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O Plano Municipal de Saneamento Básico, elaborado pela Acquatool, juntamente à CAGECE e à SEUMA, apresentou a necessidade da instalação de três grandes ETEs, divididas em grandes Bacias, da seguinte forma: Bacia da Vertente Marítima (região Norte do município, composta por 6 sub-bacias), Bacia do Siqueira (região Oeste de Fortaleza, composta por 15 sub-bacias), Bacia do Cocó (área de drenagem natural em direção ao rio homônimo, composta por 24 sub-bacias) e Bacia do Coaçu/Miriú (região Sudeste do município, com o rio Coaçu como divisor desta bacia, composta por 8 sub-bacias). Essa reorganização configurou uma abordagem extremamente mais centralizada no âmbito do tratamento de esgoto, completamente diferente do que vem sendo adotado pela CAGECE até o momento.

Como não foram previstas grandes alterações para a Bacia da Vertente Marítima, uma vez que esta já abrange, atualmente, toda a respectiva área de atuação, não se projetou uma nova estação de tratamento para essa bacia, considerando, apenas, pequenas intervenções para contemplar a manutenção e a ampliação do crescimento vegetativo dos habitantes dessa região. Entretanto, para as demais bacias, houve previsão da construção de três grandes ETEs, uma para cada região determinada, cujos dados de projeto já foram apresentados na Tabela 8.

6,98%

67,44% 25,58%

Classificação das ETEs do Ceará quanto ao

modelo de Lobato (2011)

APS PS ST

Ao contrário da ETE Miriú, foi estabelecido que as ETEs Cocó e Siqueira apresentariam tecnologia principal de tratamento por lodos ativados de aeração prolongada (LAAP), de rota aeróbia, como o nome sugere, a qual já é classicamente conhecida por demandar potência relativamente alta de energia elétrica, devido ao uso de sopradores e bombas hidráulicas, culminando em custos exorbitantes da companhia de saneamento básico com eletricidade. Enquanto que, como já incessantemente discutido nesse trabalho, a tecnologia anaeróbia, e.g., a escolhida para a ETE Miriú, demonstrou ser capaz de produzir energia elétrica e consumir níveis bem inferiores de eletricidade.

Dessa forma, foram utilizados os parâmetros para consumo elétrico em ETEs de tecnologia LAAP, desconsiderando o pós-tratamento, apresentados por Von Sperling (2016): 20 a 35 kWh.hab-1.ano-1; e por Gude (2015), apud Paulo et al. (2019): 0,6 kWh.m-3 de efluente tratado, para construção da Tabela 17, a qual permitiu calcular o dispêndio energético para a operação das ETEs aeróbias. Por exemplo, admitindo o valor máximo de consumo apresentado por Von Sperling (2016), o somatório do resultado apresentado pelas ETEs Cocó e Siqueira equivaleu-se à demanda de cerca de 18.666 casas, ou podendo atingir aproximadamente 17.712 unidades habitacionais, se adotada a taxa de Gude (2015), apud Paulo et al. (2019), dado que o consumo médio de eletricidade residencial no Ceará, no ano de 2017, foi igual a 126,1 kWh.mês-1, conforme descrito na Tabela 6.

Tabela 17 – Previsão de consumo elétrico das ETEs aeróbias em Fortaleza, para 2033.

ETE Cocó ETE Siqueira

Referência (MWh.dia-1) (MWh.dia-1)

24,94 19,89

Von Sperling (2016).

43,65 34,81

47,11 27,34 Gude (2015), apud Paulo et al. (2019). Fonte: O AUTOR (2019).

A Tabela 8 também permitiu conferir que cada uma das três ETEs ultrapassou o limite mínimo de 100.000 contribuintes para tornar economicamente viável a alternativa de geração de energia elétrica por meio do aproveitamento do biogás proveniente de reatores UASB tratando esgoto doméstico, admitindo que ambas as ETEs (Cocó e Siqueira) também apresentassem a mesma tipologia da ETE Miriú, o que evitaria os gastos com eletricidade expostos na Tabela 17, ou seja, além de não consumir a mesma demanda de energia elétrica, as ETEs Cocó e Siqueira passariam a produzir eletricidade por meio do biogás.

