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4 Análise de Resultados

4.1 Fase I Entrevistas

4.1.1 Determinantes no acesso à ECC

Em seguida, apresentamos os dados recolhidos sobre os determinantes no acesso aos cuidados prestados pela ECCI, na perspetiva dos profissionais de saúde entrevistados.

4.1.1.1 Proximidade

Todos os participantes focaram, ao longo das entrevistas, vários itens inerentes à proximidade entre os cuidados prestados pela ECCI e os utentes a que se destinam. Foram focados como potenciais barreiras ao acesso a esta tipologia de cuidados fatores relacionados com a capacidade de perceção do utente e seus familiares em identificar a necessidade destes cuidados, bem como a capacidade dos prestadores de cuidados se organizarem de forma a divulgarem informação coesa e explícita sobre as ECCI e a RNCCI, sendo capazes de chegarem até aos utentes, cativarem a sua confiança e irem de encontro às suas expectativas.

Os participantes identificaram a reduzida literacia em saúde e informação que o utente possui relativamente ao modo de funcionamento e articulação das ECCI e da RNCCI como um importante condicionante no acesso aos cuidados prestados. Relataram existir “desconhecimento sobre as respostas da RNCCI, especificamente no que diz respeito ao contexto

domiciliário” (...) “O facto de desconhecerem a existência deste género de apoio de cuidados faz com que também não sejam solicitados” (E3). E ainda “desconhecimento de toda a orgânica de funcionamento, como por exemplo horários, apoio de fins-de-semana e feriados, assim como de recursos que estão alocados às mesmas e o tempo de espera para admissão” (E3).

De acordo com um dos intervenientes, “a existência de um internamento prévio na ECCI” ou “se teve um familiar ou vizinho internado na ECCI (...) aumenta a acessibilidade dos cuidados da

mesma, pois o conhecimento que o utente, ou os seus familiares, têm da ECCI, associado ao surgimento de novas necessidades de cuidados, leva-o a solicitar nova referenciação à sua unidade de saúde”. Assim, “terá maior acessibilidade aos cuidados da mesma pela perceção da existência desse recurso de saúde” e por

33 Os profissionais de saúde abordados neste momento de investigação, referiram ainda que seria importante um maior investimento na formação e divulgação de informação relativa às ECCI e à RNCCI junto dos profissionais que referenciam, quer em contexto de cuidados de saúde primários quer diferenciados. Asseguraram que “existe um desconhecimento

da existência das ECCI, quais os critérios de referenciação, como é feito o processo de referenciação, e quais são os profissionais que devem ser articulados para os mesmos” (...) “isto é na minha ótica o maior entrave para o acesso” (E3). E ainda que “a perceção que os profissionais das outras unidades de saúde (...) têm da ECCI, nomeadamente qual o seu propósito, potencial e modo de funcionamento, influencia a acessibilidade dos utentes à mesma. Quanto maior o conhecimento desses profissionais, maior a probabilidade de os seus utentes serem referenciados, pela perceção que os primeiros têm dos ganhos potenciais que a ECCI trará aos segundos” (E4). Ainda acerca da perceção dos profissionais

referenciadores, um dos entrevistados salientou a importância de uma transmissão de informação correta e coesa, na medida em que “elevadas expectativas impostas por outros colegas

de trabalho (profissionais referenciadores) (...) conduzem por vezes a frustrações (por parte do

utente)” (E1).

4.1.1.2 Aceitabilidade

Nesta dimensão da acessibilidade em saúde foram considerados fatores culturais e sociais que os intervenientes consideraram determinar a possibilidade dos utentes procurarem os cuidados prestados pelas ECCI. Um dos entrevistados identificou como possível barreira ao acesso “o facto das pessoas não estarem de mente aberta, e as famílias por exemplo

não estarem disponíveis para aceitar a entrada e a opinião de um enfermeiro (em sua casa)”. O mesmo

entrevistado referiu ainda que os utentes poderão não procurar os cuidados prestados por estas Equipas porque “não gostam que se mexa naquilo que é o hábito deles” (E1).

