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4. Entrevistas

4.3. Tópicos Relevantes Retirados

4.3.2. Dolby

A Dolby Laboratories é uma empresa, fundada em Londres, por Ray Dolby e tem como principal objectivo melhorar a qualidade de som no mundo do entretenimento. Em 1966 desenvolve um redutor de ruído que era aplicado no som dos filmes.

“O Sr. Dolby aparece associado ao som para cinema com as misturas do “Laranja Mecânica” do Rubrick e (…) a ideia era simplesmente usar um sistema que permitisse diminuir o ruído de fundo nas misturas.” “(…) o facto de se utilizar os sistemas da Dolby significava só ter menos ruído de fundo, ter uma banda passante mais alargada, no fundo ter mais clareza na banda sonora, do que numa mistura mono tradicional.” (JP)

4.3.2.1. Objectivos da Dolby no mercado

Desde os seus primórdios que Dolby se compromete a desenvolver apenas produtos profissionais e que iria licenciar tecnologias que fossem apropriadas para as aplicações do

40 consumidor.5 Com isto em mente a empresa uniu forças com o realizador do filme “Star Wars”, George Lucas.

“Ele queria assegurar que o Star Wars que ele ouvia no seu estúdio em casa, (…) fosse exactamente a mesma coisa em qualquer sítio do mundo e a Dolby nesse sentido, cresceu e fundamentou-se com esse objectivo. De criar uma espécie... Um conjunto de regras e métodos de trabalho que essencialmente assentavam em suportes para fazer com que aquilo que fosse misturado no estúdio, passasse da mesma forma numa outra sala qualquer. E isso de certa forma funcionou, porque havia um conjunto de regras muito restritas.“ (HL) “Dolby, é que conseguiu impor um novo padrão de qualidade de escuta nas salas e conseguiu durante muitos anos mantê-lo de uma forma muito previsível. Nós mais ou menos sabíamos o que é que nos esperava nas salas de cinema porque havia uns princípios básicos que foram respeitados na instalação dos sistemas de reprodução de som e alinhamento destes sistemas.” (BN) “A Dolby ajudou a criar um padrão. Tu vais misturar mais ou menos a este nível e sabes que neste nível, num sistema Dolby se vai ouvir direito e acho que isso foi fundamental para que as pessoas não misturassem às cegas e mantivessem sempre uma coesão de escuta” (JA)

Com o sucesso de “Star Wars” a Dolby passou a ser líder do mercado e como já foi mencionado, implementou uma série de normas e regras para conseguir obter os melhores resultados. “A Dolby nessa altura assegurava-se que tudo isto tinha sido feito de acordo com as normas para assegurar que o filme passava correctamente em todas as salas.” (HL)

“A Dolby mandava sempre um consultor e eram pessoas que não eram funcionários da Dolby, eram pessoas contratadas pela Dolby, portanto independentes e que estavam durante as misturas. (…) Normalmente sempre carregadíssimas de trabalho porque passavam a vida aos saltos de uns países para os outros para acompanhar as misturas, e na maior parte das vezes não eram sequer muito participativos portanto só estava a confirmar o que estava a ser feito.” (JP)

“Eu lembro-me que alguns anos atrás nós misturávamos um filme e vinha um consultor da Dolby, não vinha aprovar a mistura, isso é um mito. Vinha pura e simplesmente alinhar a sala e perceber se a mistura que tínhamos acabado de fazer estava a ser feita numa sala alinhada segundo os parâmetros da Dolby. (…) Ele não te vai dizer que tu tens que pôr o

5 Dolby. (2015). Dolby History - 50 Years of Innovation. Retirado a 3 de Agosto, 2015, de

41 filme mais baixo ou mais alto, esse não é o trabalho dele. Aquilo que ele vem primeiro fazer é certificar-se que a sala está calibrada e a seguir é certificar-se que o print master era feito de acordo com as regras.” (HL)

