• Nenhum resultado encontrado

Dimensões de valor: unidimensional x multidimensional

Video 8 Casar no Rock in Rio #PodeSerÉpico

2. FUNDAMENTAÇÃO TÉORICA

2.3 CONCEITUAÇÃO DE VALOR

2.3.1 Dimensões de valor: unidimensional x multidimensional

2.3.1.1 Valor unidimensional

As abordagens de estudo de valor como um constructo unidimensional têm como enfoque a relação custo-benefício. O valor para o cliente deriva, nessa abordagem, do trade-off entre qualidade e preço do produto (DODDS; MONROE; GREWAL, 1991; DODDS; MONROE, 1985; GREWAL; MONROE; KRISHNAN, 1998; ZEITHAML, 1988).

Assim, o valor (percebido)4 é entendido como um conceito único, que pode ser medido por um item ou conjunto de itens, sendo a percepção de valor decorrente dos efeitos de vários antecedentes e não formado por um conjunto de componentes (SÁNCHEZ-FERNÁNDEZ; INIESTA-BONILLO, 2007). Essa abordagem tem sido utilizada em muitos estudos com o propósito de analisar vários aspectos do comportamento de consumo, como a influência do valor na satisfação (GALLARZA; GIL-SAURA, 2006; GREWAL; MONROE; KRISHNAN, 1998; LAI; GRIFFIN; BABIN, 2009; YANG; PETERSON, 2004), nas intenções do consumidor (MCDOUGALL; LEVESQUE, 2000; SINKULA; BAKER; NOORDEWIER, 1997) e nas outras áreas (DODDS; MONROE, 1985; GREWAL; MONROE; KRISHNAN, 1998; MCDONALD, 1993; THALER, 1985).

4 O valor nos estudos unidimensionais é abordado, na maioria das vezes, como o valor percebido como referido

por Dodds, Monroe e Grewal (1991, p.308): “trade-off cognitivo entre as percepções de qualidade e sacrifício resultam na percepção de valor. ”.

Em um trabalho abrangente, com larga repercussão em pesquisas posteriores, Zeithaml (1988) fornece uma perspectiva sobre o valor relacionando os valores dos consumidores com seus comportamentos. Para a autora, os processos relativos às tomadas de decisão do consumidor são influenciados por três elementos principais: (a) os vínculos entre os atributos do produto; (b) as consequências percebidas de consumo; e (c) os valores pessoais dos consumidores. Tendo esses processos como base, a autora descreveu quatro definições diferentes de valor: (a) valor como baixo preço; (b) valor como o que se quer em um produto; (c) valor como a qualidade obtida pelo preço pago; e (d) valor como o que o consumidor recebe por aquilo que dá. A partir dessas definições, Zeithaml (1988) considera o valor percebido como a relação entre “o que eu ganho pelo que eu dou”. Segundo Sánchez-Fernandez e Iniesta- Bonillo (2007), a essência da teoria meio-fim proposta por Zeithaml (1988) é que os indivíduos buscam produtos ou serviços que os permitam alcançar os estados finais desejados; logo, os atributos dos produtos ou serviços, sejam eles intrínsecos ou extrínsecos, nada mais são que um meio para chegar ao estado desejado.

Os estudos baseados nessa abordagem, no entanto, não tiveram êxito em explicar plenamente o conceito de valor, sugerindo, assim, outras abordagens complementares que buscassem inserir outras dimensões de análise na tentativa de melhor compreender este fenômeno.

2.3.1.2 Valor Multidimensional

A abordagem multidimensional, segundo Sánchez-Fernandez e Iniesta-Bonillo (2007), analisa o valor como um constructo formado por vários atributos ou dimensões que, a partir da sua interação, permitirão ao consumidor definir o valor como uma representação integral de um fenômeno complexo (BABIN; BABIN, 2001; GALLARZA; ARTEAGA; GIL-SAURA, 2013; GALLARZA; GIL-SAURA; HOLBROOK, 2011; HOLBROOK, 2006; HUBER et al., 1997; SHETH; NEWMAN; GROSS, 1991; SWEENEY; SOUTAR, 2001; WOODRUFF, 1997).

