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4.3. Relação teoria e prática nas práticas pedagógicas com os colegas e com a comunidade

4.3.2. Dos estudos teóricos para a prática pedagógica

O professor Bruno volta a referir-se pontualmente à importância do estabelecimento de um forte elo de ligação entre a teoria e a prática, quando diz que “lá, na prática, ou ele se calça na teoria e tem ‘bala na agulha’ para resolver os seus problemas práticos, através da teoria, ou ele não consegue, e se frustra e acaba não tendo um estágio muito feliz, uma participação muito feliz” (entrevista em 15/09/04). O “estágio”, ao qual se refere o professor Bruno, é justamente a prática pedagógica realizada na comunidade durante a disciplina desportiva ministrada por ele.

O professor Fábio conta que espera do estudante-professor “um posicionamento crítico em relação ao que ele está fazendo [...] que ele veja que deu certo e por que deu certo. Que ele entenda como o processo aconteceu, de dar certo ou não [...] que ele faça essa religação da prática com a teoria” (entrevista em 14/12/04). O professor Fábio exemplifica, dizendo que o estudante-professor se questiona: “Mas professor, nós vimos na teoria que a questão da adaptação se dá assim, e eu estou tentando fazer isso e não estou conseguindo com essa pessoa”. Diante disso, o professor ressalta a importância de que o estudante-professor compreenda que aquele conteúdo constitui uma parte dos conhecimentos necessários para a intervenção docente (entrevista em 14/12/04).

Nesse sentido, a opinião da estudante-professora Fernanda é de que

na teoria tudo ocorre perfeitinho, no papel tudo é bonitinho. Depois, lá na hora da prática, acontecem situações que nem na teoria tu pode prever [...] certos acontecimentos que na prática tu se depara, com algumas situações que tu não sabe às vezes como agir (entrevista em 18/12/04).

Abordando igualmente a questão da relação entre a teoria e a prática, a estudante- professora Ana também utiliza o exemplo do livro ao qual se referiu o professor Bruno. Para ela, as práticas pedagógicas constituem oportunidades para “pegar coisas da teoria e ver se na prática dava certo. Tu pega exercícios, de ‘Mil exercícios de vôlei’, pegava o livro lá. Aí tu ia lá e via se esses mil exercícios davam certo. Então era mais ou menos por aí” (entrevista em 16/09/04).

A estudante-professora Bianca, relatando a sua interpretação sobre a relação entre a teoria e a prática, em sua primeira aula com as crianças, diz: “No meu primeiro contato, eu vi que eu não conhecia nada, eu não tinha experiência nenhuma, que eu tinha a teoria e não sabia [...] [sabia] pouco da teoria também, e eu tinha que botar em prática, e foi um pouco difícil no início” (entrevista em 17/09/04).

Esse sentimento também é manifestado pelo estudante-professor Hugo, ao dizer que nas primeiras intervenções práticas na comunidade, os estudantes-professores

não têm muito o controle da situação, é mais desafiador do que prazeroso na verdade [...] porque tu não tem nem a prática do desporto e nem a prática docente. Então não tem experiência nenhuma. Mas a partir do momento em que tu começa a ter a experiência, começa a se tornar prazeroso (entrevista em 20/12/04).

Além disso, a estudante-professora Bianca diz que as atividades de prática pedagógica com crianças “contribuíram no sentido de a gente ter que ir atrás do material, de tu criar um exercício para ver se dá certo” (entrevista em 17/09/04).

Assim como as estudantes-professoras Ana, Bianca e Fernanda, a estudante- professora Gabriela também apresenta sua interpretação sobre a prática pedagógica com os alunos da comunidade. Para ela,

essa oportunidade de passar a teoria, o que tu viu, o que tu aprendeu para as crianças é muito importante, porque é aí que tu vai ver o que vai dar certo e o que vai dar errado. E, normalmente, o que tu escreve no papel, aquela aula perfeita, bonitinha, quando tu chega na prática não é tudo que vai dar certo. A gente tem essa ilusão. Quando a gente tá na faculdade, a gente dá aula para os colegas, e os colegas fazem tudo. Mas na escola é diferente (entrevista em 20/12/04).

A estudante-professora Inês também considera importante a possibilidade de realização das práticas pedagógicas na medida em que

tu aprende muito, é mais válido do que tu estudar aqui com os colegas, porque tu sabe que aqui é outra realidade [...] tu põe tudo em prática aqui com os teus colegas, que é uma população sadia, sem problema nenhum, todo mundo está ali por um mesmo objetivo, todo mundo coopera, é uma realidade. Daqui a pouco tu faz essa mesma aula lá fora com teu outro grupo de alunos, e não acontece nada. Então é diferente sim (entrevista em 22/12/04).

