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5 PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO, SISTEMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO

5.3 Sistema Nacional de Educação: marcos legais

As conferências de educação se constituíram como espaços públicos de debate da política educacional, com destaque para as duas últimas que elegeram como tema central a discussão sobre a construção do Sistema Nacional de Educação. Somados a estes debates, diversos pesquisadores têm se dedicado à temática2. Tais estudos têm focado na organização da gestão da educação numa perspectiva sistêmica, aprofundando do debate sobre as relações colaborativas entre os entes federados e influenciando na formulação do arcabouço jurídico que regulamenta a organização da educação brasileira com vistas à instituição de um sistema nacional de educação.

De acordo com Andrade (2014) a expressão “diretrizes e bases” passou a integrar a educação e o conjunto de leis que organizam a educação brasileira a partir da Lei n.º 4.024/1961. Na análise do autor:

[...] o termo sistema surge no cenário da educação brasileira sem que, de fato, houvesse uma orientação legal que estabelecesse parâmetros em que as ações neste campo pudessem ser articuladas, por meio de mecanismos que garantissem coerência em âmbito nacional (ANDRADE, 2014, p. 1078).

2 Ver SAVIANI, 2014; ANDRADE, 2014; GADOTTI, 2014; DOURADO, 2016; WERLE, 2016, CURY, 2014;

A despeito de suas análises sobre a legislação da organização educacional em âmbito nacional, Andrade mostra as primeiras leis que se utilizaram do termo “sistema de educação”: [...] a Lei nº 5.540/1968 que dispõe sobre a Reforma Universitária, baixada no Regime Militar, pode ser considerada a primeira Lei na qual a terminologia sistema de educação é utilizada com relativa constância. [E sobre a Lei n.º 5.692/1971] [...] é a que melhor emprega a expressão sistema

de educação, mantendo-se coerente no conjunto de seus artigos (idem).

O autor ainda acrescenta ao debate sobre o surgimento deste termo que:

o surgimento da lógica de sistema na educação correlaciona-se com a manifestação de intencionalidade em relação à ação educativa [...] [e com] emergência de um modelo educacional que pressupõe organização sob normas próprias, construídas no coletivo dos indivíduos que compartilham os processos educativos (idem).

Antes da promulgação da atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), em 20 de dezembro de 1996, “havia no Brasil apenas duas modalidades de ensino: o sistema federal, que abrangia os territórios federais e tinha caráter supletivo em relação aos estados; e os sistemas estaduais e do Distrito Federal” (SAVIANI, 2014b, p. 18). Neste contexto, afirma que “as escolas de educação básica, públicas e particulares, integravam o sistema federal, subordinando-se, pois, às normas fixadas pela União” (idem). Os estados poderiam se responsabilizar pelo ensino superior, desde que já tivessem experiência neste nível de ensino.

A Constituição Federal de 1988 introduziu o conceito de sistema municipal de educação, entretanto, no artigo 22, inciso XXIV, define que compete privativamente à União legislar sobre diretrizes e bases da educação nacional, e no artigo 24, inciso IX, determina que compete à União, aos estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre educação, cultura, ensino e desporto. O texto constitucional, em seu artigo 23, inciso V, estabelece que seja competência comum da União, estados, Distrito Federal e municípios proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação e à ciência. Desta forma, a Carta Magna não atribuiu aos municípios a competência para instituírem seus sistemas de educação. Entretanto, o artigo 211 da Constituição Federal de 1988 estabelece que “a União, os Estados, O Distrito Federal e os Municípios organizarão, em regime de colaboração, os seus sistemas de ensino” (BRASIL, 1988).

Para o autor, a forma como o termo sistema tem sido tratado na educação é o fator determinante para a presença desta dubiedade na lei. O artigo 211 estaria se referindo à organização das redes escolares e não de sistemas de ensino. A competência dos Municípios está estabelecida no artigo 30, inciso VI, da Constituição Federal de 1988: “compete aos

Municípios, VI – manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação pré-escolar e de ensino fundamental” (BRASIL, 1988). Assim, o artigo não se refere à competência dos municípios para “legislar sobre educação, cultura, ensino e desporto”. Deste modo, os municípios não poderiam instituir seus próprios sistemas de ensino, e as escolas municipais integrariam o sistema estadual de ensino e seguiria as normas estabelecidas pelos estados.

