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Direitos Fundamentais Versus Direitos de Personalidade

3. Direitos Fundamentais

3.1. Direitos Fundamentais Versus Direitos de Personalidade

Estando os Direitos Fundamentais designados na Constituição como situações jurídicas fundamentais reconhecidas às pessoas na defesa desses direitos, a Lei Fundamental não manda que esses direitos, constitucionalmente consagrados, sofram um abrandamento em face da autonomia privada, nem são de admitir intimidações resultantes da dissemelhança da relação de trabalho que resultem dos poderes do empregador. Assim, o empregador deve obediência às normas constitucionais, significando que este está obrigado a reconhecer os direitos, liberdades e garantias de todos os cidadãos, independentemente de serem trabalhadores ou não.

No entanto, há que reconhecer a existência de interesses económicos, tanto locais como globais, que faz com que estejamos longe da ordem dos sujeitos livres e intersubjetivamente iguais, pela existência da voragem mercantil dos «senhores do comércio». Por isso, a monopolização maciça dos meios económicos por parte das grandes potências mercantis foi um atropelo à esforçada e lentamente estruturada ordem jurídica internacional e aos esforços jurídicos nacionais para defesa da igualdade dos cidadãos.

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Veja-se e compare-se os diplomas em causa, e os direitos de personalidade do trabalhador, no âmbito da execução do contrato de trabalho (GONÇALVES, Fernando e ALVES, Manuel João - Código do Trabalho.28.ª ed. Coimbra: Almedina, julho 2012, 544 p. ISBN 978-972-40-4914-4, p.49).

192 Vejamos a opinião de Pedro Romano Martinez e outros, em MARTINEZ, Pedro Romano, et al –Código do

Trabalho Anotado. 6.ª ed. Coimbra: Coimbra Almedina, fevereiro, 2008. 1336 p. ISBN 978-972-40-3425-6, pp.109 e 110.

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Dito isto, e tendo em conta os direitos fundamentais e a segurança no emprego, podemos dizer que, na atualidade, um dos temas mais nobres da dogmática jurídica diz respeito aos complexos entrelaçados da tentativa de irradicação dos direitos fundamentais constitucionalmente consagrados e o dever de proteção desses direitos por parte do poder público relativamente a terceiros - principalmente, na ordem jurídico-privada dos contratos de trabalho.

Por isso, consideramos ser de importância fundamental a proteção dos direitos dos trabalhadores, nomeadamente os seus direitos fundamentais de caráter específico e constitucionalmente consagrados: como o direito de resistência – artigo 21.º -, os direitos inerentes à proteção de dados pessoais – artigo 35.º-, o direito ao sigilo da correspondência e de outros meios de comunicação privada – artigo 34.º-, o direito à integridade pessoal – artigo 25.º-, a liberdade de expressão e informação – artigo 37.º, bem como a liberdade de religião, de culto e a liberdade de consciência – artigo 41.º193194.

Sabemos que o moderno Estado Constitucional – vertido nos direitos fundamentais dos cidadãos - não teve uma evolução linear; além disso, a positivação dos direitos fundamentais não é um fenómeno universal: não existe suficiente sintonia entre culturas, nem comunhão, no que concerne à extensão do catálogo à titularidade, à oponibilidade dos direitos, sendo que a garantia da efetividade dos direitos parece estar sempre na dependência do funcionamento dos sistemas políticos, lutas sociais e outras dimensões culturais.

Assim sendo, pugnamos pela defesa dos direitos fundamentais dos cidadãos, onde se incluem os trabalhadores, pelo seu direito à privacidade como direito fundamental e como um dos direitos de personalidade, sendo que o prestador de trabalho, na execução do exercício laboral, não deve, por qualquer forma, sentir-se ameaçado nos seus direitos, tanto por forma física como moral.

Destacamos a ideia de que os direitos de personalidade (por pressuporem relações de igualdade) não têm uma projeção especial face ao Estado, ao passo que os direitos fundamentais pressupõem sempre um relacionamento direto e uma especial vinculação do Estado, tendo por isso uma dominante incidência publicística. E se há direitos de

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Artigos citados ao longo do presente estudo.

