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Distinção entre Cláusula Penal e outras Modalidades de Obrigações

No documento Luiz Carlos Branco.pdf (páginas 36-39)

III. Considerações Gerais

1.5 Distinção entre Cláusula Penal e outras Modalidades de Obrigações

Muito semelhante por características próximas e comuns a outras modalidades obrigacionais, delas destaca-se e distingue-se a cláusula penal por diferenças específicas. Cumpre, portanto, distingui-la das figuras com as quais pode ser confundida.

Clóvis Beviláqua comentando o artigo 1.095 do Código Civil revogado54, correspondente ao atual artigo 42055, relativo às arras ou sinal, diz:

53Art. 412. O valor da cominação imposta na cláusula penal não pode exceder o da obrigação principal.

54Art. 1.095. Podem, porém, as partes estipular o direito de se arrepender, não obstante as arras dadas. Em caso tal, se o arrependido for o que as deu, perdê-las-á em proveito do outro; se o que as recebeu, restituí-las-á em dobro.

55Art. 420. Se o contrato for estipulado o direito de arrependimento para qualquer das partes, as arras ou sinal terão função unicamente indenizatória. Neste caso, quem as deu perdê-las-á em benefício da outra parte; e quem as recebeu devolvê-las-á, mais o equivalente. Em ambos os casos não haverá direito a indenização suplementar.

O código admite o direito de arrependimento com conjunção com as arras, mas não como conseqüência delas. Deve esse direito ser estipulado, de modo expresso, e, neste caso, as arras funcionam como cláusula penal. E, como a cláusula penal importa a determinação prévia das perdas e danos pelo não cumprimento das obrigações, segue-se que se não podem acumular a perda das arras por quem as deu, ou a sua restituição em dobro, por quem as recebeu, com a indenização dos danos resultantes do inadimplemento.56

A diferença entre essas duas figuras é muito bem colocada por Manuel Inácio Carvalho de Mendonça, senão vejamos:

É preciso não confundir a cláusula penal com a mulcta poenitentialis. Mulcta

poenitentialis, de origem germânica, não era desconhecida dos romanos. A

primeira, instituída só por utilidade do credor, tem por fim dispensá-lo da prova do dano e exigir logo a indenização estipulada como pena. A multa instituída em favor do devedor tem por fim salvaguardá-lo dos efeitos do arrependimento, uma espécie de obrigação facultativa, para o caso de querer rescindir o contrato, ou uma espécie de novação que a parte efetua à vontade. Um instituto reforça a obrigação; outro afrouxa o vínculo, tornando a obrigação precária. Mas decaída do que a cláusula penal, a multa penitencial não é, entretanto, incompatível com o direito moderno, pois que, no fundo, nada há nela de ilícito e imoral.57

Também sobre essa diferença, escreve Francisco de Paula Lacerda de Almeida58:

Este signal (Arrha poenitentialis) tem caráter inverso da pena convencional. A pena garante o credor; o sinal, o devedor. Na obrigação penal não pode o devedor eximir-se da obrigação, oferecendo pagar a pena; no sinal, o devedor compra o direito de não cumprir a obrigação, estipulando a perda do sinal.

A respeito das arras penitenciais e exclusão da indenização suplementar, diz a professora Maria Helena Diniz59,

Ter-se-ão arras penitenciais quando os contraentes, na entrega do sinal, estipulam, expressamente, o direito de arrependimento e, tornando resolúvel o contrato, atenuando-lhe a força obrigatória, mas à custa da perda do sinal dado em benefício de outra parte se o desistente for quem as deu ou de sua restituição mais o equivalente se aquele que desistiu for quem as recebeu. As arras penitenciais, por serem suficientes, excluem a indenização suplementar. A parte inocente, que não deu origem à resolução contratual, fará jus às arras, mas não à indenização suplementar.

56BEVILÁQUA, Clóvis. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil. Rio de Janeiro: Rio, 1979.

57MENDONÇA, Manuel Inácio Carvalho de. Doutrina e prática das obrigações ou tratado geral dos

direitos de crédito. 4. ed. aum. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 1956. Tomo I. v. II.

