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Duas diferentes correntes da psicologia da educação, a comportamentalista e a construtivista, contribuem para a elaboração de diferentes materiais e também

PROF DR NORBERTO CARDOSO FERREIRA

4) Duas diferentes correntes da psicologia da educação, a comportamentalista e a construtivista, contribuem para a elaboração de diferentes materiais e também

diferentes práticas docentes. Ambas pregam a importância do uso de materiais didáticos diferenciados. Hoje, nos materiais impressos para o ensino médio, por exemplo, temos de um lado os Sistemas Educacionais apostilados (predominantes em escolas particulares) e de outro os livros validados pela banca do PNLEM MEC (escolas públicas), mais próximos da vertente construtivista. Isso também acontece com os softwares educacionais. Como o senhor vê essas duas visões de ensino- aprendizagem?

Eu fui um dos autores do FAI – Física Auto-Instrutiva. Que eu saiba, é o único curso que foi baseado em uma corrente – o comportamentalismo. Era um curso que, apesar de ser extremamente chato, produzia alguns resultados. Por outro lado, os professores não estavam capacitados à utilização desse método. Assim, o curso não passou de um modismo. Na mesma época, eu trabalhava no Colégio Vocacional, que foi o grande modelo construtivista. Porém, os professores eram formados e constantemente atualizados no próprio colégio. Lá, quase não existiam livros, os professores é que preparavam os textos para seus alunos. Assim, não vejo muitas diferenças entre os dois tipos de textos que você menciona.

Lógico, sempre há mais uma moda... Mas o FAI era o único texto que tinha uma filosofia: era uma instrução programada. Onde se diz que é “construtivista”, “piagetiano”, “montessoriano”, como vamos saber? Não há como, e tem algumas coisas em que a própria filosofia é ligada a isso. Os outros dizerem que é “construtivista”, é muito difícil.

Volto a falar: às vezes se reforça ou não se reforça o FAI. Aconteceu que fizemos o FAI e víamos que era auto-instrutivo, e descobrimos depois que ensinava mesmo! Não ensinava todo mundo, pois era chato. O professor precisava ficar cuidando... Mas muitos professores acharam que era legal, que não precisava mais dar aula: ele se sentavam, abriam o jornal e ficavam lendo.

Alguns alunos aprendiam com o material do FAI, iam fazer perguntas ao professor e ele não sabia responder. E o chato é que nós, às vezes, recebíamos cartas de alunos dizendo que o FAI falou uma coisa e o professor falou outra, questionando o que estaria certo. E nós não respondíamos para o aluno o que estava certo, se não ele iria ao mural da

escola para colocar a nossa resposta. Mas acontecia isso, de deixar o professor numa situação complicada perante seus alunos.

Como o FAI era auto-instrutivo, cada aluno tinha uma velocidade diferente. O que acontecia era que uns alunos iam lá para a frente e outros ficavam lá atrás. Pegavam os da frente para dar as mãos aos que estavam atrás. E nas outras atividades, às vezes os da frente, principalmente em coisas experimentais, ajudavam os outros. Evidentemente, aí alguns alunos iam ser privilegiados com a situação. Mas, depois de certo tempo, todo mundo teria cumprido as metas que eram propostas, apesar de ser alguma coisa comportamentalista ao extremo.

Eu recebi um e-mail de um aluno que estava fazendo uma pesquisa sobre o FAI. O FAI foi feito por um monte de professores, mas o grupo original era pequeno, depois ganhou uma segunda parte. No começo teve muita briga, sempre tinha um diálogo entre grupos diferentes. Era o GREF de um lado, o FAI de outro: mesmo dentro da universidade – a USP – tinha muito ciúme, até porque uns tinham financiamento – os do GREF – e outros não, como era o nosso caso.

[Observação do entrevistador] Nesse momento, peço sua opinião sobre a oposição de diferentes correntes pedagógicas, que freqüentemente aparecem nos discursos e nos livros como assumidamente antagônicas. Existiria uma vantagem em adotar uma prática que utilizasse mídias e tecnologias dentro de uma ou de outra visão didático- pedagógica?

Mas o que fazer com os estudos teóricos em geral? Teve uma época dos conceitos intuitivos, que todo mundo ficava pesquisando. Fez muitos pesquisadores terem muitos conceitos, ou seja, ninguém está isento disso aí... As pesquisas são tão grandes que todo mundo sabia disso. Eu me lembro de um texto que citei no script, em que eles falavam desses conceitos intuitivos, esses conceitos piagetianos. Mas, enquanto eles falavam disso, falavam cada bobagem em termos de ciência, que invalidavam toda a pesquisa... Não adianta querer encarar um modismo qualquer sem que tenhamos um objetivo.

