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É importante sublinhar o fato histórico de que, no período do século XVII até ao último quartel do XVIII, haviam dois estados coloniais separados, o Estado do

Brasil, que teve como capital a cidade de Salvador e posteriormente o Rio de Janeiro

e o Estado do Maranhão e Grão Pará, com sedes nas cidades de São Luís e Belém alternadamente. Área de vasta abrangência, pois a ela pertenciam os territórios que hoje correspondem ao Ceará, Piauí, Maranhão e Pará, propriamente ditos, e ainda boa parte da Amazônia. Praticamente, metade do atual território brasileiro.

Em 1775, Sebastião José de Carvalho e Melo, o Marquês de Pombal, primeiro ministro do rei D. José I de Portugal promoveu a unificação dos dois estados, além de uma série de medidas, que provocariam significativas mudanças na realidade econômica do Maranhão.

O aumento da escravidão negra e a criação da Companhia Geral do Comércio do Grão-Pará e Maranhão, com recursos públicos e de grandes comerciantes portugueses, são as principais decisões que influirão no futuro da região. A esta Companhia, foi concedido o monopólio do abastecimento, bem como o direito exclusivo do comércio com a metrópole e da navegação, inclusive para a África, e do tráfico de escravos, além de receber do poder público as instalações para seu funcionamento e dispor de privilégios de nobreza para seus acionistas.

Viveiros,20 autor da História do Comércio do Maranhão refere-se à atuação da Cia. de Comércio:

De fato, introduzindo escravos africanos para o trabalho, os quais vendia a preços módicos e a longos prazos, adiantando numerário aos colonos para a fundação dos campos de lavoura, fornecendo sementes, entregando mercadorias num ano para serem pagas no ano seguinte, financiando negócios, comprando só produtos coloniais a justo preço, estabelecendo, a navegação para o Reino e agindo em tudo com lisura e probidade, a companhia de comércio transformou a nossa penúria em fartura, nossa pobreza em riqueza. Deve-lhe o Maranhão o surto de progresso que desfrutou nos últimos quarenta anos do período colonial e que todos os historiadores consideram verdadeiramente notável.

Não obstante a admiração do historiador, assim se fazia a globalização da época, desde então presidida por interesses do capital internacional. A comunicação e o transporte eram assegurados pelas naus, caravelas ou galeões, navios geralmente aproveitados da armada portuguesa.

Por outro lado, ela fornecia aos fazendeiros insumos a baixos preços e créditos para o custeio da safra agrícola e compra de equipamentos, colocando a produção resultante nos mercados consumidores na Europa, que pagavam preços compensadores pelo algodão e arroz produzidos no Estado.

Em suma, os propósitos firmavam-se na transferência de produtos agrícolas em larga escala para a Europa. De igual forma, ocorria com o ouro das Minas Gerais ou com o açúcar de Pernambuco. A mesma Cia. de Comércio providenciou a vinda de milhares de escravos africanos para o Maranhão, a fim de

20 VIVEIROS, Jerônimo de. História do comércio do Maranhão. 3v., 2ª ed. São Luís: Associação Comercial do Maranhão, 1993..

que facilitasse a produção de algodão e arroz, produtos das terras férteis da província de Cumã, hoje cidade de Alcântara.

A combinação de trabalho escravo com o lucro da exportação, engendrou no Maranhão, como em outras regiões da América Latina, o mecanismo de concentração de riquezas. O testemunho destas atividades se materializou com a maior ênfase nos principais pontos de escoamento, as sedes dos entrepostos comerciais, que foram respectivamente as cidades portuárias de Belém, São Luís e Alcântara, onde se localizaram os proprietários de terras e os comerciantes.

No período de 1812 a 1821 foram comprados cerca de 50.000 escravos para trabalhar nas lavouras do Maranhão. Período este que coincide com o melhor

desempenho da economia. Conforme Simonsen em sua História Econômica do

Brasil, “em 1817 a economia colonial maranhense conseguia o máximo de eficiência,

superando a pernambucana e igualando-se a baiana, recebendo 155 navios”, o que

nos dá uma média de quase um navio a cada dois dias no porto de São Luís. Conforme bem observa Corrêa, “...o Maranhão recebia escravos

duplamente: da África e do Brasil, e os tratava com inusitada violência, chegando a imortalizar uma senhora, Ana Jansen, pela perversidade dos suplícios aos quais submetia os cativos”.21

A escravidão africana foi um dos pilares para que se constituíssem centros urbanos com os confortos da vida moderna da época.

Em resumo, era uma economia primária, com pouca diversificação produtiva, mas que foi suficiente para integrar o Maranhão ao sistema mundial do comércio, pelas exportações de algodão, arroz e outros produtos regionais, e canalizar para São Luís e Alcântara, principais portos de escoamento, a circulação de riquezas que iriam promover um florescimento cultural significativo nestas cidades.

Entretanto, não só de arroz e algodão, constituiu-se este período econômico da região do meio norte brasileiro. Nos documentos de época há referências a outros produtos da pauta de exportações, embora em menor quantidade e valor. Dentre eles o açúcar desde o século XVII, mas também o couro proveniente das fazendas de gado das regiões mais ao sul do Estado.

A presença do gado representou um fator importante na economia do período colonial. Embora, de significado modesto nos índices de exportação, a

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pecuária bovina esteve sempre presente e estabeleceu um traço comum na história da ocupação dos territórios que correspondem à Bahia, Pernambuco, Piauí e Maranhão, através da reconstituição dos caminhos percorridos pelos rebanhos de gado que, a partir da Bahia, eram tangidos pelos sertões em busca de pastagens e água, o que vinham encontrar em terras maranhenses.

O arroz aparece em segundo lugar, afirma-se por ser um produto que encontrou terras extremamente favoráveis ao seu cultivo, e, funcionou como alimento preferencial, de menor custo para alimentar quantidades de escravos. Já o crescimento acentuado da produção de algodão sobre os demais também se deve a fatores externos como o fato de que este passou a ganhar valor no mercado internacional em decorrência das guerras de independência dos Estados Unidos da América do Norte (em 1776 e 1816) assim como a guerra de secessão (1861), que desorganizaram a exportação da matéria prima naquele país e obrigaram os ingleses a importá-lo do Maranhão em plena “Revolução Industrial”.

Entretanto São Luís e Alcântara, por sua condição portuária, no período em que toda a comunicação com a Europa se fazia pelo mar, acabaram por se constituir os mais expressivos exemplares de arquitetura e urbanismo da época.

Além do que havia, como até hoje há, o fato de que o campo trabalhava para enriquecer a cidade. Grande parte das riquezas oriundas das extensões pastoris dos sertões escoava-se pelo porto, este reunia, portanto, as benesses de ser capital, sede administrativa e entreposto comercial, produzindo-se aí, as maiores e mais expressivas manifestações de urbanidade. Uma elite de comerciantes por aqui se estabeleceu em função destas rendosas atividades de comércio de exportação, gerou a necessidade de construir em São Luís e Alcântara, um ambiente urbano capaz de reproduzir padrões de conforto aos quais seus proprietários estavam acostumados nas cidades européias.