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DISCUSSÃO

No documento Renato Assayag Botelho (páginas 76-83)

Para se avaliar se os resultados obtidos a partir de um teste diagnóstico são fidedignos, é necessário avaliar a validade e a reprodutibilidade dos achados dessa interpretação.

A validade de um teste diagnóstico é vista através da confrontação com achados anatomopatológicos. A partir dessa confrontação, é possível se determinar sensibilidade, especificidade e valores preditivos, no sentido de se dizer se o teste é eficaz ou não na identificação ou exclusão de determinada anormalidade. No que se refere à ao achado tomográfico de invasão do EPE, foram feitos diversos trabalhos na tentativa de se confirmar os se os achados obtidos pela avaliação da tomografia eram verdadeiros. Cruz e Quadros (1978) compararam a interpretação das TC com os resultados pós-cirúrgicos em 60 casos, em que avaliaram a extensão do carcinoma de laringe para o EPE, obtendo sensibilidade de 86,6% e especificidade de 73,3%. Oktay et al. (2002) obtiveram em estudo semelhante com 31 casos, sensibilidade de 84% e especificidade de 75%. Zbaren et al. (1996) em seu estudo com 40 casos, que correlacionava a avaliação do EPE pela TC e pela RM com achados anatomopatológicos

quanto à invasão tumoral, afirmaram que, à TC, apresentou excelentes índices de sensibilidade e especificidade em relação à invasão neoplásica do EPE, índices esses comparáveis aos obtidos pela RM.

Apesar dos altos índices de sensibilidade e especificidade obtidos nos estudos supra-citados, não é possível afirmar que esses resultados sejam reprodutíveis pois, segundo Loevner et al. (1997), as amostras destes estudos são pequenas.

Para se obter resultados mais consistentes quanto à validade dos sinais tomográficos que indicam invasão do EPE, seriam necessários, portanto, estudos prospectivos com grande número de pacientes. Entretanto, para que seja realizado um estudos como esses, é necessário, primeiramente, verificar-se se existe ou não reprodutibilidade dos achados tomográficos de invasão do EPE entre os profissionais que laudam tomografias de pescoço. A verificação de boa reprodutibilidade é fundamental, pois se houver grandes discordâncias entre as interpretações sobre um mesmo exame, por exemplo, não haverá um parâmetro para afirmar qual interpretação seria correta e, consequentemente, não seria possível confiar nos achados do exame. Nesse sentido, o presente estudo foi realizado de tal maneira a identificar a reprodutibilidade das interpretações relacionadas ao acometimento tumoral do EPE a partir da verificação da concordância entre observadores em várias situações distintas de análise.

Foram escolhidos três observadores, pois este é o número adotado pela maioria dos autores que realizaram estudos semelhantes. A escolha

levou em consideração a boa experiência destes em laudar exames de TC de pescoço. Todos apresentam tempos de experiência semelhantes, no sentido de se reduzir possíveis discrepâncias nos resultados relacionadas a este fator.

Foram selecionados 95 exames de TC que foram realizados em três aparelhos distintos, sendo que a maior parte dos exames foi feita em tomógrafos convencionais com cortes tomográficos de 5 mm de espessura. Apesar de grande parte da amostra ser de exames de tomógrafos convencionais, não existe nenhuma comprovação científica de que possa haver diferenças significativas de interpretação tomográfica do EPE entre exames realizados em tomógrafos convencionais e exames realizados em tomógrafos helicoidais ou multislice.

Apesar de todos os exames estarem acompanhados de cópias dos prontuários, não foram fornecidos dados clínicos dos pacientes aos observadores para que a leitura do observador não fosse sugestionada pos dados de oroscopia ou laringoscopia.

A opção pelo cálculo do índice Kappa para interpretação dos resultados obtifdos nas leituras pelos radiologistas foi baseada na experiência de diversos trabalhos de concordância entre observadores. O valor de Kappa permite se avaliar se a concordância entre observadores existe de fato ou ocorreu ao acaso. No presente trabalho foram considerados resultados de concordância significantes, quando os valores obtidos de Kappa foram superiores à 0,6 (Tabela 1).