Quando eu comecei, acho que na escola pública, ao mesmo tempo eu dava aulas no Vocacional – escola particular –, que era piagetiano ao extremo. Depois veio Vygotsky, com análise de problemas, e de cinco em cinco anos há uma escola que prevalece...

Há coisas que podem ser encaixadas na teoria, digamos, “da moda”. Quer dizer, se mudar a teoria, ela vai mudar os dados. Porque eu procuro ser claro: aquilo que está sendo proposto tem um significado para mim. E esse significado, se alguém souber do fato, tem de ser algo intrigante... Mas muitas vezes faz ter uma interação grande entre ele e a ciência. Isso eu acho que independe da escola: é uma interação entre ele e o objeto.

5) No passado, programas como os da Funbec, com materiais instrumentais simples,

kits e também os vídeos, tiveram boa divulgação e aceitação. Nesse período também

os espaços de laboratório de ciências e de física eram mais valorizados. Hoje, essas soluções parecem ter sido esquecidas, por conta da onda da informática. Como o senhor vê o papel dos softwares e da Internet como instrumentos de ensino de Física? Como fica a questão da busca pela valorização da observação e da investigação científica, próprias do ensino de Física, com as novas tecnologias?

Fala-se muito do passado. Agora, e no passado... Em 1955 foi realizado pelo Ibecc um curso para formação de professores. Na realidade, uma espécie de simpósio do qual participaram inúmeros físicos de renome, inclusive o Richard Feynman.

Numa das palestras, J. Costa Ribeiro descrevia o laboratório como um local “cujas chaves muitas vezes já se perderam, ou estão inacessíveis nas gavetas do secretário ou do diretor”. Ao mesmo tempo, como outros, defendia o uso de materiais simples. Ainda nesse mesmo curso, o professor Ribeiro de Arruda falava que a sociedade “atual”, com seus brinquedos de plástico, tolhia a criatividade das crianças que, anteriormente, construíam seus próprios brinquedos. Assim, todos têm saudades do passado. E os problemas antigos permanecem.

Quanto a opor instrumentos de ensino de física aos softwares, creio que essa oposição não existe. Eu próprio faço os dois. Se o instrumento ou o experimento ou o

software não for capaz de suscitar uma ação por parte do aluno, ambos terão falhado.

[Observação do entrevistador] Nesse momento, volto a questioná-lo sobre sua opinião a respeito das novas tecnologias da informática (experiências virtuais) substituindo os experimentos concretos em muitas escolas, já que entendi que ele não tinha contemplado isso antes na resposta.

Você fala da oposição existente entre o computador e o instrumental de baixo custo. O gozado é que eu faço os dois e acho que não tem nada incompatível entre eles: depende muito do produto que você coloca e do produto final. Se você vê ou faz um instrumental de baixo custo que seja de baixo nível, não adianta nada, nem para o professor e nem para o aluno. Agora, se você deixar os alunos e o professor entusiasmados ou intrigados, tanto faz você usar o computador ou o instrumental de baixo custo. Eu procuro exatamente fazer isso, pensar no aluno. A incompatibilidade não existe.

Eu não sei se quando o professor opta – se ele “opta” ou “troca” –, ele opta em representar o programa e depois mexe com a parte de laboratório, porque o chato é achar que dependemos muito do fato de desligar ou ligar o computador. Cada vez que cai a tensão aqui na USP, o computador desliga e pronto. Em geral, acontece no fim de semana, aí fica sábado e domingo e às vezes segunda-feira fora do ar. Isso é muito prejudicial, principalmente para escolas da rede pública que usam nosso site.9 Vemos agora que cerca de 600 a 700 pessoas por dia consultam o site. Nas estatísticas aparecem os países que entram – tem bastante coisa, é só dar uma olhada.

Outro exemplo era o fato de os alunos – até os da USP – fazerem certa confusão entre o que é o “modelo” e o que é “realidade”. Por exemplo, achavam que a natureza é representada por alguma coisa, e acabou... Eles não raciocinam um pouco mais, que aquilo lá é uma das possíveis representações que foram tiradas da observação.

6) Na sua opinião, diante dos resultados do questionário Saresp, que indicam a baixa