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6. Resultados e Discussões

6.6. Discussões

Nesse trabalho, a definição de que as regiões em situação preocupante, crítica ou muito crítica estão sob estresse hídrico não implica que, necessariamente, as termelétricas dessas localidades estejam com restrições operativas de natureza hídrica. No entanto, essas centrais se encontram mais susceptíveis a algum tipo de penalidade por conta de restrições hídricas, seja devido à falta de água no presente ou por eventuais casos futuros.

As torres mecânicas úmidas são o sistema de resfriamento mais utilizado pelas centrais analisadas nesse trabalho, como apresentado na Figura 6.2. Apesar do consumo de energia para movimentação dos ventiladores, as torres úmidas mecânicas seguem sendo a melhor opção para o resfriamento da água do condensador, pois esses equipamentos são capazes de operarem com eficiência regular ao longo do ano, independente das variações climáticas. No entanto, a utilização desse sistema em regiões com restrição hídrica não configura, necessariamente, a melhor opção quanto à utilização de água. Em alguns casos, pode ser mais vantajoso para a bacia hidrográfica que o sistema aberto seja utilizado, pois a água captada pela termelétrica continuará dentro da mesma bacia e disponível para os usuários a jusante da central.

As termelétricas analisadas nesse trabalho utilizam, na sua maioria, água doce no sistema de resfriamento. Uma alternativa é a utilização de água residual no sistema de tratamento. O uso de águas residuais possui algumas complexidades devido à presença de nutrientes e contaminantes que podem causar corrosão, incrustação e bioincrustação nos materiais do sistema de resfriamento, sendo necessário o tratamento para seu uso. O custo do tratamento varia de acordo com a qualidade da água: quanto mais deteriorada a água (mais poluída), mais etapas do sistema de tratamento são necessárias e, consequentemente, mais caro se torna o tratamento. Atualmente, 42,75% do esgoto é tratado no Brasil, encarecendo essa opção no país (TRATA BRASIL, [s.d.]).

As águas residuais também podem ter a presença de vírus e bactérias que são dispersos nas torres de resfriamento. Além do tratamento da água, é necessária que as torres realizem a manutenção dos eliminadores de gotas para evitar a propagação de doenças. A doença dos legionários (forma atípica de pneumonia) pode ser propagada por torres de resfriamento, pois a bactéria causadora da doença pode ser dispersa através das torres em distâncias de até 3 km (ASHRAE, 2000).

Internacionalmente, as águas residuais vêm sendo utilizada nos sistemas de resfriamento das centrais termelétricas. Por exemplo, nos Estados Unidos, aproximadamente 5% de um total de 1709 termelétricas utilizavam águas residuais em 2014, como a usina Cherokee, perto de

Denver, Colorado. A central possui 717 MW de capacidade instalada e é movida a carvão e utiliza 227 milhões de m³/ano de água residual do sistema de tratamento de água de Denver (CARPENTER, 2016).

Em Maryland, a termelétrica Brandon Shores Power Plant com capacidade instalada de 1273 MW, movida a carvão possui uma estação de tratamento terciário (com tratamento físico- químico e biológico), cuja produção durante o período de pico pode chegar a 18.170 l/min (CARPENTER, 2016; TALEN ENERGY, 2017).

Outra opção é a utilização de água salobra ou água do mar nos sistemas de resfriamento. No Brasil, apenas uma termelétrica analisada nesse trabalho utiliza água salobra e dez termelétricas utilizam água do mar. A utilização de água do mar pode ser realizada diretamente nas torres de resfriamento ou após o tratamento químico (dessalinização), de acordo com os materiais do sistema de resfriamento.

Na China, 103 usinas de dessalinização produziram 0,9 milhões de m³/ano de água doce em 2013, para atender principalmente consumidores municipais e as geradoras de energia elétrica. Dentre as dez maiores usinas chinesas de dessalinização estão as plantas cuja produção de água é destinada as plantas de carvão. Na Índia existem 1100 usinas de dessalinização, com expectativa de crescimento de 22% até 2021 (CARPENTER, 2016).