Foram realizados cálculos de índices Kappa para aferir a concordância entre os observadores na primeira leitura, a concordância entre os observadores na segunda leitura, a concordância entre os observadores nas duas leituras, a concordância entre os observadores nas duas leituras para os tumores classificados clinicamente como T1 e T2 e a concordância entre os observadores nas duas leituras para os tumores classificados clinicamente como T3 e T4.

A opção pela realização de cálculos, desta forma, teve como objetivo simular diversas situações em que poderiam ser verificados índices Kappa inferiores a 0,6.

A avaliação da concordância entre os observadores em duas leituras teve por objetivo avaliar se o possível achado de boa concordância em uma primeira leitura seria reproduzido após um intervalo de 30 dias e se, após se analisar em conjunto ambos os resultados, seriam ainda verificados bons resultados de concordância. A escolha de tempo de 30 dias foi feita baseada nos trabalhos semelhantes previamente realizados.

A avaliação da concordância entre as leituras realizadas pelo mesmo observador em dias diferentes teve por objetivo avaliar a presença de um conceito bem estabelecido no que se refere aos sinais de invasão do EPE. Na inexistência deste conceito entre vários observadores poderia indicar que achados de concordância interobservadores não estariam necessariamente relacionados a uma boa reprodutibilidade.

O desmembramento da amostra em dois grupos, com relação ao estadio clínico, foi realizado no sentido de evidenciar um possível viés de

seleção da amostra, uma vez que, por conta de suas grandes dimensões, os tumores classificados como T3 e T4 seriam de mais fácil interpretação quanto à invasão, tendo em vista que a maior parte das divergências na leitura ocorrem em casos de tumores clinicamente estadiados como T1 e T2. Se não fosse realizada essa divisão, poderia ocorrer, por conta de elevado número de casos considerados T3 e T4, uma concordância geral elevada sem que esta, no entanto, pudesse ser reproduzida na prática radiológica. Além disso, é citado na literatura que a real necessidade de uma avaliação correta no que se refere à invasão tumoral do EPE se faz nos tumores classificados clinicamente como T1 e T2, tendo em vista que a identificação de invasão tumoral do EPE em casos mais avançados não resultaria em grande impacto quanto à conduta a ser adotada (Loevner et al., 1997).

Após a realização da análise estatística, obtiveram-se índices de concordância considerados bons ou ótimos, com valores de kappa superiores à 0,6 em todas as situações de cálculo citadas anteriormente (Kappa geral de 0,721). Com base nestes resultados, percebe-se que há reprodutibilidade boa quanto à interpretação dos achados radiológicos que sugerem invasão do EPE. Houve concordância similar com os achados vistos com o trabalho de Aragão Jr. (2002), a partir da análise interobservadores de 39 casos, no qual se obteve índice Kappa geral de 0,74 (variando entre 0,61 e 0,80).

Entretanto, Paes Jr (2004) a partir da avaliação de 14 casos de carcinoma de base de língua, obteve índice Kappa geral de 0,5 com variação entre 0,5 e 0,6 (concordância moderada) e Yamashiro (2006)

tomando como base a análise tomográfica de 25 pacientes com carcinoma epidermóide da loja tonsilar, obteve índice Kappa geral entre 0,21 e 0,40 (concordância mínima). Os autores afirmaram que esses valores baixos de

Kappa geral encontrados, podiam ser conseqüência da falsa interpretação

do ligamento hioepiglótico como invasão tumoral do EPE (Paes Jr, 2004) ou da não realização de cortes tomográficos em plano sagital (Yamashiro, 2006). Uma possibilidade não apresentada pelos autores citados e que poderia ter influenciado nos resultados obtidos por eles seria o baixo número de exames avaliados, tendo em vista que, nestes casos, pode haver uma supervalorização da discordância entre observadores caso esta aconteça.

Tendo em vista os bons resultados de concordância entre os observadores, propõe-se a realização de estudos prospectivos com grande casuística e com correlação anatomopatológica para determinar a sensibilidade e especificidade da tomografia computadorizada na determinação da invasão tumoral do EPE, para que se determine a confiabilidade dos critérios tomográficos de invasão desse espaço e se ratifique a condição da TC como principal método para avaliação do EPE.

No documento Renato Assayag Botelho (páginas 76-83)

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