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CAPÍTULO III: Trilhas

2. Dimensão Teleológica

De início, a fim de evitar equívocos, é bom deixar claro que, apesar das discussões filosóficas em torno do termo “teleologia”4

, admite-se que aqui ele foi usado no seu sentido mais amplo, que seria algo que ocorre em função de uma determinada causa final, ou seja, relativo ao que é / ou será obtido. É nesse sentido que se dividiu a dimensão teleológica em dois níveis: objetivos e finalidades e/ou funções.

2.1. Os objetivos da ASRP

Em primeiro lugar, é preciso ter em mente que os objetivos de uma organização não precisam ser exatamente iguais aos definidos, por exemplo, nos regulamentos ou nos estatutos, apesar de estes refletirem não apenas os objetivos, mas os posicionamentos e estratégias do(s) grupo(s) que influencia(m) a organização.

Mintzberg (1992) argumenta que os objetivos dos agentes internos e externos de uma organização nem sempre correspondem à missão da mesma, sendo esta a premissa básica da instituição na sociedade e os objetivos relacionam-se diretamente a indivíduos e grupos. O autor, inspirado na teoria do “ação social” / “ator social” de Weber (1994), deduz que

[…] o poder é uma obra de teatro. Em nossa sociedade, o poder nas organizações e em seu entorno é uma espécie de tragicomédia; nós gostaríamos de rir e às vezes o fazemos, mas muitas vezes

4 O termo teleologia do grego telos igual a fim, onde teleo igual a finalizar e logos igual a dizer; (no sentido de um raciocínio lógico) foi criado por Wolff na sua filosofia racional, segundo a Lógica, seção-85. Daí decorreram algumas variações de sentido. Em Kant, temos a teleologia como o estudo da finalidade, num senso qualquer da coisa. É dele a questão: ―Toda uma ciência deve ter na Enciclopédia de todas as ciências o seu lugar determinado... qual lugar convém a teleologia? Ela pertence propriamente à nominada ciência da natureza ou à teologia?‖ KANT, I. Crítica da força do juízo, parágrafo 68. (LALANDE, A. Vocabulaire Technique et critique de la Philosophie, 1962).

também choramos [...] a organização instrumental [controlada por um agente externo] descreve-se como uma „representação do poder em dois atos‟; o sistema fechado [controlada por um agente interno burocrático] como uma „representação privada em um só ato‟; as autocracias [organização controlada pessoalmente por um agente interno] como um solo; as organizações missionárias [com forte ideologia] como „uma obra com paixão‟, as meritocracias [dependentes de conhecimentos e habilidades de técnicas específicas] como um „espetáculo com muito talento‟; e as arenas políticas [em que não existe um agente interno ou externo predominante] como „um espetáculo circense com muitos cenários‟ (MINTZBERG, 1992, p. XXIII-XXIV).

A fim de se ter o maior grau de informações sobre a ASRP, buscou-se todos os estatutos no Cartório de Serviço Notarial e Registral “Rocha Brito”, sito à cidade de Pelotas. O respectivo cartório, conforme comprova-se em anexo, certificou o seguinte:

ROCHA BRITO SERVIÇO NOTARIAL E REGISTRAL, por seu

responsável infra-assinado, certifica o requerimento da parte interessada, que revendo o Arquivo deste Serviço do REGISTRO

CIVIL DAS PESSOAS JURÍDICAS, dele consta registrado sob nº

013 das fls. 055/056 do Livro A-2 em data de 20.06.1930. O Estatuto Social da ASSOCIAÇÃO SUL-RIOGRANDENSE DE

PROFESSORES. Certifico mais que, constam arquivadas,

averbadas e registradas sob nº 382 as fls. 020/021 do Livro A-3 em data de 02.03.1953; sob nº 1448 a fls. 147 do Livro A-5 em data de 06.10.1975 as respectivas alterações do Estatuto Social. O referido é verdade e dou fé. Pelotas, trinta dias de março de dois mil e onze.