6.6.1. Região Sul

Em praticamente toda a região Sul tem-se o predomínio do clima temperado, com exceção do norte do estado do Paraná, que possui regiões com clima tropical (IBGE, 2002). Em regiões de clima temperado, a temperatura média varia entre 10 °C e 15 °C, de modo que a utilização do sistema de resfriamento seco não apresenta restrições operacionais.

Para a UTE Usitesc (SC), cuja construção não foi iniciada, foi optado pela substituição do sistema de resfriamento úmido (torres úmidas mecânicas) por torres secas. A substituição foi feita para redução dos custos, pois seria construído um reservatório de acumulação para a captação de água destinada a UTE. Apesar da central se encontrar em uma região considerada excelente pelo BHQ, a central reduzirá a captação de água em 90% do valor anterior (utilizando o sistema de resfriamento fechado úmido) (BUTZKE, 2014).

Existem duas termelétricas em operação utilizando o sistema de resfriamento seco na região Sul, as UTEs movidas a carvão mineral Presidente Médici A e B, que entraram em operação em 1974. Essas termelétricas operam com eficiência de 24,5% e 25%, respectivamente (MME, 2017b), com potência instalada total de 446 MW. No entanto,

atualmente apenas 63 MW são utilizados, pois as unidades nº 2, 3 e 4 se encontram com operação suspensa devido a fatores ambientais (JORNAL MINUANO, 2017). Em 2016, a ANEEL declarou ser favorável à desativação das centrais, devido à tecnologia ultrapassada e por estarem depreciadas. A Eletrobrás manteve a operação até dezembro de 2017 (AGÊNCIA ESTADO, 2016), no entanto, desde outubro de 2017 a central não está gerando eletricidade (ONS, 2017a)

Entre as termelétricas de água doce instaladas na região Sul, duas estão paralisadas, as UTE Araucária (PR) e UTE Uruguaiana (RS), ambas movidas a gás natural (MONTEGRO, 2017). A UTE Uruguaiana está paralisada desde junho de 2015 (ONS, 2017a), devido à falta de acordo no suprimento do combustível. A Petrobrás fornece o gás natural para a UTE Uruguaiana proveniente de importação da Argentina (MONTEGRO, 2017). A UTE Araucária depende do fornecimento da Petrobrás, que apesar de terem fechado um contrato de fornecimento em outubro de 2017, ainda não retomou a operação (AGÊNCIA CANALENERGIA, 2017).

A UTE Sepé Tiaruju (RS) utiliza gás natural e se encontra a menos de 20 km da cidade de Porto Alegre, capital do RS, numa região considerada crítica pelo BHQ. A região de Porto Alegre possui alta demanda hídrica urbana, além de alta demanda de irrigação (ANA, 2017). Assim, como o consumo de água por termelétricas gás natural é relativamente baixo em comparação a outros combustíveis, tem-se que a central não está sob potencial risco de paralização.

Cerca de 70 km de Canoas (RS) está a cidade de Charqueadas (RS), onde será construída a UTE Jacuí, movida a carvão mineral. A região também possui alta demanda por irrigação e demanda urbana (ANA, 2017). Nesse caso, ao contrário da UTE Sepé Tiaruju, a captação de água é alta, pois o sistema de resfriamento utilizado será o sistema aberto, aumentando o risco de não haver vazão suficiente para a operação. Entretanto, como o consumo desse sistema é baixo, os usuários a jusante não serão, necessariamente, afetados pela operação da termelétrica.

Caso de Candiota (RS)

A região de Candiota se localiza no sul do Rio Grande do Sul, região que possui a maior jazida de carvão mineral do Brasil (CRM, 2018). As UTEs a carvão Presidente Médici A e B e Candiota III, que fazem parte do complexo termelétrico Presidente Médici, estão instaladas em Candiota. Além dessas, existe uma termelétrica em construção (UTE Pampa Sul) e quatro

termelétricas que não constam no BIG: UTEs Eneva Sul I e II, Ouro Negro e Seival, todas movidas a carvão mineral, conforme apresenta a Figura 6.11.