Assim, o valor passa a ser estudado como resultado de múltiplas interações, já que os “consumidores [buscam] antecipar e derivar o valor através de muitas fontes — produto marketing de busca, mensagens, compra de produto, experiência direta e uso, conselhos de boca a boca e assim por diante. (BRADLEY; SPARKS, 2012, p. 192)”. Considerando esse contexto, os estudos passam a refletir a preocupação de englobar as múltiplas dimensões que se inter- relacionam, formando uma representação holística desse fenômeno (DODDS; BULMER; MURPHY, 2014).

Essa visão mais ampla do conceito de valor não é recente e pode ser observada, por exemplo, no trabalho Holbrook e Hirschman (1982), quando descrevem a importância dos aspectos experienciais do consumo como uma experiência hedônica e utilitária, oferecendo, assim, uma visão mais ampla do comportamento do consumidor. Múltiplas dimensões têm sido estudadas como formadoras do valor para o consumidor, entre elas: apelo visual, altruísmo, atenção, circunstancial, condicional, conforto, conveniência, preço monetário percebido /econômico, econômico, eficiência, emocional, entretenimento, escapismo, epistêmico, espiritualidade, estética, estima, ética, excelência, experiencial, extrínseco, espacial, funcional (qualidade x performance), harmonia, hedônico, imagem, intrínseco, play, politica, pós-venda, preço, qualidade, reconhecimento, relacional, reputação, risco, simbólico, sacrifício, social, status , técnica, temporal, tempo e esforço dispendido e utilitária. A descrição destas dimensões e estudos que as investigaram podem ser observadas no Apêndice A.

Sheth, Newman e Gross (1991) identificaram cinco dimensões de valor: funcional, social, emocional, epistêmica e condicional. O valor funcional refere-se à utilidade percebida que é obtida por meio da capacidade de desempenho de uma alternativa, decorrente de seus atributos fisicos, utilitários ou funcionais salientes. O valor social se relaciona com a congruência relativa às normas do consumidor e ao seu ambiente social e está muito associado ao imaginário, visto que envolve escolhas que demonstram o compartilhamento de valores com grupos por meio produtos ou serviços. O valor emocional refere-se aos sentimentos do consumidor em relação ao consumo, enquanto o valor epistêmico refere-se ao desejo de conhecimento do consumidor. Por último, o valor condicional reflete a ideia de que as necessidades e desejos dos consumidores variam de acordo com diferentes fatores situacionais ou circunstanciais.

Para Sweeney e Soutar (2001), as dimensões de valor epistêmica e condicional não são relevantes, mas eles concordam que os valores funcional, social e emocional propostos por Sheth, Newman e Gross (1991) devem ser avaliados. Os autores destacam que “apesar da importância do valor, tem havido pouca pesquisa empírica para desenvolver uma compreensão aprofundada do conceito. Poucas investigações centraram-se sobre a especificação de seu domínio ou o desenvolvimento de uma escala prático e operacional de valor” (SWEENEY; SOUTAR, 2001, p. 204). Assim, propõem a análise de valor a partir de quatro dimensões: valor emocional, valor social e valor funcional dividido em dois âmbitos: preço/valor econômico e valor no sentido de qualidade e performance.

No entanto, a tipologia do valor proposta por Holbrook (2006;1999) ainda se revela uma das abordagens mais exaustivas e completas para a construção de valor (GALLARZA; GIL-

SAURA, 2006; MATHWICK; MALHOTRA; RIGDON, 2001; SÁNCHEZ-FERNÁNDEZ; INIESTA-BONILLO, 2009). Holbrook (1999) propõe uma tipologia para valor do consumidor considerando sua orientação para compra e o tipo de estímulo (extrínseco e intrínseco), como pode ser observado no quadro 1.