Os participantes consideraram ainda a relação entre o utente e o profissional de saúde referenciador como um importante condicionante ao acesso aos cuidados prestados pela ECCI, na medida em que “quanto melhor um profissional de saúde conhece os seus utentes, mais

facilmente percebe as suas necessidades e promove esta articulação de cuidados e referenciação” (E1).

4.1.1.3 Capacidade e Acomodação

A capacidade e acomodação representam a medida em que o prestador detém os recursos necessários para atender às necessidades dos utentes. Assim, o acesso é restrito caso os recursos do prestador de cuidados sejam desajustados à procura verificada.

34 No âmbito das ECCI, os profissionais entrevistados focaram a importância da quantidade e qualidade dos recursos humanos disponíveis, para que se assegure o acesso a esta tipologia de cuidados. Um deles referiu que “os recursos humanos são de facto escassos e por

isso vêem-se restringidos a fazerem aquilo que nós consideramos quase o satisfatório e não o ideal (...) Verifica-se um rácio de profissionais reduzido para as necessidades identificadas, especialmente na área da reabilitação” (E1). Outro dos participantes disse que “o número de profissionais da ECCI e a sua respetiva área de especialização, que se traduzirão num determinado número de horas de prestação efetiva de cuidados das diversas áreas em causa, influencia a acessibilidade aos cuidados da mesma; quanto maior for o número de horas de prestação de cuidados, menor será a duração dos internamentos e, consequentemente, menor será a permanência de utentes em lista de espera” (E4). Um dos participantes identificou

ainda “dificuldades na articulação entre a equipa multidisciplinar, essencialmente por alguns profissionais

terem poucas horas alocadas à prestação de cuidados na ECCI, por exemplo na área de nutrição, apoio social, saúde mental” (E3).

No caso específico do acesso às ECCI, os participantes mencionaram, para além dos recursos humanos, a importância de assegurar o transporte dos profissionais de saúde envolvidos, referindo “dificuldade em fazerem visita domiciliária por haver condicionantes ao

transporte” (E3).

Os participantes consideraram o número de camas/vagas da ECCI como fator determinante no acesso a estes cuidados, “que se traduzirá na capacidade de lidar com x utentes em

simultâneo” (E4), podendo acontecer que haja “ausência de vagas que coloque os doentes em lista de espera” (E2). De acordo com um dos entrevistados, “a principal ‘queixa’ mencionada pelos utentes e/ou familiares prende-se com o tempo de espera até ao início efetivo dos cuidados” (E4), aspeto que

considerou ter um peso valorizável no acesso a cuidados de saúde. Este participante atribuiu também grande importância à gestão da lista de espera no acesso equitativo às ECCI, salientando que “a lista de espera dos utentes da ECCI é gerida de forma cronológica,

independentemente do motivo de referenciação ou da premência de acesso aos cuidados (...) a acessibilidade dos utentes com maior necessidade de ingresso na ECCI fica severamente prejudicada, perdendo-se nalgumas situações a janela terapêutica promotora da consecução dos melhores ganhos em saúde atingíveis” (E4).

O horário de funcionamento foi considerado importante pelos participantes, que visualizaram o horário de 12 horas diárias como ajustado à resposta de cuidados prestados pelas ECCI. Um dos entrevistados referiu que “é suficiente para dar resposta às necessidades de

cuidados dos nossos utentes. (...) Penso que não se justificaria as 24 horas por dia (...) a minha dúvida é se o número de utentes que poderiam ser atendidos nessas outras 12 horas do período noturno justifica a

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alocação de recursos nesse sentido, sendo estes recursos escassos” (E3). Contudo, um dos entrevistados

menciona como interessante a “passagem direta do hospital para a ECCI, em que a ECCI faria o

acompanhamento durante 24 horas aos casos necessários e protocolados, os profissionais poderiam dar resposta a todos os objetivos, a equipa seria sempre a mesma e o intercâmbio de informação e planeamento seria mais fácil (...) a continuidade de cuidados seria positivamente influenciada” (E1).