Logo, foram utilizados, mais uma vez, os parâmetros expressos na Tabela 6, destacando os seguintes valores: geração de DQO per capita (0,10 kgDQO.hab-1.dia-1), eficiência de remoção de DQO de reatores UASB (65%), eficiência de um gerador de energia

elétrica a biogás (36%), consumo médio de eletricidade residencial no Ceará (126,1 kWh.mês-

1

), bem como os demais parâmetros destacados para o cálculo da geração atual de energia térmica para as ETEs do item 5.4. Assim, os resultados foram incluídos na Tabela 18.

Com esses valores, notou-se que a produção de biogás foi diretamente proporcional ao total de habitantes da estação, uma vez que se manteve invariável a eficiência de remoção de DQO (estimada em um cenário típico) e se adotou uma taxa de aplicação de DQO com base no número de contribuintes, e não com base na vazão afluente à ETE. Por isso, a estação que indicou maior produção foi a ETE Cocó (40,3% da geração total de biogás), seguida pela ETE Siqueira (32,2%) e ETE Miriú (27,5%), totalizando 27.358,52 m³.dia-1 de biogás, o que correspondeu a, aproximadamente, quatro vezes o valor do somatório de todas as 43 ETEs analisadas no item 5.4 (para o ano de 2018, Qbiogás = 6.914,34

m³.dia-1), contribuindo com a ideia de que a viabilidade econômica para adotar a alternativa de utilizar biogás proveniente de reatores UASB visando à geração de energia elétrica se torna atrativa apenas para estações de grande porte (Pop > 100.000 hab).

Tabela 18 – Avaliação da previsão de produção de biogás e geração de energia elétrica em Fortaleza, no ano de 2033.

ETE

População Vazão DQO per

capita Eficiência de remoção de DQO DQO Aplicada DQO

Removida DQO Lodo DQO CH4 Q CH4

Q Biogás Potencial elétrico Nº de residências abastecidas por ETE hab L.s-1 kgDQO.dia -

1.hab-1 kgDQO.dia-1 kgDQO.dia-1 kgDQO.dia-1 kgDQO.dia-1 m³.dia-1 m³.dia-1 MWh.dia-1

Cocó 455159 908,8 0,10 65% 45515,90 29585,34 7737,70 21847,63 8272,83 11030,43 29,69 7064 Miriú 310721 955,0 0,10 65% 31072,10 20196,87 5282,26 14914,61 5647,57 7530,09 20,27 4822 Siqueira 363040 527,3 0,10 65% 36304,00 23597,60 6171,68 17425,92 6598,50 8798,00 23,68 5634

Assim, assumir tratamento anaeróbio (reatores UASB) para as três estações de tratamento previstas no PMSB permitiu indicar um potencial elétrico igual a 73,7 MWh.dia-1, energia capaz de alimentar 17.521 residências por mês; enquanto que apenas o tratamento primário das ETEs Cocó e Siqueira (LAAP), desconsiderando seus pós-tratamentos também aerados, como já mencionado, consumiria o equivalente mensal de 17.712 a 18.666 famílias.

Caso a CAGECE opte por não integrar o Sistema Interligado Nacional (SIN) e participar dos ambientes de contratação regulada ou de contratação livre, a fim de possibilitar a venda desse excedente energético, há a possibilidade de reutilizar essa energia para alimentar secadores de lodo, sopradores de um pós-tratamento aerado, bombas de sucção e de dosagem de cloro, bem como para os demais consumos elétricos dentro do próprio terreno da ETE ou fora dele, conforme inúmeras sugestões abordadas na Revisão Bibliográfica, seja para demanda dos prédios administrativos da companhia, seja para aquelas estações em que não há produção de biogás, devido à tecnologia do tratamento de efluentes, em todo o estado do Ceará, isto é, sem, necessariamente, precisar restringir-se apenas à cidade em que a energia elétrica foi gerada.