Figura 6.11. Termelétricas na região de Candiota (RS). Fonte: Adaptado de GOOGLE EARTH

Quanto à utilização dos recursos hídricos, tem-se que:

 A UTE Candiota III capta água da bacia de acumulação da Barragem II, dentro da bacia do Arroio Candiota (CGTEE ELETROBRÁS, 2017)

 A UTE Pampa Sul irá captar as águas do Rio Jaguarão, principal afluente do Arroio Candiota (HAR ENGENHARIA E MEIO AMBIENTE LTDA, 2014);

 A UTE Ouro Negro será construída na cidade de Pedras Altas, que se encontra a cerca de 50 km de Candiota. A captação de água para central será feita diretamente no Arroio Candiota (POLAR INTELIGÊNCIA EM MEIO AMBIENTE, 2015);

 A UTE Seival irá captar a água do Reservatório de Candiota (HAR ENGENHARIA E MEIO AMBIENTE, 2000);

 A UTE Eneva Sul I e II irá realizar a captação num reservatório no Rio Jaguarão (CRA, 2008);

Figura 6.12. Corpos hídricos na região de Candiota. Fonte: ANA (2017)

Na região, existe ainda o Polo Econômico de Candiota, cujos efluentes são despejados no Arroio Candiota, sendo esses efluentes da termelétrica, da indústria cimenteira e de mineração, além dos efluentes de outras atividades antrópicas (STRECK et al., 1999). Além disso, a região possui alta demanda hídrica por irrigação e demanda rural (ANA, 2017).

Com isso, ao observar a Figura 5.1, que apresenta o BHQ, tem-se que o sul do Rio Grande do Sul concentra as regiões do estado em situação preocupante, crítica e muito crítica (sob estresse hídrico). Nos últimos anos, a frequência de eventos de escassez hídrica tem aumentado na região, como ocorreu nos seguintes anos:

 Em janeiro de 2011, quando foi necessária a utilização de caminhões pipa para atender a população (REDAÇÃO TERRA, 2011).

 Em maio de 2015, a cidade de Candiota decretou estado de emergência devido à estiagem no RS, evento que afetou diretamente a produção da pecuária leiteira e agricultura (G1 RS, 2015).

 Em dezembro de 2017, pelo menos 200 famílias da zona rural de Candiota foram abastecidas por um caminhão pipa, sendo que na cidade também teve falta d’água. Em Hulha Negra, foi necessário o início do racionamento de água de 8 horas por dia. O

abastecimento na cidade é realizado pela captação de águas subterrâneas vinda de cinco poços artesianos (G1 RS, 2017).

Ainda assim, a UTE Ouro Negro conseguiu as licenças ambientais para sua instalação, além da outorga para captação de água em 2016. A captação de água pela UTE Ouro Negro representará um aumento de 25% na captação do rio, sendo que dentre todos os usuários desse rio, as termelétricas representarão 70% de toda a captação (ESTADÃO CONTEÚDO, 2016a). No EIA da UTE Ouro Negro está prevista a construção de uma barragem de reservação para captação de água para a utilização na central. O IBAMA negou o pedido de construção dessa barragem, pois a barragem aumentaria a concentração de fósforo na água. Sendo assim, a central captará água diretamente do rio, com a vazão de 1.609 m³/h (ANGELO, 2016).

A opção pela utilização de torres úmidas mecânicas na UTE Ouro Negro, ao invés da utilização do sistema seco, é justificada no EIA em três argumentos (POLAR INTELIGÊNCIA EM MEIO AMBIENTE, 2015):

 Maior eficiência da central termelétrica;

 Menor influência das variações climáticas sobre a operação da central;

 Menor custo inicial. Segundo o EIA, as torres secas custam cinco vezes mais que as torres úmidas mecânicas.