A primeira alteração do estatuto (1953) teve mudanças significativas, precisando-se da confecção de praticamente um novo estatuto; já a última alteração mencionada acima previa apenas a “reeleição de qualquer membro do Conselho Diretor, por mais de um período” (Reforma do Estatuto da ASRP, 1975).

principais objetivos da instituição e suas variâncias ao longo de sua história (Quadro 05):

Quadro 05

Quadro de comparação entre os estatutos da ASRP

Estatuto de 1929-30 Estatuto de 1953

a) Pugnar pelo aperfeiçoamento da instrução

e da educação no Rio Grande do Sul. Introduzindo métodos e processos novos, adaptando ou não outros já usados em

alguns países, criando bibliotecas e

laboratórios pedagógicos, realizando

palestras, promovendo congressos,

caravanas de professores, etc.;

b) Procurar manter e aumentar a coesão

entre os vários elementos que, no Rio Grande do Sul, se dedicam ao magistério oficial ou particular, seja primário,

secundário, superior, profissional ou

artístico;

c) Manifestar-se sobre reformas e

modificações feitas nos vários

departamentos da instrução e educação relativas ao problema educativo no Rio Grande do Sul;

d) Intervir, sendo solicitada, na defesa dos

direitos ou da reputação dos seus

associados quando estes injustamente forem prejudicados;

e) Crear secções em todos os municípios de

nosso Estado;

f) Tornar-se o mais breve possível em

sociedade beneficente também;

g) Aproximar os paes dos professores; h) Solenizar em todo o Estado o dia 15 de

outubro, consagrado ao professor.

a) Pugnar pelo aperfeiçoamento da instrução

e da educação no Rio Grande do Sul, introduzindo métodos e processos novos, adaptando outros já usados em países estrangeiros, criando bibliotecas, realizando

palestras, promovendo congressos,

caravanas de professôres;

b) Manifestar-se sôbre reformas ou

modificações feitas nos vários

departamentos da instrução e educação no Brasil;

c) proteger, prestigiar e defender os sócios,

quando necessário, em público ou em particular, na Imprensa ou nos Tribunais;

d) promover a criação de entidades

congêneres em outros municípios do Estado;

e) representar a classe diante das

autoridades públicas, pleiteando

providências oportunas e convenientes ao seu prestígio e ao seu interêsse;

f) promover a aproximação entre pais e

mestres;

g) solenizar o dia “15 de outubro”,

consagrado ao Professor.

A partir dessas diretrizes declaradas nos dois estatutos distingue-se quatro tipos de objetivos ___ profissional, pedagógico, político e social. Dificilmente tais objetivos podem ser separados, pois todos estão interligados, sendo mais visíveis nas finalidades.

Os objetivos profissionais são mais concernentes aos aspectos da qualificação docente, pois havia desde sua fundação uma certa carência tanto na

primeira formação como na continuada. Tais objetivos estimularam a ASRP a realizar palestras, conferências, seminários não só aos seus associados, mas também à classe professoral em geral.

Os objetivos pedagógicos, intimamente relacionados com os objetivos profissionais e sociais impulsionaram as intervenções e opiniões realizadas pela ASRP nos sistemas e reformas educacionais, principalmente nas esferas municipais e estaduais, focando sempre, conforme o estatuto, o “aperfeiçoamento da instrução e da educação no Rio Grande do Sul. Introduzindo métodos e processos novos, adaptando ou não outros já usados em alguns países, criando bibliotecas e laboratórios pedagógicos...”.

Os objetivos políticos, conectados a todos os outros, remetem-se ao panorama dos conflitos internos e externos da organização, ou seja, é um embate de interesses, que vão desde os individuais aos coletivos. No caso da ASRP, estes conflitos priorizam na maioria das vezes a defesa dos interesses dos professores enquanto profissionais e, num segundo plano, dos aspectos educacionais de âmbito geral.

Os objetivos sociais, vinculados diretamente às funções da organização, ou seja, dos serviços prestados pela instituição para melhorar num primeiro momento a qualidade social de seus membros, num primeiro momento, mas que perpassa o corporativismo no momento seguinte quando, por exemplo, uma palestra seria livre, ou no caso da biblioteca pedagógica da ASRP servir não só aos associados mas à comunidade em geral.

Um fato interessante é a exclusão, na reforma do estatuto, em 1953, da letra “b” do estatuto anterior, bem como a mudança da letra “c” [que passou a ser a letra “b” no novo estatuto], que ampliou sua área de domínio de estadual para nacional: “manifestar-se sobre reformas ou modificações feitas nos vários departamentos da instrução e educação no Brasil” (ESTATUTOS DA ASRP, 1953,CAP. I, ART. 1º).

Isso se dá principalmente devido às características do sistema educacional, que passa a ser de caráter nacional e homogeneizante, de fato, a partir dos anos 30 com a criação da Pasta dos Negócios da Educação e Saúde Pública em 1930, com o Plano Nacional de Educação, estabelecido pela Constituição de 1934, bem como as reformas educacionais nas décadas de 30 e 40.

