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Síntese dos depoimentos e breve análise final, com relação às questões propostas para serem estudadas nesta pesquisa

4. C ONSIDERAÇÕES F INAIS

Muito embora não seja o objetivo deste trabalho analisar detalhadamente os principais problemas que envolvem o panorama geral e as condições de trabalho que se apresentam para o ensino de Física na escola pública de ensino médio – tais como o déficit de professores licenciados,56 a qualidade da formação docente, a remuneração e a estrutura

de apoio oferecida pelas unidades escolares em termos de materiais e equipamentos pedagógicos –,57 sem dúvida não podemos ignorar esses fatores na macro-análise da

questão. Eles são grandes indutores do problema aqui estudado: a baixa utilização das diferentes mídias e tecnologias de apoio pedagógico na prática escolar.

A avaliação histórica com relação às mídias educacionais e a evolução das práticas pedagógicas que as incluem mostraram que muitos dos problemas hoje enfrentados não são novos – estão postos há décadas e ainda não foram adequadamente enfrentados e solucionados.

Os especialistas entrevistados parecem ter um entendimento consensual de que é preciso avaliar a Educação como um sistema complexo, com múltiplas causas para seus problemas. Soluções eficientes e duradouras para esses problemas devem incluir políticas públicas e privadas que consigam melhorar a articulação do todo, o que inclui também a gestão escolar e a organização curricular. Não basta investir unicamente na compra de materiais e equipamentos para as escolas, ou melhorar a formação acadêmica e em serviço do professor.

Grandes programas e ações isoladas do passado fracassaram em seus principais objetivos porque não levaram em conta realidades culturais, econômicas e estruturais das escolas públicas brasileiras e dos profissionais que nelas trabalham. Hoje, importantes avaliações nacionais e internacionais comprovam que muitas das antigas crenças e teorias

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Apenas 9% do quadro de docentes de Física no Brasil são licenciados na disciplina. Como já citamos nesta pesquisa, no Estado de São Paulo a situação é ligeiramente melhor, mas ainda assim extremamente deficitária. Fonte: Conselho Nacional de Educação (CNE) – Relatório “Escassez de professores no ensino médio: soluções estruturais e emergenciais” (Brasília: 2006/2007).

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Embora existam em todas as escolas de ensino médio, as condições de manutenção das SAI em boa parte delas é sabidamente problemática. Já um espaço próprio para o laboratório de ciências existe apenas em uma parcela das unidades escolares – muito embora isso não devesse constituir empecilho para a constatação sobre a não utilização de experimentos como meio de prática didática por parte do professor de Física, como vemos no Saresp.

no campo da Educação e da Política Educacional são falsas – ou, pelo menos, imprecisas e incompletas.

Quanto às chamadas “novas tecnologias” (como o computador e a Internet), estão na mesma categoria de outras mídias: são instrumentos e não fins. Mesmo que possuam características novas e próprias – e que a evolução das tecnologias pareça indicar que caminhamos para uma convergência de formatos multimídia –, são ainda sub-utilizadas no ambiente escolar pelos mesmos motivos que outras mídias e tecnologias mais antigas foram e ainda o são. A escola ainda está presa às tradições orais e reprodutoras, e isso tem grande peso sobre as práticas. As entrevistas enfatizaram aspectos históricos dessa temática, e visualizar essa dimensão pode ser fundamental para compreender o porquê dos problemas relacionados ao uso (ou ao não-uso) das chamadas “novas tecnologias” nas escolas. Certamente, muito da apologia e dos desvios de finalidade na aplicação curricular verificados nas escolas de hoje tem a ver com uma não compreensão da caracterização de mídia como instrumento e, assim sendo, um meio e não um fim em si mesmo.

O fato mais preocupante é que, sem dúvida, na atual sociedade globalizada e que valoriza o acesso à informação e o conhecimento, ainda estamos excluindo professores e alunos de inúmeras possibilidades por conta da falta de acesso, de conectividade e de articulação entre diferentes fontes de informação, comunicação e interação (pessoa-pessoa e pessoa-natureza). Para todos os envolvidos essa situação traz prejuízos: nos processos de educação formal, de educação informal, de acesso ao mercado de trabalho e às suas atualizações, à formação ética e crítica etc. No caso do ensino de Física, podemos incluir também o prejuízo ao desenvolvimento de uma adequada formação técnica e científica dos jovens. Os desenvolvimentos dessas formações básicas são desejáveis e devem ser buscados a todo custo, já que representam o principal papel reservado à instituição “escola” dentro da sociedade. Finalmente, a falta de utilização de diferentes fontes de referência e de aproveitamento das mídias existentes por parte dos professores em sua prática certamente colabora para o empobrecimento qualitativo do rendimento escolar, agora constatado nas mais diversas formas de avaliação que podemos obter.

