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Para a compreensão da Educação Básica faz-se necessário apresentar, ainda que brevemente, os documentos que norteiam sua organização e funcionamento, sendo eles: a Lei nº 9.394, que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica e o Plano Nacional de Educação, aprovado em 2014. Além desses, deve-se fazer menção a outros documentos fundamentais como a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) nos itens referentes à educação51,52. Devido à proposta do presente estudo, será dado maior enfoque à etapa do ensino fundamental.

A Constituição Federal prevê nos artigos 205 e 206 a educação como relevante para o pleno desenvolvimento do ser humano no tocante ao exercício da cidadania e o preparo para o mercado de trabalho52. O direito subjetivo da criança à educação, entre outros, também é citado na lei do ECA53, conforme explicita o artigo 4º: é “dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária”. Essa lei define criança como o indivíduo na faixa etária de até doze anos de idade incompletos e adolescente entre doze e dezoito anos de idade.

A Lei nº 9.394/1996, LDB54, afirma no Art. 1º que “a educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais” ressaltando a relação necessária entre meio social e a escola.

De acordo com essa lei, conforme Art. 16, o sistema federal de ensino compreende as instituições de ensino mantidas pela União; as instituições de educação superior criadas e mantidas pela iniciativa privada; e os órgãos federais de educação. A Educação Básica é tratada no Art. 21 como primeiro nível da educação escolar, sendo composta pela educação infantil, ensino fundamental e médio. O ensino superior constitui o segundo nível54.

A educação básica está estruturada em três etapas: Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio. A primeira etapa contempla a creche com crianças até três anos e a pré-escola com duração de dois anos. A segunda constitui uma etapa obrigatória e gratuita, tem duração de nove anos e é dividida em duas fases: cinco anos iniciais e quatro anos finais. A terceira etapa, o ensino médio, tem duração mínima de três anos55. O Quadro 1 sintetiza a organização da educação escolar no Brasil56.

Quadro 1 – Organização da educação escolar no Brasil.

Níveis Etapas Duração Faixa Etária

Educação Superior Ensino Superior Variável Acima de 18 anos

Educação Básica

Ensino Médio 3 anos 15-17 anos Ensino

Fundamental

Anos

finais 4 anos 11-14 anos Anos

iniciais 5 anos 6-10 anos

Educação Infantil

Pré-escola 2 anos 4-5 anos Creche

3 anos 0-3 anos

Fonte: Adaptado de Ministério da Educação. Relatório educação para todos no Brasil 2000- 2015.

Também fazem parte da Educação Básica outras modalidades de ensino que podem ser ofertadas de maneira adicional às demais etapas: Educação Especial, Educação de Jovens e Adultos, Educação do Campo, Educação Escolar Indígena, Educação Profissional e Tecnológica, Educação a Distância, a educação nos estabelecimentos penais e a quilombola55.

Conforme o Art. 22 da LDB54, a educação básica deve assegurar a todos “a formação comum indispensável para o exercício da cidadania e fornecer-lhes meios para progredir no

trabalho e em estudos posteriores”, conferindo um duplo caráter: o término de um ciclo e/ou a continuidade dos estudos no segundo nível de educação55.

A primeira etapa da Educação Básica, a educação infantil, “tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança [...] em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade” (Art. 29)54

.

A LDB de 1996 consolida e amplia o dever o Estado com a educação básica do cidadão, principalmente, em relação ao ensino fundamental, mediante:

[...]I - o desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como meios básicos o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo; II - a compreensão do ambiente natural e social, do sistema político, da tecnologia, das artes e dos valores em que se fundamenta a sociedade; III - o desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, tendo em vista a aquisição de conhecimentos e habilidades e a formação de atitudes e valores; IV - o fortalecimento dos vínculos de família, dos laços de solidariedade humana e de tolerância recíproca em que se assenta a vida social (Art. 32)54.

De maneira a garantir uma base nacional comum a LDB pressupõe um conjunto de diretrizes para nortear os currículos e conteúdos mínimos do ensino fundamental e médio, porém, passíveis de adaptação aos diferentes contextos loco-regionais. Para tanto, alguns itens são obrigatórios: o estudo da língua portuguesa e da matemática, do mundo físico e natural, da realidade social e política, especialmente do Brasil; o ensino da arte; a educação física; o ensino da História do Brasil, considerando as variações culturais e étnicas, sobretudo, no tocante aos povos indígenas, africanos e europeus; e a inclusão, a partir da quinta série, do ensino em uma língua estrangeira moderna, tendo a instituição livre arbítrio para escolha(Art. 26, entre os § § 1º e 5º)54.

A ampliação do ensino fundamental de oito para nove anos firmada pela Resolução no 3 de agosto de 2005 CNE/CEB e o ingresso da criança no ensino fundamental a partir dos seis anos de idade – desde que completos até o dia 31 de março do respectivo ano da matrícula – tem como escopo melhorar as condições de equidade e qualidade da Educação Básica. Além disso, o ensino em nove anos amplia a vivência da criança no Ensino Fundamental permitindo um maior tempo para o aprendizado da alfabetização e do letramento55,57.