2.2. As finalidades e/ou funções da ASRP

Apesar de este estudo estar usando os termos finalidade e função como sinônimos, isso é apenas uma estratégia de composição do modelo de análise proposto para a ASRP, pois não são poucas as vezes que as finalidades e as funções se misturam. Mas para efeito de identificação, é bom ter consciência de que as finalidades estão mais inclinadas aos objetivos enquanto que as funções resumem-se praticamente aos produtos e/ou serviços produzidos e/ou prestados pela organização.

Além disso, a junção não prejudica em nada o estudo da referida instituição; esta estratégia é tão somente para evitar a repetição de análises e argumentações, mas as finalidades e funções de uma organização podem ser, dependendo do tipo da análise, estudadas separadamente.

Focando mais as finalidades, Mayntz (1972, p. 76) argumenta que elas seriam as metas mais específicas, guiadas pelos objetivos, mas com uma perspectiva não tão abstrata, mais palpável, materializável e, portanto, mais previsível. Hall (2004) complementa afirmando que as finalidades de uma organização, sejam latentes ou oficiais, reais ou declaradas, agem coligadas com os objetivos, mas sofrem a pressão direta de alguns imperativos de adaptação e sobrevivência. Sobre esse aspecto, SCOTT (1964 apud HALL, 2004, p.28), afirma que as:

Organizações são definidas como coletividades [...] que foram estabelecidas para a concretização de objetivos relativamente específicos de forma mais ou menos contínua. Deve, no entanto, ficar claro [...] que as organizações possuem características diferenciadoras, além da especificidade e continuidade da meta. Essas características incluem fronteiras relativamente fixas uma ordem normativa, níveis de autoridade, um sistema de comunicações e um sistema de incentivos que permitem, aos diversos tipos de participante, trabalhar juntos para a realização de metas comuns.

Mas isso não equivale dizer que as funções e os objetivos devam coincidir. O “objetivo da organização só constitui uma função quando a ação proposta e a ação efetiva são iguais”; Caso contrário, ela passa a ser considerada uma “ação concomitante” (MAYNTZ, 1972, p. 76).

Vale ressaltar também que, para que uma organização exista e se desenvolva, é necessário que ela agregue cada vez mais membros; dessa forma, para clarificar a análise das finalidades e/ou funções, é fundamental perguntar-se: Como são recrutados novos membros? Que incentivos são oferecidos pela organização para cativá-los? Quais as estratégias utilizadas pela organização para garantir a permanência e a colaboração dos indivíduos? (MAYNTZ, 1972, p.143)

Para a ASRP se desenvolver e se institucionalizar, era vital o aumento dos associados; entretanto, havia um certo filtro, garantido pela indicação de novos sócios por antigos sócios em Assembleia Geral. Além disso, havia algumas restrições para se tornar sócio, o que já mostrava a preocupação com a profissionalização docente:

Só poderão ser admitidos como sócios os portadores de diplomas, títulos de habilitação ou registros que lhes assegurem o direito de exercer o magistério em estabelecimento de ensino do país. [...] Na falta de qualquer um destes documentos, só serão admitidos os professores que tiverem parecer favorável de uma comissão de sindicância para este fim designada pelo Conselho Diretor (ESTATUTOS DA ASRP, 1953,CAP. III, ART. 13º).

Como exemplo da rigorosidade desse processo, descreve-se o fato de uma “professora de corte e costura” tentar se associar mas ser recusada:

Em prosseguimento a Sra. Presidente levou ao conhecimento do Conselho a proposta para sócia de uma prof. Diplomada em corte e costura que, por interesse próprio, solicitava sua admissão. Julgado o curso, posto em discussão e após analisado, foi o mesmo

rejeitado (LIVRO DE ATAS, 1966-1975, ATA Nº 5, 8/03/1967).

[grifo intencional]

Devido a essa necessária rigorosidade, houve muitos altos e baixos em relação ao número de associados, pois o grande problema era a inadimplência em relação às mensalidades, implicando na exclusão do associado após seis meses de atraso, pois

A exclusão do sócio efetivo do quadro social dar-se-á por deliberação do Conselho Diretor: […] quando faltar ao pagamento da mensalidade durante seis meses consecutivos, sem motivo justificado perante o mesmo Conselho; […] quando por seu procedimento, prejudicar os interesses ou o renome da entidade ou da classe do magistério, comprovada sua culpa (ESTATUTOS DA ASRP, 1953,CAP. III, ART. 16º).