No entanto, é importante notar que a região de Candiota possui temperaturas amenas ao longo do ano, propiciando a instalação do sistema seco, como é utilizado nas UTE Presidente Médici A e B (ambas movidas a carvão). A Tabela 6.13 apresenta as temperaturas média, máxima e mínima em Candiota.

Tabela 6.13. Clima de Candiota.

Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez Tmédia (°C) 23,3 21,9 19,8 16,5 13,7 12,7 13,1 14,1 16,2 18,7 21 19,7 Tmínima (°C) 17,5 15,6 14,3 11,2 8,8 7,9 8,2 9 10,9 13 14,8 13,8 Tmáxima (°C) 29,2 28,2 25,3 21,8 18,6 17,5 18 19,3 21,6 24,4 27,2 25,6 Fonte: CLIMATE-DATA.org, [s.d.]d

Além disso, em outras regiões do mundo, o sistema de resfriamento seco (seja direto ou indireto) vem sendo utilizado com sucesso, principalmente em termelétricas com ciclo combinado. A Çan Power Plant II, movida a carvão, localizada na província de Çanakkale utiliza o sistema Heller para o resfriamento, como apresentado na Figura 3.13b.

Desse modo, para fins comparativos, são apresentadas as temperaturas máximas e mínimas da província de Çanakkale na Turquia, na Figura 7.13. As regiões de Candiota e Çanakkale possuem temperaturas próximas ao longo do ano, demonstrando que é possível a instalação de um sistema seco indireto na região.

Figura 6.13. Temperatura média mínima e máxima na cidade Çanakkale, Turquia. Fonte: WORLD WEATHER & CLIMATE INFORMATION (2016)

Considerando o histórico de eventos de seca na região, além da alta concentração de termelétricas a carvão (caso todos projetos sejam implantados), observa-se que a decisão pela utilização do sistema úmido baseia-se no planejamento de curto prazo, não considerando a criticidade hídrica da região. Dessa forma, é mais interessante para a UTE Ouro Negro e para as termelétricas que serão implantadas a instalação de um sistema alternativo ao atual (sistema fechado úmido) que consuma menor quantidade de água, ou ainda, utilizar fontes de água alternativas, como águas residuais.

6.6.2. Região Nordeste

Na região Nordeste, a opção pela substituição do sistema de resfriamento úmido pelo sistema de resfriamento seco tem um impacto na produção muito maior que na região Sul, devido às condições climáticas da região. Em locais quentes e com o sistema de resfriamento constituído apenas por torres secas, a eficiência total da planta pode reduzir em até 25% (IAEA, 2012).

Como alternativa ao uso de água doce tem-se a opção de uso da água salgada no sistema de resfriamento. Das 56 termelétricas analisadas nesse trabalho, 10 utilizam água salgada, sendo cinco estão instaladas na região Nordeste. Dessas centrais, uma utiliza o sistema de resfriamento aberto, UTE Termopernambuco (PE), movida a gás natural e que opera desde 2004.

A UTE Porto Itaqui, movida a carvão, capta água do mar para utilização na central, sendo que nas torres de resfriamento é utilizada água salgada e no restante da central é utilizada água dessalinizada, para alimentar o sistema de água potável e a caldeira. Essa termelétrica pertencia ao grupo MPX (atualmente pertence à Eneva), assim como as UTE Pecém I e Pecém II, nas quais, devido a fatores econômicos, foi escolhida a utilização de água doce no sistema de resfriamento.

As outras três UTE que utilizarão água do mar são a Porto de Sergipe I, Laranjeiras I e Governador Marcelo Deda, que irão compor o Complexo Termelétrico Porto de Sergipe, cuja potência instalada total atingirá cerca de 3 GW.

Dentre as termelétricas que utilizam água doce, todas as seis centrais analisadas nesse trabalho se encontram em região muito crítica pela classificação do BHQ. A UTE Fortaleza, que utiliza gás natural, não apresentou restrições hídricas nos últimos anos, assim como as usinas Maranhão III (MA), Rômulo Almeida (BA) e Celso Furtado (BA). Apenas as centrais Pecém I e Pecém II apresentaram restrições hídricas de operação.

