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Do direito de arena diferenças de percentual e natureza jurídica

Na inicial, o autor postula (fls. 06, item V), pagamento de diferença de direito de arena, “... no importe de 15%, de tudo que o Reclamado recebeu...” pela transmissão televisiva. Na causa de pedir, alega que recebeu apenas 5% do valor auferido pela transmissão dos jogos, quando o correto, no seu entender, seria 15% (20%, previsto na Lei Pelé, menos 5%). Diz ainda que não recebeu a citada parcela relativamente aos jogos da Copa do Brasil e da Copa Sul-americana.

A ré sustenta que o percentual devido é o de 5%. Escuda-se em acordo firmado entre sindicados e clubes, em ação judicial em trâmite perante a MM. 23ª Vara Cível da Comarca do Rio de Janeiro. Acresce que não lhe cabe o repasse de tais valores aos jogadores. Pugna, ainda, pela natureza indenizatória da verba.

O MM Juízo a quo condenou a ré ao pagamento das diferenças. A uma; por falta de prova de quitação. A duas; por considerar inválida a transação relativa ao percentual mínimo de 20% (sentença às fls. 65).

De logo, registre-se que a matéria ora em debate é recorrente em sede trabalhista. Diversas as reclamações já intentadas por jogadores de futebol, contra os clubes, a respeito do percentual devido a título de direito de arena.

No tema, esta Relatora filia-se à corrente jurisprudencial que distingue o direito de imagem do direito de arena do atleta profissional.

Necessário esclarecer, de início, que o direito de imagem assegurado pelo art. 5º, inciso XXVIII, alínea “a”, da Constituição da República (a proteção às participações individuais em obras coletivas e à reprodução da imagem e voz humanas, inclusive nas atividades desportivas) não se confunde com o chamado direito de arena, disciplinado pelo art. 42 da Lei 9.615/98. Este último integra o próprio contrato de trabalho do atleta profissional, porque constitui a

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retribuição pela sua participação nos eventos desportivos, vale dizer, o direito à participação do atleta nos lucros obtidos pela entidade de prática desportiva com a fixação, transmissão ou retransmissão de espetáculo esportivo público, tem forma de remuneração fixada na lei e, a rigor, prescinde de contratação específica, porque a própria norma legal já confere ao clube o direito de dispor da figura dos atletas por ele contratados.

Neste passo, a parcela em foco tem nítido caráter salarial porque remunera a atividade do atleta enquanto profissional no exercício da atividade para a qual contratado, ou seja, a prestação de seu trabalho. Paga por terceiros, assume a natureza jurídica assemelhada a da gorjeta, fazendo incidir a norma do art. 457, parágrafo primeiro, da CLT, por analogia.

O direito de imagem, por outro lado, é inerente ao indivíduo, personalíssimo e indisponível, por isso que indispensável, para a sua cessão, que seja pactuado em contrato particular de natureza civil, individualmente ou por pessoa jurídica por ele constituída, envolvendo situação diversa daquela prevista no art. 42 da Lei 9.615/98, ora analisada nos autos.

Com efeito, o parágrafo primeiro, do dispositivo legal em apreço, assegurou aos jogadores que integram as equipes em jogo, uma participação total mínima de 20% sobre o valor pago pela emissora, cabendo, pois, a cada atleta parte desse percentual, conforme o número de partidas das quais participa e do número de jogadores que a disputam, o que poderá representar uma importância bem significativa, a ser acrescida à receita do profissional de futebol.

Estabelece o dispositivo legal:

Art. 42. Às entidades de prática desportiva pertence o direito de negociar, autorizar e proibir a fixação, a transmissão ou retransmissão de imagem de espetáculo ou eventos desportivos de que participem.

Parágrafo primeiro. Salvo convenção em contrário, vinte por cento do preço total

da autorização, como mínimo, será distribuído, em partes iguais, aos atletas profissionais participantes do espetáculo ou evento. (grifos nossos)

No caso em análise, o Clube recorrente traz aos autos (fls. 50) acordo firmado entre Sindicado representante dos atletas deste Estado e o denominado “Clube dos Treze”, dentre os quais se inclui o Clube ora recorrente.

