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O domínio software em Lev Manovich

No documento ALT+R-HOTKEY  (páginas 63-68)

SEGUNDA PARTE

2. Para uma estratégia de defesa à subversão espacial

2.4. O domínio software em Lev Manovich

O software tornou-se a nossa interface para com mundo, para com os outros, para com a                                nossa memória e a nossa imaginação - uma linguagem universal através da qual o mundo                              fala e um mecanismo universal no qual o mundo funciona. A eletricidade e motor de                              combustão está para o início do século XX, como software está para o início do século                                XXI. 80(Manovich, 2013, 2) 

 

Na obra   ​Software Takes Command     ​(2013) o historiador de arte e professor de ciência da        computação, o russo Lev Manovich (n. 1960), enceta uma epistemologia do       ​software​.  Elabora uma importante teoria que postula o       ​software enquanto produtor de uma cultura          com história própria, ao qual Manovich apelidou de “estudos de software”. No centro da        sua investigação o     ​software aparece como mediador da experiência e expressão humanas.       

78 Tradução livre: “It is obvious that information collection takes place in asymmetrical power relationships:                           

we rarely have a choice as to whether or not we are monitored, what is done with any information that is                                          gathered, or what is done to us on basis of conclusions drawn from that information. If you want … make a                                          phone call, … you are going to be subject to information gathering and you are going to give up some or all                                            control over elements of that information. It is rarely a matter of explicit agreement in space of complete                                    information and informed choice. You will have to fill out certain forms in order to receive critical resources                                    or to participate in civic life, and you will have to consent to onerous terms of services in order to use                                          software that your job may require.” ​(Brunton e Nissenbaum, 2015, 43) 

79 Tradução livre: “it is an approach suited to situations in which we can’t easily escape observation but we                                    must move and act but this problem is only the surface aspect of information collection, what we know we                                      know” ​(Brunton e Nissenbaum, 2015, 43) 

80 Tradução livre: “Software has become our interface to the world, to others, to our memory and our                                  imagination - a universal language through which the world speaks, and a universal engine on which the                                  world runs. What electricity and the combustion engine were to the early twentieth century, software is to the                                    early twenty-first century.”(Manovich, 2013, 2) 

Embora o   ​software opere de forma oculta e subtil, o autor identificou um défice de estudo        aos efeitos deste na vida contemporânea, desenvolvendo dessa forma uma importante obra        acerca da linguagem binária do      ​software​, responsável pela modelação da vida das        sociedades contemporâneas, como assume o autor, de forma perentória. Antes de mais, no        ponto anterior, os autores Brunton e Nissenbaum, desenvolvem estratégias de defesa à        vigilância através do desenvolvimento de ferramentas de       ​software ao qual, podemos      afirmar, Manovich define como “Software Cinzento”: de logística e de automação        industrial, entre outros. Mas sobretudo, o que a obra de Manovich vem trazer ao        pensamento contemporâneo é um alerta ao conhecimento de uma genealogia da ascensão        do ​software​, desde a PARC da Xerox que nasce em Silicon Valley, até os fenómeno atuais:       

a omnipresença do     ​software   e da profunda raiz em quase todas as esferas da existência        humana. Em particular, Manovich concentra-se no “Software Cultural”. Uma categoria de        software por ele estabelecida, que molda de forma invisível a estética contemporânea. Uma        espécie de   ​software que estabelece o interface do utilizador (UIs) entre a produção dos        média - do ponto de vista da web 2.0 - e os seus produtores. Um interface que apresenta as        opções que o utilizador tem quando interage com o       ​software​: o design de       ​Alt+R-hotkey​, por    exemplo, onde clicamos, onde são reproduzidos os vídeos e os sons. Para o autor, o        interface representa um espaço-chave no qual um sem número de camadas convergem: os        mundos virtuais e os seres humanos. Essa incorporação do      ​software  numa nova    urbanidade, opera globalmente os média; transforma o produto artístico num abismo entre        o tradicional médium e o moderno       ​monomedium   /​metamedium​, termos utilizados por Alan          Kay (n. 1940) e Adele Goldberg (n. 1945) em       ​Personal Dynamic Media     ​(1977). Como    forma de reforçar a sua convicção, Manovich constrói a base da sua teoria na obra de Kay        e Goldberg, que estabelecem o         ​software como um dos componente da cultura, como        referimos anteriormente. A partir daqui, Manovich inicia uma investigação profunda ao        interface​ e ao papel do ​software​ na produção multimédia.  

