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2. Revisão da Literatura

2.3. O modelo de jogo, elemento constituinte da base de sustentação para tomar

2.3.4. Do modelo de jogo à construção “da equipa do treinador”

Será de esperar que o treinador controle e avalie todo o processo de treino e de competição à luz do modelo de jogo adoptado para a equipa. A própria observação do jogo deverá ser dirigida a esse modelo, no sentido de aferir a consumação ou não dos princípios e dos comportamentos planeados por parte dos jogadores e da equipa no decorrer da competição (Silva, 1998).

Klein (1998), ainda em referência às características do processo de treino de equipas sublinha a necessidade de avaliar quão bem a equipa é capaz de desempenhar as funções e processos identificados como chave, num determinado contexto (específico); o mesmo autor salienta também a importância de identificar pontos de fraqueza no sentido de se poder treinar a equipa de forma a melhorá-los ou evitá-los.

Também nesta linha de raciocínio aponta Garganta (2005, p.5) ao afirmar que na busca da identificação e interpretação dos comportamentos críticos do jogo, se deverá valorizar mais o registo e a interpretação, “não tanto das quantidades per si, mas sobretudo das quantidades da qualidade”

No entanto, não basta ao treinador ter e desenvolver uma ideia o mais clara possível de jogo e do que pretende para obter “essa qualidade”, um modelo mental da forma como quer que a sua equipa jogue substanciada, ajustada à realidade do contexto, coerente com os objectivos, cultura do clube e direccionando-a para a vitória. Tão ou mais importante será transmiti-la conseguindo que os seus jogadores a partilhem intimamente consigo.

Em situação de jogo cada equipa deverá comportar-se como um sistema dinâmico vivendo da organização, o que quer dizer que a eficácia depende do compromisso entre a sua identidade e a sua integridade.

O que faz o jogo é a transformação da causalidade em casualidade, ou seja, aproveitar o momento; e quem ensina a aproveitar o momento são a

permanente disposição estratégico-táctica, cuja qualidade depende do conhecimento que o jogador tem do jogo (Garganta e Cunha e Silva, 2000) e, também, da forma como entendem o projecto de Jogo que se quer para a equipa.

Podendo recorrer às mais variadas técnicas, estratégias e tecnologias o treinador deverá conseguir que a sua equipa/jogadores cresça, se desenvolva e mature no sentido de funcionar como um todo, consistente, organizado e direccionado para os objectivos propostos conseguindo que como um todo a equipa funcione bem para além do somatório das partes constituintes.

O modelo de tomada de decisão em equipa proposto por Klein (1998) aponta um resumo sob a forma de esquema de uma série de características que o treinador deverá conseguir no âmbito do desenvolvimento da tomada de decisão em equipa. De seguida será desenvolvida cada uma delas:

Figura 3. Modelo avançado de tomada de decisão em equipa (Adaptado de Klein, 1998)

O mesmo autor (1999) afirma que para o bom funcionamento da equipa se deverá garantir o desenvolvimento de Competências de Equipa: a equipa deverá apresentar, adquirir e desenvolver competências, para isso será importante que o treinador perceba quão bons sãos os membros da equipa e se ainda têm dificuldades com os procedimentos básicos;

Competências da Equipa Identidade da Equipa Metacognição da Equipa Cognição da Equipa

Garganta (2005, p.3) corrobora essa necessidade de desenvolver um conjunto de competências, não só no treino de jogadores, mas também na preparação e construção de equipas. Dentro dessas competências realça as que se encontram directamente relacionadas com: “a) as capacidades de leitura e interpretação do jogo, e com b) a produção e vivência de situações de exercitação que permitam um elevado efeito de transferência, associado a c) consideráveis níveis de autonomia e criatividade”.

Outro aspecto que o treinador de verá apontar será o desenvolvimento e consolidação da Identidade de Equipa: todos os jogadores se identificam com o proposto, deverão saber quem faz o quê, ser capazes de se entre-ajudarem, isto é, desenvolver uma Identidade de Equipa, conseguindo que ninguém “fique fora” desta e sem que haja alguns elementos preocupados unicamente em ter sucesso individual, ou seja, concentrados apenas nas suas próprias tarefas (“micromanaging”) (Klein, 1998).

Paulo Assunção enquanto jogador do Porto foi sendo, recorrentemente, reconhecido por ser um jogador com um forte jogo colectivo, intuindo-se essas suas características nas suas palavras sobre as suas funções na equipa e o facto de não lhe ser permitido falhar, demonstrando bem a sua integração, a sua “entrega à causa”, a identidade com a equipa e a capacidade de, em certa medida, subjugar a sua forma de jogar em prol de objectivos superiores, o funcionamento optimal da equipa: “É uma tarefa muito complicada. Se eu falhar um passe ponho em risco os meus companheiros da defesa; (…) Não posso errar e é por isso que procuro jogar sempre de uma forma muito simples.” (cit. por Sousa, 2009).

Considerando que a acção de um jogador de Futebol desemboca, obrigatoriamente, na interacção dos demais elementos em jogo, cada uma das equipas que se enfrentam comporta-se como um agregado cujas relações entre os seus elementos se sobrepõem às mais-valias individuais. É nas articulações do sistema que este tece a sua identidade e é igualmente nelas, e através delas, que cria condições para a manter ou alterar, em função das circunstâncias e das respectivas debilidades e mais valias dos intervenientes (Garganta, 2005).