Entretanto, por questão de sobrevivência, a ASRP, sempre que possível, fazia abatimentos e/ou campanhas de reintegração de associados afastados como, por exemplo: “O Conselho resolveu que os sócios que se demitiram e que quisessem retornar à Associação, até junho próximo vindouro, ficassem isentas do pagamento de nova joia” (ATAS DO CONSELHO DIRETOR E ASSEMBLEIA GERAL, 1933-1937, ATA Nº 104, 27/04/1936).

Para se ter uma ideia melhor desse processo, o gráfico abaixo (Figura 02) apresenta o crescimento do número de associados ao longo de 43 anos, cujos dados foram retirados dos Relatórios Anuais das Diretorias da ASRP. Os dados foram coletados até o ano de 1972; de 1973 em diante estes dados não foram mais registrados nos relatórios.

Desde a fundação da associação, havia uma categorização de associados:

 Efetivos ___ que eram os sócios que contribuíam com uma quantia de entrada (joia) e seguiam pagando a mensalidade, além de terem de preencher os requisitos supracitados;

 Grandes benfeitores ___ eram as pessoas que doavam uma quantia não inferior a um determinado limite (em 1929, cinco contos de réis; em 1953, Cr$ 25.000, 00);

 Benfeitores ___ entravam para a associação doando não menos de quinhentos mil réis. Esta tipologia foi extinta na reforma nos estatutos de 1953;

 Beneméritos ___ eram pessoas que prestavam serviços relevantes à associação e à classe. Interessante saber que a expressão “à classe” somente foi incorporada nos estatutos de 1953, o que indica já uma ruptura no corporativismo associativo, implicando, de fato, numa perspectiva classista consciente. A próxima ilustração (Figura 03), no momento em que a Professora Gerta M. O de Almeida saudava a Professora Cecy Sacco, exemplifica como eram estas solenidades.

 Honorários ___ eram pessoas sem ligação direta nem social com a associação que esta quisesse honrar.

Figura 03: Sessão solene de entrega do título de “Sócio Benemérito” à Professora Cecy Sacco, na sede própria da ASRP, em 15/10/1970.

Retornando aos questionamentos propostos por Mayntz (1972, p. 143), o recrutamento de novos sócios foi uma das grandes empreitadas da ASRP, principalmente em seu primeiros anos. E para garantir um recrutamento maior de associados, uma das estratégias da ASRP foi expandir para outras cidades do Rio Grande do Sul.

A cidade do Rio Grande foi a primeira a sediar uma filial da ASRP, cujos encontros eram realizados no Colégio Juvenal Müller. Assim como Rio Grande, outras cidades fizeram parte do raio de ação da ASRP; entretanto, um dos grandes obstáculos desse processo foi a não concordância com alguns pontos dos estatutos: “... foi lido um ofício que recebemos do diretor do Colégio Elementar de Vacaria, o qual nos diz que será impossível fundar uma filial nossa lá porque a maior parte não concorda com os estatutos” (LIVRO DE ATAS DO CONSELHO DIRETOR, Ata nº 26).

Quando a ASRP não conseguia fundar uma filial nas cidades pretendidas, a fim de agregar sócios nessas cidades, usava-se a estratégia dos sócios- correspondentes. Pois, em alguns municípios, o número de interessados em associar-se não era suficiente para fundar uma sucursal da ASRP; como sócios- correspondentes, estes pagavam as mensalidades via correio e tinham seus direitos de sócios assegurados.

Um dos grandes empecilhos encontrados pela ASRP foi a concorrência com outras associações docente que surgiram nos anos 30 como, por exemplo,

Associação Riograndense de Educação, fundada em Setembro de 1930, em Porto

Alegre (ATA DO CONSELHO DIRETOR DA ASRP nº 16, 22/11/1930); Associação

de Professores Católicos – sucursal de Pelotas, criada em 1932 (ATA DO

CONSELHO DIRETOR DA ASRP nº 66, 25/10/1933); União dos Professores de

Santa Maria, fundada em 1933 (ATA DA ASSEMBLEIA GERAL ORDINÁRIA DA

ASRP, 13/10/1933); União dos Professores Públicos e Particulares do Rio Grande

do Sul, fundada em 1933 no Município de Santa Maria (ATA DA ASSEMBLEIA

GERAL ORDINÁRIA DA ASRP, 17/11/1933).

