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O direito à educação: dos requerimentos de D João III à constituição federal de

5 PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO, SISTEMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO

5.1 O direito à educação: dos requerimentos de D João III à constituição federal de

A primeira medida do Estado considerada por Saviani (2014c) com vistas ao acesso à educação no Brasil refere-se aos “Regimentos” de D. João III, em 1549. Tais Regimentos se constituíam de orientações dirigidas ao primeiro governador geral do Brasil, Tomé de Souza, que chegou ao País em 1549, acompanhado dos Jesuítas, dentre eles, Manuel da Nóbrega.

O autor explica que neste Regimento havia um mandato delegado pelo rei de Portugal aos Jesuítas para iniciarem a obra da educação centrada na catequese. Neste contexto, a Coroa seria responsável pela manutenção do ensino, porém: “o rei só enviava verbas para a manutenção e vestimenta dos Jesuítas; não para construções” (idem). Todavia, essa verba era desviada ao colégio da Bahia, deixando os Jesuítas em precárias condições de sobrevivência (idem).

A partir de 1564, inaugurou-se uma fase oposta à anterior no que tange às finanças, materiais e conforto dos Jesuítas, pois a Coroa adotou o plano de redízima, o qual destinava dez por cento de todos os impostos produzidos na colônia brasileira para a manutenção dos colégios jesuíticos.

Neste contexto, a educação era financiada com recursos públicos, porém, administrada pelos Jesuítas, que definiam sua infraestrutura, currículo, diretrizes curriculares e pedagógicas, agentes, disciplina e avaliação. Apesar da educação Jesuítica ser mantida por recursos públicos, ela era excludente, pois não tinham acesso: as mulheres, os escravos, os negros livres, os pardos, filhos ilegítimos e crianças abandonadas, por isso mesmo, em 1759, ano da expulsão dos Jesuítas, a educação não chegava a atender 1% da população.

No período da pedagogia pombalina (1759-1827) teve início as primeiras tentativas de instituição de uma escola pública estatal. Os colégios Jesuítas foram fechados por força de um alvará expedido em 1759 e implantaram-se as aulas régias, mantidas pela Coroa, e em 1772 pelo “subsídio literário”. Inspiradas no Iluminismo, as reformas pombalinas defendiam uma educação laica e de dever do Estado. Porém, a manutenção do ensino neste período foi precária porque ocorreu, segundo Saviani (2009), “dificuldade de cobrança desse tributo na Colônia” (SAVIANI, 2009, p. 55).

A partir da independência política foi instalado o Primeiro Império, o qual aprovou a lei de escolas de primeiras letras que estabelecia em seu artigo primeiro: “em todas as cidades, vilas e lugares mais populosos haverá as escolas de primeiras letras que forem necessárias” (ibidem, p. 56). Entretanto, esta lei não foi cumprida, pois o Ato Adicional de 1834 determinou que o ensino primário fosse responsabilidade das Províncias, desobrigando o

Estado Nacional de atender a esse nível de ensino. Segundo Saviani (2014c), esse Ato favoreceu a criação e instalação das escolas, porém, as Províncias não tinham condições, nem financeiras e nem técnicas, para difundir o ensino. Como resultado, o autor afirma que o século XIX findou sem a satisfatória expansão de uma educação pública. Desta forma, apesar de proclamada na Constituição, a educação pública foi prejudicada, pois não foram promovidas as necessárias condições para a citada expansão.

Por sua vez, o orçamento destinado à educação no Segundo Império também não conseguia custear as despesas, de modo que a ausência da implantação de um sistema nacional de ensino provocou um déficit histórico na educação brasileira. Assim, a efetivação do direito à educação continuava sendo negado à população.

Em 1891, a primeira Constituição do regime republicano apenas estabeleceu uma educação laica. Essa omissão contribuiu para a estagnação do ensino e altas taxas de analfabetismo no país. Cumpre ressaltar que a educação primária desse período continuou descentralizada, sob responsabilidade dos estados federados, o que provocou a postergação da organização de um sistema público educacional.

Em 1934, a segunda Constituição do período republicano, destinou um capítulo à questão da educação. Cumpre relembrar que neste período o país vivia um processo de urbanização e industrialização, o qual necessitava de mão de obra mais qualificada, inclusive para operar as máquinas. De acordo com Saviani, a Constituição de 1934 “determinou que a União e os municípios deveriam aplicar nunca menos de 10% e os Estados 20% da arrecadação dos impostos na manutenção e desenvolvimento dos sistemas educacionais” (SAVIANI, 2009, p. 56).