Klein (1998) aponta alguns aspectos importantes para o desenvolvimento da identidade de equipa, começando por afirmar que os membros de uma equipa têm, a priori, de aprender os seus próprios trabalhos (tarefas). Depois os elementos de uma equipa deverão perceber algo acerca do trabalho (tarefas) dos companheiros, prosseguindo posteriormente com o desenvolvimento de automatismos no sentido de se coordenarem e de trabalharem em conjunto. Finalmente, e apenas quando têm o básico assegurado podem descentrar a sua atenção para perceber os desafios com que a equipa enquanto um todo se depara.

Um jogador que não tenha domínio sobre as suas tarefas básicas ou tenha permanentemente dúvidas sobre quais serão os comportamentos da sua equipa estará constantemente preocupado em aferir o seu desempenho descontextualizado do da, procurando não cometer erros que lhe possam ser apontados individualmente. Em relação à equipa terá necessidade, a todo o instante, de despender mais energia para perceber o que se está a passar, tendo necessidade de ajustar constantemente os seus comportamentos em vez de funcionar de forma fluida e com maior possibilidade de antecipação. Só assim, dominando as suas tarefas específicas, percebendo o funcionamento geral da equipa e sabendo algo sobre as funções dos companheiros os jogadores poderão “entregar-se por inteiro à equipa”, assumindo individualmente os objectivos comuns.

Klein (1998) salienta a importância, para a tomada de decisão em equipa, da Metacognição da Equipa: relaciona-se com o conceito de pensar acerca de pensar. Em todos os elementos deverá haver consciência do que se passa com a equipa a cada momento e nos mais variados contextos, quais são os problemas com que se deparam e como os solucionar, quais as limitações da equipa e quais os seus pontos fortes. Todos os elementos devem perceber, em cada momento, quem deve assumir as responsabilidades, o mesmo autor afirma ainda que será importante haver consciência do efeito da pressão do tempo sob a equipa;

Por fim e sendo, também este um aspecto determinante para Klein (1998) a Cognição de Equipa: a equipa deve perceber o que o treinador quer, isto é,

todos os jogadores deverão ter a mesma imagem do que é pretendido, tendo, também uma ideia global de quais são os objectivos e as intenções, conseguindo que os jogadores partilhem o entendimento das diferentes situações sem que fiquem paralisados pela incerteza. Reconhecer cada situação é um factor chave e as equipas devem ser capazes de comunicar esse reconhecimento de forma a alcançar um entendimento partilhado.

Também Queiroz (2006, cit. por Almeida 2006) salienta a importância do jogador compreender exactamente o que a equipa espera dele e depois saber qual deverá ser o seu contributo para a equipa, isto é, em função da especificidade da sua equipa, o jogador deverá perceber claramente a dinâmica de funcionamento do colectivo e a partir dai saber qual(is) a(s) sua(s) função/tarefa(s).

Van Gaal (cit. por Kormelink e Seeverens, 1997) corrobora esta importância do “sentimento de equipa” para um bom funcionamento colectivo ao afirmar que no Futebol, dependendo tudo do colectivo, os jogadores devem aprender a colocar os interesses da equipa como prioridade.

Também os autores Tavares e Faria (1996) afirmam ser a sua convicção de que a fonte mais importante de vantagem competitiva reside nos modelos existentes na mente dos jogadores e no modo como eles desenvolvem continuamente esses modelos para lidar com situações altamente incertas através de raciocínios analógicos.

Concordando com Araújo (1987) (cit. por Garganta, 1997), destaca-se a importância que o ensino e treino das modalidades colectivas deverá ser desenvolvido segundo planeamentos e programações positivamente relacionados e influenciadas pelos modelos de jogo, de preparação e de jogador.

No mesmo sentido os modelos técnico-tácticos deverão reproduzir de uma forma metódica e sistemática todo o sistema de relações que se pretendem ver estabelecidas entre os diferentes elementos de uma dada situação de jogo, contribuindo para uma definição tão precisa quanto possível das tarefas e dos comportamentos exigíveis aos jogadores, em função dos seus níveis de aptidão e de capacidade (Queiroz, 1986).

Assim sendo e seguindo a lógica do que deverá ser a construção da atitude táctica contextualizada à equipa, reforçamos a ideia de Garganta e Pinto (1998) em relação ao desenvolvimento das diferentes possibilidades de escolha por parte do jogado ser altamente depende do conhecimento que este tem do jogo. A sua prestação será, sempre, influenciada pelos seus modelos de explicação, isto é, pelo modo com concebe e percebe o jogo. Modelos estes que funcionarão como orientação para as respectivas decisões em jogo, condicionando a organização da percepção, a compreensão das informações e a resposta motora.

Apenas neste contexto de inter-acção, de pertença ao colectivo como parte integrante e estruturante da mente da equipa os jogadores estarão prontos para contribuir em grande escala e de forma consistente para a supressão dos pontos de debilidade e maximização das possíveis vantagens da equipa, ajudando na procura de soluções, enquanto indivíduos, tendo como horizonte o “ser colectivo”, adaptando as suas decisões e acções a cada momento do jogo enquadrando-as na especificidade da sua equipa e nas características dos companheiros.

2.3.5. A interacção de macro-estruturas enquanto indutoras da