Um dos determinantes mais vincado pelos intervenientes no acesso a esta tipologia de cuidados foi o processo de referenciação do utente. Os entrevistados consideraram que “o processo de referenciação para a ECCI é burocrático (...) com duplicação dos dados clínicos nos sistemas

de informação vigentes nas unidades referenciadoras” e “com a participação obrigatória de três profissionais (assistente social, enfermeiro e médico)” (E4). Aspetos que o tornam “complexo e moroso, principalmente para os profissionais que não lidam com ele com frequência” (E2). Um dos

entrevistados referiu ainda que “a experiência das equipas referenciadoras poderá discriminá-los (utentes com necessidades semelhantes, mas equipas referenciadoras diferentes) no acesso” (E3). O mesmo entrevistado disse também que “a maioria das equipas referenciadoras considera

que é um processo muito burocrático, o que automaticamente desencoraja alguns destes profissionais a seguirem com o processo de referenciação” (E3). Assim, referiram que “a metodologia de referenciação é um dos fatores que impacta negativamente a acessibilidade à ECCI” (E4), considerando importante

“aprimorar os momentos de auditoria aos processos de referenciação de forma a identificar problemas nesse

âmbito” (E3), e ainda que “a interatividade entre sistemas de informação (Gestcare e SClinico) também poderia facilitar” (E3).

4.1.1.4 Adequabilidade

Os entrevistados entendem a adequação de cuidados como algo inerente à prestação de cuidados no âmbito das ECCI, e referiram que “os cuidados prestados no domicílio permitem

que se adapte muito mais rapidamente toda a dinâmica familiar e o prestador de cuidados à nova realidade de saúde do utente” (E1). Consideraram ainda que “o facto de termos profissionais de diferentes especialidades é também uma mais valia na adequação dos cuidados, (...) com uma abordagem mais ampla de complementaridade na prestação de cuidados aos utentes” (E3). Neste sentido, um dos

participantes vincou a importância de “dotar as ECCI cada vez melhor, não só na formação dos

seus profissionais, mas também no rácio de profissionais, de forma que realmente todas estas respostas possam ser dadas com qualidade” (E1), demonstrando a interligação entre as diferentes

36 Nesta linha de pensamento, os profissionais entrevistados relataram que “a adequação

de cuidados às necessidades de cada utente e à dinâmica familiar de cada um permite facilitar o acesso, sendo necessário muitas vezes a articulação com outras equipas ou outros profissionais/ entidades exteriores à ECCI” (E3), como por exemplo na “articulação com as várias Equipas e projetos, na gestão e articulação das vagas e na gestão dos cuidados aos utentes” (E4).

Tal como referido por um dos entrevistados, “as auditorias e articulação entre diferentes

tipologias de cuidados são mecanismos de melhoria de qualidade dos serviços prestados” (E2), aspeto

considerado por Levesque et al. (2013) como essencial para a adequação dos cuidados às necessidades dos utentes bem como, consequentemente, ao acesso a melhores resultados em saúde. “Para além das auditorias (...) também as reuniões de acompanhamento visam ajudar as

Equipas na resolução precoce de possíveis problemas ou dificuldades, promovendo a construção de melhores cuidados e a agilização dos processos” (E1).

Atendendo à capacidade de articulação e organização das UCC, unidades onde se inserem as ECCI, são desenvolvidas estratégias de adequação dos cuidados que visam ir de encontro às necessidades identificadas em determinada comunidade, assegurando a continuidade dos cuidados. Assim, um dos entrevistados explicou que “a existência de projetos

adjacentes que possam agilizar as altas da ECCI, como por exemplo os projetos de reabilitação que permitem dar continuidade ao processo de reabilitação iniciado na ECCI, influencia positivamente a acessibilidade à mesma, pois altas mais céleres significam menores tempos de permanência em lista de espera” (E4).

A capacidade de adequabilidade do prestador de cuidadas foi fortemente vincada pelos entrevistados como determinante no acesso a esta tipologia de cuidados, de forma a potenciar os resultados por ela prestados. Contudo, foi também exposta a importância do envolvimento por parte da procura dos cuidados, considerando que “um utente e uma família

cuidadora que seja envolvida em todo este processo é uma família que terá espírito crítico, que poderá e deverá ser envolvida na mobilização de recursos e chamará a atenção para determinadas dificuldades” (E3).

Concluindo, “quanto maior o envolvimento de ambas as partes, mais e melhores ganhos em saúde se

obtêm. E (...) maior é a perceção da utilidade e potencial da ECCI” (E4).

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