Pela análise apresentada neste trabalho, fica claro que não bastaria superar o problema da dita “exclusão digital” – que, aliás, tenderá a diminuir progressivamente ao longo dos próximos anos no Brasil e no Mundo. É preciso definir “o que se pode efetivamente fazer de positivo, na Educação, com as mídias e as tecnologias disponíveis”. Esse parece ser um problema mais duradouro, analisado por essa retrospectiva histórica, e que demanda esforços articulados de planejamento político-pedagógico em esferas mais amplas, ligadas à manutenção das escolas públicas, investimentos em infra-estrutura educacional, políticas sociais, formação docente acadêmica e continuada e melhoria das condições de trabalho dos profissionais da Educação.

Falando mais especificamente sobre o ensino de Física, é certo que o atual déficit de profissionais habilitados para lecionar no ensino médio, por si só, já é um grave problema e que explica, em parte, a pouca utilização de fontes e mídias diversas na prática escolar e também o quase esquecimento dos kits experimentais e do laboratório. É difícil, para profissionais formados em outras áreas ou mesmo não habilitados, assumir o desafio de preparar e executar aulas que incluem atividades práticas, observação, investigação e discussão de fenômenos naturais e tecnológicos e de conceitos da Física a eles associados. Mesmo para boa parte dos profissionais habilitados na disciplina, já não é simples executar essa tarefa com eficiência. Os simuladores digitais tornam-se, assim, uma opção mais simples, tanto técnica como financeiramente, para que professores e escolas incluam atividades de investigação em seus cursos. Mas uma análise simples dessa opção mostra que não se pode realizar a troca do real pelo virtual sem perder a essência do “fazer Ciência”. Certamente, também nesse assunto o microcomputador e seus aplicativos educacionais devem ser encarados como complementos, que estão aí para trazer novas possibilidades: não podem ser entendidos como instrumentos substitutos das vivências concretas.

Uma outra preocupação perpassou as entrevistas aqui apresentadas: tanto a formação universitária como as políticas públicas devem dar prioridade à articulação de ações, sejam elas formativas ou estruturais. A história mostra uma sucessão de modas que

dão ênfase isolada a um tipo de ação, a cada momento. As TICs estão implementadas na sociedade contemporânea, mas são sub-aproveitadas na Educação. A mesma articulação de formação e de ação aqui solicitada vale tanto para a “microescala” (esfera de ação do professor e sua escola) quanto para a “macroescala” (políticas públicas de formação universitária e de administração governamental). Como se vê em DIB (2007), CORTELLA

(2006), MASETTO (2004) e outros, as mídias não são nada em si mesmas58 – só adquirem

sentido quando estão a serviço de uma opção político-pedagógica e se articulam com outras atitudes e práticas que são protagonizadas pelos docentes, que por sua vez estão inseridas em um entorno mais amplo e complexo. Talvez o professor ainda esteja pouco preparado e com poucas condições de entorno físico para propor e gerir uma tecnologia educacional própria, adequada às suas especificidades locais e temporais (que são únicas), a fim de propiciar um salto qualitativo em suas práticas.

Esgotamos as possíveis respostas aqui? Obviamente não!

Neste estudo, optei pela abordagem histórica do tema e pelos depoimentos de protagonistas envolvidos em projetos do passado e do presente, ligados à formação docente em Física. Dado o tempo limitado de uma pesquisa de mestrado, não seria possível ampliar a discussão, com qualidade, para muito além disso. De concreto, aqui foi possível levantar problemas, opiniões e constatações que estão no referencial teórico, em entrevistas de apoio e em documentos históricos e governamentais, além da voz dos especialistas entrevistados, todos ligados à pesquisa e à docência universitária no tema. Para ampliar o estudo e obter outras respostas significativas, seria interessante a ampliação desta pesquisa num outro âmbito, em que os próprios professores da rede paulista respondessem sobre as causas que julgam influenciar na falta de utilização das diversas mídias disponíveis em sua escola – quando as têm. Ou mesmo entrevistar outros personagens da equipe escolar, tais como diretores, professores coordenadores ou supervisores, em busca de mais pistas sobre as causas e soluções para essa situação.

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Refiro-me aqui às “mídias educacionais”, já que as mídias de informação e comunicação de massa, abertas, são capazes de influenciar as pessoas mesmo quando não têm uma articulação intencional. Aqui voltamos ao ponto em que se resgata o sentido da instituição “escola”: ela é um ambiente “intencional” de ensino-aprendizagem e por isso tem de ser planejada para atingir objetivos. É nisso que ela difere de outras formas de educação – as não-formais.

De qualquer forma, foi possível avançar em direção aos objetivos propostos para este trabalho e vislumbrar novas perspectivas de reflexão e de ação, que podem contribuir para entendermos melhor a problemática aqui apresentada.