Apesar dos esforços empreendidos, a ASRP conseguiu implantar filiais apenas em 3 municípios: Rio Grande, Camaquã e Osório. Entretanto, possuía sócios-correspondentes em mais 11 municípios: São Borja, Itaqui, Santo Ângelo, Cruz Alta, Tupanciretã, Vacaria, Santa Cruz, São Leopoldo, Rio Pardo, Caçapava e Herval (Figura 04).

Os outros dois questionamentos propostos por Mayntz (1972, p.142), são estritamente relativos às finalidades e/ou funções da ASRP, que se

concentraram nos seguintes pontos: qualificação docente; institucionalização do “15 de outubro”, dia “consagrado ao professor”; valorização do profissional docente no âmbito do funcionalismo público; a criação e manutenção da biblioteca pedagógica; caixa beneficente. Estes serão analisados detalhadamente em seguida.

2.2.1. A luta pela institucionalização do “15 de outubro consagrado ao professor”

As sociedades contemporâneas incorporaram em seu cotidiano dias festivos/ memorativos seja na esfera local, nacional ou global. Em contrapartida, salienta-se que estas datas memorativas são históricas, ou seja, não são naturais; constroem-se à medida que o seres humanos produzem sua vida cultural, suas referências, seus ciclos temporais. Isto é, tais datas são alusões à marcos, que auxiliam na estruturação dos ciclos temporais das sociedades, organizando a vida tanto na esfera pública como na esfera privada, já que esta é consequência daquela. Sendo assim, pode-se dizer que o calendário, bem como os marcos temporais que o compõem, é mormente uma produção social e, portanto, produto de relações de poder.

Essa relação de poder, através da ação social, é importante tanto para os que estão envolvidos diretamente como para aqueles que estão à margem, sem entretanto estar isento aos seus efeitos. Isso ocorre devido aos diversos e variados sistemas de códigos,que os seres humanos usam para representar e valorar o mundo ao seu entorno; os significados destes códigos vai depender de cada sociedade, onde cada indivíduo o usa para regular e organizar suas ações em relação ao meio em que vive.

O calendário, assim como as datas comemorativas que o compõe, é um desses sistemas de códigos e, em sendo uma produção social consequente de uma embate de interesses, tais datas são carregadas de ideologias, simbologias e representações:

O tempo e o espaço são coordenadas básicas de todo sistema de representação. Todo meio de representação ___ escrita, pintura, desenho, fotografia, simbolização através da arte ou dos sistemas de telecomunicações ___ deve traduzir seus objetos em dimensões espaciais e temporais […] Assim a moldagem e remoldagem de relações espaço-tempo no interior de diferentes sistemas de representação têm efeitos profundos sobre a forma como as identidades são localizadas e representadas. Todas as identidades

estão localizadas no espaço e no tempo simbólicos (HALL, 2002, p. 70-71).

A manifestação popular do Dia do Professor tem origens desconhecidas, mas os historiadores da educação brasileira têm um posicionamento hegemônico em relação à data histórica que referenciou a tradição: 15 de outubro de 1827, dia da promulgação da primeira Lei Geral do Ensino Elementar no Brasil.

Sobre a manifestação popular da comemoração do Dia do Professor no dia 15 de outubro há ainda muitas divergências. Por enquanto, parece ter sido em São Paulo onde a prática começou, tendo sido trazida para o Rio Grande do Sul pelo professor Joaquim Alves da Fonseca, presidente-fundador da Associação Sul Rio- Grandense de Professores.

Em entrevista alusiva ao Dia do Professor, dada ao periódico “Gazeta Pelotense”, no ano de 1976, o professor Joaquim Alves da Fonseca deixa claro que, mesmo antes da criação da ASRP, já brigava pela institucionalização do Dia do Professor:

Entre todas as coisas que lhe parecem interessantes, no decurso de sua profissão, o professor Joaquim cita como da máxima relevância o fato de ter sido quem primeiro instituiu o Dia do Professor no Rio Grande do Sul. Ele havia lido num jornal de São Paulo que lá haviam festejado essa data, no ano de 1925. Pediu então ao Diretor do Ginásio Pelotense, na época o Dr. Joaquim Luís Osório, para festejar o dia 15 de outubro daquele ano (1926). E, desde aí,os festejos desse dia têm se repetido ininterruptamente (GAZETA PELOTENSE, nº 18, 17/10/1976, p. 07).

transformação numa “tradição inventada”5

pode ser interpretada como um rito de colaboração da construção e (re) construção da identidade da classe docente. Pois

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