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1.1 Fronteira: frente pioneira e frente de expansão

1.1.2 A economia brasileira no pós 30

A economia brasileira pós 30 caminhava para a diversificação, procurava

novas alternativas capazes de desenvolver um sistema interno auto-suficiente,

que fugisse da monocultura exportadora e da vulnerabilidade às oscilações do

mercado internacional. É então que surge o Estado Novo como instrumento

condutor desse processo, instituindo a política da Marcha para o Oeste,

propondo o “desenvolvimento da nação”, entendido como a ocupação dos

vazios demográficos, a defesa do território nacional e o crescimento e

diversificação da agricultura.

Após o movimento de 30, o poder público passou a intervir sistematicamente nas diferentes esferas que compunham a vida social. No âmbito econômico e institucional, criou mecanismos que proporcionaram o ajustamento da economia goiana ao novo padrão de acumulação que estava sendo implantado no país. (Borges, 1996, p. 40)

No final deste período histórico, o setor industrial, em fase dinâmica,

concentrava-se no sudeste do país, comandando a economia nacional; ao passo

que, o setor agrário continuava com seu modo tradicional de produzir, revelando

suas limitações diante da crescente demanda de produtos alimentícios para o

abastecimento do mercado interno.

E aqui importa ressaltar que até então todo o processo de acumulação

de capital tinha fulcro nas exportações, principalmente do café. Era a exportação

desse produto que gerava a acumulação do capital nacional, isto é, a geração

de divisas se realizava no exterior, com o processo ligado quase que somente ao

número de sacas de café vendidas no mercado internacional.

Com o desenvolvimento industrial da região

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Centro-Sul, centralizado

em São Paulo, buscou-se corrigir tal situação, buscou-se alcançar que a produção

do valor se concretizasse internamente, o que seria impossível sem a criação de

10.Entende Francisco Oliveira que o conceito de região encontra seu fundamento nas formas específicas de reprodução do capital e do processo de acumulação e na peculiar estrutura de classes embutidas em tais formas.

mecanismos institucionais e financeiros conducentes à expansão da industria

nacional.

Entre esses mecanismos, Francisco de Oliveira destaca a nascente

legislação trabalhista,

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que regulamentou as relações entre o capital e o trabalho.

Passou então a força de trabalho a ser uma mercadoria de preços nivelados,

tendo estes preços como referência essencial o custo de vida básico para a

reprodução da força de trabalho do operário, já que os trabalhadores passaram

a receber o mínimo necessário à sua sobrevivência, sem ônus para os custos da

acumulação do capital.

Com preços uniformizados, guardando diferenças regionais, dissolvendo o dualismo que tendia a formar-se entre os distintos mercados de trabalho; persistiam diferenças regionais, diferenças entre a cidade e campo, mas isso está muito longe do dualismo; a referência básica passou a ser o custo de reprodução da força de trabalho, e as gradações no mercado urbano da força de trabalho partiam do mínimo de subsistência necessário à reprodução. (Oliveira, 1993, p. 74)

Outra medida significativa para a criação de uma economia nacional

foi a extinção das barreiras alfandegárias que vigiam entre os Estados. Criou-se

também o Imposto de Consumo que, taxando todos os bens produzidos em

território nacional, retirou dos Estados o poder de estabelecer leis sobre o comércio

exterior.

Estava-se, em verdade, em presença da implantação de um projeto de estado nacional unificado, em sua forma política, que recobria a realidade de uma expansão capitalista que tendia a ser hegemônica; voltada agora para uma produção de valor cuja realização era, sobretudo de caráter interno, podia a mesma impor

11. Em 1931, o ministro do Trabalho, Indústria e Comércio, Lindolfho Collor, criou a lei que estabelecia que em cada assembléia sindical haveria um funcionário do ministério para fazer relatórios. Caso o sindicato não acatasse a lei, isto é, se fosse combativo, poderia ser fechado. Entraram em vigor algumas leis trabalhistas como a que criava férias remuneradas e a que regulamentou o trabalho de mulheres e de crianças. Criou-se em 1943, a CLT-Consolidação das Leis do Trabalho. A CLT foi diretamente inspirada na Carta del Lavoro, Carta do Trabalho, instituída na Itália por Benedito Mussolini.

ao conjunto do território nacional o seu eqüivalente geral: essa imposição do eqüivalente geral criava o espaço econômico capitalista nacional unificado. (Oliveira, 1993, p. 75)

Cumpre também lembrar que a aliança entre o Estado e a burguesia

industrial foi importante fator nesse processo de industrialização nacional. Coube

ao Estado adotar medidas institucionais e aplicar recursos financeiros capazes

de incrementar o processo. Em suma, o Estado financiou a industrialização no

Centro-Sul não só criando mecanismos políticos institucionais, mas também

mediante a “ação suplementar que, como Estado em sentido restrito imprimia a

seus gastos: estradas de rodagem que tornavam fisicamente possível a circulação

nacional das mercadorias produzidas no Centro-Sul” (Oliveira, 1993, p. 75).

Assinala Oliveira que este notório apoio do Estado à burguesia industrial fazia

parte de uma política econômica mais ampla, ou seja, para se criar uma economia

nacional, tendo como base a indústria nacional, era preciso a conjugação de

interesses políticos e econômicos tanto do setor industrial quanto das oligarquias

agrárias. Ora, o setor industrial em fase de implantação necessitava da economia

agroexportadora para reprodução do seu capital, isto é, “as divisas necessárias

para a importação dos bens para a indústria continuavam a ser, sobretudo,

advindas da realização externa do produto da economia agroexportadora”

(Oliveira, 1993, p. 84).