Naquele instrumento, estabeleceram os contratantes o percentual de 5% (cinco por cento) como correspondente ao direito de arena (cláusula 4ª e alíneas). O pacto foi homologado nos seguintes termos, em pesquisa realizada na página da internet do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (www.tjrj.gov.br):

A- HOMOLOGO o acordo celebrado entre as partes conforme termos da petição de fls. 2120/2124 para que surta os devidos efeitos. B - Como há notícia do não cumprimento parcial do acordo (não pagamento das 02 (duas) últimas parcelas), que ora é homologado, determino o prosseguimento em relação à parte faltante, devendo a executada ser intimada nos termos do comando inserido no art. 475-J do CPC. 20-09- 2007. (Processo 1997-001-141973-5 – 23ª Vara Cível da Comarca da Capital)

O ponto nodal da lide consiste em determinar se o acordo homologado nos autos daquela ação gera efeitos de sentença irrecorrível (artigos 467 e 468 do CPC). Entende-se como coisa julgada (res judicata) a decisão que se tornou imutável, por não poder haver contra

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ela qualquer recurso. A oportunidade permite lembrar que também a Norma Consolidada estabelece que o termo de conciliação vale como decisão irrecorrível, na forma do art. 831, parágrafo único.

Feita esta breve consideração, tem-se que, no aspecto, o direito socorre ao recorrente. Registre-se que a Norma Constitucional confere a possibilidade de negociação de parcelas decorrentes do contrato de trabalho, inclusive salários, por meio de ajuste entre sindicatos das categorias (art. 7º, inciso XXVI). Quem pode o mais (no caso, negociar salários), pode o menos (ajustar percentual para parte da remuneração: direito de arena).

Nesta linha, o acordo firmado entre as entidades representantes das categorias dos ora litigantes na ação ajuizada perante a 23ª Vara do Rio de Janeiro (fls. 65), então homologada, tem o condão de afastar a incidência o percentual mínimo (20%) previsto no art. 42 e §§, da Lei nº 9.615/98.

Oportuno destacar que o próprio diploma legal prevê a possibilidade de se transacionar o percentual em comento. Neste sentido o § 1º do art. 42 (“Salvo convenção em contrário...”).

Assim, não é devida a diferença por uso de percentual inferior (no caso, 5%). Não prospera o pleito fundado no percentual de 15%. Merece reforma o julgado, no particular.

Por outro lado, deve ser mantida, contudo, a condenação ao pagamento de diferenças de direito de arena pela falta de prova de sua correspondente quitação.

Não há nos autos qualquer documento que demonstre a quitação das parcelas. Por certo, era ônus da ré tal providência, ainda que o repasse seja feito por outra entidade (como alega). Induvidoso o dever de zelo da ré pelo cumprimento das obrigações diretamente vinculadas à relação jogador-clube. Questão que prepondera. Não cabe, agora, como requerido a expedição de ofício ao Sindicato dos Atletas.

Por outro lado, as dificuldades financeiras vivenciadas há muito pelo Fluminense (fato público e notório, além de confessado pela ré – fls. 33) militam em favor do autor. Note-se que a efetividade da quitação do direito de arena depende do repasse (este sim) ao respectivo sindicato obreiro, do valor recebido das redes de TV pelo Clube de Futebol.

Destaque-se, no particular, que as diferenças estão relacionadas apenas aos jogos da Copa do Brasil e da Copa Sul-americana. Pois, como alega o autor (fls. 04), nada recebeu quanto a estes. Em relação aos demais jogos, nada mais há que discutir.

Considerar os jogos nos quais o autor tenha efetivamente atuado. Nos termos da lei – esclareça-se – a transmissão é da “... imagem do espetáculo...”. Indubitável que o espetáculo é o jogo (“a bola rolando”, no linguajar do torcedor, seu maior apreciador). Reitera-se a distinção entre direito de arena e de imagem, conforme acima.

Na ausência de prova quanto à atuação do jogador, considere-se como tendo participado efetivamente do jogo.

A fim de evitar o enriquecimento sem causa, passível a dedução dos valores pagos a idêntico título, conforme prova em liquidação de sentença. Presumem-se expressivos os valores envolvidos. Questão de ordem pública.

Para efeito do art. 832, § 3º, da CLT, reafirma-se a natureza salarial da parcela em foco. Dou parcial provimento.