Por muitos anos, o Ensino Fundamental foi o foco das políticas públicas educacionais por meio do repasse financeiro a essa etapa do ensino, prejudicando a universalização das demais etapas da educação básica58. O mecanismo inicial de redistribuição de recursos para a educação básica era o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF) implantado em 1998, porém, com enfoque no ensino fundamental, em detrimento da educação infantil e do ensino médio. Essa lacuna foi

preenchida somente em 2007 quando se tornou o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB) e ampliou a abrangência dos recursos financeiros englobando as três modalidades da educação básica55.

A universalização do ensino fundamental foi proposta pelo Plano Nacional da Educação59, aprovado pela Lei nº 10.172, em 2001, como diretriz a ser atingida dentre dos próximos cincos anos de sua promulgação. A cargo do Poder Público e considerando a qualidade do ensino desde a matrícula até a conclusão dos estudos nessa etapa.

Os dados do Censo Escolar 201660 evidenciam que as matrículas no ensino fundamental regular apresentaram declínio entres os anos de 2008 e 2016. Nos anos inicias, houve queda de 1,51% das matriculas do ano de 2014 para 2015 e 0,76% de 2015 para 2016. Nos anos finais, o decréscimo foi de 3,12% no ano de 2014 para 2015 e de 0,96% de 2015 para 2016. Essa redução pode ser decorrente da melhoria dos indicadores fluxo escolar e do ajustamento ao tamanho da população com consequente diminuição de matrículas em uma determinada idade. Entretanto, nos anos iniciais, observa-se alta taxa de não aprovação e distorção idade-série nos alunos do 3o ano do ensino fundamental e nas etapas introdutórias dos anos finais.

Esses indicadores fazem refletir acerca da qualidade da educação oferecida, pois não basta ampliar o acesso dos estudantes ao ensino em suas diversas modalidades, e sim garantir que a escola promova a formação de cidadãos aptos a atuar no mundo de trabalho ou dar continuidade ao processo educacional.

A construção da cidadania requer processos pedagógicos que considerem a realidade social, os direitos e as responsabilidades no âmbito individual, coletivo e ambiental. Na preocupação em atender questões relevantes e atuais que se colocam no cotidiano das relações sociais, os PCN especificam os temas transversais que devem ser abordados nos projetos educacionais das escolas: Ética, Pluralidade Cultural, Meio Ambiente, Saúde e Orientação Sexual. A transversalidade significa que esses temas deverão ser incorporados em todas as etapas do ensino fundamental27.

Em relação à abordagem de saúde, com base nos PCN, esta não é mais responsabilidade única do professor da disciplina de Ciências Naturais, mas de toda a comunidade escolar (professores) em parceria com a família e sociedade, abordando o tema de maneira contextualizada e sistemática com vistas à formação de cidadãos capazes de atuar em prol da melhoria dos níveis de saúde pessoais e da coletividade61.

A abordagem do tema de maneira transversal visa superar a fragmentação do ensino em saúde e a visão biológica, centrada na transmissão de conhecimentos acerca do

funcionamento do corpo, descrição de doenças e hábitos de higiene. Esse tipo de metodologia de ensino é insuficiente para promover mudanças de comportamentos e o desenvolvimento de hábitos de vida mais saudáveis61.

A premente necessidade de incorporar conceitos acerca de saúde no cenário escolar não implica em tornar o professor um especialista na área, mas que o seu trabalho pedagógico permita instrumentalizar o aluno para o desenvolvimento de uma visão crítica dos desafios que lhe são apresentados em suas relações sociais tais como opiniões negativas sobre saúde, necessidades de transformar hábitos e de reavaliar crenças e tabus61.

Ao iniciar a vida escolar a criança traz consigo valores e comportamentos de saúde que foram observados e adquiridos ao longo de uma convivência prévia com a família e entes mais próximos. Nesse contexto, a escola assume um papel social relevante em função da sua estrutura para um trabalho sistematizado e contínuo em um período considerado oportuno para a construção de hábitos de vida saudáveis, tanto para reafirmar comportamentos corretos como para transformar os inadequados61.

Nessa perspectiva, compreende-se que abordar a temática do aleitamento materno no ensino fundamental poderá contribuir para o desenvolvimento de crianças que sejam capazes de influenciar positivamente o seu entorno social a partir do compartilhamento do conhecimento adquirido na escola. Dessa forma, a criança poderá promover a revisão de práticas inadequadas, desmistificação de crenças e tabus, e reforçar comportamentos favoráveis à amamentação em uma relação dialógica entre escola-criança-família-sociedade.