“A Dolby, como empresa, desenvolveu um sistema de transmitir o som do estúdio para as salas. Isto foi sobretudo muito importante no sistema Dolby Digital e Dolby Stereo, e eles estavam presentes todo o tempo para informar os misturadores de limitações do próprio sistema, para não tentar as coisas que depois não podem transmitir para salas de cinema. (...) Eles estavam aqui para assegurar que o processo de gravação de master, de print master está feito do ponto de vista técnico correctamente. Portanto a Dolby nunca chegava e dizia "ah, esta mistura não pode passar". O que normalmente era é "queres mesmo assim?" "Sim, quero mesmo assim" "Bom, então vamos fazer assim.” (…) Podiam ser feitas algumas recomendações por parte deles, porque alguns dos consultores de facto muito bons e sabiam imensa coisa sobre som de cinema. Alguns deles foram misturadores também mas também havia consultores da Dolby que são outro tipo de pessoa, que não têm ouvido, que não sabem nada sobre som. Sabem sobre técnica e tecnologia de transmissão e nada mais.” (BN)

Um dos aspectos fundamentais para o sucesso da Dolby está associado à exclusividade de formatos que eles tentam estabelecer.

“Quando aparece o som óptico para cinema, um dos problemas que havia era que no som óptico passava tudo o que era sujidade e à medida que as cópias iam ficando estragadas, portanto todos esses clicks, esses “fritar”, ouvia-se. Então os estúdios de Hollywood decidem chegar a um acordo de introduzir um filtro na escuta que cortasse o extremo agudo e o extremo grave. Partindo do princípio que não havia informação útil em termos de áudio nessas frequências (…) permitia deixar de ouvir ou ouvir-se menos todos esses cracks e clicks e todos esses ruídos que era acrescentado pelo som óptico. O filtro academia permaneceu activo praticamente até aparecer a Dolby. Portanto, quando se misturava som óptico tradicional o filtro academia era colocado na escuta. (…) Aos 7 000 e aos 10 000 praticamente não passa nada. (…) Normalmente nos processadores Dolby, desde os primeiros até hoje em dia, tem aqueles botões onde escolhe os vários formatos, o Dolby A, o Dolby SR, o Dolby Digital (…) e tem um botão mono, para os filmes que são feitos em mono. A Dolby inclui nos seus processadores um filtro academia mono, super conservador. (…) Isto é, partindo do momento em que a Dolby aparece, quem trabalhasse em mono estava lixado. Nos primeiros processadores da Dolby, projectar em mono era pior do que se não tivesse lá nada. (…) E é uma estratégia comercial. A ideia é: não trabalhem em mono porque soa péssimo.” (JP) “Dolby foi durante umas décadas um monopólio um bocado mafioso. Os

42 estúdios de cinema e televisão para além de terem que comprar as tecnologia, tinham que pagar ao minuto a utilização. E tinham que pôr lá os carimbos todos e isso. Felizmente que aparecem outros concorrentes: o THX, a DTS, STDS e outras; que acabam por dar concorrência a outros monopólios.” (EB)

4.3.2.2. As guidelines da Dolby

Com o início da era da Dolby Digital, a Dolby lançou guidelines em que informava os misturadores da melhor maneira de misturarem os filmes. Em retrospectiva, as guidelines tiveram um papel fundamental no processo de mistura e a opinião geral dos técnicos assenta na categorizarão das mesmas como meros guias, que não devem ser totalmente interpretadas como regras. Contudo alguns técnicos consideram que algumas directrizes têm que ser cumpridas de forma a existir mais coesão nas misturas de cada filme.