Considerando a capacidade total de atendimento das ETEs Cocó, Miriú e Siqueira em termos populacionais (1.128.920 habitantes) e admitindo uma composição familiar de quatro pessoas por unidade habitacional, foi possível estimar que, supondo a injeção dessa energia na rede da concessionária de abastecimento elétrico, com o intuito de facilitar a mensuração da distribuição de eletricidade, um total de 70.084 pessoas seria beneficiado com a energia elétrica fornecida por essas estações previstas, o que correspondeu a uma taxa de atendimento de 1,55% em Fortaleza, aplicando a Equação 14.

Esse valor se aproximou do apresentado por Chernicharo et al. (2017), para as ETEs das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, as quais indicaram uma capacidade instalada para atender 10,7 milhões de habitantes nos reatores anaeróbios de porte grande (Pop > 100.000 hab), correspondendo a uma geração de energia elétrica da ordem de 108,1 GWh.ano-

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, ou seja, o suficiente para suprir a demanda mensal de 48.830 residências (195.320 pessoas beneficiadas nesses estados), resultando em um índice de atendimento igual a 1,83%. A taxa de atendimento calculada para o estudo de Bressani-Ribeiro et al. (2017), por sua vez, embora um pouco maior que a de Chernicharo et al. (2017), também se aproximou da analisada para a cidade de Fortaleza, uma vez que se percebeu a produção de 6.559.278 MWh.ano-1 em ETEs de grande porte, com capacidade instalada de atendimento de 582.327.513 habitantes,

suficiente para atender 3,2 milhões de habitações (ou 12,8 milhões de pessoas), o que culminou em um índice de atendimento igual a 2,20%.

A diferença entre essas taxas, entre outros fatores, pode ser explicada pela adoção de diferentes índices de consumo médio de energia elétrica, uma vez que, para análise das ETEs de Fortaleza, foi utilizado o índice do Ceará de 2017 (EPE, 2017); enquanto que, para os demais casos, foi utilizada a taxa apresentada para o consumo médio nacional. Outro fator interveniente desses resultados é também a eficiência média de remoção de DQO, a qual variou caso a caso. Entretanto, a proximidade dos índices de atendimento permitiu reforçar a ideia de que seria mais interessante promover a substituição da tipologia prevista para as ETEs Cocó e Siqueira pela mesma adotada para a ETE Miriú, a fim de fornecer energia elétrica para a comunidade residente de Fortaleza.

Comparando o cenário específico da ETE Cocó com um exemplo internacional: a ETE Taunusstein, na Alemanha (ROSA, 2013), que, com porte similar (50.000 habitantes), ostentou a marca de produção de energia elétrica igual a 1.500 kWh.dia-1, a partir de 1.000 m³.dia-1 de biogás gerado (64% de CH4). Assim, a estimativa representada pela ETE Cocó

apresentou superioridade à ETE Taunusstein, em escala real, uma vez que se previu uma produção de mais de 11.000 m³.dia-1 de biogás e 29.690 kWh.dia-1 de energia elétrica.

Esse e os demais respectivos potenciais energéticos da Tabela 18 também exibiram superioridade numérica quanto à geração de energia elétrica prevista para a ETE Laboreaux, em Itabira – MG, na qual se observou, de acordo com Rosa et al. (2016), para uma população de 70.000 habitantes, uma produção de 390,1 Nm³.dia-1 de biogás (78,2% de metano), equivalente a uma geração elétrica de 10.962 MJ.dia-1.

Por fim, sob a ótica dos créditos de carbono gerados pela produção de energia elétrica, por meio de fontes renováveis, a calculadora online (RENSMART, 2018), de posse do potencial elétrico de cada ETE proposta, permitiu observar a criação de 3.067,88 tonCO2eq.ano-1 para a ETE Cocó; 2.094,33 tonCO2eq.ano-1 para a ETE Miriú; e 2.446,98

tonCO2eq.ano-1 para a ETE Siqueira. Dessa forma, como a ETE Miriú produziria a mesma

quantidade no cenário proposto no PMSB (2014), a diferença dos cenários proporcionaria a geração de um total de 5.514,86 tonCO2eq.ano-1 de créditos de carbono, ou seja, de compostos

potencializadores do efeito estufa que se evitou emitir na atmosfera, os quais podem ser negociados (vendidos) para compensação de empresas que necessitem equilibrar os níveis de emissão de gases de efeito estufa na atmosfera.