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O direito de acesso à justiça

No documento Prova ilícita-inadmissibilidade relativa (páginas 30-34)

2. O due process of law e o princípio do contraditório

2.4 O direito de acesso à justiça

Ao contrário de outras nações que servem de referência ao direito brasileiro, como a França, Portugal e a Alemanha, o direito nacional proclama o sistema de jurisdição única, ou seja, nenhuma lesão ou ameaça ao direito individual ou coletivo, de pessoa física ou jurídica, é passível de exclusão ao controle jurisdicional, pela lei.

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A Constituição de 1967, no seu art. 157, estabelecia uma hipótese de condicionamento para o ingresso em juízo na parte final do §4º:

... O ingresso em juízo poderá ser condicionado a que se exaurem previamente as vias administrativas, desde que não seja exigida a garantia instância, nem ultrapassado o prazo de 180 dias para a decisão sobre o pedido.

Este condicionamento foi afastado pelo constituinte de 1988, quando não mais se admitiu o pré-requisito do esgotamento prévio da via administrativa para que a pretensão resistida fosse submetida a juízo.

Procedendo-se a análise da Lei 1.533/51, em seu art. 5º, observa-se um aparente contraste com o que dispõe o inciso XXXV da CF, porque referido art. 5o da lei contém o seguinte comando: “Não se dará mandado de segurança quando se tratar: I- de ato a que couber recurso administrativo com efeito suspensivo, independente de caução.”

Não obstante, in casu, não há que se falar em revogação da lei supracitada por oposição ao comando constitucional; é que em se tratando do ato do qual cabe ainda recurso administrativo com efeito suspensivo e independente do depósito para garantia de instância, não há que se falar em lesões, tampouco de ameaça a direito. De fato, com interposição do recurso, e em não havendo a exigência de caução, o ato tem a sua eficácia jurídica contida em decorrência do efeito suspensivo do recurso administrativo, não se podendo falar em vulnerabilidade de direito de terceiro a quem os efeitos potenciais do ato se destinam.

Neste sentido, afirma Michel Temer:11

É preciso ressaltar, de logo, que a garantia constitucional insculpida no art. 5º, LXIX, se destina a impedir lesões a direito individual, ou seja, este instrumento só é utilizável na medida em que se efetive vulneração a direito líquido e certo.

E continua:

Anota-se que não é efeito suspensivo, atribuído ao recurso, que impede a utilização do mandado de segurança, mas sim que, em face desse efeito, desaparece a lesão autorizadora do mandado de segurança. Repita-se, não é o simples fato do recurso suspender o efeito do ato administrativo que desautoriza o uso do mandamus, mais sim, a circunstância de que a suspensão de seus efeitos importa no afastamento da lesão ao direito. Esta inexiste. Inexistindo lesão, não há espaço para segurança. Se nenhuma lesão de direito individual será excluída da apreciação do Judiciário, é preciso que ele efetivamente ocorra para autorizar o acesso àquele Poder. Ninguém pode ingressar em juízo a não ser para defender interesse próprio que considere lesado.

Deve-se observar que o que se extrai do cotejo da lei com o comando constitucional é que não se admite o recurso suspensivo concomitante ao Writ, não obstante o interessado poderá, se assim preferir, ignorar a possibilidade do recurso administrativo e desde logo ingressar na via judicial com a impetração do mandado de segurança, outro não é o entendimento do STF expresso na súmula 429, que assenta: “A existência de recurso administrativo com efeito suspensivo não impede o uso do mandato de segurança contra omissão de autoridade.”

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TEMER, Michel. Elementos de Direito Constitucional. 16° Ed. São Paulo, Malheiros Editores. 2000. 187-188 p.

Como bem ressalta Michel Temer, a suspensibilidade do recurso administrativo não é de molde a trazer reparação fática à lesão sofrida, em se tratando de ato omissivo do agente público.

Logo, in casu, o pré-requisito fundamental autorizador do Writ, quer se trate de ato omissivo ou comissivo, será sempre o mesmo: a efetivação dos efeitos do ato impugnado acarretando a lesão ou a sua potencialidade para lesionar o direito de terceiro.

Outra hipótese de restrição do controle judicial é a que diz respeito à discricionariedade administrativa de administração. É certo que ao Poder Judiciário caberá realizar sempre a fiscalização da validade dos elementos vinculados do ato administrativo, da competência (atribuição) do agente para a gênese do ato, da forma legal, da licitude do objeto e da forma pública, devendo proceder à declaração de nulidade do ato sempre que ocorrer desvio em qualquer um dos elementos que confere validade ao ato.

Não obstante, quando o administrador for livre para escolher o objeto, os motivos para a realização do ato, a solução do agente público encerra o que se traduz no mérito administrativo, que por sua vez se subtrai ao alvedrio de julgamento pelo Poder Judiciário, ou seja, não poderá o Poder Judiciário realizar a escolha de outro objeto ou oferecer nova motivação substitutivos à vontade do administrador.

Caberá ao Poder Judiciário, no caso de escolha do objeto, simplesmente realizar o exame e sua licitude, e quanto à escolha dos motivos, deverá o julgador verificar a sua correspondência com a finalidade pública e a realidade dos fatos. Nesta direção, sinaliza o Prof. Arruda Alvim :

Espera-se do Judiciário amplo exame do ato administrativo mesmo naqueles casos em que realmente se constate a impossibilidade do exercício e de seu controle, sob pena de ferir a tripartição dos poderes. Nestes casos, como acentuado há pouco, o Judiciário ‘revalidará’ o ato administrativo em juízo. Nunca no entanto, eximir-se-á de seu dever de dar cumprimento à ampla cláusula de acesso à justiça, constante no inciso XXXV do art.5º do CF.

No documento Prova ilícita-inadmissibilidade relativa (páginas 30-34)