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ANEXO IV.3 – Transcrição integral das entrevistas de aprofundamento ao inquérito geral e análise de conteúdo

E.: Muito obrigada por este bocadinho.

III. Dimensão cultural

Redes de sociabilidade

Redes à chegada a Portugal

O marido já estava instalado em Portugal, mas também conhecia uma antiga colega de trabalho no Brasil que entretanto também estava imigrada em Portugal.

“O meu marido tinha vindo na frente, depois veio eu e a minha filha.”

“A Wal [colega de trabalho] veio, aí da Wal depois veio um pouco da família dela. Depois veio eu, veio a minha filhota [risos].”

Redes de sociabilidade primárias

Está atualmente separada e vive com a filha e a mãe, que trouxe também para Portugal há aproximadamente dois anos.

“Tenho, eu tenho a minha mãe, eu trouxe a minha mãe para cá.” “Minha mãe só tem dois anos, mas para o final do ano ela quer ir embora. Aí a minha situação vai ficar ainda mais delicada, porque ela também é uma companhia, um alicerce, é minha mãe… Mas também não posso segurá-la aqui, tem minha irmã, minhas sobrinhas, não é?”

Aprofundamento das disposições relativamente aos grupos com que o entrevistado se relaciona menos ou não se relaciona e as justificações em torno dessa situação.

Os seus amigos são maioritariamente portugueses e são eles que a ajudam a sentir-se acolhida em Portugal. A razão pela qual se relaciona menos com brasileiros relaciona-se com o facto de considerar que em contexto migratório os brasileiros “se tornam diferentes”, nomeadamente, tornam-se menos unidos, mais individualistas.

[questionada sobre se se sente bem com os portugueses] “Sim, mais do que nós próprios, brasileiros. Eu acho que os brasileiros que estão aqui se tornam diferentes. Porque não é assim. Nós, brasileiros, somos um povo mais amigo, mais junto. Mas quando chegam ou mudam de país mudam completamente, não sei…” “Querem assim, tipo, dizerem que são mais, quando estão aqui. E eu acho que não é por esse lado.”

“Eu gosto de sair com o meu pessoal, o meu grupo, é português, só tem eu brasileira. Só eu. Porquê? O meu pessoal, esse pessoal que eu tenho, português, a gente é mesmo amigo. Estamos ali

juntos, se tiver alguma necessidade… Se estamos tristes, estamos tristes juntos, é legal, isso. E não tem “ai porque eu sou brasileira”. Não. E eles me acolheram como isso. E eu me sinto bem, e é isso que também me ajuda a estar aqui.”

Aprofundamento das razões e motivações subjacentes à pertença ou ausência de pertença às diferentes organizações ou grupos de apoio.

Em Portugal a entrevistada pertence à Igreja Adventista do Sétimo Dia, mas pertence à igreja evangélica desde que nasceu.

Relativamente à AMB, a que está associada, afirma não ter “ligação”, conhece, mas nem sequer sabe onde se localiza.

“Na escola da minha filha o professor perguntou quem acreditava em Deus e a minha filha foi a única que levantou a mão. E eu no trabalho também vejo isso, o pessoal, tudo. Se ofende, não faz isso, e sempre estão com o nome de Deus na boca, não têm a fé, não acreditam, porque eu já perguntei muitas vezes e não acreditam. Então, eu acho que aqui é um povo descrente, é um povo descrente. Porque nós só temos um Deus, um Deus vivo.”

“A pessoa sofre mais, não sei qual é a sua crença, mas sofre mais se não tiver uma fé, porque você tem de acreditar porque a fé move montanhas, porque é ela que nos dá a força. Eu mesma, quando eu vi que estava doente, que ia entrar numa depressão, quando eu perdi o meu pai no ano passado, eu caí ao chão e falei assim “o Senhor ponha as suas mãos sobre mim porque só tenho a Si, Meu Deus, mais nada”.”

“A associação de imigrantes, mais como a da Wilma, não é? Eu não tenho assim essa ligação, nem sei onde é, se quer saber. (…) Isso, eu conheço por elas, por falarem e assim. Porque nem dá tempo…”

Estereótipos e representações

Relato de situações em que foi vítima de preconceito e/ou discriminação

A entrevistada reconhece que lhe dizem muitas “ironias” por ser brasileira, uma vez chegou mesmo a chatear-se, mas no geral toma as situações como brincadeiras e com respeito.

“Uma pessoa que começou a falar brasileiro e começou na brincadeira comigo, tipo assim aquelas ironias. Eu disse a ele “nem todos são iguais”. Nem todos são iguais, e umas são assim, outros não são, mas você está-me confundindo. A situação parou por aí mesmo e eu não tive mais problema nenhum. É isso que eu acho legal aqui, porque quando começam as ironias… Mas vocês têm um lado bom, há brincadeira, há respeito.”

Perceber se os estereótipos em relação aos brasileiros têm fundamento; se favorecem ou dificultam a integração dos brasileiros em geral na sociedade portuguesa; e se

favorecem ou dificultam o estabelecimento de relações sociais

Considera que o preconceito tem fundamento, nas suas palavras “eles andam aí”, mas também reconhece que esse facto generaliza uma ideia sobre todos os brasileiros injustamente.

“Querem assim, tipo, dizerem que são mais, quando estão aqui. E eu acho que não é por esse lado. (…) Por isso que muitas vezes a gente leva jus pelo nome que não é. Por já ter essa fama, o brasileiro. O homem brasileiro é por ser malandro e a mulher brasileira por ser puta. É a expressão, não é? Mas porquê? Eles andam aí, está entendendo?”

Perceber se já utilizou algum tipo de comportamento fora do habitual ao relacionar-se com portugueses temendo algum tipo de discriminação. Se sim, pedir para relatar a situação

Não se pode afirmar que adotou qualquer comportamento fora do habitual, mas teve o cuidado de se informar sobre as diferenças de vocabulário entre os dois países, afirma, “para “não passar vergonha”.

“Eu para não estranhar tanto, cheguei aqui e dei uma olhada num dicionário [risos]. Eu não vou passar vergonha, quando chegar lá, deixa eu dar uma olhada primeiro porque ainda faço alguma asneira [risos].”

IV. Dimensão