Caso de Pecém I e Pecém II

O fornecimento de água para as UTEs Pecém I e Pecém II é proveniente de duas fontes: o açude Sítios Novos e o açude do Gavião. Ambas as centrais possuem a outorga de 1100 l/s, sendo que em cada torre de resfriamento é consumido 1000 m³/h, totalizando 3000 m³/h, além de 200 m³/h que são consumidos no processo de clarificação de água (CASTAGNINO, 2014). A utilização de água pelas centrais é equivalente a 6% do consumo diário da capital do estado, Fortaleza (BORGES; WARTH, 2016).

O açude Gavião se encontra próximo de Fortaleza e recebe as águas do açude Castanhão, após a água percorrer 200 km pelo Eixão das Águas (JANGADEIRO FM, 2016). Em outubro de 2016, o açude Sítios Novos encontrava-se apenas com o volume morto. Em novembro de 2016, o açude Castanhão estava com 5,5% da capacidade total (G1 CE, 2016).

Devido à crise hídrica enfrentada pelo estado do Ceará, em outubro de 2016, as UTE Pecém I e Pecém II ameaçaram parar totalmente a operação devido ao aumento do valor cobrado pelo uso da água. No entanto, é importante notar que o estado do Ceará efetua a cobrança pelo uso de recursos hídricos desde 1996 (ARAÚJO; CAMPOS, 2009) como instrumento de gestão.

Durante os períodos em que a situação de escassez hídrica se torna crítica, existe a possibilidade da criação de uma tarifa extra para cobrança de água por meio de mecanismos

legais. Essa tarifa, chamada de Encargo Hídrico Emergencial, possui a finalidade de garantir o fornecimento de água aos usos prioritários (consumo humano e dessedentação de animais), através da construção de obras de infraestrutura hídrica, como canais.

Entre 1º de outubro de 2016 e 31 de agosto de 2017, o valor estabelecido para o encargo foi de R$ 7.2101,00/1000 m³ para essas duas termelétricas, no decreto nº 32.044, de 16 de junho de 2016 (CEARÁ, 2016). Em 16 de agosto de 2017 a tarifa foi renovada por tempo indeterminado no valor de R$ 3.101,39/1000 m³ para Pecém I e Pecém II, conforme o decreto nº 32.305 de 11 de agosto de 2017 (CEARÁ, 2017). Importante frisar que ambas as termelétricas possuíam um desconto de 50% na tarifa de água, conforme a Lei Estadual nº 14.920 de 2011 (CEARÁ, 2011).

A conta de água das centrais em outubro de 2016, referente ao mês de setembro do mesmo ano, foi de R$ 1,308 milhão mais R$ 9,125 milhões referentes ao encargo (FILHO, 2016). Por essa razão, as termelétricas ameaçaram paralisar a operação em decorrência do alto custo de água, de modo que recorreram a ANEEL para que pudessem repassar o valor da tarifa para os consumidores. Em dezembro de 2016, a ANEEL não autorizou o repasse do encargo para os consumidores.

Entretanto, em maio de 2017, as termelétricas ganharam na justiça o direito de repassar o valor do encargo para os consumidores. Além disso, as centrais também conseguiram judicialmente, a suspensão de qualquer tipo de penalidade da ANEEL por eventual redução ou interrupção de operação de natureza hídrica. Dessa forma, as centrais puderam operar durante todo o ano de 2017 sem restrições dessa natureza (COSCODAI, 2018).

As termelétricas se encontram a 5 km do litoral cearense, de modo que o projeto poderia ter considerado a opção pela dessalinização de água salgada (ESTADÃO CONTEÚDO, 2016b). A opção pela dessalinização da água do mar tem o entrave econômico de aumentar os custos do projeto. Nos Estados Unidos, o custo estimado da dessalinização por membrana varia entre 0,75 e 1,50 U$/m³ de água (VALOR ECONÔMICO, 2016).