 

Dessa forma, o autor ao invocar esses termos da computação, faz estabelecer a ideia de       

“Software Cultural” - termo utilizado pela primeira vez por J. M. Balkin (n. 1956) em        Cultural Software: A Theory of Ideology           (1998) - que Manovich o utiliza de forma literal.       

Nesta conformidade, o “Software Cultural”, segundo Manovich, faz parte da categoria de        software que opera ações, normalmente associadas à cultura: criar, publicar, partilhar e        misturar imagens fixas e sequências de imagens em movimento, desenho 3D, textos,        mapas e elementos interativos. Além disso, combinam esses conteúdos em websites,       

aplicações interativas,    ​motion graphics,    ​mundos virtuais 3D, entre outros. Assim        Manovich, estabelece um sistema de         ​softwares​: “Software do Média” onde se encontram        as ferramentas de programação computacional, como são exemplo os serviços de       ​network  e tecnologia de média social estabelecida pelo aparecimento da web 2.0 - onde o utilizador        é o principal produtor de conteúdos artísticos (visual / textual) e informação (dados).  

 

É neste sentido que o autor explora, não apenas a face técnica, mas também faz um exame        ao que identifica como sendo uma das faces do       ​software​: a cultura. No entanto, segundo        Manovich, tanto o     ​software cinzento   como o cultural, são responsáveis por moldar a        experiência e estética humans através de mapas de bits e vetoriais: 

 

Dentro do ambiente das aplicações informáticas, um utilizador trabalha com um ou mais                          documentos que contém conteúdo estruturado de uma maneira específica. O utilizador                      está ciente da importância dessa estrutura, mesmo que as aplicações de multimédia não                          utilizem o termo "estrutura de dados". O utilizador entende que a estrutura de dados                            determina qual conteúdo que pode ser criado e as operações que podem ser usadas para                              modelá-lo e modificá-lo. Se eu escolher os gráficos vetoriais como formato, isso implica                          que vou criar linhas retas e curvas e gradientes; Eu poderei remodelar qualquer linha no                              futuro sem perder qualidade; Também poderei obter impressões perfeitas em qualquer                      resolução. (…) o termo “estruturas de dados” têm um significado particular na ciência da                            computação, referindo-se a como são organizados os dados a serem processados                     ​​por um    programa. (...) uso esse termo para me referir ao nível de organização de dados, que se                                torna visível e acessível a um utilizador e, assim, torna-se parte de seu modelo mental do                                processo de criação e edição de média. (Manovich, 2013, 209) 81

   

Através daquilo que Manovich define por hibridação, uma espécie de ADN do       ​software​,  estamos seguros que     ​Alt+R-hotkey ​está presente da mesma forma no       ​software cultural e o      seu observador/utilizador é-lhe retirado a consciência de, por um lado, um mundo que        simula todas as estratégias existentes no seu mundo-próprio subjetivo, por outro, através da        low-fidelity​ da representação, patente em​ Alt+R-hotkey​: 

 

a simulação de software substitui uma variedade de materiais distintos e as ferramentas                          usadas para inscrever informações (ou seja, fazer marcas) nesses materiais com um novo                          meio híbrido definido por uma estrutura de dados comum. Por causa dessa estrutura                         

81 Tradução livre: “Inside the application environment, a user is working with one or more documents which                                contain content structured in a particular way. The user is aware of the importance of this structure—even                                  though media applications do not use the term “data structure.” The user understands that the data structure                                  determines what content can be created and the operations which can be used to shape and modify it. If I                                        choose vector graphics as my format, this implies that I will be creating straight and curved lines and                                    gradients; I will be able to reshape any line in the future without losing quality; (...) the term “data structures”                                       

has a particular meaning in computer science, referring to how data to be processed by a program is                                    organized. (...) using this term to refer to the level of data organization, which is made visible and accessible                                      to a user and thus becomes a part of his/her mental model of the media creation and editing process.”                                     