Com o advento do Estado Novo, a Constituição de 1937 retirou esta vinculação orçamentária. Saviani (2014c) destaca que foi a partir dessa Constituição que surgiram as leis orgânicas do ensino, as quais estruturaram a educação do país por segmento, e não como um sistema integrado, regulamentado por uma única lei. Essas leis, de acordo com o autor, estabeleciam como dever prioritário do estado o ensino profissional, e as Leis orgânicas regularam os ensinos secundário e primário, enquanto os ensinos industrial e comercial e normal foram complementados pela criação do Sistema Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) e pelo Sistema Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC).

A Constituição de 1946 retomou a vinculação orçamentária, a qual, segundo Saviani (2009) [...] “fixou em 20% a obrigação mínima dos Estados e Municípios, e em 10% a da União” (p. 56). Esta lei também foi descumprida pela União que só destinou em 1955, segundo o autor, 5,7%, enquanto os estados destinaram 13,7%, e os municípios, 11, 4%.

No período do regime militar instaurado em 1964, foi promulgada a Constituição Federal de 1967, na qual, Saviani (2014) observa que houve uma relativização do princípio da gratuidade quando, no Inciso III do parágrafo 3º, do artigo 168, se estabeleceu: sempre que possível, o Poder Público substituirá o regime de gratuidade pelo de concessão de bolsas de estudo, exigido o posterior reembolso no caso de ensino de grau superior. O autor (2014) também verifica que esta Constituição não contemplou os princípios da seleção pelo mérito, estabilidade dos professores, remuneração condigna do corpo docente, vinculação orçamentária, vitaliciedade e inamovibilidade dos cargos.

De acordo com Saviani (2009) esta Constituição e a Emenda de 1969 voltaram a desvincular os recursos para a educação, o que provocou significativa redução nos investimentos: “o orçamento da União para a educação e cultura caiu de 9,6%, em 1965, para 4,31%, em 1975” (p. 57). Esta redução orçamentária e as demais políticas educacionais desse período inviabilizaram a construção de um Sistema Nacional de Educação, o que dificultou a efetivação do direito à educação, pois persistiam os altos índices de analfabetismo decorrentes da falta de políticas direcionadas à universalização do ensino fundamental.

A Constituição de 1988 restabeleceu a vinculação orçamentária, fixando para a União, 18%, e 25% para Estados e municípios. Saviani (2009, p. 57) afirma que esta lei foi descumprida na medida em que novos impostos foram criados no governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso , porém, com a denominação de contribuição, o que na prática, não insidia sobre essas contribuições os percentuais previstos no texto constitucional para a educação, assim, têm-se mais uma vez, o descumprimento da lei. Além disso, a partir do governo do Presidente Fernando Henrique a Desvinculação das Receitas da União foi novamente implementada, o que subtraiu do orçamento da educação o percentual de vinte por cento.

Saviani (2014: int.) assinala que neste governo houve incentivos à filantropia e ao voluntariado, transferindo do Estado para a sociedade civil, parte da responsabilidade com a educação. Além disso, o autor aponta o fortalecimento da iniciativa privada, sobretudo no ensino superior, e as parcerias público-privadas. No contexto dessas políticas, a sociedade é estimulada a proferir palestras, doar livros para as escolas, substituir trabalhadores da educação no cotidiano escolar. Enfim, a intenção do governo era é diminuir sua atuação e repassá-la para a sociedade civil, ficando com a exclusividade de exercer a regulação e a avaliação.

Com a intenção de resolver o problema da universalização do ensino fundamental e do analfabetismo no País, a Constituição de 1988 previu que a União, Estados e Municípios

deveriam destinar no período de dez anos 50% do orçamento da educação para essa etapa da educação básica, entretanto, essa foi apenas mais uma lei descumprida. Com o mesmo objetivo, o governo FHC criou o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério, também com prazo para dez anos. Saviani (2014: int) afirma que neste período se soma a LDB, promulgada em 1996, que instituiu a Década da Educação, e em 2001 foi aprovado o Plano Nacional de Educação – PNE, também com vigência decenal, para o período entre 2001 a 2010.

Em 2006, período do governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foi instituído o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB), com prazo para 14 anos, ou seja, com vigência até 2020. O governo Lula implanta o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), com prazo previsto para vigorar em 15 anos. Este Plano substituiu na prática o PNE 2001-2011. Em 2014 foi sancionado no governo da Presidenta Dilma, o II Plano Nacional de Educação (PNE) com vigência de dez anos, ou seja, para vigorar até 2024.

Entretanto, o direito à educação vem sendo, na história da educação brasileira, muito proclamado, porém, não efetivado. Diante do exposto, fica explícito que a persistência dessa situação decorre da resistência da União para assumir as responsabilidades com a educação, sobretudo, a educação básica, o que nos indica também a necessidade de que o PNE articule a instituição de um Sistema Nacional de Educação no contexto federativo brasileiro por meio do regime de colaboração, tema que aprofundaremos na sessão seguinte.

5.2 Conceito de sistema, de estrutura, e de sistema educacional: fundamentos histórico-