A interrupção da operação das termelétricas possui forte impacto no SIN, pois ambas são responsáveis pelo suprimento de 65% da energia elétrica no CE, que corresponde a 10% do consumo na região Nordeste (FREIRE, 2016). Para evitar as paralizações, o governo do estado investiu R$ 6,5 milhões numa bateria de poços, adutoras e estações de bombeamento para captação de água subterrânea no Aquífero Dunas, em São Gonçalo do Amarante (DIÁRIO DO NORDESTE, 2017). É esperada a captação de 200 l/s em cada bateria de poços instalados em dunas de Pecém, Cumbuco, Cauípe e Taíba (CAVALCANTE, 2017).

Além desses projetos, também foi construída uma estação de tratamento de efluente com o objetivo de reaproveitar a água utilizada no Complexo Industrial e Portuário do Pecém (CIPP). Com isso, é esperado que a demanda hídrica do complexo seja reduzida em 13%, cerca de 140 l/s. Em dezembro de 2017, o projeto piloto foi capaz de produzir 15 l/s de água de reuso (REDAÇÃO O POVO ONLINE, 2017).

A Companhia de Água e Esgoto do Ceará (Cagece) pretende lançar um edital para escolher um parceiro privado para a construção de uma usina de dessalinização, assim que concluir os estudos do projeto. Inicialmente, a proposta prevê a operação dessa usina apenas durante os períodos de estiagem, para reduzir a captação do açude Castanhão, e por meio de uma planta menor, atender as indústrias do CIPP com 115 l/s (O POVO, 2018).

O caso das termelétricas de Pecém apresenta a uma peculiaridade ao cenário de geração elétrica no Brasil. O acionamento das centrais termelétricas está relacionado com a crise hídrica; no entanto, devida a própria crise hídrica, a operação das centrais se encontra comprometida, pois o custo do uso água não foi considerado no projeto. Nesse caso, a restrição da operação não ocorre apenas devido à diminuição na vazão disponível, mas também devido a razões econômicas consequentes da restrição hídrica.

6.6.3. Região Sudeste

Para esse trabalho, foram analisadas apenas termelétricas movidas a gás natural e urânio na região Sudeste. O Sudeste é a única região brasileira com a presença de termonucleares, sendo essas responsáveis pelo fornecimento de 50% da demanda elétrica do estado do Rio de Janeiro (PORTAL BRASIL, 2010). A central nuclear Angra III, gêmea de Angra II, teve sua obrada iniciada nos anos 1980, porém em 1986 foi interrompida. Em 2009, a obra foi retomada, porém em 2015 foi novamente interrompida, devido a investigações de irregularidades e falta de pagamento. Até o momento, a obra recebeu mais de 5 bilhões de reais, porém segundo o governo, ainda será necessário mais 13 bilhões de reais para o término, que poderia ser 2025, caso a obra fosse retomada (COSTA; GAIER, 2018).

Das 17 centrais analisadas localizadas na região Sudeste, 11 estão no Rio de Janeiro, três centrais em São Paulo, duas no Espirito Santo e uma em Minas Gerais. Apenas 5 termelétricas se encontram em região sob estresse hídrico, sendo uma em Minas Gerais, duas no Rio de Janeiro e duas em São Paulo. Dessas centrais, quatro estão em operação e uma não foi contabilizada no BIG.

O Rio de Janeiro possui poucas áreas sob estresse hídrico, sendo essas as regiões metropolitanas e o norte do estado. As UTEs Baixada Fluminense, localizada em Seropédica capta água do rio Guandu, assim como a UTE Governador Leonel Brizola. A UTE Santa Cruz também se encontra na bacia hidrográfica do Rio Guandu, porém não capta água diretamente do rio.

A UTE Queimados I, localizada em Queimados, se encontram em situação preocupante pelo BHQ. O rio Queimados é afluente do rio Guandu, juntamente com os rios Poços, Cabuçu e Ipiranga, sendo que todos possuem alta carga de poluentes, o que contribui gravemente para