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Para além do campo profissional – em que me falou de todas as situações que passou por ser emigrante, por ser brasileiro –, algum outro contexto que o tenham

ANEXO IV.3 – Transcrição integral das entrevistas de aprofundamento ao inquérito geral e análise de conteúdo

E.: Para além do campo profissional – em que me falou de todas as situações que passou por ser emigrante, por ser brasileiro –, algum outro contexto que o tenham

feito sentir mal, em termos de instituições públicas, de saúde…SEF?

e.: É assim, dizer que não seria mentira. Como eu lhe disse, algumas vezes nas finanças há um tratamento mais ríspido e se a pessoa não souber… saí logo com três pedras, num instantinho todo o mundo baixou a crista e ele tratou muito bem. No SEF nunca tive nenhum problema. Talvez até por conta um pouco da idade, não é? Então, com certeza…prostituto não sou e com essa idade…de repente, sou um cara que falo bem, também acho que as pessoas…não é? Num primeiro momento, na Segurança Social, sim. Olharam meio de lado, tipo “o que é que você está fazendo aqui com essa idade, para quê que você vem para cá?” Mas…não. Eu acho que mesmo a sociedade, é o comum, é o dia-a-dia, do ónibus, da padaria, de não se conseguir integrar com as pessoas, não ter gente para ir visitar. Eu sei que as pessoas têm uma segregação muito grande a nível de você se aproximar das pessoas e isso é muito engraçado. Eu me lembro de ter entrado na padaria, eram dez horas da manhã e como chego sempre lá “Bom dia, tudo bem?”. Nunca tinha visto a menina mais gorda. Ela olhou para mim e eu falei: “ Quero dois pãezinhos”. Ela entregou, eu falei “Você está bem?” Ela disse: “Você sabe que eu estou trabalhando desde as seis horas da manhã?! Você foi a primeira pessoa que me deu o bom dia!” Aí, você começa a entender porque vocês fazem isso com vocês mesmos. Vocês não se cumprimentem, vocês são capaz de estar no mesmo café todo o dia e um não cumprimentar o outro. Então, é assim…aí você começa a dizer isso é tristeza! Isso é sentir-se isolado, isto é não participar. Então, as pessoas têm medo, as pessoas acham que têm que se manter dessa forma, mas eu vejo muito, muito, muito pessoal mais novo brasileiro, muita menina, então nem se fala…as meninas aqui são mesmo humilhadas. Homem tenta explorar ao máximo, ao máximo, quase que trabalho escravo. Você pega esse pessoal que trabalha aí, a maioria das churrascarias são brasileiros. Nós comemos muita carne, gostamos muito de fazer churrasco, não é? Um cara ganha mil, mil e cem… Vai ver quantas horas eles trabalham, vai ver se eles têm os dois descansos semanais. Nós não nos preocupamos com isso, nós queremos trabalho, nós temos vontade de fazer. E se nós gostamos de fazer, nós fazemos mais! O português quer fazer sempre menos. E quando digo português é porque estou vivendo em Portugal, mas isso vale para o resto da Europa, não pense que o resto da Europa é exceção também! Que todo o mundo quer trabalhar muito e o português quer trabalhar pouco, não! A história das conversas das conquistas

sociais que é isto que está matando todos os países da Europa. Eles vão levar um tempinho mais para descobrir, mas é isso que está matando, isso é um cancro. Porque se você não morre, a velho chega. Quem é velho tem o direito a ser bem tratado, precisa de ter o seu remédio, ter a sua consulta, para isso alguém tem que pagar! O jovem não consegue emprego, não consegue pagar a quem está empregado, que está ficando desempregado, porque…e quebrou porquê? Porque todo o mundo quer trabalhar trinta horas, porque todo o mundo quer trabalhar menos e ganhar mais e isso que está acontecendo em Portugal hoje, eu já vi no Brasil há trinta anos, quando o Lula foi para a rua fazer greve e as conquistas sociais, supostas, começaram… aí você vê o sindicato fazer greve. Porquê? Eles queriam cinco por cento e o patrão estava dando três. Isso não é greve, desculpe. Por isso, é que querem esbanjar…esbanjar no sentido de que nós temos o poder. Então, o sindicalismo criou um poder muito grande, afundou as empresas, o Estado, por sua vez, com que cobra em cima das empresas também afunda as empresas. Quer dizer, obriga com que as pessoas se neguem, obriga com que as pessoas que tentem dar a volta, porque não há uma administração clara. O que há é uma perda de dinheiro, não só do erário público, como das comissões que têm de fazer… Porque todo o mundo pensa que pode continuar a viver como era na monarquia. O rei vivia muito bem e a corte, e o resto do povo tinha que passar fome. Então é bom que o português continuar comendo a sua batata, comendo a sua sopinha e vivendo no campo ou indo ao campo buscar a sua batatinha, a sua couve que tem lá no quintal de casa, isso para ele está bom. Infelizmente, o português está-se contentando com isto… Eu fiz muita pesquisa e me assusta saber que nem dez por cento dos portugueses saem de férias para fora de Portugal. Hoje são cinco por cento… Quer dizer, hoje mais de cinquenta dos portugueses não têm o nono ano. Ah? É um absurdo. Estamos falando em dez milhões de pessoas. Não sabem andar de metro, não sabem o que é uma escada rolante… Não foram a outros, a outro lugar, ou seja, sair de uma ponta de Portugal e ir para outra. Aí a pergunta, isto é viver? Você ser dono de um café que dá muito dinheiro, como eu conheço um aí, um não, dois e o cara não tem férias. Até que o homem tira um dia…o café fecha um dia por ano, tira férias, por exemplo, uma semana com a família, é verdade, e fica em Portugal “Ai, mas eu tenho dez casas, dez apartamentos, dez não sei o quê”. Está andando torto, o outro teve um derrame e nunca e nunca, não sabe o que é ir à França, não sabe…vamos falar de Espanha que é mais perto…não foi a uma praia fora de Portugal…isso não é vida. Isto não é vida! Diga lá, me conta. Diga mais que eu só falei… que mais quer saber?