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Durante a gestão corrente pelo Administrador Judicial (art 81º do CIRE)

2. A LEGISLAÇÃO DA INSOLVÊNCIA

2.3 O CIRE e a responsabilidade tributária dos Administradores Judiciais

2.3.5 Durante a gestão corrente pelo Administrador Judicial (art 81º do CIRE)

Nesta situação, os anteriores gestores apresentam à insolvência uma empresa em funcionamento, sem tentarem viabilizá-la. Não existindo nenhum plano de viabilização, nem sendo requerida a gestão pelo devedor nos termos do art. 224º do CIRE, então o AJ tem de gerir uma empresa em funcionamento pleno, até que os credores a encerrem.

Neste caso, imediatamente com a declaração de insolvência emerge a obrigação de apreender a contabilidade nos termos do art. 149º do CIRE, porquanto o art. 81º priva os anteriores gestores dos poderes de gestão. Esta conjugação de fatores, significa que passa a incumbir ao AJ o cumprimento

das obrigações declarativas e fiscais, que se mantêm latentes até à Assembleia de Credores. De facto, o art. 117º, nº 10 do CIRC determina que neste caso a responsabilidade fiscal passa a estar acometida ao AJ.

Assim, a gestão corrente fica acometida36 unicamente ao AJ, nos termos do art. 81º do CIRE, devendo o AJ decidir sobre a manutenção da atividade até à Assembleia de Credores ou sobre a sua suspensão. De salientar que as decisões sobre o início da liquidação são da soberana vontade dos credores e não do AJ, mas também é de realçar que o AJ pode e deve deliberar sobre a manutenção da atividade comercial corrente37.

De facto, o art. 65, nº 2 do CIRE determina que até à Assembleia de Credores deverão continuar a cumprir-se todas as responsabilidades declarativas e tributárias, sendo apenas dispensadas quando e depois de os credores, reunidos em assembleia, decidirem soberanamente ordenar o encerramento da atividade comercial corrente e o AJ o registar junto da AT. Porém, podem surgir dificuldades nesse ato de registo. O que faz suspender e delimitar as obrigações contabilísticas e declarativas é a decisão de fazer cessar a atividade comercial e o respetivo registo na AT, nos termos do art. 65º, nº 3 do CIRE, e não a habitual decisão dos credores de ordenarem o início da liquidação.

É de recordar que o AJ só está dispensado do cumprimento da obrigação de entregar a Declaração de Alterações junto da AT e da SS se os atos a declarar forem registáveis na conservatória, conforme o art. 118º, nº 7 do CIRC. Ora, a cessação de atividade comercial referida no art. 65º, nº 3 do CIRE, não é um ato sujeito a registo conservador, pelo que a AT só tem conhecimento dele se o AJ o declarar junto daquela entidade, com a colaboração do Contabilista Certificado (CC), ou se o tribunal o decretar e o comunicar à AT. De facto, a cessão da atividade comercial, tem de ser acionada por outrem, porque a AT não o pode fazer de per se. De facto, mesmo que a AT queira extinguir uma entidade fiscal, tem de pedir à conservatória do registo comercial que o faça, nos termos do art. 5º, al. b), do Regime Jurídico de Dissolução e Liquidação de Entidades Comerciais ( RJDLEC).

Neste contexto, até à realização, no espaço de 45 a 60 dias (art. 36º, nº 1, al. n) do CIRE), da Assembleia de Credores (art. 156º do CIRE), cabe ao AJ defender o património dos credores, sendo certo que a melhor forma de delimitar as eventuais responsabilidades fiscais pessoais passa por decretar, implementar e comunicar esta decisão de cessação da atividade corrente ao respetivo serviço de Finanças37.

36 Neste contexto, o termo “acometida” significa “atribuída quase à força”, sem poder recusar, passar ou partilhar

responsabilidades. É o único responsável, quer queira quer não.

37 A atividade comercial corrente é um importante conceito que será usado ao longo desta dissertação. Este conceito é

invocado no art. 65º, nº 3 do CIRE. Simplificadamente, a cessação da atividade comercial corrente é deixar de emitir faturas, e formaliza-se comunicando esta decisão à AT para efeitos de IVA.

Portanto, cabe ao AJ avaliar e ponderar se a empresa está em normal funcionamento, pelo menos burocrático, com uma contabilidade exemplar e saldos bancários que permitam satisfazer as responsabilidades fiscais até à Assembleia de Credores.

Pode o AJ decidir pela cessação da atividade corrente e agir em conformidade, procedendo às respetivas declarações de alterações a entregar no serviço de finanças. De facto, como já se viu, nesta fase a legislação é ambígua e poderá o AJ ser responsabilizado por este período de gestão.

Por fim, é importante realçar que as finanças não têm conhecimento oficioso da decisão de fazer cessar a atividade comercial corrente pelo que, nos termos do art. 188º, nº 7 do CIRC, cabe ao AJ promover a comunicação pelos mecanismos disponíveis, o tribunal ou o CC.

De facto, as finanças apenas sabem pela conservatória se a empresa entrou em liquidação ou se a liquidação terminou, pois são as únicas comunicações previstas no art. 14º, al. a), do RJDLEC. Não existe mecanismo de comunicação previsto no RJDLEC nem no Código do Registo Comercial (Cod.RC) para comunicar ao serviço de finanças decisões sobre a manutenção ou cessação da atividade corrente por via da conservatória ou do tribunal.

Neste contexto legal, uma empresa pode estar em liquidação e simultaneamente em atividade corrente38, acumulando responsabilidades para o AJ.

De facto, a cessação da atividade só pode ser feita das seguintes formas:

• O tribunal determina e comunica o encerramento da atividade, acionando o art. 65º, nº 3 do CIRE, ou

• O CC cumpre os procedimentos fiscais de encerramento da atividade comercial em IVA nos termos do art. 35º do CIVA, ou

• O AJ consegue promover a cessação da atividade nos termos do art. 119º do CIRC.

Neste contexto, cabe ao AJ aferir se tem condições para manter a atividade corrente até à Assembleia de Credores, ou se será recomendável cessar a atividade corrente, pelo menos provisoriamente, e registar tal decisão no serviço de finanças. Para manter a atividade corrente dentro da legalidade fiscal será necessário que o AJ mantenha a contabilidade e todas as declarações contabilísticas e fiscais descritas no art. 117º do CIRC, mantendo, renovando ou contratando um CC nos termos do art. 102º, do CIRE, especialmente o seu nº 4.

38 Por exemplo, quando os credores decidem liquidar (vender) uma farmácia e simultaneamente manter a sua atividade

comercial corrente até ao trespasse do alvará do estabelecimento, por forma a evitar perder esse mesmo alvará. Quer o AJ concorde ou discorde da decisão dos credores, é esta a determinação que tem de implementar, com as consequentes responsabilidades fiscais.

De facto, independentemente de se iniciar a liquidação, e principalmente durante a liquidação do ativo corrente (stocks, etc.), desde o início da insolvência até que o AJ registe a cessação da atividade comercial corrente nos moldes previstos nos art.s 35º do CIVA, 112.º do CIRS e 118.º do CIRC, mantêm-se as suas obrigações declarativas e fiscais, constantes do art. 117º, nº 10 do CIRC, plenas de responsabilidades, só terminando quando a AT for informada da cessação da atividade comercial corrente nos moldes previstos nos art.s 35º do CIVA, 112.º do CIRS e 118.º do CIRC.