Visando superar tal dificuldade, a LDB/96 procurou se basear nos incisos I e II do artigo 30 da Constituição Federal de 1988 que afirmam a competência dos municípios para “legislar sobre assuntos de interesse local” e “suplementar a legislação federal e a estadual no que couber”. Definindo as atribuições municipais com a educação, o inciso III do Artigo 11º da LDB atribui aos municípios “baixar normas complementares para o seu sistema de ensino”. Assim, já não cabem dúvidas a respeito da competência dos municípios para instituírem seus respectivos sistemas de ensino.

Saviani (2014b) aborda outra alternativa legal para a institucionalização dos sistemas municipais do ensino. Trata-se do Artigo 11º, Parágrafo Único, da LDB/96, a qual, concede aos municípios a opção de optar ou não pela criação dos seus sistemas de ensino, visto que, “os municípios poderão optar, ainda, por se integrar ao sistema estadual de ensino ou compor com ele um sistema único de educação básica” (SAVIANI, 2014b, p. 22).

A Constituição Federal de 1988 também considerou a situação dos municípios, quando, em seu Artigo 30, inciso VI, atribuiu aos municípios a manutenção de programas de educação pré-escolar e de ensino fundamental com cooperação técnica e financeira da União e do estado. Andrade (2014) afirma que, na atualidade, “o modelo de gestão sistêmica vem sendo requeridos em que os entes federativos são convocados a constituírem seus sistemas próprios de educação” (p. 1074).

Contrário ao posicionamento de que não é possível instituir-se um sistema nacional de educação no contexto federativo, Saviani (2014b) argumenta que

a melhor forma de fortalecer as instâncias locais, não é, necessariamente, lhes conferir autonomia deixando-as a própria sorte. Na verdade, a melhor maneira de respeitar a diversidade dos diferentes locais e regiões é articulá- los no todo, e não isolá-los. Isso porque o isolamento tende a fazer degenerar a diversidade em desigualdade, cristalizando-a pela manutenção das deficiências locais (SAVIANI, 2014b, p. 29).

Saviani acredita que se as deficiências dos entes federados forem articuladas no sistema, é possível revertê-las, pois proporcionará o “fortalecimento das diversidades em benefício do próprio sistema” (idem). Outro argumento apresentado pelo autor em defesa da

possibilidade da institucionalização de um Sistema Nacional de Educação no contexto federativo consiste em que:

[...] a própria forma de se responder adequadamente às necessidades educacionais de um país organizado sob o regime federativo é exatamente por meio da organização de um Sistema Nacional de Educação. Isso porque, sendo a federação a unidade de vários estados que, preservando suas respectivas identidades, intencionalmente se articulam tendo em vista assegurar interesses e necessidades comuns [...] (SAVIANI, 2014c, p; 29).

Este posicionamento do autor entra em consonância com a organização federativa do Estado Brasileiro e a premente necessidade de organizar a educação por meio de uma política nacional, entendendo a impossibilidade de que qualquer ente federado seja capaz de organizar a educação de seu território sem contar com a parceria de demais entes, Saviani acrescenta que:

a federação postula o sistema nacional de educação que, no campo da educação, representa a união intencional dos vários serviços educacionais que se desenvolvem no âmbito territorial dos diversos entes federativos que compõem o Estado federado nacional (idem).

Entretanto, o contexto federativo apresenta diversos desafios no sentido de consolidar uma gestão sistêmica. Neste sentido, Andrade entende que estes desafios

[...] têm explicação na própria estrutura federativa adotada no País, em que se legitima a autonomia político-administrativa dos Estados e Municípios, sem a clara posição quanto ao compartilhamento do poder decisório entre estes entes e a União (ANDRADE, 2016, p. 154).

Este cenário promove limites para a efetivação de uma política de estado para a educação, concebida e materializada na constante relação entre os sistemas de educação instituídos pelos entes federados em seus respectivos territórios.

Na próxima sessão, apresentaremos as dificuldades apontadas por estudiosos da temática para a instituição de um Sistema Nacional de Educação no país.