Quadro 1-Tipologia de Valor na experiência de consumo de Holbrook

Fonte: Holbrook (1999, p. 149)

O valor extrínseco refere-se a uma relação meio-fim, em que o consumo é valorizado por sua instrumentalidade funcional, utilitária, ao servir como um meio para realizar ou alcançar um objetivo. Já o valor intrínseco ocorre quando uma experiência de consumo é apreciada como um fim em si — por si só —, para além de qualquer outra consequência que possa resultar. A orientação é considerada pelo aspecto do auto-orientado versus orientado para os outros; o auto- orientado envolve o valor em virtude do efeito que tem sobre si mesmo, enquanto o orientado pelos outros envolve um aspecto de consumo avaliado positivamente por causa da maneira como os outros respondem. O papel desempenhado pelo consumidor é analisando considerando se ele é ativo ou reativo, ou seja, se o consumidor se envolve manipulando e interagindo com o produto ou os serviços ou se a valorização da experiência de consumo ocorre quando o objeto afeta o consumidor de forma reativa (HOLBROOK, 1999).

A partir desses aspectos, a tipologia de Holbrook propõe a análise do valor considerando oito dimensões: eficiência (benefícios/sacrifícios), excelência (qualidade), status (sucesso, gestão da impressão/imagem), estima (reputação, posses), jogo (diversão), estética (beleza), ética (justiça, moralidade) e espiritualidade (fé, santidade, êxtase). Todas podem ocorrer na

mesma atividade de consumo, em diferentes graus, e formar uma “experiência relativista interativa onde o relativismo envolvido inclui o conceito de uma comparação entre as fontes concorrentes de valor” (HOLBROOK, 1999, p. 187). Para Babin, Darden e Griffin (1994, p. 646), a natureza subjetiva e pessoal das percepções intrínsecas de valor resultam da “diversão e da brincadeira (de uma experiência), ao invés de tarefa conclusão”.

Essa tipologia é largamente aceita pelos acadêmicos e serviu como base para trabalhos como os de Bevan e Murphy (2001), Mathwick, Malhotra e Rigdon. (2002, 2001), Jensen e Hansen (2007), Gallarza, Arteaga e Gil-Saura (2013), além de ser refletida nos resultados encontrados por Dodds, Bulmer e Murphy (2014) quando estudaram em profundidade, por meio de entrevistas, as experiências de consumidores com serviços de medicina alternativa, identificando sete valores: 1) qualidade de cuidados, tratamento; 2) eficiência; 3) ambiente físico; 4) aspecto social (estima); 5) aspecto espiritual; 6) ética (aspecto natural); e 7) diversão (relaxamento, atividades de lazer).

Heinonen (2004), em seu estudo do valor para consumidores de serviços bancários on- line, sugeriu um modelo de análise baseado em quatro dimensões. Nesse modelo a dimensão técnica do valor refere-se ao resultado da interação dos atributos que compõem o núcleo do serviço. A dimensão funcional refere-se à experiência dos clientes durante o processo de serviço, ou seja, as interações entre o cliente e todos os tipos de interfaces da empresa (pessoal ou técnica). A dimensão espacial dá conta das características e ao local de prestação do serviço, revela a forma como o cliente percebe o local onde ocorre a interação. A dimensão temporal indica a percepção dos clientes quanto aos aspectos de disponibilidade temporal do serviço. Essa abordagem entende o valor para o cliente como uma experiência cujas dimensões compreendem aspectos que implicam benefícios e sacrifícios, e a percepção destes é evidenciada pela comparação com outras experiências ou serviços concorrentes (HEINONEN, 2004; HEINONEN; STRANDVIK, 2004).

Diversos estudos e escalas foram testados, como por exemplo a SPERVAL composta de doze dimensões de Kainth e Verma (2011) e a Bradley e Sparks (2012), de onze variáveis. Estas propostas buscam dar conta das deficiências de medição que emergem da complexidade revelada pelo conceito sem, no entanto, conseguir capturar por completo a riqueza multidimensional do conceito de valor (GALLARZA; GIL-SAURA; HOLBROOK, 2011).