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2. História das Ciências nos Anos Iniciais: um caminho a ser trilhado

3.4 Apresentação e análise dos dados

3.4.5 Dificuldades e facilidades

Ter vivenciado o desenvolvimento das propostas com suas próprias turmas, ainda que isto não tivesse sido proposto na formação, deu às professoras a segurança para responderam unanimemente que acreditam ser possível inserir

aspectos da História das Ciências nos conteúdos trabalhados na Educação Infantil e nos Anos iniciais. Mas, ainda que o trabalho com a HC seja possível, existem dificuldades como apontaram algumas professoras no questionário final. Tais dificuldades versaram sobre alguns pontos específicos como: a relação com o currículo; a pesquisa e seleção dos materiais; adequação dos materiais à linguagem e entendimento dos alunos; a “nova” proposta metodológica; e o apoio e parceria dos colegas. Selecionamos apenas algumas das respostas, tendo em vista que algumas respostas acabam se repetindo.

P5. Tive um pouco de dificuldade para inserir o tema da minha apresentação aos conteúdos e ao projeto da escola em que atuo, que não tratam desse tema em específico, além de ter que adaptar a linguagem dos textos para a faixa etária dos meus alunos do 2 ano do ciclo 1, uma vez que não encontrei, pesquisando o tema , material disponível específico para esse ano ciclo.

P7. Na dificuldade de pensar a Ciências como história, e poder incorporar as práticas.

P11. Organização da rotina. Parceria com os colegas de ano/ciclo.

P13. Acredito que seja a de os alunos se sentirem parte integrante desse espaço. P25. Estávamos acostumados a trabalhar interdisciplinaridade, porém a história da ciência tem um foco diferente, permitindo que o aluno pesquise mais, interage mais e aponte as suas próprias observações e aprendizados.

P9. A questão de que a escola muitas vezes não está preparada para desenvolver atitudes de investigação, de raciocínio lógico, de tomada de decisões. Temos práticas enraizadas e que impossibilitam muitas vezes proporcionar aos nossos estudantes espaços educacionais com mais autonomia, criatividade, solidariedade e participação, condições que penso serem fundamentais para se viver neste novo mundo e pelas novas tecnologias.

P20. Toda nova didática gera dificuldade. Primeiro acredito que nós educadores temos que nos alterar e se tornar pesquisadores, para que essa metodologia dê certo temos que ter a prática dos "porquês" e não das respostas prontas.

Bastos (1998 Apud ZANOTELLO, 2011, p 990-991) ao enumerar “algumas outras dificuldades” para o trabalho em sala de aula com a HC, corrobora as falas apresentadas no que diz respeito aos materiais, destacando que

Os textos disponíveis para subsidiar o trabalho dos alunos em sala de aula dificilmente contemplam as necessidades específicas do ensino fundamental e médio; [...] há uma certa escassez de propostas concretas sobre como explorar conteúdos de História da Ciência de maneira a contribuir para a realização de objetivos educacionais como ‘compreender melhor o que é a ciência’ e ‘formar o cidadão’; [...] os currículos escolares não dispõem de espaço suficiente para uma adequada apresentação da História da Ciência; [...] os contextos específicos em que os cientistas do passado trabalhavam são de difícil compreensão para os alunos de hoje (BASTOS, 1998, p. 56-57)

Certamente, olhar para o currículo, para os conteúdos e temas trabalhados na educação infantil e nos anos iniciais e enxergar ali possibilidades do trabalho com a HC foi um desafio, mas acredito que ao socializarmos algumas práticas desenvolvidas pela pesquisadora e colegas desde o mestrado, mostrou que não é tão difícil assim. Infelizmente existem poucas pesquisas que versem sobre o trabalho com HC nos anos iniciais.

Outra questão que apareceu em várias respostas, tratou do acesso a fontes confiáveis de pesquisa e informação. Ao longo dos encontros, as professoras iam solicitando indicações de sites, páginas de internet, revistas e outros materiais que pudessem subsidiá-las no planejamento das propostas. Nem todas as escolas dispõe de acervos recentes de livros paradidáticos e de pesquisa para uso em sala, e algumas enfrentam problemas com acesso à internet, tanto na escola quanto na comunidade, o que acaba sobrecarregando o professor na seleção dos materiais, e quando não se sabe onde procurar, fica mais difícil. Mas, posso descrever como ponto positivo a troca entre as professoras, durante os encontros. Sempre que encontravam um material interessante, levavam para socializar com as colegas, criando assim uma rede de troca e suporte.

Com relação a “nova metodologia”, ao protagonismo do aluno, o incentivo à pesquisa e a investigação, já pontuamos anteriormente que é uma mudança

necessária e indispensável, ainda mais nos tempos atuais em que a informação e o conhecimento estão a um click de distância.