A educação em saúde na escola vem atender o PSE, instituído em 2007 pelo Decreto Presidencial nº 6 elaborado em parceria entre o MS e o MEC tendo como finalidade promover saúde e educação integral para crianças, adolescentes, jovens e adultos da rede pública de ensino. No ano de 2013 houve a universalização do PSE, atingindo todos os municípios do país62,63.

O desenvolvimento do programa requer a articulação entre educação e rede básica de saúde bem como entre outras redes sociais que se fizerem necessárias ao enfretamento das vulnerabilidades dos estudantes brasileiros. Para tanto, torna-se obrigatório o movimento de aproximação entre a escola e a unidade básica de saúde no planejamento e na implementação das atividades de educação em saúde62,63.

As ações propostas pelo PSE devem estar contempladas no projeto político- pedagógico da instituição escolar, respeitando-se a diversidade sociocultural do país e a autonomia dos educadores. Antes de iniciar ações de promoção da saúde na escola deve-se primeiramente conhecer os saberes prévios dos estudantes, professores e funcionários e, a

partir disso, favorecer o desenvolvimento de atitudes e comportamentos que promovam a qualidade de vida63.

O PSE pode representar um avanço ao estreitar as relações entre gestores, educadores e profissionais da saúde. No entanto, são observadas algumas limitações para a concretização dessa proposta, pois as ações de educação em saúde, quando acontecem, são realizadas pelos serviços de saúde, instituições de ensino superior e/ou empresas privadas na escola. Além disso, as temáticas abordadas enfatizam a alimentação saudável, hábitos de higiene, prevenção de doenças sexualmente transmissíveis e gravidez indesejada. E as atividades, em sua maioria, são desvinculadas do programa curricular e do projeto pedagógico e não envolvem a participação efetiva da instituição de ensino64.

Dessa forma, observa-se a necessidade de articular e integrar as ações de educação em saúde entre profissionais da saúde e educadores. É necessário investir no desenvolvimento do potencial educador dos professores como promotores de saúde na escola por meio da oferta de capacitação através de cursos de educação continuada ou atualização. As equipes de saúde da família deverão manter contato contínuo com a escola, realizando visitas periódicas ao longo do ano letivo para avaliar as condições de saúde dos educandos65.

A efetivação do PSE requer a formação de vínculo de saúde da família com a coordenação da escola e demais profissionais da educação. O grupo precisa ter conhecimento do funcionamento do programa, das atividades previstas, do público-alvo e das demandas da instituição. É necessário um trabalho conjunto, o estabelecimento de parceria e compromisso de todos os envolvidos. Para atingir esse objetivo, reuniões e seminários de integração podem ser realizados com a participação da equipe de saúde da família, profissionais da educação, estudantes e familiares66.

O público-alvo do PSE, os estudantes, devem ser ouvidos, de maneira a identificar as suas necessidades para a formulação de ações de promoção da saúde e prevenção de doenças, ultrapassando a visão meramente assistencialista. O enfermeiro pode mediar a interlocução da equipe multidisciplinar de saúde com os profissionais da educação com vistas à criação de momentos no ambiente escolar que possam ser compartilhados pela equipe de saúde da família, professores, estudantes e familiares. Os professores, nesse contexto, podem indicar temas a serem abordados de acordo com as disciplinas que ministram e metodologias que tornem os assuntos mais interessantes aos alunos, como, por exemplo, palestras, oficinas, teatros, música, jogos entre outros28.

Por sua vez, o educador da área do ensino ou da saúde precisa compreender a relação entre cuidar e educar no processo formativo da criança, fundada na ética e na estética, e que

permita o desenvolvimento de valores essenciais para um ser humano em construção: cooperação, solidariedade e respeito ao outro55.

Diante do exposto, percebe-se que a educação brasileira vem se construindo no âmbito dos programas, políticas, leis e resoluções em constante processo de avaliação e reavaliação para atender as demandas sociais. A articulação e integração entre as instituições educacionais, os serviços de saúde, família e comunidade pode promover melhorias na qualidade do ensino e favorecer a aquisição de hábitos e comportamentos mais saudáveis, sobretudo, nas crianças. É nessa perspectiva que a promoção do aleitamento materno na escola possibilitará a promoção e construção de saberes acerca do tema e o desenvolvimento de valores de cooperação e respeito.

Para tanto, o planejamento e a implementação da atividade educacional na escola voltada à promoção do aleitamento materno exige do enfermeiro um conhecimento capaz de instrumentalizá-lo para a abordagem da criança. Assim, devem-se considerar aspectos do crescimento e desenvolvimento infantil que influenciam o aprendizado do escolar à medida que cada período específico do desenvolvimento humano requer propostas pedagógicas próprias. Nesse contexto, destacam-se teorias de Jean Piaget e Lev Semynovycth Vygotsky, cujos constructos fundamentam e norteiam o planejamento, a execução e a avaliação dessa intervenção educacional.

4.2 CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO INFANTIL NA PERSPECTIVA DE