“Eu acho que as guidelines da Dolby são indicativas. São indicativas e provavelmente resultantes de algumas más experiências logo no início do processo. Agora eu acho que não há que tomar sugestões ou indicações como verdades, como dogmas. Eu acho que se forem entendidas como conselhos de alguém que tem uma enorme experiência no som para cinema, acho que fazem sentido. Levá-las como se fossem verdades absolutas, acho que não fazem sentido.” (JP)

“No início essas guidelines foram criadas para auxiliar os designers de som a integrarem o sistema 5.1 que não era muito conhecido porque quem está a aprender a editar inicialmente num sistema 5.1 não sabe. (…) Mas chega um ponto em que isso limita-te a criatividade, limita-te o teu trabalho e quando essa limitação surge, para haver evolução essa limitação tem que ser quebrada. Ou seja, essas guidelines têm que ser quebradas.” (VP)

“Eu acho que isso acontece ou agora torna-se cada vez mais importante porque qualquer pessoa em casa consegue fazer um 5.1 e pô-lo no cinema. Portanto a Dolby aquilo que faz nesse sentido é alertar as pessoas que realmente querem ter a certeza que o filme quando chegar às salas sai com as características correctas e não é uma má experiência... Aquilo é uma guideline, não é uma imposição.” (HL)

“Tens a questão do ponto de vista criativo da maneira como tu ouves, da maneira como tu misturas, como vais ouvir o final e quando o teu som passa a ser do mundo. E tentar estabelecer um método de escuta que seja o mais semelhante possível em larga escala, a nível

43 de espaço e eu todo o sítio, acho que faz sentido. (…) Está-te a criar limites mas também está a ajudar com que esses limites sejam cumpridos.” (JA)

“…eles têm um DVD que faz stereo e faz surround. Acho que é por isso que existem essas coisas. E acho que isso influencia os misturadores, claro. Mas acho que um bom misturador, ou um misturador de topo pode contornar isso à vontade. Sabe, nem sequer se interessa, porque sabe o que está a fazer.” (DH)

“Eu acho excelente. Se respeitarmos todos uma pequena regra que seja, as guidelines da Dolby são tão poucas, se houver apenas aquelas não fará mal a ninguém. E isso só unicamente vai fazer com que todos os filmes fiquem equilibrados, e não haja uma anarquia total (…).” (EF)

Tal como afirmam os técnicos, as guidelines não são imposições e não devem ser seguidas em todos os casos, mas o que elas proporcionam é um padrão estético nas misturas de som para cinema. Sendo todas misturas certificadas pela Dolby, convém que as misturas sejam semelhantes.

4.3.2.3. O papel actual da Dolby

Actualmente a Dolby preocupa-se mais em garantir que os filmes sejam adequados ao mercado do home theather, o mercado do consumidor caseiro, do que propriamente na experiência sonora nas salas de cinema.

“Eu acho que foi importante, foi uma das formas de assegurar que as coisas eram feitas de acordo com as regras. Hoje isso desaparece um bocado porque, a Dolby percebeu também que o seu mercado também, desapareceu um bocadinho do contexto daquilo que era a área profissional. A marca Dolby neste momento está muito mais interessada em vender sistemas de som para casa e esse tipo de coisas. Porque a tecnologia evoluiu, mais uma vez voltamos sempre a esta questão do avanço tecnológico das coisas (…) O papel da Dolby neste momento é assegurar que as salas estão calibradas e estão calibradas na forma correcta. É um papel muito mais passivo do que era antigamente. (...) Continuam a respeitar-se algumas regras obviamente, uma sala de cinema deve ser calibrada a 85dB, ou seja essa documentação é pública (…).” (HL)

“(…) Eles vão impulsionar sempre os estúdios a acharem que vão vender no circuito comercial, (…) o circuito caseiro, alegando que terá sempre melhor qualidade.“ (AR)

44 Com a introdução do Digital Cinema Processor6 “deixou de haver qualquer revisão do consultor sobre os filmes. Os consultores deixaram de vir.” (EF) O que implica haver menos controlo por parte da Dolby em relação a questões de escolhas criativas.

De uma forma geral, a Dolby proporcionou o cenário ideal para um misturador, que é garantir que a sua mistura é apresentada de forma igual em todas as salas de cinema. Juntando as regras e requisitos da empresa com a calibrarão das salas a nível mundial, a Dolby garante um som de qualidade.

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