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Que se verte no reconhecimento de direitos aos cidadãos nascidos romanos – não aos convertidos à cidadania romana; pactos e confirmações estamentais de direitos; decretos pontifícios ( bulas papais), tudo culminando no Glorious Revolution ( Revolução Inglesa (1688); Revolução Americana (1776) e Revolução Francesa (1789) que desembocou na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão; e por último, no plano jurídico ( Habeas Córpus (1679), Bill of Rights inglês (1689), Declaração dos Direitos da Virgínia (1776) e a Declaração dos

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personalidade que têm objeto idêntico aos direitos fundamentais, há muitos direitos fundamentais que não têm uma relação direta e imediata com bens da personalidade (por exemplo, é o caso dos direitos políticos, consagrados na Constituição)195.

SECÇÃO IV

1. FORMAÇÃO E EXECUÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO

SECÇÃO V

1. CUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES LABORAIS

1. Autonomia contratual

Autonomia da vontade ou autonomia privada, verte-se na liberdade do “querer” pessoal (intenção ou teor declarado dessa intenção – foro mental), isto é, no sentido da atuação humana na produção de efeitos jurídicos (constituição, modificação, extinção de relações jurídicas), resultante de atos de vontade (declarações de vontade) que se projetam na produção de efeitos.

Ora, a autonomia da vontade “consiste no poder reconhecido aos particulares de autorregulamentação dos seus interesses, de autogoverno da sua esfera jurídica”196. Tal princípio significa que os indivíduos podem estabelecer, no domínio da sua convivência com outros sujeitos, relações jurídicas.

Esse autogoverno da esfera privada dos indivíduos e das suas relações jurídicas, manifesta-se, nomeadamente, na realização de negócios jurídicos, onde se enquadra o contrato de trabalho. Este, vertido num consentimento que se traduz num acordo (escrito ou presumido), em que, por regra, existem duas declarações de vontade negocial – de âmbito laboral – que se fundam ou se encontram no sentido de reciprocamente celebrar um contrato de trabalho com um certo conteúdo.

Entende-se, porém, que, nestas condições, a igual liberdade que pressupõe a autonomia da vontade é apenas ilusória, pois a liberdade do assalariado para recusar aderir a determinado contrato que lhe é oferecido pela entidade empregadora é medida pelo grau e

195 ALEXANDRINO, José Melo – Direitos Fundamentais. 2.ª ed., revista e atualizada. Cascais: Princípia,

Setembro de 2011, 173 p. ISBN 978-989-7160-32-5. Depósito Legal 332179/11, p.34.

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MOTA Pinto, Carlos Alberto da – Teoria Geral do Direito Civil. 4.ª edição por António Pinto Monteiro e Paulo Mota Pinto. Coimbra Editora, Maio de 2005. 687 p. ISBN 972-32-1325-7. p.102 .

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premência da sua dependência económica. O trabalhador, por regra, tira os seus recursos apenas do seu trabalho, não podendo diferir por muito tempo a conclusão do contrato. Mais cedo ou mais tarde virá a aceitar as condições que o empregador lhe oferece197, podendo considerar-se que a alienação da força de trabalho, no âmbito contratual laboral, exprime e funda simultaneamente a alienação social.

Nestes termos, quando as relações são economicamente e socialmente desiguais, a liberdade ou a autonomia privada conduz à opressão do mais fraco: procurar-se-á protege-lo através de leis imperativas, que limitem o campo de liberdade contratual (ou do direito potestativo do empregador). Assim, e para evitar que uma igualdade de tratamento teórica aplicada a situações desiguais (até porque a situação do trabalhador não é igual à situação do empregador) resulte em consequências iníquas, a legislação laboral deverá proteger o trabalhador, favorecendo-o de vários pontos de vista, de maneira a compensar a desigualdade real entre os contraentes198.