973 e, sobretudo, após 1989, com a queda da União Soviética, a prioridade absoluta do capital se tornou a retomada das taxas de lucro, se preciso ao preço de desemprego massivo e de um agravamento das tensões sociais.

Nessas condições o capitalismo atual se caracterizaria por um estágio de intensificação de todas as suas contradições inerentes, tais como: a contradição entre a socialização crescente do trabalho e a apropriação privada da produção social; ou a contradição entre a produção de valores de uso (que atualmente chega a níveis incalculáveis) e a realização de valores de troca (que permanece atrelada ao poder de compra da população), ou ainda, a produção de mercadorias de luxo comparada ao subconsumo de bens essenciais por parte da população, entre muitas outras.

O capitalismo tardio corresponde a uma fase em que o capital se reestrutura de cima a baixo para continuamente superar as crises sucessivas de superprodução, provenientes da “onda longa depressiva”, intensificando a busca por superlucros. E, ao fazer isto, o sistema capitalista extenua suas possibilidades civilizatórias, tornando-se um modo de produção ainda mais expropriador e destrutivo. Tanto no que diz respeito à humanidade como no que diz respeito às forças naturais. Segundo Mandel (1982), Marx já havia previsto esse processo destrutivo ao afirmar que o capital só poderia desenvolver-se e também desenvolver as forças produtivas da humanidade saqueando simultaneamente as fontes de riqueza humana, da terra e do trabalho. Para Mandel (1982) estamos assistindo a uma fase capitalista na qual para desenvolver suas forças o capital deve necessariamente destruir

continuamente capacidade produtiva (humana e natural). Em um trecho de sua obra Mandel (1982, p. 403) afirma:

No capitalismo tardio, esse saque atingiu proporções imensuráveis. A oposição entre valor de troca e valor de uso, que no apogeu do capitalismo só vinha à tona excepcional e repentinamente em tempos de crise econômica, é sempre visível no capitalismo tardio. Essa oposição encontrou sua forma mais dramática na produção em massa de meios de destruição (não só de armas militares, mas também de todos os instrumentos destinados à destruição física, psicológica e moral do homem).

Apesar de desenvolver uma análise bem diversa da teoria mandeliana outro marxista que aprofundou os estudos sobre as características destrutivas do capitalismo, pós década de 70, foi o filósofo húngaro, discípulo de Lukács, István Mészáros39. O autor húngaro concorda com Marx e Schumpeter ao afirmar que o capital possui um incontrolável impulso para a expansão e para a universalidade. Ou seja, o capital só é capital à medida que mantém ativa sua capacidade de auto-reprodução e expansão. Portanto, estamos diante de um modo de produção que possui seu aspecto civilizatório mais intenso no fato de, por um lado, “libertar cada vez mais o homem de suas barreiras naturais” (LUKÁCS, 1976) e, por outro, transformar a produção social num jorrar incessante de bens materiais que possibilitam a humanidade superar o quadro de escassez das sociedades pré-capitalistas.

Para Meszaros (2002) foi exatamente essa dinâmica expansionista da produção social e do desenvolvimento das forças produtivas da humanidade que fez com que o capital superasse todas as formas anteriores de reprodução social. No entanto, ao possibilitar esse fantástico desenvolvimento das forças produtivas – que ainda no século XVIII, como diz Marx (1999), igualou as prensas industriais à força do martelo do Deus Thor – a dinâmica capitalista realizou tais feitos reificando todas as relações dos homens com a natureza e com os homens entre si. Segundo Meszaros (2002) o sistema capitalista ao desenvolver as potencialidades produtivas também produziu fraturas inerentes

39 Para um aprofundamento sobre as teses de István Meszaros ver: PANIAGO, Cristina. A

Incontrolabilidade Ontológica do Capital: um estudo sobre Beyond Capital, de I. Meszaros.

ao seu modo de reprodução sociometabólica. Fissuras provenientes da separação entre meios de produção e força de trabalho e que se manifestam de diversas formas em todos os circuitos de reprodução ampliada do capital e acompanham todo o desenvolvimento histórico capitalista:

1. Primeiro, através de uma separação entre a produção social e seu

controle que estão “isolados entre si e diametralmente opostos”

(MESZAROS, 2002, p. 105).