O professor Celso manifesta os seus objetivos em proporcionar aos estudantes- professores vivências com as práticas pedagógicas com a comunidade, dizendo que os levava para dentro das aulas de Educação Física nas escolas, para que conhecessem a realidade da aula, e que pudessem repassar para a prática o que foi estudado na teoria (entrevista em 13/12/04).

Segundo Tani (1995), “a vivência prática desempenha um importante papel enquanto mecanismo que possibilita a verificação ‘experimental’ do conhecimento no processo de aquisição” (p. 20). Essa afirmação vem ao encontro do que os estudantes- professores relataram como “ver se na prática dava certo”, e a busca da comprovação dos seus próprios processos de construção de conhecimentos através das atividades de prática pedagógica.

Nesse cenário, a estudante-professora Camila ressalta que um dos aspectos mais relevantes nas práticas pedagógicas com a comunidade foi “a busca de bibliografia. Eu vou procurar nos livros, eu vou atrás, eu vou buscar, eu vou pedir ajuda para aquela

professora de Educação Física, eu vou pedir ajuda para o meu orientador” (entrevista em 14/12/04).

A estudante-professora Eduarda também reconhece a importância dos estudos teóricos realizados durante o planejamento das aulas para os alunos. Segundo ela, um aspecto que contribuiu para sua formação

foi o fato de ter que construir propostas de trabalho e estar sempre buscando construir, planejar, mesmo em disciplinas em que não teria que dar aulas, ou que teria que ser dada mas para o colega. Conhecer as abordagens e as formas de trabalhar, estudar várias possibilidades de trabalho, também me ajudaram a trabalhar melhor, e a querer melhorar o meu trabalho (entrevista em 17/12/04).

A importância de um forte embasamento teórico para a realização das atividades de prática pedagógica, fica evidente também no depoimento da estudante-professora Ana, ao falar sobre a sua formação:

Tu tem que ler, tu tem que ir atrás, tu tem que ir em busca, aí tu consegue relacionar, aí tu aproveita bem as tuas disciplinas. [...] Eu me sinto preparada, com uma base muito boa. Pelo que o curso me ofereceu, no currículo dele, nas disciplinas, e no que ele me ofereceu extra [...] que é o currículo oculto, no sentido de me fazerem ir atrás, ir buscar e ler. Eu sempre tive isso (entrevista em 16/09/04).

A estudante-professora Bianca, descrevendo como se concretizou essa relação durante sua formação inicial, revela: “Com relação à prática, eu tive necessidade de buscar mais informação, que o que eu tinha não era suficiente. Isso eu acho que contribuiu bastante, eu aprendi que eu tinha que ter uma boa teoria antes de ir para a prática, mesmo achando que a prática, na minha opinião, é mais importante. Acho que isso contribuiu” (entrevista em 17/09/04).

O professor Celso, quando aborda a questão dos conhecimentos teóricos e sua relação com as práticas pedagógicas, diz que o estudante-professor “não vai conseguir trabalhar nada do desporto coletivo se não tiver um embasamento teórico muito grande, e uma metodologia, uma bibliografia, e utilizar ela” (entrevista em 13/12/04). Segundo o mesmo professor, os estudantes-professores utilizam muito os seus próprios conhecimentos prévios sobre o desporto, atribuindo aos conhecimentos teóricos uma importância secundária no processo de construção das suas competências pedagógicas.

Com relação à necessidade que os estudantes-professores sentiram em embasar teoricamente suas ações práticas, Demo (2002) ensina que os estudantes-professores precisam “buscar na teoria fundamentos para refazer a prática, pesquisando posturas alternativas, propostas diferentes ou divergentes, linhas de pensamento e questionamento, paradigmas científicos” (p. 42).

Fica evidente nas falas dos estudantes-professores e dos professores-formadores que o contato dos estudantes-professores com alunos da comunidade escolar obrigou-os a recorrer a estudos teóricos para embasar seu planejamento e suas ações. Em assim

sendo, demonstra-se a relevante participação das práticas pedagógicas com essas características para a construção dos conhecimentos teóricos e práticos dos estudantes- professores durante a sua formação inicial.

4.3.3. Processo de construção e planejamento das práticas pedagógicas