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A energia livre de superfície (ELS) reconhecida como γs é para as superfícies

sólidas o que a tensão superficial significa para os líquidos. Porém, é válido salientar que tal energia não pode ser mensurada de forma análoga às medidas realizadas para os líquidos. Com relação aos materiais sólidos, duas principais categorias podem ser consideradas: os que possuem elevada ELS e os que possuem baixa ELS. O primeiro grupo inclui metais e compostos inorgânicos (óxidos, silicatos, diamantes, nitretos) com valores de ELS entre 200-500 mJ/m2. O segundo grupo inclui compostos orgânicos, como os polímeros, com valores de ELS menores que 100 mJ/m2. Superfícies poliméricas são comumente classificadas com baixo (10-30 mJ/m2), médio (30-40 mJ/m2) e alto (maior que 40 mJ/m2) valor de ELS [44, 51]. Alguns dos métodos empregados para cálculo de ELS serão descritos mais adiante neste trabalho.

A tensão superficial é uma propriedade dos líquidos governada por interações intermoleculares originadas a partir das forças coesivas entre as moléculas de um líquido. Termodinamicamente, isso se significa que o líquido se acomoda de modo que a quantidade de moléculas contidas em seu interior seja máxima, enquanto que a quantidade de moléculas contidas na superfície seja mínima. Por isso, para que ocorra um aumento da área de superfície, as moléculas tendem a se mover para a superfície. Entretanto, as moléculas contidas na interface líquido-vapor são menos favoráveis a interações e, portanto, apresentam estado de maior energia se comparada com as moléculas mais internas do líquido. Por isso, para mover as moléculas do interior para a superfície, é necessário energia. Dessa maneira, a tensão superficial é classificada como a energia (J) necessária para criar 1 m2 de uma nova área superficial líquido-vapor. Sua unidade dimensional é J/m2, porém N/m é frequentemente utilizado similarmente.

Para os sólidos, convencionalmente, o termo energia livre de superfície é utilizado e considera-se a tensão interfacial de uma interface sólido-vapor (geralmente, o ar). Quando um material sólido apresenta energia de superfície elevada, as interações possíveis com aquela superfície são bastante fortes e a adesão é mais favorecida. Nos sólidos, as moléculas e os átomos que os constituem não possuem livre capacidade de movimentação, como ocorre com os líquidos, e as superfícies são regiões altamente energéticas, devido à diferença entre a energia contida no interior do sólido e aquela contida na superfície. Materiais com energia de superfície mais baixa são mais difíceis de serem revestidos, porém existem técnicas que permitem modificações superficiais e promovem melhorias no molhamento e na adesão desses materiais [52, 53].

A ELS tem efeito decisivo na molhabilidade dos sólidos e pode ser medida indiretamente a partir de valores de ângulo de contato com diversos líquidos. O conhecimento da ELS permite que o ângulo de contato, o trabalho de adesão e a tensão interfacial com líquidos cujas propriedades são conhecidas, sejam previsíveis. Essa informação é de extrema importância para processos de revestimento de materiais, pinturas, limpezas, impressões e revestimentos hidrofóbicos e hidrofílicos [54].

Para calcular a energia de superfície através dos valores de ângulo de contato, alguns métodos podem ser aplicados. Modelos como o Método de Fowkes e o Método de Owens-Wendt-Rabel & Kaelble (OWRK), os quais serão exemplificados adiante, se diferem na forma com que as interações entre as fases são analisadas e quais componentes de interação das fases isoladas são responsáveis por produzir os valores de energia superficial. Em geral, a equação que relaciona as componentes do sólido (γs)e

do líquido (γl) bem como as interações entre as fases, permite calcular a tensão

interfacial (γsl) e é configurada da seguinte maneira:

ץ𝑠𝑙= ץ𝑙 + ץ𝑠− 𝑖𝑛𝑡𝑒𝑟𝑎çõ𝑒𝑠 𝑒𝑛𝑡𝑟𝑒 𝑎𝑠 𝑓𝑎𝑠𝑒𝑠 (3)

A energia de superfície (ELS ou γs) é gerada pela coesão entre os átomos e as

moléculas que constituem uma substância, sendo definida através de diferentes tipos de interação. Em particular, as interações entre as fases podem ser diferenciadas como polares e dispersivas. As interações dispersivas são atribuídas a flutuações temporárias da distribuição de cargas em átomos e moléculas (interações de van der Waals), enquanto que as interações polares compreendem as relações entre dipolos permanentes e entre dipolos permanentes e induzidos (ligações de hidrogênio). Em suma, a energia

superficial (γs) (equação 4) pode ser definida como a somatória das contribuições

polares (γpolar ou γp) e dispersivas (γdispersiva ou γd):