58ALMEIDA, Francisco de Paula Lacerda de. Obrigações. Rio de Janeiro: Cruz Coutinho. p. 229. 59DINIZ, Maria Helena. Código Civil anotado. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 403.

Vejam-se a propósito os artigos 884 e 885, do Código Civil vigente60, Súmula 412, do Supremo Tribunal Federal61, e o artigo 53, do Código de Defesa do Consumidor62.

Também não se confunde a cláusula penal, como já vimos, com outros institutos jurídicos semelhantes. Não se confunde com as arras penitenciais, que são pagas antecipadamente e garante ao contraente o direito de se arrepender, desfazendo, via de consequência, o negócio realizado, não obstante as arras dadas.

A cláusula penal que será devida somente pelo inadimplemento da obrigação, portanto, nunca será paga antecipadamente, terá caráter exclusivamente indenizatório. A cláusula penal, ao contrário das arras, não garante direito de arrependimento.

Além de não ser obrigatoriamente alternativa à prestação principal, a cláusula penal somente será devida quando esta for descumprida a título indenizatório.63

No mesmo diapasão, distingui-se da cláusula penal, as astreintes (é a medida cominatória de constrição contra o devedor de obrigação de fazer ou não fazer, cujo valor diário, fixado pelo juiz na sentença executada, que durará enquanto permanecer a inadimplência).64

Nelson Rosenvald65 diz que,

60Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.

Parágrafo único. Se o enriquecimento tiver por objeto coisa determinada, quem a recebeu é

obrigado a restituí-la, e, se a coisa não mais subsistir, a restituição se fará pelo valor do bem na época em que foi exigido.

Art. 885. A restituição é devida, não só quando não tenha havido causa que justifique o

enriquecimento, mas também se esta deixou de existir.

61Súmula 412. No compromisso de compra e venda com cláusula de arrependimento, a devolução do sinal por quem o deu, ou a sua restituição em dobro por quem a recebeu, exclui indenização maior a título de perdas e danos, salvo os juros moratórios e os encargos do processo.

62Art. 53. Nos contratos de compra e venda de móveis ou imóveis mediante pagamento em prestações, bem como nas alienações fiduciárias em garantia, consideram-se nulas de pleno direito as cláusulas que estabeleçam a perda total das prestações pagas em benefício do credor que, em razão do inadimplemento, pleitear a resolução do contrato e a retomada do produto alienado. 63GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil. Obrigações.

São Paulo: Saraiva, 2003. v. II, p. 349.

64SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. Rio de Janeiro: Forense, 2003. [verbete astreintes]. p. 153.

65ROSENVALD, Nelson. Cláusula penal. A pena privada nas relações negociais. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007. p. 185.

A cláusula penal pode ser considerada como “astreintes convencional”, pois

a coerção privada é de sua essência, enquanto as astreintes serão pronunciadas pelo juiz, por provocação do interessado ou de ofício (art. 461, parágrafo 4º, do CPC).66 Certamente a cláusula penal é de grande utilidade para o credor, pois, se lograr êxito em cumprir a sua função intimidante, o credor não necessitará do recurso ao magistrado pela via das astreintes.

A distinção fica muito clara no acórdão do STJ, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, 4ª Turma, REsp. 422.966/SP, DJ 1/3/2004:

Na linha de jurisprudência dessa corte, não se confunde a cláusula penal, instituto de direito material vinculado a um negócio jurídico em que há acordo de vontades, com as astreintes, instrumento de direito processual, somente cabíveis na execução, que visa compelir o devedor ao cumprimento de uma obrigação de fazer ou não fazer, e que não correspondem a qualquer indenização por inadimplemento. A regra da vedação ao enriquecimento sem causa permite a aplicação do art. 920 do Código Civil de 1916, nos embargos à execução de sentença transitada em julgado, para limitar a multa decendial ao montante da obrigação principal, sobretudo se o título exeqüendo não mencionou o período de exigência da multa.

No documento Luiz Carlos Branco.pdf (páginas 36-39)