(Manovich, 2013, 209) 

comum, várias técnicas que antes eram exclusivas da média, agora podem ser usadas                          juntas. Ao mesmo tempo, novas técnicas anteriormente inexistentes podem ser                    adicionadas, desde que possam operar na mesma estrutura de dados. Na discussão, estou                          apenas referindo o denominador comum - em que os algoritmos trabalham quando uma                          imagem é carregada na memória - uma matriz de pixels contendo valores de cores.)                          82  (Manovich, 2013, 199) 

     

Perante tudo isto, podemos afirmar que todas as categorias de       ​software sofrem alterações    na sua qualidade ao longo do tempo: «durante os anos 2000, a fronteira entre “informações        pessoais” e “informações públicas” foi reconfigurada à medida que as pessoas começaram        a colocar a sua informação multimédia, rotineiramente em sites de partilha multimédia e        também comunicar-se com outras pessoas nas redes sociais [web 2.0].» (Manovich, 2013,      83      28) Dessa forma,     ​Alt+R-hotkey oculta dos seus utilizadores a sua estrutura de informação.       

Um consciência-bit-byte que revela inteiramente o seu       ​Umwelt ​binário, camuflado por      imagens. Coloca-o em confronto direto com essa estratégia de subversão da ordem dos        espaços e que, provavelmente, o obriga a relacionar-se e a moldar-se pelas privações do        domínio do tempo novo na web 2.0. Uma estratégia de defesa à tendência da destruição do        espaço a partir da web 2.0, que, sob o olhar atento do domínio invisível do software, a        incorporação da cibernética na nova urbanidade estabelece uma inquietante normalidade. 

 

Segunda conclusão parcial 

Ao criarmos   ​Alt+R-hotkey​, estamos a defender a ideia de anti-subversão, uma crítica ao        que é aceite como arte mas também ao poder representado por esta e às instituições        estabelecidas onde uma enorme quantidade de capital cultural e simbólico fora investido.       

Através da web 2.0 que é a sua essência, expressão e estética visual do objeto artístico        digital promovemos uma ordem e coerência discursiva, uma naturalização de mitos digitais        condensados em práticas herdadas, convenções dogmatizadas e descontextualizadas. Ora,        perante esta cidade web 2.0 que vemos e por isso nos olha,       ​Alt+R-hotkey ​coloca uma    questão fundamental: quais são na verdade as características e condições que definem a        subversão contra a qual luta a estratégia da camuflagem digital? Como observa Sennett, as       

82 Tradução livre: software simulation substitutes a variety of distinct materials and the tools used to inscribe                                information (i.e., make marks) on these materials with a new hybrid medium defined by a common data                                  structure. Because of this common structure, multiple techniques that were previously unique to dierent                            media can now be used together. At the same time, new previously non-existent techniques can be added as                                    well, so long as they can operate on the same data structure. (...) However, in this discussion, I am only                                        talking about their common denominator—what the algorithms work on when an image is loaded in                              memory—an array of pixels holding color values.)​(Manovich, 2013, 199) 

83 Tradução livre: “during the 2000s the boundary between “personal information” and “public information” 

has been reconfigured as people started to routinely place their media on media sharing sites, and also  communicate with others on social networks” (Manovich, 2013, 28)  

máscaras rituais da sociabilidade realmente não torna o Ser Humano mais primitivo        culturalmente do que a mais simples página de arte para a Internet? Parece-nos que sim,        através da estratégia da camuflagem ainda necessária à defesa da privacidade na web 2.0.       

Parece ser válido o estudo de Abbott acerca dos padrões no Reino Animal aplicados como        ciência da arte na Segunda Guerra Mundial, com o significado do privado substituindo-se        ao do público através de um domínio total do espaço. Uma página web 2.0 não tem valor        em si ou por si. Adquire-o por meio de estruturas de dados exógena que       ​Alt+R-hotkey traz  para a sua interpretação sejam elas culturais ou industriais, sejam elas visiveis ou invisiveis        na rede de Internet. Aqui, o estatuto de       ​Alt+R-hotkey baseia-se frequentemente (embora      não exclusivamente) na (1) não divulgação generalizada do seu endereço WWW, (2)        singularidade, (3) exibição em instituições de estatura como museus, leitões ou academias        de artes.   ​Alt+R-hotkey ​responde nos termos mais exatos possível: (1) criada num software        cultural, (2) desfuncionalizou-se e inverteu-se face à fidelidade da qualidade das imagens        que apresenta (3) ofereceu-se à rede através do seu alojamento público na web 2.0.  

                                       

 

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