Deve-se considerar que o papel da escola é contribuir para que o aluno tenha acesso ao conhecimento científico e possa desenvolver o senso crítico necessário para uma melhor compreensão do mundo; é ainda um dos objetivos nesse sentido que a escola possa propiciar um espaço favorável à descoberta, à investigação cientifica e à construção de conceitos, junto aos alunos, sobre fenômenos naturais, sociais, tecnológicos dentre outros (PEREIRA e TEIXEIRA, 2015. p. 03).

Não dá mais para acreditar num modelo de escola e de ensino que se encontra ultrapassado, e nem ser um professor do século passado. É preciso estar aberto a mudanças.

Uma última dificuldade apontada diz respeito à dificuldade encontrada por uma professora, de trabalhar com um tema distante de realidade dos mesmos.

P4. Partir da realidade dos meus alunos, justaposto que trabalho em lugar de difícil acesso, nos pós balsa do Município de São Bernardo, que é zona rural e os meios de transporte mais utilizados não são os mesmos das regiões centrais, mais urbanizadas.

A professora em questão desenvolveu uma sequência na qual trabalhou com os diferentes meios de transporte, especificamente explorando a história do carro. O problema centra-se no fato de que na região em que trabalha é considerada “zona rural” do município, sendo necessário atravessar a balsa para chegar ao bairro onde se localiza a escola. É uma região que apresenta uma série de problemas estruturais, encontra-se em uma área de manancial, sofre com problemas de falta de energia, internet e transporte. Poucos são os moradores que possuem carro na região. A maioria faz uso dos ônibus que circulam no bairro e que são fornecidos pela prefeitura gratuitamente. E por fim, pouquíssimos alunos saem do bairro para vir ao centro da cidade, logo, desconhecem outros meios de transporte. Todos esses fatores foram relatados pela professora durante a socialização de sua proposta e representaram para ela um fator de angústia. Isto porque, pensar em propostas didáticas que sejam significativas implica conhecer as realidades dos alunos e seus interesses.

Mas nem todas enfrentaram dificuldades. Houve facilidades também. E assim como as dificuldades, elas também puderam ser agrupadas por similaridade. No

quadro abaixo agrupamos dificuldades e facilidades, pois o que para um se configura em dificuldade, para outro é facilidade, como podemos observar a seguir. Tabela 4: Dificuldades e Facilidades no trabalho com a HC

Dificuldades Facilidades

Inserção da HC no conteúdo Seleção de materiais

Fontes de pesquisa confiáveis Currículo x interesse do aluno

Adaptação do conteúdo à faixa etária Ser um “assunto” novo

Parceria com colegas

Escola tradicional x protagonismo do aluno

Tempo disponível

Olhar para ciência como algo que faz parte do dia-a-dia

Uso dos recursos da escola (laboratório, internet, netbook, biblioteca)

Organização da rotina

Facilidade em relacionar o tema com o cotidiano dos alunos;

Aliar a HC com o conteúdo previsto para o ano/ciclo;

O interesse dos alunos e apoio da direção da escola;

Parceria com outras professoras;

Troca e apoio da

formadora/pesquisadora; Interdisciplinaridade;

Sugestões e indicações de materiais; Dinâmica do curso;

A aplicação da proposta;

Estar familiarizada ao trabalho com a HC Protagonismo do aluno

Todas estas facilidades são importantes, mas elas só aconteceram porque a força motriz por trás de tudo, além da curiosidade das crianças, foi a curiosidade das professoras, como pode ser observado na fala de duas delas.

P9. A curiosidade por aprender mais sobre o tema, me fazia pesquisar mais profundamente sobre o tema, e assim pude perceber o quanto a Ciência está presente em tudo no nosso cotidiano.

P47. Curiosidade foi um disparador tanto para mim quanto para as crianças quando impropério foi apresentado.

Considerando a importância da curiosidade, enquanto motor da aprendizagem, partilho da ideia expressa por DELIZOICOV; ANGOTTI; PERNAMBUCO (2009, p. 154)

Partir de temas significativos e apresentar os conhecimentos como processuais, históricos, portadores de procedimentos é resultado de ações e possibilita ações e explicações, tornando seu aprendizado uma forma de conquista pessoal e coletiva de uma vida melhor. Uma vez que o ponto de partida e de chegada é o mundo em que a vida se dá, o conhecimento científico aparece como uma das formas – nem a única nem a mais importante, mas indispensável na atualidade – de atuar e explicar criticamente. Só faz sentido em sua relação com os conhecimentos tanto da cultura prevalecente como das outras disciplinas escolares.

Em outras palavras, quando encontramos algo que nos deixa curioso em nosso cotidiano, nos sentimos instigados a descobrir os por quês, ficamos incomodados até encontrarmos a resposta. A curiosidade nos tira do lugar comum, nos transforma em pesquisadores, em investigadores. Quanto mais descobrimos, mais queremos descobrir. E a curiosidade era um tema implícito em nosso contrato didático, bem como a relação com o contexto, com o cotidiano dos alunos.