2. Segundo, na separação extremamente problemática entre produção e o

consumo; tanto que no final do ciclo geralmente se acumula um

“excesso de consumo produtivo” ou “superprodução”, geradora de crises sucessivas.

3. Terceiro, na separação entre produção e circulação, continuamente forçada pelos capitalistas individuais que buscam superar essa contradição ampliando cada vez mais seus domínios para áreas antes inexploradas. Dessa forma, a necessidade de dominação e subordinação prevalece, não apenas no interior das fábricas capitalistas mas também se expandem continuamente para fora dos seus limites na busca pela equalização da separação entre produção e circulação o capital rompe todas as barreiras regionais e nacionais. (MESZAROS, 2002).

É por isso que o sistema capitalista é um modo de reprodução social baseado na alienação e na reificação das relações sociais, pois à medida que desenvolve as forças produtivas humanas o faz através de uma lógica reprodutiva enraizada na ausência de unidade. Uma ausência de unidade que começa na alienação entre meios de produção e trabalho e se desdobra na separação cada vez maior entre produção e estabelecimento das necessidades sociais. Para Meszaros (2001), esta dinâmica reificadora e fragmentada da lógica capitalista institui um metabolismo social que se caracteriza, por um lado, na necessidade de expansão e, por outro, na incontrolabilidade do sistema. Pois, neste caso, pelas suas próprias características alienantes qualquer tentativa realizada pelas personificações do capital ou pelo Estado

para transpor a estrutura fragmentária da reprodução ampliada do capital tende a ser problemática e a permanecer rigorosamente temporária.

Nesse sentido, o desenvolvimento capitalista representa um impacto na relação dialética entre a satisfação das necessidades e aumento da produtividade, pois rompe radicalmente com essa relação prévia estabelecida a milhares de anos invertendo toda a lógica da produção. No capitalismo a produção não está subordinada a satisfação de necessidades, mas sim a satisfação de necessidades é que está subordinada a produção de mercadorias. Uma verdadeira vitória do fetichismo da quantificação sobre a emancipação qualitativa da satisfação das necessidades humanas universais. Por outro lado, remove-se não só as determinações limitantes da “produção orientada-para-a-necessidade” (MESZAROS, 2002, p. 615), mas também, simultaneamente, a possibilidade dos produtores controlarem as tendências destrutivas nascidas da “dominação total da qualidade pelos imperativos da expansão quantitativa ilimitada do capital.” (Idem, idem).

Através dessa forma de reprodução sócio-metabólica inerentemente fragmentária, expansionista e incontrolável é que os homens puderam desenvolver sem precedentes suas forças produtivas, como também ativaram forças destrutivas nunca antes imagináveis. Como atesta uma célebre citação de Marx (1977, p. 81):

Na economia burguesa – e na época de produção à qual corresponde – este completo desenvolvimento das potencialidades humanas aparece com uma total alienação, como destruição de todos os objetivos unilaterais determinados, como sacrifício do fim em si mesmo em proveito de forças que lhe são externas.

Para Meszaros (2002) essas contradições inerentes ao sistema capitalista, que opõem o aumento quantitativo da produção de bens materiais à realização das necessidades sociais dos homens, irão adquirir uma dimensão ainda maior na realidade atual. No mesmo período chamado por Mandel (1982) de “onda longa depressiva” Meszaros identifica uma fase de disjunção radical entre produção genuína e auto-reprodução do capital. Como ressalta o mesmo autor (2002, p. 614),

[...] em um estágio mais avançado do desenvolvimento histórico, sob as condições de reprodução generalizada de mercadorias, [...] o fetichismo da quantificação domina completamente a dimensão qualitativa do processo de produção. [...] Esse modo particular de reprodução social é sobrecarregado com uma contradição por fim explosiva que

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