Entretanto, essa conjugação entre os dois setores não eliminava a posição

de subordinação do setor agrário em relação ao setor industrial. Na fase de

consolidação industrial o setor agrário, mesmo em face de sua tradicional forma

de produzir, possibilitou o avanço industrial. Porém, quando o setor industrial

se impôs ao conjunto da economia nacional, exigiu que o setor agrário redefinisse

a forma de reprodução do seu capital.

O ultimato do capital industrial à economia agroexportadora podia ser sintetizado em: “ou te reproduzes como eu, ou te extinguirás”. A reposta freqüentemente tomou duas formas: uma, a forma da expansão da fronteira onde era possível; a outra, uma forma de concentração peculiar aos estágios iniciais da indústria em sentido lato: uma concentração em forma de capital variável, isto é, uma transformação nas relações de produção. (Oliveira, 1993, p. 84).

Verdade é que esse conjunto de medidas implementadas para alavancar

o setor industrial não pode ser atribuído a um planejamento próprio do Estado.

Em outras palavras, o Estado somente o realizou porque foi cooptado pelas formas

capitalistas de produção. “A região do café passa a ser a” região da indústria:

São Paulo é o centro, o Rio de Janeiro seu subcentro, Minas Gerais e o Paraná

seus limites e a expansão da fronteira dessa “região” começa a capturar os espaços

vazios do Centro-Oeste (Oliveira, 1993, p. 37).

Foi neste contexto histórico, político e econômico que Vargas propôs

uma nova articulação, ou melhor, uma maior integração entre o setor industrial

e o setor agrário, abrindo novas fronteiras econômicas. Portanto, a industrialização

do Sudeste suscitou a expansão da fronteira agrícola no país.

Este alargamento das fronteiras estimulou a integração entre as diferentes

regiões e, aqui em Goiás, recebeu apoio de Pedro Ludovico. “A expansão da

fronteira agrícola em Goiás ocorreu em consonância com as transformações

estruturais na economia do Sudeste do país” (Borges, 2000, p. 71).

Segundo Amado, a região do norte do Estado de Goiás até a década de

40, era considerada uma área distante e de difícil acesso. Entretanto, nesse mesmo

período passou para “a condição de nova fronteira do Brasil” (Amado, s/d, p. 9).

Porém, é necessário ponderar que esta nova fronteira dispunha de grandes áreas

de terras pertencentes ao Estado, ou seja, terras devolutas.

Foi nesse cenário político, social e econômico que se promoveu

campanha de divulgação nacional através do rádio, oferecendo terras aos

trabalhadores rurais: “Lavrador sem terra, venha para Goiás, trabalhar na sua

terra doada pelo governo”. “Lavrador que não tem terra deve vir para Goiás, só

não vem quem não quer trabalhar e ter o que é seu”. (Carneiro, 1988, p. 80).

Mas, a campanha não esclarecia que a prometida doação de terras, restringia-se

apenas a uma área de colonização, a Colônia Agrícola Nacional de Goiás –

CANG.

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12. Previu-se a instalação da CANG à margem esquerda do Rio das Almas. A doação das terras efetuada pelo decreto estadual no 3.704 de 4/11/1940, sendo retificada e ratificada pelo decreto n. 403 de

Não obstante, essa campanha publicitária atraiu enorme contingente

migratório, que logo esgotou a capacidade de assentamento da CANG. Basta

citar que em 1953 a população da colônia alcançou cerca de 36 mil habitantes.

Na década de 50, a economia goiana era essencialmente agrária. As

regiões sul e sudeste, densamente povoadas, já estavam integradas à economia

nacional, escoando-se sua produção por estradas de ferro. O sudoeste goiano

mantinha estreitos laços comerciais com o Triângulo Mineiro, através das estradas

de rodagem que ligavam os dois estados. Já na região norte, a população escassa

se espalhava por imensas áreas de terras devolutas.

Neste mesmo período, o preço da terra em Goiás apresentava sensíveis

variações, resultado da diversa “fertilidade do solo” e da maior ou menor

facilidade de escoamento da produção.

No final dos anos 50 os terrenos mais valorizados encontravam- se no sudoeste e no Mato Grosso Goiano, seja pelo valor dos rebanhos, seja pelo maior aporte de capital com o início da mecanização das lavouras ou mesmo pelo “fechamento” da fronteira agrícola nessas regiões. As terras menos valorizadas encontravam-se no Norte do Estado, onde a fronteira agrícola permanecia “aberta” e as terras devolutas eram abundantes e de fácil acesso. (Borges, 2000, p. 136)

Em suma, as regiões sul e sudoeste do Estado encontravam-se densa-

mente povoadas e integradas à economia nacional. Por isso, a expansão da

fronteira agrícola dirigiu-se para a região norte de Goiás onde havia grandes

porções de terras devolutas. “A expansão da fronteira agrícola tende a consolidar

a grande propriedade fundiária, que expulsa para a fronteira o pequeno produtor,

sobretudo na condição de posseiro ou ocupante de terra devoluta” (Borges,

2000, p. 132). Para expandir a fronteira, foi necessário a figura do posseiro, ou

seja, o indivíduo que não tinha condição de pagar o preço de uma gleba, mas

que queria trabalhar na terra e dela retirar o sustento da prole. “Por essas razões,

entre fins da década de 1940 e meados dos anos 1960 milhares de posseiros

chegaram à região. Foi o início da grande migração que nos últimos cinqüenta

anos ajudou a mudar a face do país” (Amado s/d, p. 9)