ELS (γs) = γpolar + γdispersiva (4)

Não existem substâncias com parcelas de ELS exclusivamente polares, pois as interações de van der Waals ocorrem entre todos os átomos e moléculas. Entretanto, os alcanos (compostos formados apenas por cadeias de hidrocarbonetos, tais como metano, propano, butano, etc), exibem ELS puramente dispersivas, pois não apresentam grupos polares. Através da comparação entre as partes polares e dispersivas da ELS de duas fases, é possível prever qual será a capacidade de adesão entre elas. Ou seja, quanto mais aproximados forem os valores das componentes de diferentes materiais entre si (polar-polar e dispersiva-dispersiva), maior será o grau de interação possível entre as fases e, consequentemente, maior a adesão entre os materiais [54-56]. A Figura 16 correlaciona o fenômeno de adesão entre duas fases distintas (fases 1 e 2) a partir das interações entre as componentes polares e dispersivas dos materiais.

Figura 16. Interação das partes polares e dispersivas entre duas fases distintas determinando o fenômeno de adesão entre materiais [56].

Entre os modelos existentes para cálculo de ELS, a seguir, serão apresentados aqueles baseados nas componentes polares e dispersivas dos materiais envolvidos. Esses modelos serão usados aqui neste trabalho para determinar a ELS dos sólidos através das medidas de AC com testes usando diferentes líquidos.

3.2.1 Método de Fowkes

Esse modelo é usado para calcular a ELS de um sólido a partir dos ângulos de contato obtidos com diferentes líquidos. Ao fazer isso, trabalha-se com a divisão da ELS em duas partes essenciais para análise: parte dispersiva (γd) parte não dispersiva

(γnd). Baseando-se na Equação de Young (equação 1) apresentada anteriormente, a

tensão interfacial ץsl, deve ser determinada para identificação da ELS. Essa tensão é

calculada baseada nas tensões superficiais do sólido (ץs), do líquido (ץl) e nas interações

entre ambas as fases (equação 5). Essas interações são interpretadas como uma média geométrica das componentes dispersiva (ץd) e não dispersiva (ץnd) da ELS, conforme:

ץ𝑠𝑙 = ץ𝑙 + ץ𝑠 − 2 ( √𝛾𝑙 𝑑. 𝛾𝑠𝑑 + √𝛾𝑙 𝑛𝑑. 𝛾𝑠𝑛𝑑 ) (5)

A ELS da superfície sólida é determinada a partir do ângulo de contato em duas etapas: primeiro, a parte dispersiva é calculada com o conhecimento de pelo menos um líquido puramente dispersivo. Já a parte não dispersiva é determinada com outro líquido adicional com parte polar. Na segunda etapa, o Método de Fowkes toma como base [57] outro modelo usado frequentemente, o Método de Owens, Wendt, Rabel e Kaelble (OWRK). Assim, a parte não dispersiva é considerada como parte polar e requer apenas dois líquidos diferentes [57-60].

3.2.2 Método de Owens, Wendt, Rabel and Kaelble (OWRK)

De forma análoga ao método de Fowkes, esse modelo permite calcular a ELS de um sólido a partir de medidas de ângulo de contato de vários líquidos. Contudo, nesse caso, a ELS é dividida em uma parte polar (𝛾𝑝) e outra parte dispersiva (𝛾𝑑). Assim, a

tensão interfacial é calculada a partir da Equação 5, com substituição da parte não dispersiva pela componente polar. Dessa forma, a equação 6 obtida é configurada como:

ץ𝑙𝑠 = ץ𝑙 + ץ𝑠− 2 ( √𝛾𝑙 𝑑. 𝛾

𝑠𝑑+ √𝛾𝑙 𝑝

Para determinação da ELS do sólido utilizando esse método, são requeridos pelo menos dois líquidos cujas tensões superficiais apresentam as componentes polares e dispersivas conhecidas. Além disso, um desses líquidos deve ter uma componente polar significativa, sendo maior do que zero. Esse método é usado para investigar o efeito das interações referentes às componentes polares e dispersivas nas propriedades de molhabilidade e adesão de superfícies sólidas. Por exemplo, os ângulos obtidos com valores diferentes para as superfícies devido a modificações das polaridades por conta de um recobrimento são avaliados por meio da utilização desse método [58-60].

3.3 REVISÃO DA LITERATURA SOBRE AS PROPRIEDADES DE SUPERFÍCIE