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Educação de adultos em Portugal: da educação popular aos cursos EFA

2.2. Educação de adultos

2.2.2. Educação de adultos em Portugal: da educação popular aos cursos EFA

Em Portugal, só há bem pouco tempo é que o problema dos baixos índices de escolarização da população adulta teve um alargado reconhecimento social. Embora haja elevada taxa de adultos nessa situação, as políticas educativas têm tido a tendência

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de ficar centradas nos jovens e o que pode ser feito para melhorar o sistema regular de ensino a eles dirigido.

As principais iniciativas no domínio da educação de adultos, dirigida a um segmento da população, o dos adultos pouco escolarizados, são posteriores ao 25 de Abril. Numa primeira fase, de curta duração, marcada pela chamada educação popular, foi muito influenciada pelas ideias e práticas de Paulo Freire (Canário 2000, p. 59). A partir do início da década de 80 começaram a ser dados os primeiros passos no sentido da constituição de uma rede pública de educação de adultos e foram redigidos os principais documentos de carácter político visando o planeamento de iniciativas neste campo (Silva, 1990).

Um dos principais documentos, consensualmente reconhecido, é o Plano Nacional de Alfabetização e Educação de Base de Adultos (PNAEBA, 1979), aprovado em finais da década de 1970, que consubstancia uma concepção educação de adultos bastante ampla, na qual as várias perspectivas de educação popular têm ainda lugar de destaque e se defende a participação de instituições de diversos tipos (Silva & Rothes, 1999, p. 21). Seguiram-se vários outros projectos que, no essencial, retomaram os objectivos do PNAEBA.

A realização dos vários planos elaborados ficou, no entanto, muito abaixo das metas neles estabelecidas, o que foi interpretado com o facto de em Portugal, a educação de adultos se confrontar a uma dupla exigência, a de responder aos desafios de uma educação para o futuro, pensada para um conjunto da população adulta que a ela possa recorrer em diversos momentos ao longo da sua vida e de, simultaneamente, colmatar as deficiências dos sistemas educativos em vigor (Pinto, Matos & Rothes, 1998, p. 21).

A Lei de Bases do Sistema Educativo de 1986 (LBSE)2 prevê duas vertentes para a educação de adultos, o ensino recorrente e a educação extra-escolar. A primeira incide sobre os processos que visam a obtenção de diplomas escolares ao nível do ensino básico e secundário. A segunda não implica a certificação académica e constitui um campo muito heterogéneo, envolvendo diferentes instituições, áreas de intervenção e formas educativas. Apesar de inicialmente se considerar estas duas dimensões, foi o ensino recorrente que concentrou a maior parte dos esforços e recursos do sector,

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39 enquanto a educação extra-escolar foi progressivamente secundarizada, nunca alcançando um papel relevante (Silva & Rothes, 1999, p. 61).

Embora a partir da década de 80 se tenha construído uma rede pública de educação de adultos, praticamente inexistente até à data, o modo como foi concretizada e a sua generalização não deixou de levantar alguns problemas.

As limitações da rede pública da educação de adultos foram sistematizadas por Silva (1990) em três pontos: detinha um estatuto marginal, face ao sistema educativo e às políticas governamentais; foi acompanhada por um afunilamento das instâncias educativas envolvidas; e estava fortemente vinculada ao paradigma escolar (pp. 30/ 32).

O ensino recorrente, embora pensado para a população adulta, acabou por ter de responder também às necessidades dos jovens com mais de 15 anos que abandonaram o ensino regular. Como declaram Silva e Rothes (1999) “houve uma deriva da educação de adultos, a qual se afastou muito da definição ampla de que partira, para se centrar quase obsessivamente numa escolarização compensatória dirigida a um público juvenil” (p. 53).

Essa dependência do paradigma escolar irá acentuar-se até meados da década de 90. Foi no abeirar do novo século que emergiram as condições para uma nova fase no campo da educação de adultos com a criação da Agência Nacional de Educação e Formação de Adultos (ANEFA) em 1999. Esta instituição apoiada numa dupla tutela ministerial (Educação e Trabalho e Solidariedade Social) vem dar um novo impulso à interligação entre dois campos de práticas, educação e formação que até aí se encontravam de costas voltadas, o primeiro associado à “alfabetização” e o segundo identificado com a “formação profissional” (Canário, 2000, p. 33).

Mais recentemente e em consonância com as concepções prevalecentes sobre aprendizagem ao longo da vida, a proximidade e articulação entre elas é cada vez mais sustentada e exercida, a tal ponto que, como sugere Canário (2000), os termos de educação e formação começam hoje a ser utilizados de forma indistinta ou sinónima (p. 36).

Entre os projectos da ANEFA dirigidos à população adulta sem escolaridade obrigatória destacam-se os cursos EFA e a concepção de um sistema nacional de reconhecimento, validação e certificação de competências, apoiado por uma rede de centros distribuídos por todo o país, centros de RVCC. Ambos tiveram início em 2000 e são dirigidos à população adulta com idade igual ou superior a 18 anos, sem

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escolaridade básica obrigatória, a qual passa, assim a dispor destas duas novas modalidades como meio de melhorar os seus níveis de qualificação.

A ANEFA foi, entretanto, extinta em 2002, tendo as suas actividades sido continuadas pela Direcção-Geral de Formação Vocacional (DGFV) sob a tutela do Ministério da Educação. Esse caminho é reforçado pela criação da ANQ (Agência Nacional de Qualificação) com a mesma dupla tutela ministerial que tinha a ANEFA. Através desta configuração institucional, a articulação entre as políticas de educação e formação ganhou uma nova matriz de suporte e consolidação, contribuindo para a recolocação da educação e formação de adultos no centro das políticas educativas em Portugal (Canelas, 2007).

Um dos aspectos de maior novidade, quer nos cursos EFA quer nos processos de RVCC, é o desenvolvimento de um modelo curricular/sistema de reconhecimento, orientados não por programas disciplinares, mas por um Referencial de Competências- Chave (RCC). Este instrumento construído por uma equipa multidisciplinar, é a base fundamental que sustenta os modelos de certificação e reconhecimento de competências e deve ser entendido no âmbito das orientações actuais no domínio educativo. Estas tendências vão no sentido de inverter a perspectiva que tem vigorado, até agora, de um ensino escolar baseado na aquisição de conhecimentos disciplinares, para uma modalidade educativa orientada por uma lógica de competências com utilidade social efectiva.